Diógenes Pires Amaral* | Téla
Nón | opinião
São Tomé e Príncipe, actualmente
encontra se mergulhado numa profunda crise de múltiplas facetas económica,
política, social, moral, cultural…
Há semanas esteve reunido o
Conselho de Estado, órgãos de consulta do Chefe de Estado. Pelo o que foi dado
a conhecer ao público através da imprensa, o Conselho constatou que, duma
maneira geral, as instituições da República Democrática de São Tomé e Príncipe
funcionam com múltiplas deficiências graves. Os órgãos de soberania estão de
costas viradas.
A necessária interação que
deveria existir entre os mesmos vem sendo substituída por confronto público de
competência e militância. O sistema institucional santomense corre, por
conseguinte, o risco de perder credibilidade, portanto a legitimidade.
Os partidos políticos, os mais
importantes pilares do sistema democrático, carecem de reformas profundas,
ainda não estão preparados para garantir um funcionamento adequado do sistema
democrático.
As oposições no interior dos
partidos vão-se extremando e conflitualizando cada vez mais. A concertação vai
perdendo valor enquanto instrumento que facilita o esbater das diferenças. Cada
interesse prefere permanecer autêntico, específico, e não deixa espaço para a
interpenetração e apaziguamento.
Como pilares imprescindíveis do
sistema, os partidos políticos devem ser sujeitos a reformas periódicas, não
devem continuar a ser utilizados como instrumentos descartáveis ao serviço de
agendas pessoais, pondo em risco a estabilidade do sistema.
São Tomé e Príncipe convive com
um sistema democrático, onde o desejável confronto democrático do contraditório
é inexistente. Em contrapartida, assiste–se a uma devastadora luta de clãs,
quer no interior de um mesmo partido, quer entre diferentes partidos.
Os partidos políticos em São Tomé
e Príncipe não fazem a oposição com propostas de projectos alternativos, mas
quase exclusivamente com ofensas pessoais em comunicado de imprensa e nas redes
de comunicação social.
As relações conflituosas no
interior dos partidos políticos e entre partidos políticos, são projectados
através das suas militâncias, nas comunidades e nas famílias Santomenses,
favorecendo assim o surgimento de um clima gerador de conflitos, destruidora do
espírito de solidariedade comunitária, dificultando muitas vezes a mobilização
dos moradores na busca de soluções aos problemas de interesse comum.
A sociedade civil incipientemente
organizada, ainda frágil na sua estruturação, directa ou indirectamente
infiltrada pelos partidos políticos, convive pacificamente com os atropelos do
poder instalado, não fazendo ouvir a sua voz. Optou preferencialmente pela luta
clandestina nas redes sociais.
A diáspora santomense, uma
importante comunidade quer pela sua extensão, quer ainda e sobretudo pelo seu
valioso olhar crítico sobre o país não é tida nem achada. Nada vem sendo feito
para que a diáspora se sinta integrada no processo de desenvolvimento do país.
Pouco a pouco os santomenses da diáspora e os seus descendentes vão perdendo o
sentimento de pertença a santomensidade.
Mais do que a metade dos
habitantes de São Tomé e Príncipe é jovem. O futuro de São Tomé e Príncipe
estará comprometido se no presente não forem criadas condições para garantir à
juventude uma formação adequada, em consonância com as diferentes fases dos
objectivos estratégicos a serem definido para o país. Se assim não for,
corre-se o risco de matar no ovo os sonhos da juventude.
Seria ilusório esperar-se que a
juventude não sonhe, que viva sem utopias. Durante o período da luta de
libertação nas colónias portuguesas, os jovens eram viciados em utopias. Lutar
pela independência e construir num país livre e independente uma sociedade onde
não existisse a exploração do homem pelo homem, uma sociedade onde o homem
fosse amigo do homem, era o sonho da maioria dos jovens das colónias.
É certo que a juventude do
período da luta de libertação alimentava-se com sonhos e utopias, mas não era
drogada, embora na altura já houvesse droga. Como diria o Frei Beto, citando:
“estou convencido que quanto mais utopias menos drogas. Se o sonho da juventude
não é social, não é político, não é solidário, tem que ser químico”, fim da
citação.
