Em
Portugal tudo serve para lavar a imagem do regime de José Eduardo dos Santos.
Mas há alguns que têm lixívia perfumada, o que sempre dá um ar mais agradável à
porcaria. E, claramente, a TVI é a que mais se destaca.
Orlando
Castro – Folha 8, em Mukandas
Hoje
foi a vez de José Alberto Carvalho (“A TVI é a voz oficial de José Alberto
Carvalho, que a jornalista Manuela Moura Guedes tratou por Zé Beto e apodou de
burro”, escreveu o Jornal de Angola) apresentar mais um monumental fiasco
jornalístico, mas nobre peça de branqueamento, de Victor Bandarra sobre a seita
religiosa Kalupetaca.
Certamente,
como das vezes anteriores, com um guião escrito pelos seus amigos José Ribeiro
e Artur Queiroz, eis que Victor Bandarra vai ao Huambo descobrir a pólvora,
dando tempo de antena às verdades oficiais já que, como viu, não conseguiu
ouvir um só testemunho do lado dos seguidores de Kalupeteca, dos partidos da
oposição, ou das organizações não-governamentais, da Igreja Católica, da
Amnistia Internacional, da União Europeia ou das Nações Unidas.
Segundo
o especialista em lixívia e seus sucedâneos da TVI, a ter havido um massacre no
Monte Sume na Caála (Huambo), as vítimas foram apenas e só os elementos da
Polícia que foram mortos por esses terroristas dos Kalupetecas.
Do
ponto de vista da propaganda, reconheça-se que foi um brilhante trabalho. Do
ponto de vista do jornalismo foi pura e simplesmente uma, mais uma, sabujice…
certamente bem remunerada.
Em
Outubro de 2013, o Pravda de Luanda (“Jornal de Angola”, segundo o MPLA), órgão
de referência para Victor Bandarra e para os sabujos que lhe dão cobertura,
atacou forte e feio a TVI, acusando os seus jornalistas de serem analfabetos,
virando todas as baterias para José Alberto Carvalho (então director de
informação) e Judite Sousa (directora-adjunta], tratando-a como a “segunda dama
de Seara”.
Foi
remédio santo. Os dois ficaram domesticados. Sentam, saltam e rebolam sempre
que qualquer sipaio de Luanda lhes dá indicação para isso. Victor Bandarra faz
o mesmo mas nem sequer precisa de receber ordens. Tal é a habituação.
Nesse
texto sobre a “fuga dos escriturários”, o nosso Pravda (que não se inibiu,
antes pelo contrário, de contratar Victor Bandarra para palestrar em Luanda
sobre – imaginem! – jornalismo) é dito que a “TVI apresentou num dos seus
noticiários o Jornal de Angola como ‘a voz oficial do regime angolano’”.
Mostrando ser um paradigma do que de mais nobre, puro e honorável existe no
jornalismo moderno, o jornal de José Ribeiro, Artur Queiroz e companhia,
escreveu que “a TVI é a voz oficial da dona Rosita (Rosa Cullell,
administradora delegada da Media Capital, dona da TVI) dos espanhóis” ou, em
alternativa, “voz do conde Pais do Amaral, então presidente do Conselho de
Administração da Media Capital“.
Mas
há mais. “A TVI é a voz oficial de José Alberto Carvalho, que a jornalista
Manuela Moura Guedes tratou por Zé Beto e apodou de burro”; “o canal de
televisão é a voz oficial da segunda dama de Seara, inesperadamente apeada de
primeira dama de Sintra”.
Com
este cenário, com a reacção do órgão oficial do regime, sendo o nosso país um
mercado apetitoso pelo dinheiro marginal que tem, pelos caixotes diplomáticos
cheios de dólares que aterram em Lisboa, pelos avultados investimentos que faz
nas lavandarias portuguesas, a TVI do – citemos o Jornal de Angola –
“escriturário” José Alberto Carvalho e da “ex-primeira dama de Sintra”, tinha
de fazer alguma coisa, engrossando a sabujice lusa.
E
quem melhor do que Victor Bandarra, um “jornalista” amigo do presidente do
Conselho de Administração das Edições Novembro, e director do Jornal de Angola,
António José Ribeiro, para lavar a imagem do regime e, dessa forma, sanar as
divergências entre os “escriturários” de Queluz de Baixo e os crónicos
candidatos ao Prémio Pulitzer?
