segunda-feira, 17 de outubro de 2022

DARIO FO A PRENDA DE AGUSTINA E O ESTADO DA NAÇÃO -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Dívidas são para esquecer. O Caras Lindas devia uma pipa de dinheiro ao meu Pai e quando ele tentava cobrar nem que fosse um nadinha, ele com a voz entaramelada pelo álcool respondia: Devo-te alguma coisa? Apontaste a dívida no tecto por causa das cheias do Kanuango? Vai cobrar ao Camões! A parte menos interessante da vida é que fica sempre a dever qualquer coisa à morte. Uma intimidade desconcertante e que me leva a ignorar todas as mortes menos a vida e morte severina: Esta cova em que estás de palmos medida. É de bom tamanho, nem largo nem fundo é a parte que te cabe neste latifúndio. Estou a citar João Cabral de Melo Neto. O artista da palavra ensinou isto: O nosso sangue tem pouca tinta.

Dario Fo ensinou-me que o patrão sabe mais palavras do que os trabalhadores, por isso é o patrão. Desatei a aprender palavras, até de siciliano e ngoia. Aprendi tantas que me senti um patrão. Tudo mentira. Subiram-me as palavras à cabeça e cuspia nos empregos. Andava à porrada com os patrões. Minha Mamã, quando me via com falta de ar e de bolsos vazios, dizia com ar trágico: Cabeça que não tem juízo, o corpo é que as paga. 

Dario Fo e sua trupe actuaram na Casa de Itália, na Cidade Internacional Universitária de Paris. Eu participei em grande nível. Quando ele foi galardoado com o Prémio Nobel da Literatura lembrei-me que nenhum sacana de patrão o batia em conhecimento das palavras. 

Também andei a manifestar-me nas ruas de Paris contra o arrasar dos Halles para construírem o Centro Pompidou. Entre as manifestantes estava a gauchista Annie Ernaux. É Prémio Nobel da Literatura. Aprendeu mais palavras que os patrões. Hoje desfilou nas ruas de Paris com os partidos de esquerda, contra a inflação descontrolada e a subida tresloucada dos preços. Está a ser castigada pelos patrões que sabem menos palavras do que ela!

Em Portugal, Porto e Amarante, estão a comemorar o primeiro centenário do nascimento da escritora Agustina Bessa Luís. Conheci-a em Angola. Fui ouvir Maria Alzira Seixo e ela apresentou-nos o romance “A Sibila” como uma obra-prima da Literatura Universal Contemporânea. Uma amiga que voava na TAP trouxe-me de Lisboa um exemplar e li a peça, umas 50 vezes. Nenhum patrão do mundo sabe tantas palavras como Agustina. Mas o mais sabedor é Aquilino Ribeiro. Mesmo assim foi esmagado pelo patronato fascista e salazarista. Agustina, não. Viveu sempre como quis e nunca reconheceu qualquer dívida à vida.

Um dia fui entrevistá-la à sua casa na Rua do Golgota, no Porto. Publiquei o texto mesmo no limite, porque uns dias depois peguei-me com os patrões e fiquei sem trabalho. Já me tinha esquecido do episódio (a derrota frente aos patrões) quando recebi uma encomenda pelo correio. Era um livro de Agustina Bessa Luís intitulado A Mãe de Um Rio. Na folha de rosto, uma dedicatória, escrita com uma letra elegante, redondinha: “Ao Artur Queiroz pela consideração que devo ao seu talento de entrevista”. Tinham passado anos! Nessa altura já estava a trabalhar no Jornal de Notícias e a escritora mandou para lá a oferta.

Ainda lhe fiz uma segunda entrevista para a revista Autores. Tomei uma decisão inabalável. A partir de hoje, Agustina Bessa Luís é Prémio Nobel da Literatura todos os dias. O que ela fez por mim! As palavras que me ensinou. Mesmo assim continuo a levar porrada dos patrões. Deve ser defeito de fabrico. Mas fiquem sabendo que nada devo à vida ou à morte. Nada.

A agência noticiosa Lusa, órgão oficial da UNITA, sobre o Discurso Sobre o Estado da Nação diz que a marcação das eleições para o Poder Local “era uma das mais esperadas questões no discurso de João Lourenço, que marcou a abertura do ano parlamentar em Angola”. O problema da UNITA e dos seus apoiantes é que confundem os seus desejos com a realidade e os seus anseios, sempre mesquinhos, pelos de todos os angolanos. Mania das grandezas. Não se percebe porquê. Afinal os membros da direcção da UNITA e seus sicários sabem poucas palavras. Muito menos do que a média das angolanas e angolanos.

O que foi dito pelo Presidente da República devia ser aplaudido por todos. O Estado já tomou medidas para a efectivação do Poder Local. João Lourenço reiterou no seu discurso a institucionalização das autarquias, sublinhando que faltam infra-estruturas e esse problema tem de ser resolvido antes de eleições.  

Os municípios de todo o país enfrentam um problema gravíssimo: A fixação de quadros nos seus territórios. O Presidente João Lourenço anunciou que está já em curso a construção de complexos residenciais em 36 municípios e 35 assembleias para as autarquias locais. Não pode haver melhor notícia do que esta. Claro que a UNITA não quer saber disso para nada. Porque as eleições autárquicas servem apenas para eles acomodarem umas quantas clientelas, quanto mais analfabetas, melhor. 

Mais nada. Querem lá eles saber do Poder Local! E, é claro, estão ansiosos por gritar que há fraude eleitoral! Esse é o aspecto mais importante do programa da UNITA. Há eleições? Então há fraude porque a UNITA nunca ganha. Deputadas e deputados de todas as bancadas têm o dever de aprovar uma Lei que exclui das eleições partidos, coligações e políticos que invocam a fraude, quando perdem. O jogo democrático exige esse esforço, para acabarmos com a poluição política.

Hoje o Banco Mundial pôs o dedo, com muita força, na ferida que é a guerra da NATO (ou OTAN), União Europeia e EUA contra a Federação Russa. Os números chegados da Ucrânia revelam uma tragédia humanitária. Mais de 50 por cento da população que não consegue fugir, vive abaixo do limiar da pobreza. E ninguém fala disso!

