segunda-feira, 28 de outubro de 2019

REINTERPRETAR O MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO EM ÁFRICA – III


SUBSÍDIOS EM SAUDAÇÃO AO 11 DE NOVEMBRO DE 2019

Uma das maiores deficiências de que sofrem os africanos duma forma geral e os angolanos em particular, é a ausência de reflexão própria sobre os fenómenos antropológicos e históricos afectos ao seu espaço físico, geográfico e ambiental.

Essa falta de vontade e de perspectiva abre espaço ao conhecimento que chega de fora, em prejuízo do conhecimento que tem oportunidade de florescer dentro, ou seja: subvaloriza o campo experimental próprio, quantas vezes para sobrevalorizar as teorias injectadas do exterior!

Isso permite que outros não abram o jogo sobre essas interpretações dialéticas em função de seus interesses, manipulações e ingerências, aplicando a África, por tabela a Angola, as interpretações estruturalistas de feição, de conveniência e de assimilação!


Esta série pretende reabrir dossiers que do passado iluminam o longo caminho da libertação dos povos da América Latina e Caribe, de África e por tabela de Angola, sabendo que é apenas um pequeno contributo para o muito que nesse sentido há que digna e corajosamente fazer!

Abrir os links permite complementar com fundamentos, muitas das (re)interpretações do autor.



09- Angola pode continuar a ser um país com rumo, desde que o homem a libertar seja a prioridade de todas as atenções e as abordagens sejam feitas numa lógica com sentido de vida, com a segurança vital indispensável em função do imenso respeito devido à humanidade e para com a Mãe Terra! (https://paginaglobal.blogspot.com/2017/09/mensagem-para-todos-os-africanos-e.html).



No início da luta armada essa filosofia foi adoptada sem rodeios pelo guia e pelos seus mais próximos seguidores, desde que António Agostinho Neto assumiu a direcção, (http://paginaglobal.blogspot.com/2015/02/historias-de-fevereiro-i.htmlhttp://paginaglobal.blogspot.com/2015/02/historias-de-fevereiro-ii.html;  http://paginaglobal.blogspot.com/2015/02/historias-de-fevereiro-iii.html) mas já com um temperado processo de luta que ele próprio começou antes a trilhar. (http://jornaldeangola.sapo.ao/opiniao/artigos/contributo_de_neto_para_a_afirmacao__da_nossa_identidade_cultural).

Um dos primeiros sinais dessa luta pode-se encontrar no Iº tomo de “Agostinho Neto e a libertação de Angola – 1949-1974 – Arquivos da PIDE/DGS”, (https://www.cplp.org/id-4447.aspx?Action=1&NewsId=2210&currentPage=58&M=NewsV2&PID=10872), numa informação dirigida “ao Exmº Snr Director dos Serviços de Informação da LEGIÃO PORTUGUESA”, com data de 12 de Julho de 1949, por alguém que focava preocupadíssimo a actividade da Casa dos Estudantes do Império, onde o então jovem Neto já se evidenciava. (https://www.uccla.pt/casa-dos-estudantes-do-imperiohttps://www.dw.com/pt-002/casa-dos-estudantes-do-imp%C3%A9rio-ber%C3%A7o-de-l%C3%ADderes-africanos-em-lisboa/a-16233230).

Para quem pretender ter uma visão introdutória próxima, sintética, mas substantivamente lúcida, sobre quem era António Agostinho Neto, pode ter em “O pensamento estratégico de Agostinho Neto”, de Iko Carreira, um guião indispensável, pois a sua complexa personalidade não se pode separar de sua própria trajectória patriótica e revolucionária de luta, uma forja a quente de suas capacidades de opção, decisão e clarividência face ao futuro. (https://www.wook.pt/livro/o-pensamento-estrategico-de-agostinho-neto-iko-carreira/71049).

Iko Carreira, um dos seus intrépidos seguidores, escreveu sobre ele a página 45 desse livro:

“Quando se encontrava preso pela PIDE (Policia Internacional da Defesa do Estado – polícia secreta portuguesa sob o regime de Salazar e Caetano, com outra designação) ou com residência fixa pela mesma polícia, Neto já acreditava vir a ser o grande libertador de Angola.