Feita
a escolha, até por que Victor Bandarra continua a ser um exímio conhecedor dos
hotéis de luxo de Luanda, tal como domina a máquina onde numa ponta se põe a
Carteira Profissional de Jornalista e na outra sai o diploma de vendedor de
banha da cobra, eis que TVI teima em fazer turismo e reunir os ingredientes
necessários para o slogan “A TVI lava (ainda) mais branco”.
Sobre
esta publicidade ao regime, tendo como argumento a seita Kalupeteca, quem não
gostou foi a TPA, congénere local da TVI, que, assim, se viu ultrapassada na
missão de lavagem e propaganda. A Televisão Pública de Angola pode, contudo,
contratar Victor Bandarra para – como fez o Jornal de Angola – dar lições sobre
a arte de bem bajular o dono.
No
referido artigo do Jornal de Angola sobre a TVI e em que coloca José Alberto
Carvalho e Judite de Sousa ao nível da escumalha, diz-se que “Pedro da Paixão
Franco, o príncipe dos jornalistas angolanos, dizia que era muito difícil fazer
progredir o jornalismo da época, porque da “metrópole” chegavam carradas de
analfabetos que mal passavam o Equador eram logo transformados em jornalistas.”
E
como é que a TVI respondeu a esses insultos? À boa maneira portuguesa: pondo-se
de cócoras e “dando o cu e três tostões”, pela mão de um dos seus (Victor
Bandarra), aos que a achincalharam sem apelo nem agravo.
“E
em Portugal surgiu um fenómeno notável e que merecia um estudo profundo. Depois
do 25 de Abril de 1974 o analfabetismo foi sendo banido, de uma forma
galopante. Até há pouco, ninguém conhecia o segredo de tão simpático sucesso.
Só agora se compreende o que aconteceu. Os analfabetos foram todos a correr
para o jornalismo. E como eles dão nas vistas!”, escrevia o Jornal de Angola a
propósito da TVI, admitindo-se que Victor Bandarra (até por ser amigo do
paladino dos paladinos do jornalismo mundial, José Ribeiro) não esteja nessa
sargeta.
“Um
dia destes, a TVI apresentou num dos seus noticiários o Jornal de Angola como
“a voz oficial do regime angolano”. Os analfabetos têm o seu quê de
inimputáveis. Mas fica mal a profissionais do mesmo ofício entrarem por
terrenos tão pantanosos. O Jornal de Angola é a voz dos seus leitores. E dos
jornalistas que livremente escrevem nas suas páginas. Nada mais do que isso.
Aqui não há vozes do dono nem propagandistas. Há jornalistas honrados que todos
os dias tentam dar o melhor que podem e sabem para fazer chegar aos leitores os
acontecimentos do dia”, dizia o articulista do Pravda numa enciclopédica e,
como agora se constata, bem sucedida lição de jornalismo endereçada aos
profissionais da TVI mas, sobretudo, a José Alberto Carvalho e Judite de Sousa.
“O
Jornal de Angola tem um estatuto editorial que é seguido com rigor e sem
hesitações. Se todos fizessem o mesmo, não assistíamos aos espectáculos
deploráveis que vemos na TVI e noutros órgãos de comunicação social
portugueses. Se o jornalismo português não estivesse atolado em fretes, se não
fosse servido por analfabetos de pai e mãe, provavelmente hoje Portugal não
estava a ser destruído pela Troika. E os portugueses não viviam angustiados por
desconhecerem o dia de amanhã”, lia-se no artigo que ajudou decisivamente a
colocar a TVI no rumo certo, ou seja, o da subserviência perante aqueles que
põe qualquer coisa na mão (ou noutro sítio qualquer) dos portugueses para os
satisfazer.
A
cedência dos directores de informação da TVI perante mais esta emblemática
“reportagem” que mais não foi do que a lavagem, mais uma, da imagem de um
regime, envergonha todos os seus jornalistas e deveria levar à demissão de
alguns.
Mas
tal não acontece. Superiores interesses financeiros e de mercado levam a que a
TVI coma e cale. Além disso, provavelmente a convite do Jornal de Angola, ainda
vamos um dia deste ver em Luanda os directores de informação da TVI a ser
palestrantes de jornalismo.