quarta-feira, 26 de março de 2014

ANGOLA ASSUME A PAZ SEM FRONTEIRAS EM ÁFRICA!



Martinho Júnior, Luanda

1 – Não poderá haver a consolidação da paz interna em Angola se no entorno a norte profundo da África Austral se mantiverem as múltiplas formas de desagregação, de conflito e de guerras que nos Grandes Lagos parecem não terem fim.

É assim tanto nessa região que é a região fulcral de África e a principal matriz da água interior do continente, como no Golfo da Guiné.

Angola antes tinha uma posição de busca de paz que chegou a ter incidências ao longo da costa ocidental africana, na Costa do Marfim, na Guiné Conacry e na Guiné Bissau, mas os conceitos geo estratégicos e geo políticos evidenciavam a necessidade de serem revistos no contexto amplo do continente, uma vez que surgiam à margem duma geo estratégia eficaz no que toca ao direccionamento das opções e da conjugação dos esforços.

De facto os relacionamentos externos “batiam ao lado” por que as articulações conseguidas demonstraram não se adequar às questões-chave da paz no continente, estavam longe de atacar o que é essencial, na região onde se concentram a maior parte das tensões e problemas crónicos, que se arrastam de há longas décadas a esta parte, de acordo aliás com os ensinamentos que se podem recolher àcerca da “Iª Guerra Mundial Africana”…

Angola reconverteu os seus relacionamentos africanos externos de forma rápida e exemplar:

Partindo do princípio que o “arco de crise” se manifestava em expansão em direcção ao sul do continente a partir duma implantação que se distendia da Mauritânia à Somália, na mais longa transversal continental, Angola deu início à contensão dessa expansão, galvanizando o espaço SADC no sentido de travar na RDC e nos Grandes Lagos a batalha essencial pela paz, bem nos seus limites a norte!

Nesse sentido a Conferência Inter Regional dos Grandes Lagos é um prolongamento da vontades consubstanciadas a partir da SADC!

O potencial da paz tornou-se maior quando a geo estratégia e a geo política de Angola conseguiu um laço muito estreito de relacionamentos nunca antes alcançados com a África do Sul: foi necessário que o Presidente Jacob Zuma chegasse ao poder para tornar isso possível, o que de certo modo passa por uma reconversão de alguns sectores sensíveis das elites sócio-políticas, económicas e financeiras sul africanas, o mais débil dos BRICS!

2 – De acordo com os conceitos geo estratégicos e geo políticos das iniciativas angolanas em curso, os esforços pela paz nos Grandes Lagos na África central e no Golfo da Guiné distinguem-se de outros esforços, tirando partido da sabedoria conseguida pela própria experiência angolana que até hoje se procura consolidar.

Essa experiêcia é um investimento “invisível” que tem conseguido catalizar as atenções do Cabo ao Cairo (tem, por exemplo, implicações no Sudão).

É evidente que o papel do Presidente José Eduardo dos Santos nesse ajuste que foi feito e nos passos que estão a ser dados quer no Golfo da Guiné, quer na África Central, quer nos Grandes Lagos, é por demais evidente e aglutina já um vasto leque de vontades africanas, numa concertação que antes parecia impossível.

O peso dessas iniciativas-alternativas em nome dos interesses dos povos de África, está a tornar-se muito importante para a própria União Africana, organismo que tem a responsabilidade de encontrar formas de arrancar o continente das crises que o têm assolado, em benefício de todos os seus povos que é obrigação arrancar do espectro crónico de subdesenvolvimento.

A União Africana quantas vezes “não foi ttida nem achada” ao longo dos últimos 20 anos post Guerra Fria, por que ninca antes conseguiu um denominador comum a partir da única forma possível, uma plataforma mínima de paz e de renascimento africano?

As iniciativas de paz de Angola em direcção ao Golfo da Guiné, à África Central e aos Grandes Lagos, numa altura em que o “arco de crise” atinge tanto a Nigéria como a República Centro Africana, é uma via cuja equação, em curso, poderá resultar na oportunidade do renascimento africano abrindo espaço ao protagonismo de todos os componentes da SADC e dos que se situam à sua ilharga norte, com as potencialidades económicas e financeiras da África do Sul no seu eixo, algo que nunca antes foi suficientemente aproveitado.

É evidente também que essa vontade é transmissível também na África Central e no Golfo da Guiné: se nos Grandes Lagos é a água e os imensos recursos naturais que são alvo das disputas, no Golfo da Guiné os termos das disputas reflectem geo estratégias e interesses distintos em relação sobretudo ao petróleo e ao gás, numa altura em que a procura é tanta e eles se tornam cada vez mais escassos!

3 – As geo estratégias e geo políticas inteligentes de Angola em prol da paz obrigam os interesses externos ao continente a perfilharem as vocações movidas a partir de Angola e com o concurso cada vez mais alargado dos chefes de estado da SADC, da África Central, do Golfo da Guiné e dos Grandes Lagos.

A agenda da paz abre-se assim à oportunidade de reconversão dos interesses externos movidos pelas potências ocidentais avessas às emergências, cujos impulsos têm a oportunidade de serem atenuados nas disputas subjacentes no continente, particularmente no Sahel e a sul do paralelo transversal entre a Mauritânia e a Somália.

Essa oportunidade estende-se também àqueles que tradicionalmente têm financiado as condutas fundamentalistas sunitas em África, que têm sido parte integrante da expansão do “arco de crise” em direcção a sul e com limites geográficos mais evidentes na Nigéria e na República Centro Africana.