Em São Tomé e Príncipe existem
várias organizações juvenis no atual contexto da República. Não é contudo
evidente que a partidarização das organizações juvenis seja politicamente a
forma mais acertada de mobilização da juventude. Uma única Organização Nacional
da Juventude, tendo em conta que os objectivos das organizações juvenis são no
essencial idênticos, seria não só mais representativa como também estaríamos
perante uma força política de equilíbrio no sistema democrático.
O mesmo se pode dizer das
organizações políticas das mulheres em São Tomé e Príncipe. A mulher e o homem,
ambos têm um papel decisivo a jogar no processo do desenvolvimento do País. A
mulher não pode ser colocada na boleia do processo. Ela tem que se libertar
definitivamente da tutela machista. Integrada numa organização política
Nacional única, estaria em melhores condições para desempenhar o papel que lhe
cabe no processo de desenvolvimento do nosso País.
A situação económica do país
vai-se deteriorando cada dia que passa. Não sei quem inventou que STP é um país
de rendimento médio. Há décadas que STP esta mergulhado numa profunda crise.
Com base em que dados STP mereceu ser classificado de pais de rendimento medio?
Será que o país tem estado a desenvolver? Os países que hoje são classificados
de países desenvolvidos, conseguiram atingir esse estatuto porque obedeceram
rigorosamente a três importantes factores de desenvolvimento:
Primeiro: Um alto nível de
poupança doméstica, quer dizer, tiveram que ter em conta quanto é que produziam
e quanto é que gastavam. O que sobrava é que era utilizado para o
desenvolvimento. No caso de STP, como garantir a poupança com um nível tão
baixo de produção de riquezas?
Segundo: A existência de um sector público e privado forte, iniciativa privada forte. Como esta em São Tomé e Príncipe?
Sectores públicos e privados
mergulhados na falência técnica e financeira.
Terceiro: Qualificação: A qualificação das pessoas foi fundamental para o sucesso. O investimento na educação e na formação constituiu uma preocupação prioritária dos decisores políticos.
Como é que São Tomé e Príncipe pode ser classificado de país de desenvolvimento médio, sem desenvolvimento? É caso para responder como o poeta: “ Pergunte ao sábio da escritura que segredos são esses da política”.
De 12 de Julho de 1975 até 1991 o
país evoluiu de um sistema monolítico de partido único para um sistema
democrático. A primeira eleição multipartidária foi realizada em janeiro de
1991. O partido no poder durante 15 anos organizou as eleições e, facto
histórico no continente africano, perdeu. O partido ganhador ganhou com maioria
absoluta.
Salvo os anos de 1991, 1998 e
2014 em que os partidos políticos vencedores obtiveram a maioria absoluta só
vem sendo possível garantir a governalidade com aliança entre partidos
políticos. Para garantir a governabilidade os partidos optaram por comprar o
apoio parlamentar. Assiste-se então, e isso virou moda, a um verdadeiro balcão
de negócios. A formação de governo de coligação se tornou numa autêntica feira
à céu aberto. Esse tipo de prática faz com que as pessoas estejam cada vez mais
descrentes da política.
Com atual modelo de
governabilidade o eleitor assina um cheque em branco aos partidos políticos.
Com efeito uma vez conhecido os resultados eleitorais, o cidadão eleito fica
durante quatro anos completamente afastado de todo o processo de tomada de
decisões sobre assuntos que têm a ver com a sua vida. Em suma, o poder
constitucional do povo só é exercido num domingo eleitoral, abundantemente
banhado. Por conseguinte o sistema democrático vigente não permite a
participação activa do cidadão santomense no processo de decisão sobre questões
fundamentais para a sua vida presente e futura.
É também habitual dizer- se, a
constituição da república confirma, que os deputados eleitos são na Assembleia
da República o representante do povo. Deveriam, por conseguinte, ser escolhidos
pelo povo. Todavia a forma como são eleitos, mais parecem militantes deputados
dos partidos políticos do que representantes do povo.
Num país, São Tomé e Príncipe de
1001km², com cerca de mais ou menos 200 mil habitantes poder-se-ia implementar
a democracia direta, o que reforçaria o sistema democrático vigente e
fortaleceria o cordão umbilical que deve existir entre o deputado eleito e a
comunidade que o mesmo pretende representar.