Os Media não dão espaço a essa legião de pobres. Não ouvem os deputados da Oposição ou os partidos em cujas listas foram eleitos. O Banco Mundial quer saber como vai o governo de Kiev enfrentar este problema. E, já agora, os países que mandam milhares de milhões para Kiev, exclusivamente para matar e fazer ainda mais pobres, como vão mudar os seus comportamentos. E a União Europeia ou a ONU vão continuar a ser instrumentos de guerra ou promotores da paz? É isso mesmo. Estão a afiar a moca para aniquilar as tropas das Federação Russa! E andam com uma lanterna à procura dos crimes de guerra, mas longe de Bruxelas ou Washington.

Ontem Lisboa e Porto assistiram a manifestações contra a pobreza, a fome, a miséria, os baixos salários, grandes exportações da União Europeia para o cantinho à beira mar plantado. Hoje é Paris. A greve dos trabalhadores das petrolíferas dura há semanas e nem uma notícia. Só dá Zelensky. Hoje milhares foram para as ruas protestar. Na terça-feira arranca uma greve geral em França. Na Ucrânia é só beijinhos aos nazis.

Na Alemanha, a contestação social sobe de tom e a propaganda da guerra não consegue disfarçar o mal estar no país que é o “motor da Europa”. Está gripadíssimo. Queimou. Não dá nada. Mas, mesmo assim, ameaçam aniquilar as tropas da Federação Russa. A velha mania das grandezas dos genocidas e esclavagistas, que acaba sempre em tragédia.

Dario Fo tem razão, O patrão só é patrão porque sabe mais palavras do que os trabalhadores. Mas dentro em breve, essa diferença de nada serve. Mesmo sabendo muitas palavras, vão todos ao castigo.

*Jornalista

Na imagem: Agustina e Dario Fo

A COMUNIDADE EUROPEIA: UM GOLPE DE ESPADA NA ÁGUA

Thierry Meyssan*

Desde o início da operação militar russa na Ucrânia, as relações internacionais estão bloqueadas. Nenhuma posição muda. O Presidente Macron pensou que poderia mudar as regras do jogo baralhando as cartas por ocasião de uma reunião de irmãos inimigos europeus, a Comunidade Política Europeia. Mas o Presidente Putin apanhou-o desprevenido mudando as fronteiras e o próprio jogo.

Presidente francês, Emmanuel Macron, não sabe como há-de decidir para resolver crises, assim volta a baralhar as cartas para poder pensar em novas soluções. É por isso que, constatando a ausência de discussão em torno do conflito ucraniano, ele lançou em Maio passado uma iniciativa : a « Comunidade Política Europeia » (CPE).

Depois da « Confederação Europeia » de François Mitterrand e da « União para o Mediterrâneo » de Nicolas Sarkozy, o Eliseu esforçou-se pois em convencer os seus parceiros da utilidade de um novo « esquema. Diga-se de passagem, a França varia bastante : a Confederação Mitterrandiana defendia a aliança do Ocidente e do Leste, de Bruxelas e de Moscovo, a Comunidade Macronista visa, pelo contrário, opô-las.

A França, que presidia ao Conselho Europeu durante o primeiro semestre de 2022, logicamente recorreu ao presidente permanente desta estrutura, o antigo Primeiro-Ministro belga Charles Michel. Este enfiou-se na brecha aberta com apetite. Pensava poder fazer uma união em torno da UE e sacar um belo papel às custas da Presidente da Comissão, a sua rival Ursula von der Leyen. Pacientemente, os diplomatas franceses esconderam-no nas suas “pastas” de modo a que nem sequer aparecesse em cena durante a conferência de imprensa (colectiva-br) final. Quanto à Srª von der Leyen, apenas acabou convidada por formalidade.

A CPE foi preparada com os meios da União, mas não em nome da União. Além disso, as reuniões preparatórias não foram realizadas nas instalações da União, mas no castelo belga de Val Duchesse. Era, aliás, inevitável se se desejasse associar o Reino Unido e a Turquia. Londres pós-Brexit continua a não querer uma estrutura supranacional e Ancara amarga à porta da UE há tanto tempo que não quer ser desviada para uma via de estacionamento suplementar. O Reino Unido chegou mesmo a implicar com o título « Comunidade Política Europeia », que lhe faz lembrar bastante a extinta «Comunidade Económica Europeia», ancestral da « União Europeia ». A Turquia, essa, exigiu garantias comprovando que a sua participação na CPE não seria mais uma distracção para a fazer esperar.

O QUE É A UNIÃO EUROPEIA?

Vladislav B. Sotirović* | One World

Qual é a verdadeira verdade por trás da União Europeia?

#Traduzido em português do Brasil

A União Europeia (a UE) é oficialmente caracterizada por uma difusão intencional de autoridade política entre instituições supranacionais e intergovernamentais. Assente na ideia de liderança (quase)compartilhada, assenta formalmente num delicado equilíbrio institucional que assegura a igualdade declarada entre os seus membros cada vez mais diversos e gere as tensões potenciais e reais entre os estados mais e menos populosos e os estados desenvolvidos. Tais tensões estão presentes em qualquer construção federal e têm sido uma preocupação fundamental desde que os “seis originais” (EU6) fundaram a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) em 1951 (Benelux, Alemanha Ocidental, França e Itália). ).

Os factos formais e a propaganda oficial da UE sobre si própria é algo que todos conhecemos e concordamos que é um conceito admirável e surpreendente, que todas estas pessoas diferentes (hoje 27 Estados-Membros) de nações tão coloridas decidiram viver juntas com o objectivo principal de ter uma comunidade grande e unida tentando viver em paz e conforto e desfrutar dos sistemas médicos e educacionais desenvolvidos. É tudo o que sempre lemos na imprensa e vemos na TV, mas não houve comunicados públicos sobre uma única decisão ou ação errada ou questionável da UE.

Então, o que é mais interessante agora: vamos dar uma olhada em algumas opiniões diferentes. Não quero escrever sobre uma “realidade” porque a realidade é um campo tão subjetivo e questionável, mas gostaria de chamar a atenção para uma abordagem crítica dos estudos sobre a UE e a integração europeia no guarda-chuva político-econômico do UE. 

Todos os teóricos da unificação europeia dentro do guarda-chuva das Comunidades Europeias (ocidentais) pós-Segunda Guerra Mundial (hoje a UE) enfatizarão quatro pontos cruciais da importância desse processo:

Porá fim à guerra milenar entre as principais potências europeias.

Uma Europa unificada ancorará o sistema de poder mundial em uma estrutura policêntrica com seu poder econômico e tecnológico e sua influência cultural e política (provavelmente junto com a ascensão dos estados do Pacífico).

Isso impedirá a existência de qualquer superpotência hegemônica, apesar da contínua preeminência militar e tecnológica dos EUA.

