Artur Queiroz*, Luanda
A Selecção Nacional de Futebol chegou aos quartos-de-final do Campeonato Africano das Nações (CAN). A vitória desencadeou críticas ferozes à ministra que tutela o Desporto, Palmira Barbosa, ao Executivo, ao Presidente da República e a todos os deputados do MPLA. Se tivéssemos perdido, ficava tudo bem. Para quem odeia Angola, não é capaz de suportar a ideia de sermos um país e quer regressar ao tempo dos sobados, quanto pior, melhor. O brilharete dos Palancas Negras estragou tudo.
A Selecção Nacional de Futebol é de todos os angolanos. O Presidente da República é o mais alto magistrado da Nação. O Presidente de todos nós. É natural que a ministra Palmira Barbosa, entusiasmada com a vitória sobre a Namíbia, tenha dedicado este feito inédito ao Presidente da República. Por muitas críticas que nos mereça, por muita desilusão que nos cause, é o Chefe de Estado. Foi eleito por uma maioria absoluta do eleitorado. Até 2027 é o nosso Presidente, democraticamente eleito.
William Tonet é um verdadeiro autóctone. Os dois nomes que usa são retintamente africanos. Bantus. Oriundos dos mabululus. Muito autêntico, muito sério, muito jornalista, muito amante da verdade. Confesso que tenho por ele especial admiração. Este não finge. É ele mesmo. Tem imensa piada. A propósito da vitória da Selecção Nacional frente à Namíbia fez um discurso que vai ficar nos anais do ridículo que mata. O autóctone disse isto através da Televisão Número 8:
“As pernas brilhantes em campo ganham jogos. O melhor Executivo que temos são os Palancas Negras. Libertaram-nos dos nossos colonialistas. Nós, que somos filhos dos vários reis. Eles deram-nos uma alegria. É preciso ter a noção do ridículo. Os bajuladores que se cuidem. Desinfectem a boca”.
Invectivou insultuosamente a ministra Palmira Barbosa por ter dedicado a vitória da Selecção de todos nós ao Presidente de todos nós.
Hora da folga na Selecção Nacional. Gilberto e Mabululu estão no lazer. Eis que toca o telefone. O capitão pergunta: Quem és tu telefonador?
Silêncio do outro lado. O ambiente de drama adensa-se. A aparelhagem sonora solta um rufar de tambores e novamente o silêncio. Nem um mosquito anófeles se ouve. A orquestra larga um tan tan tan tan! E eis a resposta:
- Daqui fala o doutor Aguinaldo Jaime PCA da UNITEL!
Gilberto faz um gesto interrogatório para Mabululu. E ele abanou a cabeça na negativa. Não sei quem é esse muadiê.
- Não entendi. Quem és tu ó telefonador?
- Doutor Aguinaldo Jaime PCA da UNITEL. Todo o mundo me conhece. Andava na sopa dos pobres em Lisboa, vim para Luanda em 1975 e comecei logo a arrotar caviar e postas de lagosta. Trepei na vida de criado a capataz. Servi na rádio, nas finanças, na economia, nos seguros, nos roubos, nas golpadas. Testemunhei falsamente para meter na cadeia Carlos São Vicente. Agora estou aqui na UNITEL para acabar com a empresa de uma vez por todas. A Isabel, comigo não brinca. Ela é boa a criar riqueza e postos de trabalho mas eu sou truta a rebentar com tudo. Não sei fazer mais nada. Só destruir e embolsar.
- Mas quem te deu o meu número ó telefonador? O que pretendes?
- Eu sou o doutor Aguinaldo Jaime PCA da INITEL. Pelas minhas mãos passam milhões. Uns voam, outros ficam amarrados às minhas mãos que têm cola-tudo. O dinheiro quando passa por mim fica colado às mãos! Quem me deu o seu número foi o senhor Teodoro, director de marketing da UNUTEL. Teodoro não te metas no sonoro! Esse mesmo. Lhe conheces?
- Está bem, o que queres telefonador?
- Sou o doutor Aguinaldo Jaime PCA da UNITEL. Tenho Uma mensagem para a selecção. Pode ser agora?
- Fala então. Sem problemas.
- Sou o doutor Aguinaldo Jaime. Doutor, doutor, doutor. Nós, UNITEL, seu Conselho de Administração, seus directores, gestores e demais trabalhadores queremos transmitir a nossa satisfação pela excelente performance da nossa selecção contra a Namíbia.
Sou o doutor. O doutor. O doutor. Foi uma exibição muito boa, boa, boa. Magnífica. Nós, família da UNITEL, estamos cheios de orgulho.
Eu sou o doutor. Doutor, doutor. Estamos tão contentes que a UNITEL resolveu fazer uma especial oferta. Consiste na oferta de um iphone 15 para todos os membros da selecção, jogadores e equipa técnica. Ao mesmo tempo oferecer aos jogadores e equipa técnica um anos de chamadas grátis na rede UNITEL. Sou o doutor. Sou o PCA que escapou da sopa dos pobres. Sou milionário. Sou o que põe Isabel a pagar tudo. Sou o que vai rebentar com a UNITEL para o Antony engordar a Africell. Sou o doutor PCA.
- Chefe manda-nos já a claque para o jogo com a Nigéria.
- Sou o doutor Aguinaldo Jaime. Vamos ver se é possível mandar uma claque de apoio.
- Obrigado. Agradecemos mais se a claque vier.
- Sou o doutor. O PCA. Se calhar falamos amanhã. Boa sorte para o jogo contra a Nigéria. A Nigéria é um dos tubarões a nível do futebol em África. Vamos continuar a fazer história. Que Deus vos abençoe.
A peça acabou. Caiu o órgão e tocou o pano. Perdão! Caiu o pano sobre o palco e o órgão tocou a oitava de Beethoven: Oi tava na peneira, oi tava peneirando, oi tava no namoro, oi tava namorando. É mesmo preciso ter a noção do ridículo. Porque ele mata até a criadagem!
*Jornalista
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