As petro-monarquias arábicas, ao invés de alinhar na desestabilização do continente africano em nome duma fé exacerbada e de interesses alinhados ou articulados com as potências ocidentais, deveriam ajustar-se imediatamente aos esforços de paz, reforçando as pretensões da União Africana e dos seus mais expeditos membros que procuram o renascimento africano.

Os conflitos residuais nos Grandes Lagos são periféricos às sementes e aos impulsos dessoutros conflitos e por isso são equacionáveis na sua resolução, uma oportunidade que os chefes de estado africanos reunidos agora na mini-cimeira de Luanda indiciam não querer perder, demonstrando vontade construtiva em ultrapassar as dificuldades e obstáculos que estão no caminho e se tornaram agora, sob os pontos de vista geo estratégico e geo político, mais perceptíveis que nunca.

O mesmo se passa na África Central e no Golfo da Guiné, tendo em conta os conflitos étnicos e religiosos que afectam sobretudo a Nigéria e a República Centro Africana.

As ameaças da persistência do fundamentalismo islâmico financiado pelas monarquias do petróleo arábicas continua no entanto a persistir e constituem, mesmo em Angola, um factor de risco que não pode deixar de preocupar, pois é uma tentação para aqueles interesses “meio adormecidos” que procuram criar obstáculos à paz, no sentido que o estado angolano tem interpretado em benefício dos povos de todo o continente!

Potências como os Estados Unidos e seus aliados, têm dado provas de ambiguidade, de ingerência e de manipulação ao moverem seus interesses e agentes por dentro das “revoluções coloridas”, das “primaveras árabes” e até de algumas das últimas manobras de desestabilização em Angola, acarretando sempre resultados catastróficos para os povos, em função dos desequilíbrios provocados por essas iniciativas, em exclusivo proveito do capitalismo neo liberal e do cortejo dilecto de suas elites e agenciados afins, dos seus fantoches!

O AFRICOM e a NATO ainda não deram sinais de reconversão e abandono em relação a essas políticas resultantes de alianças e interesses das potências ocidentais (Estados Unidos e União Europeia), pelo que é oportuno lembrar que a chegada da nova embaixadora Hellen LaLime, uma personalidade que transitou pela AFRICOM, impõe uma questão de fundo: o AFRICOM e a NATO vão alinhar com a concertação da paz em África de acordo com a vontade do renascimento africano, ou vão a continuar no pântano do pseudo-combate ao terrorismo (a utilização do fundamentalismo islâmico como um factor de desestabilização que dá oportunidade à implantação de suas próprias forças e ao exercício neo-colonial)?

Os Estados Unuidos vão fortalecer a esquadria das fronteiras africanas, ou vão como no Sudão, alinhar com a sua desagregação fortalecendo a divisão, o tribalismo e os conflitos de todo o tipo, decorrentes ao fim e ao cabo da geo estratégia das potências coloniais europeias?

É justo que África, dadas as experiências seculares amargas que experimentou questione as potências ocidentais sobre essa disjunção, quando o neo colonialismo inibe as potencialidades do renascimento africano!

Ao que vem, a título de exemplo, o Ministro das Relações Exteriores da Alemanha, senhor Frank Walter-Steinmeier, a Luanda, logo a seguir à mini-cimeira?

Essa questão é tanto mais evidente e pertinente quanto, no mesmo dia da mini-cimeira de trabalho sobre os Grandes Lagos em Luanda, chegava ao porto da capital angolana mais uma pequena frota da NATO, desta vez sob bandeira do Reino Unido e sob cobertura do quadro dos seus próprios interesses meio ambíguos meio subversivos no hemisfério sul!

A paz galvanizadora do renascimento africano, é o objectivo historicamente mais legítimo para África na presente conjuntura e é sequência lógica das vitórias do movimento de libertação contra o colonialismo, o fascismo, o “apartheid” e todas as respectivas sequelas!

O que a Unão Europeia vai preferir e optar a 2 e 3 de Abril de 2014, na sua cimeira com África?

Foto: Uma visão de paz pan-africanista levou à mini-cimeira de Luanda alguns dos principais chefes de estado interessados no renascimento africano; a foto é histórica.

A consultar (Martinho Júnior):
- Rapidinhas do Martinho nº 16 – OTAN, o crime mais que perfeito – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/05/rapidinhas-do-martinho-16.html
- Rapidinhas do Martinho nº 28 – A “conferência do Pentágono para África” – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-28.html
- Rapidinhas do Martinho nº 34 – Riscos acrescidos para África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-34.html
- Rapidinhas do Martinho nº 36 – Salvar a Paz em África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-36.html
- Rapidinhas do Martinho nº 42 – As novas grilhetas de África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/09/rapidinhas-do-martinho-42.html
- Rapidinhas do Martinho nº 45 – A SADC pode-se tornar numa “outra África”? – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/09/rapidinhas-do-martinho-45.html
- Rapidinhas do Martinho nº 49 – Resgatar África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/10/rapidinhas-do-martinho-49.html
- Rapidinhas do Martinho nº 60 – Esqueceram que a terra é a nossa Mãe – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/11/rapidinhas-do-martinho-60.html
- Os “gendarmes” da colonização de África no século XXI – http://paginaglobal.blogspot.com/2013/04/os-gendarmes-da-colonizacao-de-africa.html
A consultar:
- Íntegra do discurso do Presidente da República na cimeira da CGG em Malabo –
- Discurso pronunciado pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, na abertura da mini-cimeira de Luanda, da CIRGL – http://www.portalangop.co.ao/angola/pt_pt/noticias/politica/2014/2/13/Discurso-Presidente-Republica-abertura-mini-cimeira-CIRGL,4059b2c6-9525-4c62-9101-46285fd8b197.html

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