A unificação europeia é significativa como fonte de inovação institucional que pode dar algumas respostas à crise do Estado-nação. [1]

Inflação e guerra na Ucrânia aumentam pobreza das crianças na Europa e Ásia Central

A guerra na Ucrânia e a inflação gerada pelo conflito mergulharam milhões de crianças na pobreza na Europa Oriental e na Ásia Central, nos últimos meses. O alerta é do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) em um relatório publicado nesta segunda-feira (17).

#Publicado em português do Brasil

Nessas regiões, o conflito gerou um aumento de19% da pobreza desde 2021", indica o estudo, que destaca que as crianças sofrem as piores consequências da crise econômica causada pelo conflito.

As crianças representam apenas 25% da população, mas cerca de 40% das 10,6 milhões de pessoas a mais atingidas pela pobreza neste ano, detalha o estudo, que abrange 22 países. A Rússia responde por três quartos do aumento total registrado pelo Unicef, com cerca de 2,8 milhões de menores nessa situação.

O relatório também aponta uma queda de 8% do PIB russo estimado pelo Fundo, o segundo pior dos países analisados. "As repercussões do conflito na Ucrânia são extremamente importantes na Rússia, porque a guerra diminui o acesso a um certo número de produtos básicos", diz  Adeline Hazan, presidente do Unicef França.

A Ucrânia tem mais meio milhão de crianças em situação de pobreza, o segundo número mais relevante, seguida pela Romênia com 110.000.

"O Unicef lança um grito de alarme sobre as consequências desta guerra e pede aos governos que forneçam um apoio extremamente forte à proteção social e adotem programas de assistência para as famílias mais vulneráveis com crianças", pede Hazan.

Maior exposição à violência

As consequências da pobreza infantil vão além das dificuldades financeiras das famílias. Quanto mais pobre é uma família, mais parte do orçamento é alocada para necessidades básicas, como alimentos e combustível. Com o preço desses produtos em alta, o dinheiro disponível para outras necessidades, como saúde ou educação, diminui.

Consequentemente, as crianças mais pobres têm menos opções de acesso a serviços essenciais e estão mais expostas à violência, exploração e abuso, explica a organização da ONU. Este aumento da pobreza infantil na Europa Oriental e na Ásia Central pode causar a morte de 4.500 crianças antes do primeiro aniversário e causar dificuldades de aprendizagem para 117.000 menores devido ao abandono escolar em 2022, alerta o Unicef.

RFI com AFP

Imagem: Guerra mergulhou milhares de crianças ucranianas na pobreza. Associated Press - Vadim Ghirda

França pode enfrentar uma gigantesca greve geral depois da paralisação das refinarias

A resposta do governo francês esta semana a uma greve nas refinarias levou a uma convocação para uma greve geral na França, onde o presidente de centro-direita, Emmanuel Macron, enfrenta o risco de agitação social em um clima cada vez mais tenso. Muito além da crise energética, uma convergência de lutas reúne organizações da sociedade civil e sindicatos, combates que vão desde a reforma da aposentadoria a aumentos salariais.

#Publicado em português do Brasil

"Não é só na Esso e na TotalEnergies que há problemas salariais. É um problema geral", advertiu o secretário-geral do sindicato CGT, Philippe Martinez, na rádio Franceinfo na sexta-feira (14), defendendo a convocação de uma greve interprofissional na terça-feira (18).

O contexto atual traz um cenário complexo: quando a França começou a virar a página dos efeitos da pandemia na economia e na saúde pública, a Rússia lançou uma ofensiva contra a Ucrânia que, juntamente com a resposta de Moscou às sanções ocidentais, fez disparar os preços da energia e dos alimentos para residências e empresas.

Endurecido pelo protesto social dos coletes amarelos, que abalou o primeiro mandato de Macron e cujo gatilho, em 2018, foi o aumento dos preços dos combustíveis, o governo rapidamente adotou medidas para limitar o aumento dos preços da energia.

Assim, a inflação na França era de 6,2% em setembro, mais de três pontos abaixo do que nas outras grandes economias da União Européia (UE): Alemanha (10,9%), Itália (9,5%) e Espanha (9,3%), de acordo com o escritório europeu de estatísticas Eurostat.

Mas o sentimento de perda do poder de compra - a primeira preocupação dos franceses nas eleições presidenciais em abril e nas eleições legislativas em junho - se instalou na França, onde a principal demanda sindical é o aumento dos salários.

"São greves ofensivas e não mais defensivas". Pela primeira vez em muito tempo, estamos realmente falando de um aumento salarial", explicou Sylvain Boulouque, historiador especializado em movimentos sociais, ao canal Público Sénat.

Por "ofensiva", o especialista quer sinalizar que as greves visam uma melhor distribuição do valor produzido pelas empresas, e não se limitam a denunciar, por exemplo, as demissões. A greve nas refinarias da TotalEnergies é paradigmática neste sentido.

"Um erro"

O gigante francês dos hidrocarbonetos obteve mais de US$ 10 bilhões em lucros extraordinários no primeiro semestre de 2022. Seus funcionários estão exigindo um aumento salarial de 10% e que os únicos beneficiários não sejam apenas os acionistas.

Cinqüenta e quatro por cento dos franceses consideram legítima sua demanda, mas dois terços apóiam a requisição de pessoal pelo governo para conter a escassez de combustível que afetou quase um terço dos postos de gasolina, de acordo com uma pesquisa da Odoxa. "Entendo o direito à greve, acho que foram feitos esforços, mas a França está num impasse. A situação está ficando tensa", disse Jean-Marc Zéni, um agente imobiliário, em uma das muitas filas de espera em frente aos postos de gasolina em Paris.

Embora ele tenha inicialmente defendido o diálogo social, imagens de motoristas desesperados e críticas à inação da oposição da direita e da extrema-direita forçaram Macron a intervir e se defender.

"Há sempre uma tendência de passar a batata quente para o governo. [Mas] não podemos substituir todos", disse Macron na noite de quarta-feira, em uma entrevista para o canal de TV France 2, assegurando que na próxima semana "tudo voltaria ao normal".

Mas os observadores acreditam que já seria tarde demais. De acordo com um editorial do diário liberal L'Opinion, durante dez dias Macron teria deixado ventilar a ideia de que "o poder executivo estava desinteressado em uma questão vital para os franceses", "isso é um erro".