Em suma, se não houver uma
democratização efectiva do poder, o que significa reduzir o poder dos políticos
e aumentar o poder dos cidadão, o que significa criar ferramentas de
participação popular, onde a governabilidade passa também pela escuta do povo,
passa por mecanismo de decisão do povo, vamos ficar sempre reféns de um modelo
que afasta o povo do poder. Há que trazer o povo para o centro do jogo
político, com plebiscito, com referendo, com formas de participação directa.
Como foi dito no primeiro
parágrafo, o país vive actualmente numa profunda crise de múltiplas facetas:
económica, politica, social, moral, cultural. O país confronta-se com grandes
desafios que não se compadecem com ausência de liderança. O que torna a
situação ainda mais perturbante é, como dizia Barack Obama, “o fosso entre a
magnitude dos desafios que temos pela frente e a pequenez das nossas políticas,
a facilidade com que nos distraímos com mesquinhices e trivialidades, a forma
cronica como evitamos decisões difíceis, a aparente incapacidade que temos para
construir consenso funcional que enfrente qualquer grande desafio (Barack Obama
na Audácia de Esperança pág. 2 e 3) ”.
Perante uma tão grave situação
nenhum santomense pode continuar a assistir passivamente o rolar do comboio
rumo ao abismo das incertezas.
Depois de 44 anos de uma
tempestuosa travessia há que se criar sem mais delongas um espaço onde todos
juntos irão repensar São Tomé e Príncipe.
Iremos continuar com o mesmo paradigma? Ou será que temos que mudar a forma como percebemos e equacionamos os problemas deste País, tão pequeno de superfície, mas com um nome tão extenso?
Pode-se, no entanto, desde já
afirmar que algo só irá mudar em STP se todos os partidos políticos, a
sociedade civil, as comunidades santomenses no país e no estrangeiro forem
chamadas a participar num debate harmonizador das diferenças, em busca de uma
saída consensual que nos assente definitivamente nos carris do desenvolvimento
sustentável.
Na conjuntura actual, este
processo de diálogo tem que ser iniciado e liderado por uma individualidade
sobre quem recai constitucionalmente a responsabilidade de garantir a “unidade
do Estado e assegurar o regular funcionamento das instituições.”
O Presidente da República, Chefe
de Estado, perante o eminente perigo de desmoronamento de sistema democrático
santomense, não deve continuar a observar a caravana a passar. Tem que agir com
celeridade porque o sistema democrático santomense corre sérios riscos de
perder credibilidade e portante a legitimidade.
De alertar desde já no entanto
que há que agir com ponderação. Seria de todo desaconselhável, no atual
contexto, qualquer ação que se assemelhe a caça as bruxas.
Um primeiro encontro do processo
do desejável diálogo liderado pelo Presidente da República deveria ser levado a
cabo, com a participação directa dos detentores dos órgãos de soberania. Do
encontro poderia ser proposto os assuntos ou temas a serem abordados no Diálogo
Nacional.
Num segundo encontro do
Presidente da República com os políticos, com e sem assento parlamentar, seria
dada a conhecer aos partidos políticos, com alguma antecedência, as conclusões
do encontro com os detentores dos órgãos de soberania.
Dos resultados dos encontros do
Presidente da República com os detentores dos órgãos de soberania e os partidos
políticos sairão elementos necessários para a elaboração dos assuntos e ou
temas a serem debatidos no Diálogo Nacional.
Tratando-se de um Diálogo
Nacional donde deverão sair as grandes linhas de orientação para a elaboração
de um projecto de Carta de Consenso Nacional, nele deveriam participar:
– Representantes máximos dos
órgãos de soberania;
– Os partidos políticos com e sem assento na Assembleia Nacional;
– Representantes da sociedade civil organizada;
– Representantes credenciados da diáspora santomense;
– Lideres das Igrejas acreditadas em STP.
– Os partidos políticos com e sem assento na Assembleia Nacional;
– Representantes da sociedade civil organizada;
– Representantes credenciados da diáspora santomense;
– Lideres das Igrejas acreditadas em STP.
A carta de Consenso Nacional
seria elaborada com base nas decisões saídas do Diálogo Nacional. A Carta seria
elaborada com apoio de especialistas e técnicos nacionais e outros.
Será na Carta de Consenso
Nacional é que iremos encontrar a resposta á pergunta: QUO VADIS STP?
*Diógenes Pires Amaral
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