Leitor dos Poetas e Escritores libertadores da América Latina da década de 30, ele foi bastante influenciado pelos escritos de Jorge Amado e os exemplos de Carlos Prestes e também por Álvaro Cunhal, respectivamente presidente do Partido Comunista Brasileiro e secretário-geral do Partido Comunista Português, dos anos60.

Na qualidade de membro do MUD Juvenil (Movimento de Unidade Democrática da juventude portuguesa), assistiu ao Festival Mundial da Juventude na Roménia, onde fez o possível por representar Angola, distinta da delegação portuguesa. Aí fez amizades que marcaram a sua vida, tais como a de Yonesco, dirigente romeno e a de Giulini, hoje homem de negócios, italiano.

Esses festivais eram, na sua grande maioria, suportados pela União Soviética e daí o início do rótulo de comunista, que sempre perseguiu Neto.

Formado em medicina, regressou a Luanda, escolhendo para lugar do seu primeiro consultório, um bairro pobre da capital angolana”…

Até à Conferência de Imprensa em Léopoldville do Presidente Honorário do MPLA, António Agostinho Neto (ocorrida a 10 de Agosto de 1962), foram no mínimo treze anos de intensa luta em que ele teve de vencer inúmeras barreiras, obstáculos, prisões e perseguições, uma temperança individual e colectiva (muitos camaradas o acompanharam e com ele assumiam a quota-parte das iniciativas) que tinha tudo a ver com o rumo da lógica com sentido de vida e da segurança vital indispensável até ao momento do jovem revolucionário se tornar no guia que orientaria o rumo do MPLA. (https://www.revistas2.uepg.br/index.php/tel/article/download/9262/6063).

Com ele o rumo do movimento de libertação em África, junto de outros insignes pares, também eles experimentados na luta e vocacionados dentro de organizações de libertação similares, ganhou vigor, coerência e claros objectivos! (https://www.facebook.com/notes/ale-xandre/liberta%C3%A7%C3%A3o-da-%C3%A1frica-austral/255317584648734/;  https://www.buala.org/pt/a-ler/a-vitoria-e-certa-apontamentos-para-a-historia-do-mpla).

Na Iª Conferência Nacional do MPLA, realizada entre 1 e 3 de Dezembro de 1962, António Agostinho Neto assumiu com seu vigor e onteligência, o cargo do Presidente do Comité Director do MPLA e desde então sua vocação e sua energia tornaram-no no guia do rumo que desde logo deveria ser tomado. (IIº tomo de “Agostinho Neto e a libertação de Angola – 1949-1974 – Arquivos da PIDE/DGS”).

Na obra “O Pensamento Estratégico de Agostinho Neto”, o Comandante Iko Carreira confirma a propósito, a página 33:

… “Neto devia, assim, ser sempre defendido, pois não só a sua acção era globalmente positiva, mas também por que ele, mesmo antes de iniciar a sua actividade na Presidência do MPLA, era já um dirigente carismático da luta de libertação do Povo Angolano.

Ninguém se opunha a isso e quem quisesse fazê-lo, acabaria sempre por ser esmagado pela dinâmica da própria luta.

O pensamento Estratégico de Agostinho Neto já estava bem delineado, já toda a gente sabia, com reuniões ou sem elas, onde ia desembocar”.

10- O Comunicado de 16 de Dezembro de 1962, resultante da Iª Conferência Nacional do MPLA, espelha os primeiros passos a dar no rumo de luta que então efectivamente se iniciou, quebrando com a psicologia do oprimido e da vitimização, quebrando também com leituras menos precisas ou indecisas de outras ideologias que porventura pretendessem vigorar. (http://www.mpla.ao/mpla.6/historia.7.htmlhttps://sites.google.com/site/tchiweka/Home/documentos-catalogados/documentos-1962https://sites.google.com/site/tchiweka/Home/documentos-catalogados/documentos-1963?tmpl=%2Fsystem%2Fapp%2Ftemplates%2Fprint%2F&showPrintDialog=1).

Segundo Iko Carreira (páginas 46 e 47 do mesmo livro), “Neto percebeu que era tomado por um intruso na luta de libertação de Angola, tudo tinha sido cozinhado pelos americanos e que portanto só lhe restava e só poderia fazer a luta se estivesse de acordo em fazê-la com base nos princípios do marxismo-leninismo e ainda, que teria de ter uma organização que lhe desse essa garantia.