"Evitar acusações de autoritarismo"

A situação também deu argumentos para a oposição de esquerda em sua luta por um imposto nacional sobre "superlucros". Esta será uma das exigências, juntamente com os aumentos salariais, da marcha "contra a vida cara" que eles convocam para este domingo (16), em Paris.

Assim, a perspectiva de um outono agitado preocupa o partido governista, especialmente porque o governo poderia usar um sistema controverso para aprovar o orçamento para 2023 e sua controvertida reforma previdenciária sem submetê-los à votação na Assembleia, onde falta uma maioria absoluta desde junho.

A primeira tentativa em 2019 e 2020 de adiar a idade da aposentadoria de 62 para 65 anos encontrou a oposição dos sindicatos e provocou protestos em massa. Macron já advertiu, através do ministro do Trabalho, que se a Assembleia não a aprovar, ele poderá dissolver o Parlamento.

Mas "a crise de combustível está nos forçando a adotar uma atitude política muito mais contida" e "evitar acusações de autoritarismo", de acordo com um funcionário do governo. Uma fonte interna teme que a "agitação" possa se cristalizar "em um movimento social".

Para Guy Groux, um especialista do centro de pesquisa política Cevipof da Sciences Po, na França, isso tem sido um "foco de atenção" por vários anos, mas não se traduzirá em um grande movimento social, mas sim em "muitas explosões esporádicas".

RFI com AFP

Imagem: Dia nacional de greve dos trabalhadores para pressionar por aumentos salariais e o fim da reforma previdenciária, em 29 de setembro de 2022, em Paris. AFP - STEPHANE DE SAKUTIN

DEMISSÃO DA PM LIZ TRUSS PARA BREVE E DEPOIS ELEIÇÕES?

'Parece que esta semana ou a próxima': esta última reviravolta só aumentou os planos para depor Liz Truss

Katy Balls* | The Guardian | opinião

Agora que Trussononomics está morto, até os partidários da primeira-ministra estão se perguntando: qual é o objetivo de seu governo?

#Traduzido em português do Brasil

Foi um partido que desenvolveu uma reputação de regicídio nos últimos anos, os parlamentares conservadores ainda têm o hábito de adiar o inevitável. Theresa May mancou por quase dois anos depois que sua autoridade foi destruída pela perda da maioria conservadora. Houve um lento declínio de poder – e várias tramas fracassadas – antes que ela fosse forçada a dizer que iria . Boris Johnson foi expulso meses depois que o escândalo do Partygate estourou. Os parlamentares continuaram se afastando de suas ameaças anônimas a ponto de a equipe de Johnson começar a acreditar que era tudo um blefe. Foi só depois de um escândalo envolvendo o vice-chefe do chicote que eles entraram para matar.

Mas com Liz Truss , a festa poderia estar prestes a contrariar a tendência e optar por um acabamento rápido? Uma combinação de pesquisas sombrias, incerteza econômica e o apelo do Partido Trabalhista para uma eleição geral está levando a um aumento nas conversas entre os parlamentares de que as questões devem vir à tona mais cedo ou mais tarde. Quando eles poderiam tentar forçá-la a sair? “Parece que esta semana ou a próxima; Os parlamentares estão lutando para encontrar uma razão para ela ficar”, afirma um ex-ministro. “Acho que será iminente”, acrescenta um backbencher sênior. “Mas essa pode ser a minha esperança e não a realidade.”

Até a semana passada, havia uma sensação entre os parlamentares de que Truss ainda tinha tempo de tentar estabilizar o navio. A maioria do partido ficou – e muitos ainda estão – horrorizados com a ideia de derrubar um líder depois de apenas seis semanas no cargo. O próximo ponto de inflamação foi visto como o evento fiscal do Dia das Bruxas , quando o governo tentaria consertar os danos do orçamento não tão pequeno e assegurar aos mercados que eles tinham um plano para equilibrar as contas, afinal.

Mas a decisão de Truss na sexta-feira de demitir seu aliado político e chanceler, Kwasi Kwarteng, bem como uma reviravolta na promessa de campanha de interromper o aumento do imposto sobre as empresas, levou a uma mudança de humor. Previsões OBR , vistas pelo governo, que prevêem um buraco negro nas finanças públicas como resultado das mentes focadas no mini-orçamento no nº 10. Eles levaram Truss a trazer Jeremy Hunt e mais reviravoltas virão em breve. O novo chanceler de Truss deixou claro no fim de semana em várias entrevistas à mídia que ele vai presidir uma nova abordagem : os impostos vão subir e os cortes de gastos estão chegando.

Em suma, a Trussononomia está morta , para ser substituída – por necessidade – por um mix econômico muito pouco atraente. A questão que permanece é se o tempo de Truss no número 10 está prestes a chegar ao fim também.

COMO É SER POBRE NA ALEMANHA

Sabine Kinkartz* | Deutsche Welle

No país que consta entre os 20 mais ricos do mundo, estatísticas apontam que um em cada seis cidadãos está ameaçado pela pobreza. Mas o que é ser pobre entre alemães?

Gente dormindo na rua, mães que abrem mão de algumas refeições para poder alimentar melhor seus filhos, aposentados que procuram garrafas retornáveis em latas de lixo: embora a Alemanha seja um dos países mais ricos do mundo, 13,8 milhões de seus 83,2 milhões de habitantes sofrem pobreza ou estão ameaçados por ela. Este é o resultado do relatório mais recente sobre o tema da associação nacional de previdência Paritätischer Wohlfahrtsverband.

Em relatório publicado em 2022, o governo alemão também afirma que há uma distância crescente entre ricos e pobres no país. Isso não significa que na Alemanha se tenha que passar fome ou frio, ou morrer doente por não têm acesso a tratamento de saúde.

No ramo das ciências sociais, é feita uma distinção entre pobreza absoluta, em que se é incapaz de satisfazer as necessidades mais básicas, e pobreza relativa, é medida pelas condições médias de vida numa sociedade.

Riqueza distribuída desigualmente

A Alemanha ocupa a 20ª posição no ranking dos países mais ricos do mundo, atualizado pela última vez em 2021. Ele é baseado na prosperidade do país, que pode ser medida pelo chamado Produto Interno Bruto (PIB) per capita. Para isso, o valor de todos os bens e mercadorias produzidos é dividido pelo número de habitantes. Na Alemanha, isso equivale a pouco mais de 50.700 dólares per capita, de crianças a idosos.

