quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Angola | Subida de preços e mais casos de corrupção nos tribunais em 2020


2020 prevê-se difícil em Angola. Os principais produtos e serviços básicos vão continuar a subir em função de algumas medidas tomadas pelo Governo. Entretanto, nos tribunais, espera-se por mais processos de corrupção.

O ano de 2019 não foi fácil para muitos cidadãos angolanos, mas o novo ano que se inicia também se advinha difícil. É o que diz um cidadão ouvido pela DW África na condição de anonimato, que desabafa: "Meu 'kassalário' que eu ganho é de 20 mil kwanzas (cerca de 20 euros). As minhas crianças não estudam. A esposa trabalha no mercado, não trabalha numa empresa".

Como ele, há milhares de cidadãos nacionais que não encaram este ano com otimismo por vários fatores. Um deles é a entrada em circulação de uma nova família de Kwanza, que inclui uma nota de 10 mil, maior valor facial nesta nova série da moeda angolana.

Alexandre Neto Solombe, jornalista e economista angolano, não tem dúvidas: esta medida vai aumentar a inflação e, consequentemente, a subida de preços dos principais produtos e serviços básicos prestados à população.  

 "Inflação já é uma realidade"

"Haverá um reforço do potencial de inflação que já é uma realidade nos dias presentes. Esta é para mim, estou a falar de inflação, a consequência e o custo reflexo mais relevantes que estão a ser tomados neste momento pelas autoridades angolanas", explica Solombe.

Outra medida a ser tomada que também vai "agravar a vida da população" é o reajuste do preço dos combustíveis, diz João Malavindele, ativista e coordenador da ONG OMUNGA, sediada no Lobito, província angolana de Benguela.

Segundo Malavindele, os preços dos combustíveis vão agravar ainda mais a situação económica e social de muitos angolanos "na medida em que os referidos reajustes não se fazem acompanhar com o reajuste salarial".

"O salário básico atualmente já não consegue suprir as necessidades básicas e com este aumento vai provocar inflação de certos produtos no mercado", avalia o ativista da OMUNGA.

Associa-se a esta realidade uma dívida pública angolana que já atingiu a cifra de 90% do Produto Interno Bruto (PIB) e um índice de desemprego que ronda os 30%, segundo dados oficiais.

Corrupção vai aos tribunais

Entretanto, o ano de 2020 prevê também mais casos de corrupção nos tribunais angolanos no âmbito da luta contra este fenómeno e a impunidade. Por exemplo, já está no supremo o processo-crime de Higino Carneiro, ex-ministro das Obras Públicas e governador de Luanda, acusado de  crimes de peculato, violação de normas de execução do plano e orçamento, entre outros crimes.

Também já foi remetida a ação de Manuel Rebelais, ex-ministro da Comunicação Social e diretor do extinto Gabinete de Revitalização e Execução da Comunicação Institucional (GRECIMA). É indiciado por crimes de peculato, associação criminosa, corrupção, entre outros. Ambos gozam de imunidade por serem deputados do MPLA, partido no poder, no Parlamento angolano.

Nuno Álvaro Dala, ativista cívico e investigador, diz que "não espera por grandes resultados" dos dois processos, "na medida em que em determinados processos, há também uma mão política que se traduzem em influenciar o sistema judicial, para que a sentença seja aquela que se enquadra dentro de uma estratégia de os mesmos cumprirem, caso venham a ser condenados, uma pena bastante curta".

Mais titulares de cargos públicos

Para além destes, Nuno Álvaro Dala acredita que mais titulares de cargos públicos serão indiciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por atos de corrupção. "Surgirão mais processos de ex-governantes envolvidos em atos de corrupção. Os últimos atos da PGR têm estado a indiciar exatamente isso, que surgirão outros processos".

"Mas, mais importante do que isso", pondera Dala, "é que esses processos sejam realmente consequentes, ou seja, que não sejam uma manobra de diversão, uma espécie de fingimento para transmitir aquela ideia de que há um combate efetivo contra a corrupção e outros males".

Na última segunda-feira, o Tribunal Provincial de Luanda, a pedido da PGR, decretou o arresto preventivo de contas pessoais e nove empresas da empresária Isabel dos Santos. A PGR aponta irregularidades em negócios celebrados pela filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos com  Estado e por isso adotou a medida cautelar. A empresária nega as acusações e diz que o processo tem motivações políticas.

O ativista Nuno Álvaro Dala lembra ainda o caso Manuel Vicente e diz não acreditar que a justiça angolana venha a quebrar o "silêncio" neste ano. O ex-vice-Presidente da República de Angola foi acusado em Portugal de corromper o ex-procurador português Orlando Figueira, com o pagamento de 760 mil euros, para que este arquivasse dois inquéritos, um dos quais,  envolvendo a empresa Portmill, relacionado com a aquisição de um imóvel de luxo no Estoril, em 2008. O processo conhecido como "Operação Fizz", foi transferido para Angola em Julho de 2018 para seguir os seus trâmites legais.

"Não acredito que haverá algum desfecho no sentido daquilo que os cidadãos imaginam. Ou seja, haver uma condenação em função dos crimes cometidos", conclui Álvaro Dala.

Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche Welle

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