A luta de libertação do povo angolano contra o colonialismo português, estava nas previsões do presidente Kennedy, que dava sempre o seu acordo a todas as iniciativas que combatessem a antiga ordem. Mas os EUA tinham já então a sua opção. Assim durante o périplo Neto correspondeu melhor o significado político e a importância do MPLA”…

O Comunicado fazia um introito sobre a composição do evento e de seguida apontava, do geral para o particular, a “LINHA POLÍTICA”, o “PROGRAMA DE ACÇÃO”, as “ESTRUTURAS”, o “COMITÉ DIRECTOR” e o “COMTÉ POLÍTICO-MILITAR”.

As coerentes linhas e o vigor da lógica com sentido de vida e de segurança vital fazem parte da essência do documento, pelo que vale a pena lembrar este curto excerto referente à “LINHA POLÍTICA”:

“Em matéria de linha política, a Primeira Conferência Nacional estabeleceu que o MPLA deve garantir a representação da população rural na direcção do Movimento e dos organismos de condução da luta no interior do país e acentuou que a Revolução Angolana deve concentrar todos os esforços na realização das aspirações das massas camponesas, na base duma aliança de todas as forças produtivas da nação.

Encarando o futuro do país, a Conferência determinou que o Movimento deve zelar pela implantação em Angola de um regime que seja a emanação da vontade popular e que ofereça garantias ao povo de exercer o controlo do poder, satisfazendo cabalmente os seus anseios de liberdade, justiça e progresso em todos os domínios.

A conferência manifestou-se categoricamente contra o tribalismo, o regionalismo, o sectarismo e a intolerância racial e contra as distinções de carácter político e religioso.

Estabeleceu que o MPLA se oporá à entrada de investimentos que comprometam a independência económica e politica de Angola”…

11- Segundo Iko Carreira (página 49 e 50 do seu livro acerca de Neto), “no MPLA não se tinha dado até então muita atenção ao problema das estruturas. Vivera-se até aí do Comité Director não eleito e das estruturas do CVAAR (Copor Voluntário Angolano de Assistência aos Refugiados).

A importância do CVAAR pode ser apreciada de várias maneiras. Constituía em primeiro lugar, a cobertura jurídica do MPLA no Congo-Léopoldville, pois o MPLA nunca conseguiu autorização para trabalhar a partir daquela capital. No CVAAR estavam integrados todos os médicos angolanos, ou simples estudantes de medicina, conseguindo realizar alguns cursos acelerados de enfermagem. No seu auge, assistindo indiscriminadamente angolanos e congoleses (leia-se zairenses), o CVAAR chegou a ter 27 dispensários distribuídos por toda a fronteira do Congo com Angola, sem esquecer o Congo-Brazzaville.

É então que se trata de dar ao Movimento as estruturas que o seu desenvolvimento necessitava. O país foi assim dividido em regiões, estas em zonas e estas últimas em sectores e estes em localidades”…

… A Conferência institucionalizou ainda o EPLA”.

O “PROGRAMA DE ACÇÃO” estabelecido no âmbito da Iª Conferência Nacional do MPLA preconizou que o MPLA era, numa incessante busca de unidade e coesão:

. “Um movimento de massas”;

. “Um movimento revolucionário”;

. Se “generalizava uma disciplina de guerra a todos os sectores do MPLA”;

. Se dava “primazia do interior sobre o exterior”;

. Se determinava o “primado da política sobre o militar”;

. Se “lançava no presente as bases da nação futura”;

. Se passava a “planificar o trabalho de todos os sectores”.

Desde logo passou-se a atender:

. À “acção no interior de Angola”;

. À “acção no exterior de Angola”;

. À “acção nos Congos”; (este aspecto detalhou-se, pois incidia “sobre o terreno” em que o movimento de libertação incidia com todos os meios ao seu dispor e com o poder de mobilização que passou a melhor deter). (http://www.mundamba.com/2015/05/manuel-quarta-mpunza-responsavel-do-cvaar-em-matadi-em-1962.html).