Para comparação: Luxemburgo é o país mais rico do mundo. O pequeno Estado europeu gerou um PIB de cerca de 136.700 dólares per capita em 2021. Os dez países mais pobres do mundo estão na África. Burundi, no último lugar da lista, tem um PIB per capita de 270 dólares.

Pobreza, uma questão de definição

Enquanto nos países mais pobres do mundo muitos vivem na pobreza absoluta, na Europa, em geral se registra pobreza relativa, uma vida com severas limitações materiais. Na maioria das vezes, os afetados só conseguem sobreviver abrindo mão de muitos bens tidos como normais pela maioria da população.

Na UE, é considerado em risco de pobreza ou pobre quem apresenta menos de 60% da renda média do respectivo país. Quem tem rendimento inferior a 50% da média, é considerado muito pobre.

No caso da Alemanha, solteiros que vivem com menos de 1.148 euros líquidos mensais são considerados pobres. Para pais solteiros com uma criança pequena, a quantia é de 1.492 euros, e para casal com dois filhos pequenos, 2.410 euros. Esse valor é considerado após as deduções de impostos e de contribuições para a seguridade social, e acrescentados os benefícios sociais.

Pobre, mesmo com benefícios sociais

A Alemanha se considera um Estado de bem-estar. Quem não consegue encontrar trabalho, não pode trabalhar e não tem renda recebe o benefício social básico, também conhecido coloquialmente como Hartz 4, que garante as despesas de subsistência.

Além disso, são cobertos pelo Estado os custos do aluguel, eletricidade e gás, assim como o plano de saúde. Em 2020, cerca de 5,3 milhões na Alemanha viviam sustentados total ou parcialmente pela verba do Hartz 4.

Quem vive sozinho e pais solteiros recebe 449 euros por mês. Esse dinheiro se destina ao pagamento de alimentação, vestuário e, entre outras coisas, cuidados com o corpo, utensílios domésticos, internet, telefone e eletricidade. Se dois beneficiados são parceiros vivendo no mesmo domicílio, a tarifa é reduzida para 404 euros para cada um. Por cada criança, são pagos entre 285 e 376 euros, dependendo da idade.

De quanto se precisa para viver?

Organizações criticam repetidamente que na Alemanha a segurança básica do seguro social não protege contra a pobreza e não é suficiente para uma "participação real" na vida. O governo alemão quer aumentar o benefício para 502 euros a partir de 2023. De acordo com o cientista social e pesquisador Christoph Butterwegge, mesmo isso não será suficiente: 650 euros seriam necessários para viver "com dignidade" no país: por exemplo, poder comer de forma saudável.

Na verdade, o cálculo do benefício social tem uma margem apertada. São calculados para alimentação cinco euros por pessoa por dia. "Para que isso seja suficiente, as famílias pobres geralmente compram menos alimentos ou alimentos de pior qualidade", constata uma análise publicada pela Fundação Heinrich Böll em 2021. Nesse contexto a fundação, ligada ao Partido Verde, fala "o risco de pobreza alimentar".

Aposentados também sofrem

A situação está se agravando cada vez mais devido à inflação e também afeta quem até agora conseguira sobreviver sem ajuda. Cada vez mais cidadãos são incapazes de arcar com o aumento dos preços do pão, leite, frutas e legumes no supermercado.

Também são afetadas as instituições que fazem arrecadação de alimentos e os distribuem aos necessitados. Em 2020, cerca de 1,1 milhão recorriam aos serviços de distribuição gratuita de alimentos, e agora já totalizam 2 milhões.

A POBREZA EM PORTUGAL

Jorge Barreto Xavier | Diário de Notícias | opinião

1 O conceito de pobreza - a pobreza inclui aspetos materiais e imateriais. Limitação severa de acesso a água e alimentos, habitação, vestuário; privação de cuidados de saúde e segurança. Acrescem a falta de acesso à educação e à cultura, assim como contextos físicos e sociais difíceis. A pobreza atinge mais de metade da população mundial. A pobreza, em Portugal, se retirássemos os apoios sociais, atingiria quase metade da população. Mesmo com os apoios sociais, a pobreza atinge quase ¼ dos portugueses (1,7 milhões de pessoas) e quase 2 milhões de portugueses vivem em risco de pobreza - totalizando mais de 3,8 milhões de pessoas. Idosos abandonados, jovens casais com pobreza envergonhada, crianças e adolescentes que se não fossem as refeições nas cantinas escolares não teriam o que comer.

2 A perceção da pobreza - a maneira como olhamos para a pobreza depende do lugar pessoal e social que ocupamos. "Eles, os pobres"; "Nós, os pobres"; "Eles a passar dificuldades"; "Nós, em risco"... Diversos estudos demonstram que um dos problemas fundamentais que impedem uma ação maior para a erradicação da pobreza é a perceção da mesma pelos não-pobres. Esta é vista como um problema do Estado ou como uma situação para a resolução da qual já se contribuiu através do pagamento de impostos. Ou seja, a efetiva melhoria do comprometimento da sociedade civil e das empresas na transformação social do fenómeno da pobreza é fundamental. Não só promovendo mudanças nos modos de vida, como valorizando de maneira efetiva as situações de terceiros em dificuldade.

3 As políticas públicas - se por um lado, a criação do Estado Social ou cuidador é uma conquista extraordinária, por outro torna-se necessário refletir no modelo atual de Estado Social e nas suas fragilidades na efetiva resolução de problemas. Uma demonstração desta circunstância está nos anos de governo socialista que vivemos e que se afirma como grande defensor do Estado Social. Todavia, desde 2016 até hoje, a distância entre ricos e pobres aumentou, a taxa de intensidade de pobreza (a distância entre o rendimento das pessoas mais pobres e o valor fixado para o limiar do risco de pobreza) aumentou, a taxa de risco de pobreza aumentou, o número de pobres aumentou. Dir-se-á que a culpa é da pandemia. Não é bem assim. De facto, de acordo com o Eurostat, no contexto europeu, vários países fizeram melhor nos anos da pandemia e caímos, comparativamente, no índice de taxa de risco de pobreza e exclusão social (dados de 2021). Citando uma notícia do Jornal de Negócios e 15.09.22 "O avanço de 2,4 pontos na taxa de pobreza e exclusão em Portugal representa o pior agravamento nas condições das famílias no bloco europeu, onde apesar dos efeitos da pandemia 12 países conseguiram tirar população da pobreza".

