#Publicado em português do Brasil
Merkel pôs em xeque o pacto
comercial devido às queimadas na Amazônia. Ao ignorarem o alerta, governos
sul-americanos deixam claro seu desinteresse na implementação do tratado.
Também na Europa o silêncio predominou.
Faz exatamente um ano desde que o
presidente francês, Emmanuel Macron, atacou o Brasil pela primeira vez por
causa dos incêndios na Amazônia, durante a cúpula do G7 na França. A chanceler
federal alemã, Angela Merkel, disse agora que tem dúvidas sobre
se o acordo comercial da União Europeia (UE) com o Mercosul ainda pode ser
implementado. O motivo são as queimadas na região amazônica.
As "sérias dúvidas" de
Merkel se encaixam na corrente de muitos outros críticos que há um ano vêm
exigindo cada vez mais veementemente que o governo brasileiro tome medidas
contra o desmatamento. Primeiro foram as organizações ambientais, depois os
embaixadores da Noruega e da Alemanha e, finalmente, agora fundos, bancos e
empresas que pediram ao governo de Jair Bolsonaro que tome uma atitude.
Mas as reações do governo até
hoje são as mesmas: afirma que faz o suficiente para proteger a Amazônia;
responde que a Europa e os Estados Unidos já desmataram tudo o que tinham; quer
oferecer parques nacionais a empresas privadas estrangeiras, para que elas
possam proteger o meio ambiente. Afinal, o que o mundo estaria disposto a
pagar pela proteção da floresta tropical?
Os militares, segundo o
governo, protegerão a floresta de maneira mais eficaz do que as
autoridades responsáveis. É preciso poder garantir aos pobres, como os
indígenas da Amazônia, uma vida digna, algo que só seria possível com empresas
e através de atividades econômicas. Assim soam os argumentos dos ministros
quando comentam o tema.
Na verdade, nada mudou em um ano:
nos últimos 12 meses até agosto deste ano, as queimadas aumentaram em cerca de
um terço em relação ao mesmo período do ano passado. Portanto, é
perfeitamente compreensível que a chanceler federal alemã se junte aos
críticos. Suas advertências têm peso.
Até poucos dias
atrás, Merkel era uma das mais importantes defensoras do
acordo UE-Mercosul dentro do bloco. Ela havia defendido publicamente no ano
passado o pacto contra as críticas do Bundestag, a câmara baixa do Parlamento
alemão: nenhuma árvore a menos seria derrubada na Amazônia se o acordo não se
concretizasse – era essa, mais ou menos, sua argumentação. Com a presidência do
Conselho da UE exercida pela Alemanha até o final do ano, muitos esperavam que
o acordo pudesse ainda dar um passo adiante em direção à ratificação.
Isso agora se tornou mais
difícil. Merkel pode não ter batido o martelo ainda, mas deixou claro que o
Brasil precisa se mexer. Assim, ela aumenta a pressão para tentar salvar o
acordo comercial. Mas até o fim de dezembro não deve acontecer muita coisa.
Ainda mais surpreendente é o
completo silêncio na América do Sul. Nenhum dos quatro governos do Mercosul
comentou as críticas da chanceler alemã. Também na imprensa suas críticas
encontraram pouca ressonância. A conclusão só pode ser uma: na América do Sul,
nenhum dos quatro países parceiros está realmente interessado no acordo. Mesmo
nas declarações dos quatro presidentes nas últimas semanas e meses, o acordo
não aparece mais sequer de forma secundária.
Isso não é diferente na Europa.
Na verdade, seria de se esperar que os interessados no acordo se manifestassem
depois das críticas de Merkel. Ou seja, as associações industriais, as empresas
de médio porte, as montadoras, os grupos de construção civil, a indústria
química – todos aqueles que fazem há 20 anos campanha pela abertura do mercado
na América do Sul e pela maior associação econômica mundial. Mas também na
Europa o silêncio predominou, com exceção de algumas
declarações de protocolo.
Portanto, tudo indica que o
acordo entre a Europa e o Mercosul terá uma morte silenciosa.
O que não é algo incomum na
América Latina. "Já houve muitos funerais para alianças regionais na
América Latina", disse o uruguaio Enrique V. Iglesias, que foi presidente
do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) por muitos anos. "Mas
nenhum enterro."
Alexander Busch* (md) | Deutsche
Welle
*Há mais de 25 anos, o jornalista
Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial
Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt)
e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e
estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch
vive e trabalha em São Paulo
e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
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