quarta-feira, 26 de março de 2014

NO REINO DA UNIPOLARIDADE



José Goulão – Jornal de Angola, opinião

Estendeu-se por um quarto de século o período de unipolaridade – e impunidade – na cena mundial proporcionado pela queda do Muro de Berlim e a implosão da União Soviética Muros conservaram-se, outros reforçaram-se, alguns nasceram e crescem desde que, violando a Carta das Nações Unidas, os Estados Unidos cometeram a primeira invasão do Iraque, em 1990, à frente de um rebanho de nações submissas.

Mas esta semana a situação alterou-se qualitativamente.

Pela primeira vez nos últimos 25 alguém disse “basta!” ao império e seus servidores, sendo que estes não sabem o que fazer entre ameaçar grosso e sancionar fininho – é arriscado apertar muito a economia dos outros porque no estado em que está a própria o efeito de boomerang pode ser devastador.

Durante as últimas duas décadas e meia o império inventou e cultivou inimigos de que se foi servindo e com os quais foi colaborando à medida da estratégia que tem como único fim fazer guerras para dividir e ocupar – directamente ou por interpostos gendarmes – de modo a reinar e explorar à vontade. Da cartola dos inimigos, alguns dos quais também às vezes bons amigos, foram saindo Bin Laden, os talibãs, Saddam Hussein, o terrorismo islâmico em geral, as mil e uma caras da Al Qaeda, os ayatollahs do Irão, Bachar Assad, Muammar Khaddafi, Milosevic... a lista podia ser alongada mas não vale a pena.

Agora a coisa fia mais fino. Da sepultura da União Soviética, restaurados que estão os ademanes czaristas num sistema bem mais monárquico do que muitas monarquias que dizem sê-lo, surge o primeiro inimigo que efectivamente o é. Não aquele que se usa na propaganda para justificar o expansionismo aqui ou ali, conforme as conveniências de recursos e riquezas naturais, mas o que resolveu dizer “parem aí, porque daí para cá mandamos nós”. E o império unipolar estacou perante uma alteração de fronteiras feita por outrem que não ele. Que atrevimento!

Aumentaram os riscos de as guerras regionalizadas se irem fundindo numa única de vastidões imprevisíveis? Provavelmente. Mas apesar de os que se definem como faróis da democracia terem proporcionado o regresso de nazis ao governo de um país europeu, reflictamos de modo a que os paralelismos não se fiquem na década de trinta do século passado.

A situação económica mundial já o vinha indiciando, mas as crises síria e ucraniana revelam que a alteração da relação de forças entre as facções mundiais de poder entrou pelos campos geoestratégico e militar.

A existência de um regime económico dominante planetário, num estado supremo  de arbitrariedade, não esbate as contradições, pelo contrário agudiza-as num nundo onde a bolha especulativa asfixia a produção de verdadeira riqueza, onde os espaços de recursos naturais, de fontes de energia e alimentares, de mão de obra barata ou mesmo escrava não coincidem com os de grande consumo, tradição exportadora e poderio político imperial – colonial ou neocolonial.

Não estamos perante um conflito ideológico entre sistemas sociais que se opõem. O capitalismo reina com poder absoluto no mundo mas os interesses cada vez mais antagónicos, letais até, corroem-no por dentro. O monstro já não tem apenas uma cabeça. Há exactamente um século, numa fase bem mais recuada do capitalismo, a Primeira Guerra Mundial foi travada entre impérios que transformaram as suas disputas de interesses na chacina de milhões de seres humanos, já derrotados à partida porque entre eles não existiam motivos de conflito, antes razões de convergência contra os que, um de um lado e de outro, os mandavam matar-se. 

Lembrem-se disto.

OBAMA AMEAÇA RÚSSIA COM INTERVENÇÃO MILITAR



Jornal de Angola

O Presidente norte-americano admitiu ontem a possibilidade de uma intervenção militar da NATO contra a Rússia. Barack Obama garante que a organização transatlântica vai fazer tudo para defender os membros europeus, caso sejam alvo de uma tentativa de anexação russa.

Obama expressou preocupação com o avanço da Rússia sobre a Ucrânia e alertou o Presidente russo, Vladimir Putin, de que essa seria uma “má escolha”, reforçando a ameaça de sanções por parte do Ocidente. Acrescentou que Putin precisa “entender que há uma escolha a ser feita”.