Sabemos que o contexto atual de guerra e as suas consequências vão piorar o quadro social. Que neste Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza possamos perceber que, ao contrário do que se passa na física quântica, aqui, se continuarmos sempre a agir da mesma maneira, não poderemos esperar melhores resultados. Atirar dinheiro para cima dos problemas ou pôr pobrezinhos a marchar na Avenida da Liberdade com um farnel não é solução.

Portugal | AUMENTO DO CUSTO DE VIDA CONTADO POR QUEM O SENTE

Sobre a inflação, o AbrilAbril não foi falar com os antónios saraivas desta vida. Pelo contrário, foi aos supermercados falar com quem vive dos rendimentos do seu trabalho. A conclusão é uma:  sobram razões para lutar.

Não é preciso ser-se especialista para saber que a inflação se faz sentir nas compras que fazemos. Sejam as compras mensais, semanais ou diárias, o denominador comum é o aumento dos preços e do dinheiro que cada pessoa deixa no supermercado. Seja a pandemia ou a guerra há dois lados evidentes - o lado dos que suportam os preços especulativos e o dos poucos que alargam as suas margens de lucro e ganham dinheiro com a especulação. 

Ouve-se por todo o lado que a vida está mais cara. É a cada vez mais comum a queixa de que «vou ao supermercado, gasto cada vez mais e trago cada vez menos». O AbrilAbril foi ao encontro das pessoas, nomeadamente a três supermercados: um no centro de Lisboa (Continente de Entrecampos) e dois na Amadora (Minipreço, perto do Parque Municipal José Afonso e Pingo Doce, no Centro Comercial Babilónia). 

«Dizem que aumento dos salários provoca a inflação, mas aumentem o meu»

A nossa primeira paragem foi no Continente de Entrecampos. O ruído de fundo confirmava que estávamos em pleno centro da cidade na hora de ponta. As entrevistas tinham somente um guião e a escolha das pessoas com quem falar não obedecia a nenhum método científico. Falámos com: Vitória Reis, tem 38 anos e é costureira; André Malhado, 36 anos e estudante de Doutoramento; Joia, de 55 anos está desempregada; Bruno Sarmento, com 45 anos é consultor e, por fim, a Maria José Sequeira, com 75 anos e que se mantém em actividade como advogada.

A primeira questão era muito simples. Perguntava-se sentem o aumento do custo de vida nas compras que fazem. A resposta foi unânime. Todos os entrevistados responderam afirmativamente. Uns até desenvolveram uma resposta que podia ser de sim ou não. A Vitória Reis, imigrante brasileira, disse que chegou a Portugal há 7 meses e que desde então reparou na evolução dos preços. Uma constação que a Joia complementou, dizendo que «as coisas que custavam 3€, 3€ e tal estão a 4€, as que custavam 2€ e tal estão a 3. É um aumento de 1€ e tal praticamente». Pelo seu lado, o André Malhado sublinhou o aumento da «maioria dos produtos. Os do dia-a-dia, subiram todos, incluindo  o tofu e a maioria dos legumes, considerando que sou vegetariano».

ESTE MUNDO E ESTE PAÍS É SÓ PARA RICOS, POLÍTICOS E GOVERNOS CRÁPULAS

Este mundo não é para os pobres. Este país também não

Margarida Cardoso | Expresso (curto)

Bom Dia!

Bem vindo a mais um Expresso Curto, 33 anos depois de os ministros da Defesa da NATO anunciarem a redução de 80 por cento das armas nucleares táticas na Europa

Sabia que há mais de dois milhões de pobres em Portugal, o país da Europa que mais se afundou nas condições de vida, mas cada português deita fora meio quilo de comida por dia? Já leu no Expresso que a meta de retirar 600 mil pessoas da situação de pobreza até 2030 fica comprometida quando a inflação encolhe o salário mínimo de 705 euros para 639 euros? Acompanhou a reportagem pelas noites de quem está só e sem casa nas ruas de Lisboa? Na última edição do semanário, chocou-se com os relatos recolhidos em diferentes pontos do país sobre a procura das urgências do Serviço Nacional de Saúde por utentes que simulam doenças para garantirem um prato de comida e um pouco de companhia?

Para lá das fronteiras nacionais, há alertas lançados pelo FMI a revelar que 345 milhões de pessoas passam fome no mundo e 860 milhões estão malnutridas, a alertar para a fome em África, um continente onde 123 milhões de pessoas correm o risco de morrer de fome. Um apelo lançado por ONG´s de 75 países à Assembleia Geral da ONU recorda que a cada 4 segundos morre uma pessoa no mundo por fome. O Banco Mundial diz que a pobreza na Ucrânia é agora 10 vezes superior à registada no início da guerra.

Neste Dia Mundial para a Erradicação da Pobreza que também é o Dia Internacional dos Sem-Abrigo, basta uma busca rápida na internet para encontrar histórias de vida, dados, notícias, a chamar à atenção para a fome, para a pobreza, para quem vive na rua sem poder dizer “no conforto pobrezinho do meu lar há fartura de carinho”, como canta Amália Rodrigues em Uma Casa Portuguesa.

“É urgente colocar a fome na agenda. A situação é dramática”, diz ao Expresso o padre Rubens Marques, da paróquia portuense de Nossa Senhora da Conceição, no Marquês, onde funciona desde 2009 um restaurante solidário.

Com o apoio de voluntários e amigos, serve 390 refeições diárias a quem tem fome na cidade. “A procura mais do que duplicou comparativamente ao período pré-pandemia e abrange idosos que esgotam a reforma a pagar o quarto e já nem têm dinheiro para os medicamentos, sem-abrigo, famílias com dificuldades, crianças, imigrantes, em especial de Marrocos e da Argélia”, conta.

Quem vai à paróquia entre as 18h e as 20h come uma refeição e leva um kit-merenda para casa, tudo preparado por um grupo de 60 voluntários “a que é preciso juntar rapidamente mais mãos para responder à procura crescente”, admite.

A crise reflete-se aqui duplamente: “Os pedidos aumentam e, ao mesmo tempo, a ajuda diminui”, resume Rubens Marques. “Com a inflação, as famílias que faziam donativos começam a ter problemas para gerir os seus próprios orçamentos e retraem-se nas ofertas. Com a subida de custos de produção e a quebra na procura, as empresas que nos ajudam têm a vida mais difícil e também reduzem os apoios”, explica.

Das histórias que vai ouvindo, percebe que “a fome é muitas vezes agravada pela solidão”, por isso acredita ser “importante recuperar as velhas relações de vizinhança”, “estar mais atento ao próximo” e “avançar urgentemente com soluções estruturais”. Afinal, está a trabalhar apenas “para uma resposta de emergência, por isso mesmo insuficiente”.

