quarta-feira, 29 de maio de 2019

Angola | 31 DE MAIO DE 1991 - Martinho Júnior



BICESSE E A PAZ "QUE ESTAMOS COM ELA"!...

Martinho Júnior, Luanda 

É claro que Bicesse, para o regime da oligarquia portuguesa e seus apêndices do processo de assimilação, vai ser lembrado enquanto mais um lavatório de imagem exposta nos relacionamentos internacionais, às tantas com alguma pompa e circunstância… (https://paginaglobal.blogspot.com/2018/08/angola-e-as-inquietacoes-essenciais.html).

1- No último dia do mês em que se assinala África, em 1991, houve Bicesse, um Acordo sobre Angola que completará em 2019, 28 anos! (https://pt.wikipedia.org/wiki/Acordos_de_Bicesse).

Vencido o "apartheid" em finais da década de 80 do século XX, vencida posteriormente a "guerra dos diamantes de sangue" em 2002 (sucedânea do Acordo de Bicesse), tendo perdido os seus aliados naturais por via duma implosiva “glasnost-perestroika” (https://m.suapesquisa.com/historia/glasnost_perestroika.htm) que acabou com aqueles que haviam cultivado a solidariedade socialista para com África e para com Angola a partir de meados da década de 80 (https://paginaglobal.blogspot.com/p/25-anos-depois.html), o estado angolano procurou abrir caminho a uma paz que tendo sido possível após o choque, inclina-se e submete-se à terapia do capitalismo neoliberal, que ora subsiste com todo o cortejo de alienações, de ilusões, de mentiras continuadas, de manipulações, de diversão e um cada vez mais exposto vendaval de corrupções (http://paginaglobal.blogspot.pt/2018/04/angola-na-charneira-dos-tempos-que.html)!...



…A “glasnost-perestroika” angolana acompanhou no tempo a que ocorreu na União Soviética, seguindo uma similar filosofia mas uma outra deriva e, por isso, desde logo pôs fim à República Popular de Angola!

A terapia neoliberal vai subsistir conforme os indicadores contemporâneos, num processo de velado neocolonialismo que molda“transversalmente” uma mentalidade que retarda o conhecimento do angolano sobre si próprio, que retarda o renascimento de África e de Angola (http://paginaglobal.blogspot.pt/2018/01/acordar-o-homem-angolano.html) e eu próprio tenho presente na minha consciência crítica em grande parte forjada na “universidade da vida” dum antigo (?) combatente, respondendo ao futuro e às futuras gerações numa consolidada lógica com sentido de vida que se vai tornando numa trincheira firme e imprescindível (http://paginaglobal.blogspot.com/2018/04/angola-construir-paz-social.html)!

Ao propor o salto em direcção ao futuro (http://paginaglobal.blogspot.pt/2018/04/colocar-nossas-pernas-titubeantes-no.html), estou a propor uma cultura de inteligência patriótica capaz de pôr fim às trevas correntes da superestrutura ideológica cujos horizontes não existem, enquanto a hegemonia impõe o “fim da história” conforme Francis Fukuyama!


2- As ideologias indexadas ao capitalismo neoliberal animam desde meados da década de 80 a superestrutura ideológica do país, numa mescla entre “mercado” e religião, entre religião e “mercado” agora em plena época de crise e com todos os oportunismos disputando o espaço das clientelas, quando o artificioso preço do barril de petróleo reflecte-se tão drasticamente no Orçamento Geral do Estado e molda as práticas financeiras de contingência a nível interno e nos relacionamentos internacionais possíveis a Angola, completamente avessas a geoestratégias de muito longo prazo por que ninguém, numa conjuntura como a corrente, pode avaliar o dia de amanhã!...

Essa deriva é propícia a um contínuo naufrágio ético e moral, com repercussões em todas as instituições e na sociedade, por que o rigor necessário ao exercício do estado entendido como fiel depositário dos interesses e aspirações de todos os angolanos, carece melhor definição desde logo nos termos de sua doutrina, filosofia e parâmetros ideológicos e práticos!!

Bicesse, a 31 de Maio de 1991, foi um caixão para a República Popular Angola (https://paginaglobal.blogspot.com/2018/08/angola-e-as-inquietacoes-essenciais.html) à qual dei toda a minha contribuição e empenho enquanto me foi possível e caindo de pé quando fui preso a 23 de Março de 1986 para ser submetido a um julgamento político sob a acusação de “golpe de estado sem derramamento de sangue” (Processo 76/86) de que se desconhece até hoje o chefe e sobre o qual sempre se evitou comentários, como se fosse necessário amnésia e anestesia colectiva sobre os acontecimentos, para não ferir as sensibilidades comuns duma parte substancial das elites que têm vindo a assumir o poder sobre o estado e o povo angolano!

