2020 prevê-se difícil em Angola.
Os principais produtos e serviços básicos vão continuar a subir em função de
algumas medidas tomadas pelo Governo. Entretanto, nos tribunais, espera-se por
mais processos de corrupção.
O ano de 2019 não foi fácil para
muitos cidadãos angolanos, mas o novo ano que se inicia também se advinha
difícil. É o que diz um cidadão ouvido pela DW África na condição de anonimato,
que desabafa: "Meu 'kassalário' que eu ganho é de 20 mil kwanzas (cerca de
20 euros). As minhas crianças não estudam. A esposa trabalha no mercado, não
trabalha numa empresa".
Como ele, há milhares de cidadãos
nacionais que não encaram este ano com otimismo por vários fatores. Um deles é
a entrada em circulação de uma nova família de Kwanza, que inclui uma nota de
10 mil, maior valor facial nesta nova série da moeda angolana.
Alexandre Neto Solombe,
jornalista e economista angolano, não tem dúvidas: esta medida vai aumentar a
inflação e, consequentemente, a subida de preços dos principais produtos e
serviços básicos prestados à população.
"Haverá um reforço do
potencial de inflação que já é uma realidade nos dias presentes. Esta é para
mim, estou a falar de inflação, a consequência e o custo reflexo mais
relevantes que estão a ser tomados neste momento pelas autoridades angolanas",
explica Solombe.
Outra medida a ser tomada que
também vai "agravar a vida da população" é o reajuste do preço dos
combustíveis, diz João Malavindele, ativista e coordenador da ONG OMUNGA,
sediada no Lobito, província angolana de Benguela.
Segundo Malavindele, os preços
dos combustíveis vão agravar ainda mais a situação económica e social de muitos
angolanos "na medida em que os referidos reajustes não se fazem acompanhar
com o reajuste salarial".
"O salário básico atualmente
já não consegue suprir as necessidades básicas e com este aumento vai provocar
inflação de certos produtos no mercado", avalia o ativista da OMUNGA.
Associa-se a esta realidade uma
dívida pública angolana que já atingiu a cifra de 90% do Produto Interno Bruto
(PIB) e um índice de desemprego que ronda os 30%, segundo dados oficiais.
Corrupção vai aos tribunais
Entretanto, o ano de 2020 prevê
também mais casos de corrupção nos tribunais angolanos no âmbito da luta contra
este fenómeno e a impunidade. Por exemplo, já está no supremo o processo-crime
de Higino
Carneiro, ex-ministro das Obras Públicas e governador de Luanda, acusado
de crimes de peculato, violação de normas de execução do plano e
orçamento, entre outros crimes.
Também já foi remetida a ação de
Manuel Rebelais, ex-ministro da Comunicação Social e diretor do extinto
Gabinete de Revitalização e Execução da Comunicação Institucional (GRECIMA). É
indiciado por crimes de peculato, associação criminosa, corrupção, entre outros.
Ambos gozam de imunidade por serem deputados do MPLA, partido no poder, no
Parlamento angolano.
Nuno Álvaro Dala, ativista cívico
e investigador, diz que "não espera por grandes resultados" dos dois
processos, "na medida em que em determinados processos, há também uma mão
política que se traduzem em influenciar o sistema judicial, para que a sentença
seja aquela que se enquadra dentro de uma estratégia de os mesmos cumprirem,
caso venham a ser condenados, uma pena bastante curta".
Mais titulares de cargos públicos
Para além destes, Nuno Álvaro
Dala acredita que mais titulares de cargos públicos serão indiciados pela
Procuradoria-Geral da República (PGR) por atos de corrupção. "Surgirão
mais processos de ex-governantes envolvidos em atos de corrupção. Os últimos
atos da PGR têm estado a indiciar exatamente isso, que surgirão outros
processos".
"Mas, mais importante do que
isso", pondera Dala, "é que esses processos sejam realmente
consequentes, ou seja, que não sejam uma manobra de diversão, uma espécie de
fingimento para transmitir aquela ideia de que há um combate efetivo contra a
corrupção e outros males".
Na última segunda-feira, o
Tribunal Provincial de Luanda, a pedido da PGR, decretou o arresto
preventivo de contas pessoais e nove empresas da empresária Isabel dos
Santos. A PGR aponta irregularidades em negócios celebrados pela filha do
ex-Presidente José Eduardo dos Santos com Estado e por isso adotou a
medida cautelar. A empresária nega as acusações e diz que o processo tem
motivações políticas.
O ativista Nuno Álvaro Dala
lembra ainda o caso Manuel Vicente e diz não acreditar que a justiça angolana
venha a quebrar o "silêncio" neste ano. O ex-vice-Presidente da
República de Angola foi acusado em Portugal de corromper o ex-procurador
português Orlando Figueira, com o pagamento de 760 mil euros, para que
este arquivasse dois inquéritos, um dos quais, envolvendo a empresa
Portmill, relacionado com a aquisição de um imóvel de luxo no Estoril, em 2008.
O processo conhecido como "Operação Fizz", foi transferido para
Angola em Julho de 2018 para seguir os seus trâmites legais.
"Não acredito que haverá
algum desfecho no sentido daquilo que os cidadãos imaginam. Ou seja, haver uma
condenação em função dos crimes cometidos", conclui Álvaro Dala.
Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche
Welle
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