Tem-se apercebido “de um ciclo de pobreza que envolve famílias inteiras e já começa a atravessar gerações”, “ de uma pobreza mais visível na paisagem urbana, desde logo pelo aumento do número dos sem-abrigo”, em especial na baixa do Porto, do Terreiro da Sé às ruas de Santa Catarina, 31 de Janeiro, Sá da Bandeira e Alves da Veiga, assim como em Júlio Dinis, na Boavista.

Tem-se apercebido, também, que faltam cada vez mais respostas para quem quer sair da rua porque “os quartos acabaram na cidade, os centros de emergência estão cheios e não temos a oferta de segunda linha para alojamento prolongado”. Na prática, isto significa que “a passagem pelo centro de emergência, em vez de ser por um dia, se vai prolongando”. “Já temos pessoas à espera de uma solução para sair da rua há meses”, nota.

E o que vai fazer hoje para assinalar este dia dedicado à pobreza e aos sem-abrigo? Na agenda de Rubens Marques está uma peça de teatro promovida pelo NPISA Porto - Núcleo de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo do Porto: Um grupo de sem-abrigo frequentou uma oficina de formação e sobe ao palco às 17h, na Casa do Infante, “para mostrar as suas qualidades artísticas e surpreender quem quiser ir até lá vê-los atuar”, conta.

Guiné-Bissau | Inundações devem-se a "má política de ordenamento do território"

O ministro do Ambiente e Biodiversidade, Viriato Soares Cassamá, considera que as constantes inundações nas cidades e campos agrícolas na Guiné-Bissau são resultado de uma má política de ordenamento do território.

Viriato Soares Cassamá referiu que a Guiné-Bissau tem tido sucesso em várias ações em curso para mitigação e adaptação aos efeitos das mudanças climáticas, mas ainda assim continua a ser fustigada com inundações durante a época das chuvas.

O ministro guineense falava à Lusa no âmbito dos preparativos do país para a participação na COP27, Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que vai ter lugar na cidade egípcia de Sharm El Sheikh, de 06 a 18 de novembro.

Angola | Políticos e diplomatas avaliaram discurso do Chefe de Estado

A maioria das individualidades políticas e diplomáticas deu nota positiva ao conteúdo da informação passada pelo Titular do Poder Executivo, no discurso sobre o Estado da Nação, durante a cerimónia de abertura do ano legislativo da Assembleia Nacional.

A vice-presidente do MPLA, Luísa Damião, disse que o Chefe de Estado ao longo do discurso à Nação fez um balanço circunstanciado sobre o que foi realizado em prol da satisfação das necessidades dos cidadãos e perspectivou o que deve ser feito em prol da resolução dos anseios e preocupações dos cidadãos nos próximos cinco anos.

Luísa Damião disse que o Chefe de Estado fez uma incursão sobre as questões sociais que mais preocupam os cidadãos, sobretudo nos sectores da Educação, Saúde, bem como o desemprego.

"Penso que o discurso correspondeu às expectativas  dos angolanos”, afirmou a responsável partidária, revelando que as eleições autárquicas só deverão ser convocadas quando todas as condições para o efeito estiverem criadas.

Lembrou, a propósito, que foi o MPLA quem inscreveu na agenda política a questão das autarquias, gesto que mostra o interesse deste partido na efectivação das mesmas. "A maior parte do pacote legislativo está aprovado, falta apenas uma lei”, informou Luísa Damião, acrescentando que, para já, não existe uma data para a aprovação desta lei.

"A aprovação da única lei em falta para a aprovação definitiva do pacote legislativo autárquico dependerá apenas do calendário da comissão parlamentar de trabalho respectiva”, declarou a responsável política, esclarecendo que as comissões parlamentares trabalham em função do seu calendário.

Moçambique espera ter este mês o primeiro cargueiro com gás natural liquefeito

Moçambique espera atestar nas próximas duas semanas o primeiro cargueiro de gás natural liquefeito (LNG) exportado da bacia do Rovuma, ao largo de Cabo Delgado, disse à Lusa o ministro da Economia e Finanças, Max Tonela

“Esperamos que aconteça antes do final do presente mês de outubro a primeira exportação de gás natural liquefeito produzido pelo país”, referiu em entrevista à Lusa na capital norte-americana, Washington, à margem dos encontros anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Dos três projetos de gás natural liquefeito aprovados para a região norte de Moçambique, caberá à plataforma Coral Sul, em mar alto, afastada da violência armada em Cabo Delgado, estrear a exportação das reservas que se encontram catalogadas entre as maiores do mundo.

A plataforma liderada pela petrolífera italiana Eni vai produzir 3,4 milhões de toneladas por ano.

O gás já começou a ser processado na plataforma, aguardando-se a chegada do primeiro navio cargueiro da BP, que comprou a produção por 20 anos.

Os outros dois projetos de maior dimensão, liderados pela TotalEnergies e Exxon/Eni, têm fábricas de liquefação projetadas para terra, na península de Afungi, mas aguardam por decisões das petrolíferas para avançarem.

Comissão Anticorrupção timorense efetua mais buscas no Palácio do Governo

TIMOR-LESTE

Elementos da Comissão Anticorrupção (CAC) timorense efetuaram hoje novas buscas no Palácio do Governo, em Díli, no âmbito de uma investigação que levou na semana passada à detenção de duas pessoas

Aoperação, que a própria CAC anunciou através da rede social Facebook, decorreu nos escritórios do Ministério dos Assuntos Parlamentares e Comunicação Social, tendo sido confiscadas várias caixas de documentos e outro material, incluindo um computador portátil.

Dezenas de funcionários acompanharam a operação nas varandas e no exterior do Palácio, com a operação a ser transmitida em direto nas redes sociais e a ser observada por vários jornalistas.

A operação ocorreu depois de agentes da CAC terem detido, na quarta-feira, no Palácio do Governo, um assessor do atual ministro de Assuntos Parlamentares e Comunicação Social, Francisco Martins Jerónimo, e, posteriormente, noutro ponto de Díli, uma empresária que foi secretária do governante no seu outro cargo, presidente da Federação de Futebol de Timor-Leste (FFTL).

Os dois detidos foram apresentados ao Tribunal de Díli no fim de semana e acusados dos crimes de abuso de poder, participação económica em negócio, branqueamento de capitais, fraude fiscal e conflito de interesses.