Até hoje o MPLA jamais se pronunciou sobre os acontecimentos e os factos da altura… havia todo o empenho em pôr fim ao Partido do Trabalho e às gloriosas FAPLA, que haviam saído vitoriosas na luta contra o “apartheid” (https://paginaglobal.blogspot.com/2014/09/desbravando-logica-com-sentido-de-vida.htmlhttps://paginaglobal.blogspot.com/2016/04/cinco-anos-de-contra-revolucao.html) e o Acordo de Bicesse foi a marca no âmbito dos relacionamentos internacionais da “glasnost-perestroika” à angolana, sobre as brasas da batalha de Cuito Cuanavale e quando se aproximava o fim do “apartheid”!...

Fui condenado a 16 anos de prisão maior dos quais cumpri mais de 5, fui amnistiado, mas tenho direito à memória pelas consequências que a deriva de Angola teve e as consequências geradas para com a minha própria família: quando se afastaram desse modo alguns dos oficiais da Segurança do Estado que mais se haviam empenhado no combate ao tráfico de diamantes e moeda, deu-se a oportunidade maior, por ausência de capacidades para melhor lhe fazer frente, a Savimbi, que por via dos diamantes de sangue levou a cabo uma guerra atroz que dilacerou o tecido social angolano, entre 1992 e 2002, uma guerra que se havia estendido a toda a região central do continente (http://pagina--um.blogspot.com/2011/01/o-vale-do-cuango.html)!...


3- Entre 1998 e 2000 consegui mesmo assim dar o meu contributo ao Estado-Maior das FAA, a fim de se vencer na “guerra dos diamantes de sangue” e alcançar-se a paz, apesar desse esforço jamais ter sido reconhecido (https://paginaglobal.blogspot.com/2018/11/em-angola-ha-20-anos-i.htmlhttp://paginaglobal.blogspot.com/2018/11/em-angola-ha-20-anos-ii.htmlhttps://paginaglobal.blogspot.com/2018/11/em-angola-ha-20-anos-iii.htmlhttps://paginaglobal.blogspot.com/2018/12/em-angola-ha-20-anos-iv.html).

Há 20 anos e apesar do tratamento de que fui alvo, reafirmei meu patriotismo e minha identidade comprometida na luta para que Angola, para que África, se assumissem no lugar de dignidade que lhes é devidamente legítimo nos relacionamentos humanos, internacionais e para com as mais candentes preocupações para com o planeta.

Nos últimos 10 anos, consciente dos desertos que fui atravessando, que tenho e terei de continuar a atravessar, mesmo assim fui dando minha contribuição a uma Associação representativa de um dos alvos dilectos, em termos de guerra psicológica, dos que no após Bicesse e Luena, instalaram em Angola a devassidão da corrupção, ao abrigo do capitalismo neoliberal luso-angolano (https://paginaglobal.blogspot.pt/2018/05/angola-uma-comunidade-sacrificada-pela_5.html), reitor dos correntes processos de assimilação aninhados na esteira da hegemonia unipolar (https://paginaglobal.blogspot.com/2018/10/angola-combater-pobreza-nas-proprias.html)!...

Esqueciam-se os autores das “glasnosto-perestroikas”, os autores de Bicesse, que também esse processo “transversal” não podia deixar de ser animado de suas próprias contradições internas e externas, escancarando de facto as portas na direcção de mal paradas elites, como por exemplo a dos oligarcas russos motivados pela corrupção (lá como cá)…

Estamos muito longe da paz com justiça social e entrámos na esfera da influência que pode levar à submissão da hegemonia unipolar do império gringo em África (https://paginaglobal.blogspot.com/2019/02/angola-na-ala-dos-namorados.html)!...

Os governos do "arco de governação" do após 25 de Novembro em Portugal, vassalos dos Estados Unidos e "amarrados-curto" pela NATO, muito contribuíram para isso!

Os papeis desempenhados em Bicesse e “a quente” por Cavaco Silva, Durão Barroso e António Monteiro (diplomata que sucedeu em Kinshasa, a Fragoso Allas - http://www.vidasalternativas.eu/a-pide-no-xadrez-africano-guerra-colonial/), são testemunhos nevrálgicos disso!

Bicesse foi a chave que escancarou as portas de Angola aos interesses indexados ao capitalismo neoliberal e, dada a natureza dos enlaces externos, foi um cenário cujos autores foram promotores dessa mesma deriva!

Martinho Júnior - Luanda, 23 de Maio de 2019

Imagens:
01 e 02- Duas fotos do acto solene do Acordo de Bicesse;
03- Durão Barroso nas Lajes, antes da invasão do Iraque; um anfitrião para as políticas elitistas da aristocracia financeira mundial em tempo de hegemonia unipolar;
04- Margaretth Anstee, que escreveu “Angola, órfã da guerra fria”, foi bastante crítica em relação ao Acordo de Bicesse;
05- Documento da minha liberdade (minha prisão: de 24 de Março de 1986 a 18 de Julho de 1991)…

A consultar ainda:
‘Os Acordos de Bicesse foram feitos muito à pressa’ – http://opais.co.ao/os-acordos-de-bicesse-foram-feitos-muito-a-pressa/

Sem comentários:

Mais lidas da semana