Conflito de interesse
Mark Curtis e Matt Kennard [*]
Lorde Arbuthnot de Edrom, ex-ministro da Defesa, é presidente remunerado do conselho consultivo da
corporação militar Thales Group e, até o início deste ano, foi conselheiro da empresa de armas Babcock International.
Ambas as empresas têm grandes contratos com o Ministério da Defesa do Reino
Unido (MOD).
As revelações põem em evidência preocupações quanto a conflitos de interesse. A
sua esposa, sra. Arbuthnot, começou a presidir o processo legal de Assange em
2017 e decidiu em Junho último que iniciaria uma audiência plena em Fevereiro
próximo a fim de considerar o pedido de extradição do Reino Unido feito pelo
governo Trump.
Exige-se aos juízes britânicos que declarem quaisquer potenciais conflitos de
interesses aos tribunais, mas entendemos que a sra. Arbuthnot não o fez.
Lady Arbuthnot nomeou recentemente um juiz distrital para julgar o caso de
extradição de Assange, mas continua a ser a figura legal que supervisiona o
processo. De acordo com o serviço de tribunais do Reino Unido, o magistrado-chefe é "responsável por ... apoiar e
orientar colegas juízes distritais".
Actualmente Assange está detido na prisão de segurança máxima de Belmarsh, em
Londres, em condições descritas pelo relator especial da ONU sobre tortura, Nils
Meltzer , como "tortura psicológica". Se for transferido para os
EUA, Assange enfrenta prisão perpétua com acusações de espionagem.
Lady Arbuthnot beneficiou-se financeiramente das organizações expostas pela
WikiLeaks
Quando Lady Arbuthnot estava no seu cargo anterior, como juíza distrital em
Westminster, ela beneficiou-se pessoalmente de financiamentos, juntamente com o
marido, de duas fontes expostas pelo WikiLeaks nas suas divulgações de
documentos.
O registo de interesses do parlamento britânico mostra que, em Outubro de 2014,
a sra. Arbuthnot recebeu ingressos no valor de 1.250 libras para o Chelsea
Flower Show em Londres, juntamente com o seu marido. Os ingressos foram fornecidos pela Bechtel Management Company Ltd, parte
da grande corporação militar dos EUA, a Bechtel, cujos contratos com o
Ministério da Defesa do Reino Unido incluem um projecto de até 215 milhões de libras para transformar sua Organização
de Equipamentos e Apoio da Defesa, o organismo que compra e suporta todo o
equipamento usado pelas forças armadas britânicas.
Outra linha de negócios da Bechtel é " cibersegurança industrial ", expressão que é
frequentemente um eufemismo para guerra cibernética e tecnologia de vigilância.
As divulgações da
WikiLeaks acerca da Bechtel mostraram conexões estreitas da empresa com a
política externa dos EUA. Os telegramas publicados em 2011, por exemplo, mostram que a
embaixadora dos EUA no Egipto, Margaret Scobey, pressionou o Ministério da
Electricidade e Energia a aceitar uma proposta da Bechtel para consultoria
técnica e concepção da primeira central nuclear do Egipto.
Em outro benefício pessoal declarado ao parlamento, a sra.
Arbuthnot, mais uma vez junto com o seu marido, teve voos e despesas no valor
de 2.426 libras esterlinas pagos para uma visita a Istambul em Novembro de
2014. Isto foi para "promover e incrementar relações bilaterais entre a
Grã-Bretanha e a Turquia em alto nível", de acordo com a declaração de
registo de interesses de Arbuthnot.
Estas despesas foram pagas pelo Tatlidil britânico-turco, um fórum
estabelecido em 2011 durante a visita a Londres do primeiro-ministro turco a
Recep Tayyip Erdoðan e anunciado com o então primeiro-ministro David Cameron. Tatlidil descreve
seus objectivos como
"facilitar e fortalecer as relações [sic] entre a República da Turquia e o
Reino Unido ao nível de governo, diplomacia, negócios, academia e media".
Seu papel principal é realizar uma conferência anual de dois dias, com a
presença do presidente da Turquia e de ministros turcos e britânicos. Lord
Arbuthnot também participou do Tatlidil em Wokingham, uma
cidade nos arredores de Londres, em Maio de 2018.
Como sujeitos de fugas não desejadas, tanto a Bechtel quanto a Tatlidil têm
motivos para se opor ao trabalho de Assange e da WikiLeaks. Embora os
pagamentos tenham sido inscritos no registo parlamentar de interesses, as
partes no processo judicial não foram informadas acerca deles. Apesar de o
julgamento de Assange ter atraído críticas significativas por todo o mundo, a
sra. Arbuthnot não considerou necessário mencionar estes pagamentos às partes,
ao público e aos media.