Depois do primeiro interrogatório, o juiz aplicou aos suspeitos a medida de coação de termo de identidade e residência, com apresentação periódica e proibição de saída do país.

As operações e detenções inserem-se numa investigação que começou em 2021 e que se relaciona com suspeitas relativas a um contrato que o ministro assinou com a empresa Dili Eternal Innovation Information para a compra de descodificadores terrestre para acesso ao sinal da Rádio e Televisão de Timor-Leste.

Na semana passada, o líder da CAC admitiu à Lusa que possa haver ainda mais detenções no âmbito da investigação. 

"Fizemos a detenção de duas pessoas para interrogatório, executando um mandado de busca e apreensão. Continuamos com as diligências de investigações e não excluímos que possa haver suspeitos adicionais envolvidos. Trata-se de alegados crimes de participação económica em negócio e abuso de poder", disse Sérgio Hornai.

Para a detenção dos suspeitos iniciais, os elementos da CAC executaram um mandado do juiz José Gonçalves, do Tribunal Distrital de Díli, assinado já em 26 de setembro, atuando, segundo Sergio Hornai, dentro do definido na lei que criou a CAC, e que lhe dá competências para "realizar interrogatórios no âmbito da investigação e demais atos instrutórios necessários para o desempenho das suas atribuições" e "realizar buscas e revistas".

A investigação indicia que o ministro terá favorecido a sua então secretária na presidência da FFTL, atribuindo-lhe um contrato no valor de quase 900 mil dólares (mais de 923 mil euros).

Francisco Martins Jerónimo recusou-se a comentar as detenções de hoje, acusando os agentes da CAC de atuar "com falta de ética" e rejeitando qualquer acusação.

"São acusações falsas. Não houve qualquer favorecimento ou abuso de poder. As regras, leis e regulamentos de aprovisionamento foram seguidas com normalidade", disse à Lusa.

"Não tenho comentários sobre as detenções. Estou a acompanhar o caso para perceber o que se passa. Se a CAC tem evidências, vamos então ver", disse.

Notícias ao Minuto | Lusa | Imagem: © Lusa

Xi Jinping deixou um aviso a Taiwan no 20.º Congresso do Partido Comunista da China

Xi muda foco da economia para a segurança da China

Presidente chinês disse, na abertura do 20.º Congresso do Partido Comunista da China, que “nunca prometeu renunciar ao uso da força” em Taiwan.

O líder da China, Xi Jinping, deixou um aviso a Taiwan no seu discurso aos delegados do 20.º Congresso do Partido Comunista da China, a mais importante reunião do partido, que começou este domingo em Pequim e que deverá confirmar mais cinco anos de mandato para Xi.

A “questão de Taiwan é um assunto do povo chinês e deve ser resolvida apenas pelo povo chinês”, disse Xi – a insistência dos EUA de que defenderiam Taiwan em caso de ataque e a visita recente da speaker da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, a Taipé causou particular irritação em Pequim. A China, continuou Xi, fará esforços para esta resolução seja pacífica, acrescentou, mas nunca porá de lado a hipótese de usar a força.

Xi congratulou-se pela aprovação, em Hong Kong, de uma lei de segurança, que basicamente criminalizou a oposição ao regime e resultou no esmagar do movimento pró-democracia, diz o diário britânico The Guardian. A ordem foi restaurada, disse o líder chinês, “uma mudança para melhor” na região, que passou “do caos para a governação”, citam as agências noticiosas.

“O rumo da História está a caminhar para a reunificação e o rejuvenescimento da grande nação chinesa. A reunificação completa tem de ser feita e pode, sem dúvida, ser conseguida”, declarou o líder chinês, na frase em que foi mais aplaudido pelos 2000 delegados.

A ideia de “rejuvenescimento nacional” está no centro dos planos de Xi para a China.

No seu discurso de duas horas, sugeriu, segundo o Guardian, que o rumo da sua liderança, caracterizado por um maior controlo social, uma postura regional mais agressiva e a rivalidade com o Ocidente, vai continuar.

Xi defendeu também a política de “covid zero”, que a China é neste momento o único país do mundo a adoptar e tem sido marcada por exageros que levaram a críticas e a grande descontentamento. Disse que esta política se irá manter, já que “põe as pessoas e as suas vidas acima de tudo o resto”.

“Dada a tensão económica e social causada pela adesão a uma política de covid zero cada vez menos popular, o discurso de Xi pode soar defensivo a muitos cidadãos chineses, insistindo que o Partido tem como prioridade os seus interesses”, comentou

John Delury, professor de estudos chineses na Universidade Yonsei, de Seul (Coreia do Sul), à agência Reuters.

O professor de estudos de segurança da Universidade de Sydney Bates Gill viu o discurso como “dizendo ‘continuidade’ a toda a velocidade, mesmo que a economia interna e as relações internacionais enfrentem dificuldades crescentes”. Mas para Gill “este discurso não teve o objectivo de ser um discurso de políticas”, mas sim “de elogiar feitos passados e mostrar confiança”.

Para Zhiwu Chen, professor de Finanças da Universidade de Hong Kong, há uma mudança muito significativa no discurso de Xi: “Tirar a ênfase do desenvolvimento económico e das reformas económicas”, disse à Reuters. “Do 14.º ao 19.º congresso do Partido, o desenvolvimento económico foi, de cada vez, declarado explicitamente como a missão central do partido. Desta vez, não há essa menção. Em vez disso, há uma ênfase no desenvolvimento ‘completo’. Ou seja, o Partido vai dedicar os seus esforços não só ao desenvolvimento económico, mas também ao desenvolvimento político, social, ambiental e cultural.”

Ja Ian Chong, professor de Ciência Política de Singapura, comentou que nada se destacou no discurso, “o que é notável no sentido de estar de acordo com a ideia de que há um mundo instável e perigoso lá fora, de que Xi fala, e ele quer apresentar a China e a sua liderança como estável”, cita a Reuters. “Notei um aumento da discussão da segurança, o que não é surpreendente porque em várias frentes a China tem hoje muito mais razões para se preocupar do que tinha há cinco anos”.

Para John Delury, “o conceito central do discurso parece ter sido a segurança, uma palavra que Xi usou de várias maneiras para justificar não só a sua abordagem em relação à política externa, mas também à economia e à saúde pública.”

Em conclusão, para Delury: “Mao Tsetung prometeu tornar as pessoas revolucionárias. Deng Xiaoping prometeu torná-las ricas. Xi está a prometer mantê-las seguras.”

Maria João Guimarães | Público

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