De então para cá a amizade entre Cuba e Angola situa-se bem no eixo da aproximação progressista entre a América e África! (http://mail.agostinhoneto.org/index.php?option=com_content&view=article&id=899:o-bloqueio-a-cuba-e-tambem-uma-afronta-a-africa&catid=37:noticias&Itemid=206).

A composição do Comité Director, do Comité Político-Militar e do Exército Popular de Libertação de Angola, EPLA, era uma pré-adaptação em função do carácter do início da luta armada, com a vocação de lógica com sentido de vida e a despontar para os parâmetros de segurança vital indexado ao interior de Angola, face ao colonialismo e ao neocolonialismo de então, face ao império que no Congo Léopoldville se fazia intensamente sentir!

O Comité Director tinha um Presidente (António Agostinho Neto), dois Vice-Presidentes e sete Departamentos (de Guerra, das Relações Exteriores, da Organização e Quadros, da Informação, dos Assuntos Sociais, de Finanças e Economia e de Segurança); cinco Departamentos vocacionavam-se essencialmente para esferas de acção “civil” e apenas dois, o Departamento de Guerra e o de Segurança, (chefiados respectivamente por Manuel Lima e Iko Carreira) tinham directamente a ver com a luta armada propriamente dita.

O subjacente Comité Político-Militar era formado pelo Presidente, o 1º Vice-Presidente (Matias Migueis) e pelos Chefes dos Departamentos da Guerra, das Relações exteriores (Mário de Andrade), da Organização e Quadros (Lúcio Lara) e das Finanças e Economia (Desidério da Graça).

A segurança vital, inspirada na própria experiência do movimento de libertação dando primazia ao interior, era desde logo indispensável ao rumo a seguir para se assumir uma vida independente e soberana, mas também indispensável quando, na sequência da independência passaria a ser necessário continuar a assumir capacidade de luta em benefício da vida e da felicidade de todos os angolanos.

12- A segurança vital nesses termos mobilizadores, permitiu desde logo outra velocidade e coerência de e na acção, permitiu articuladas transversalidades, integrando processos multidisciplinares, abrangentes ou específicos nos seus objectivos, seguindo e animando a trilha do rumo da luta pela autodeterminação, a independência e a soberania, garantindo a cultura do respeito para com a humanidade e planeta, Mãe Terra, em função da vocação inteligente da própria luta!

A 10 de Janeiro de 1963, na sequência da reorganização preconizada sob a égide de António Agostinho Neto, o MPLA informava a formação do EPLA, Exército Popular de Libertação de Angola, predispondo-se a um novo estágio de luta, apenas dois anos depois do 4 de Fevereiro de 1961. (http://jornaldeangola.sapo.ao/politica/forca_aerea_reflecte_a_estrategia_de_neto).

O EPLA contudo, tendo e conta a primazia da luta no interior, teve vida efémera e acabaria por ser substituído pelos Destacamentos Guerrilheiros, antes da proclamação das FAPLA.

A 28 de Fevereiro de 1963, era fundada a Escola de Quadros, a forja do revolucionário do MPLA.


Em todos os fóruns internacionais essa revitalização do MPLA se manifestou galvanizadora e mobilizadora em torno do e com o seu guia e, aqueles que alimentavam letargia de tendência etno-nacionalista, em torno de Viriato da Cruz e Matias Migueis, passaram a alimentar argumentos reactivos face à nascente capacidade pró-activa, face ao seu rumo, face à sua crescente energia e vitalidade apontada para o objectivo da autodeterminação e da independência de Angola e uma presença justa no seio das nações e dos povos de todo o mundo.

Vencer a vitimização não foi fácil no seio do MPLA e, no preciso momento em que essa luta intestina se radicalizava com a chegada de António Agostinho Neto, as conjunturas próximas no próprio Congo Léopoldville, assim como a cisão do campo socialista, agravada no início da década de 60 do século XX, espelhavam-se nas duas correntes internas mais expressivas de então. (https://revistaforum.com.br/blogs/rodrigovianna/brodrigovianna-hoje-na-historia-1963-ruptura-entre-urss-e-china/).

A segurança vital do rumo encetado pelo MPLA tendo como guia António Agostinho Neto, experimentou assim uma primeira ruptura que, por razões dos objectivos da própria luta, urgia ultrapassar com o reforço do próprio rumo e sua segurança vital face ao divisionismo e todas as formas de desagregação interna.

A imposição da FNLA e do Governo Revolucionário de Angola no Exílio (GRAE), favorecia a conduta etno-nacionalista e distorcia a amplitude colectiva mobilizadora indispensável à luta, inibindo a segurança vital do movimento de libertação em África e procurando sujeitá-lo a interesses que contrariavam a vocação libertária de todo o povo angolano, esmagadoramente vivendo no interior do país.

Perante esse fenómeno, os esforços resolutos em defesa do rumo escolhido em torno do guia António Agostinho Neto, foi imprescindível nos tempos do “Vitória ou Morte”, tempos que tornaram disjuntivos quando, com a expulsão do MPLA de Léopoldville, obrigou à travessia do rio Congo e à instalação da sede do MPLA no exílio em Brazzaville!

Se não houvesse lógica com sentido de vida, nem capacidade de segurança vital apontada ao interior, o movimento de libertação em África deixaria de ter a prática dum dos seus principais componentes e poderia mesmo ter desaparecido na sua expressão de coerência maior! (https://paginaglobal.blogspot.com/2016/11/a-unidade-progressista-em-torno-do.htmlhttp://litoralcentro-comunicacaoeimagem.pt/2016/11/10/a-unidade-progressista-em-torno-do/).

Martinho Júnior -- Luanda, 26 de Outubro de 2019

Imagens:
01- Capa do livro de Américo Boavida, “Angola, cinco séculos de exploração portuguesa” – https://www.estantevirtual.com.br/livros/americo-boavida/angola-cinco-seculos-de-exploracao-portuguesa/4029542074;
02- “Angola sob o domínio português, mito e realidade”, de Gerald J. Bender – https://www.estantevirtual.com.br/copelivros/gerald-j-bender-angola-sob-o-dominio-portugues-mito-e-realidade-1953109788;
03- “O pensamento estratégico de Agostinho Neto”, de Iko Carreira –  https://www.wook.pt/livro/o-pensamento-estrategico-de-agostinho-neto-iko-carreira/71049
04- “Um amplo movimento- Volume I” de três volumes – Lúcio e Ruth Lara, continuados pela ATD, “Associação Tchiweca de Documentação” – https://www.angola-books.com/p1/um-amplo-movimento-vol-i.html;

05- “Agostinho Neto e a libertação de Angola, 1949-1974, arquivos da PIDE-DGS” – Fundação Agostinho Neto –  https://www.cplp.org/id-4447.aspx?Action=1&NewsId=2210&currentPage=58&M=NewsV2&PID=10872.

Anteriores:


“ADEUS À HORA DA LARGADA”, POEMA DE ANTÓNIO AGOSTINHO NETO, MARCO DO RUMO QUE LEVOU À CONSUMAÇÃO DO PROGRAMA MÍNIMO DO MPLA E DO MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO EM ÁFRICA, (http://www.agostinhoneto.org/index.php?option=com_content&view=article&id=610:partida-para-o-contrato&catid=45:sagrada-esperanca&Itemid=233 ):

ADEUS À HORA DA LARGADA

Minha mãe
(todas as mãe negras
cujos filhos partiram)
tu me ensinaste a esperar
como esperaste nas horas difíceis

Mas a vida
matou em mim essa mística esperança

Eu já não espero
sou aquele por quem se espera

Sou
eu minha Mãe
a esperança somos nós
os teus filhos
partidos para uma fé que alimenta a vida

Hoje
somos as crianças nuas das sanzalas do mato
os garotos sem escola a jogar a bola de trapos
nos areias ao meio-dia
somos nós mesmos
os contratados a queimar vidas nos cafézais
os homens negros ignorantes
que devem respeitar o homem branco
e temer o rico
somos os teus filhos
dos bairros de pretos
além aonde não chega a luz eléctrica
os homens bêbedos a cair
abandonados ao ritmo dum batuque de morte
teus filhos
com fome
com sede
com vergonha de te chamarmos Mãe
com medo de atravessar as ruas
com medo dos homens
nós mesmos

Amanhã
entoaremos hinos à liberdade
quando comemorarmos
a data da abolição desta escravatura

Nós vamos em busca de luz
os teus filhos Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
vão em busca de vida.

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