Obama, que falava durante uma conferência de imprensa conjunta com o primeiro-ministro da Holanda, Mark Rutte, assinalou que os líderes ocidentais criaram uma estrutura capaz de gerar custos adicionais a serem impostos à Rússia, se Moscovo continuar a avançar sobre a Ucrânia. De acordo com Obama, a Rússia arrisca-se a sanções nos sectores de energia, finanças, armas e no comércio internacional com outras nações.

Obama manifestou-se preocupado com a concentração de tropas russas ao longo da fronteira com a Ucrânia. “Somos contra o que parece ser um esforço de intimidação”, salientou Obama, admitindo que a Rússia tem o direito legal de movimentar as suas tropas no seu território, mas insistiu que a Crimeia continua a ser parte da Ucrânia, mesmo depois do novo governo de Kiev, apoiado pelos EUA, ter ordenado a retirada das suas tropas do território. “Nós não reconhecemos a anexação da Crimeia”, disse Obama, rejeitando “a noção de que um referendo organizado de forma descuidada em apenas duas semanas” possa “de alguma forma ser um processo válido”. Obama disse ainda acreditar que, se os ucranianos tiverem escolha, vão procurar manter boas relações tanto com a Europa como com a Rússia.

Foto AFP

ANGOLA ASSUME A PAZ SEM FRONTEIRAS EM ÁFRICA!



Martinho Júnior, Luanda

1 – Não poderá haver a consolidação da paz interna em Angola se no entorno a norte profundo da África Austral se mantiverem as múltiplas formas de desagregação, de conflito e de guerras que nos Grandes Lagos parecem não terem fim.

É assim tanto nessa região que é a região fulcral de África e a principal matriz da água interior do continente, como no Golfo da Guiné.

Angola antes tinha uma posição de busca de paz que chegou a ter incidências ao longo da costa ocidental africana, na Costa do Marfim, na Guiné Conacry e na Guiné Bissau, mas os conceitos geo estratégicos e geo políticos evidenciavam a necessidade de serem revistos no contexto amplo do continente, uma vez que surgiam à margem duma geo estratégia eficaz no que toca ao direccionamento das opções e da conjugação dos esforços.

De facto os relacionamentos externos “batiam ao lado” por que as articulações conseguidas demonstraram não se adequar às questões-chave da paz no continente, estavam longe de atacar o que é essencial, na região onde se concentram a maior parte das tensões e problemas crónicos, que se arrastam de há longas décadas a esta parte, de acordo aliás com os ensinamentos que se podem recolher àcerca da “Iª Guerra Mundial Africana”…

Angola reconverteu os seus relacionamentos africanos externos de forma rápida e exemplar:

Partindo do princípio que o “arco de crise” se manifestava em expansão em direcção ao sul do continente a partir duma implantação que se distendia da Mauritânia à Somália, na mais longa transversal continental, Angola deu início à contensão dessa expansão, galvanizando o espaço SADC no sentido de travar na RDC e nos Grandes Lagos a batalha essencial pela paz, bem nos seus limites a norte!

Nesse sentido a Conferência Inter Regional dos Grandes Lagos é um prolongamento da vontades consubstanciadas a partir da SADC!

O potencial da paz tornou-se maior quando a geo estratégia e a geo política de Angola conseguiu um laço muito estreito de relacionamentos nunca antes alcançados com a África do Sul: foi necessário que o Presidente Jacob Zuma chegasse ao poder para tornar isso possível, o que de certo modo passa por uma reconversão de alguns sectores sensíveis das elites sócio-políticas, económicas e financeiras sul africanas, o mais débil dos BRICS!

2 – De acordo com os conceitos geo estratégicos e geo políticos das iniciativas angolanas em curso, os esforços pela paz nos Grandes Lagos na África central e no Golfo da Guiné distinguem-se de outros esforços, tirando partido da sabedoria conseguida pela própria experiência angolana que até hoje se procura consolidar.

Essa experiêcia é um investimento “invisível” que tem conseguido catalizar as atenções do Cabo ao Cairo (tem, por exemplo, implicações no Sudão).

É evidente que o papel do Presidente José Eduardo dos Santos nesse ajuste que foi feito e nos passos que estão a ser dados quer no Golfo da Guiné, quer na África Central, quer nos Grandes Lagos, é por demais evidente e aglutina já um vasto leque de vontades africanas, numa concertação que antes parecia impossível.

O peso dessas iniciativas-alternativas em nome dos interesses dos povos de África, está a tornar-se muito importante para a própria União Africana, organismo que tem a responsabilidade de encontrar formas de arrancar o continente das crises que o têm assolado, em benefício de todos os seus povos que é obrigação arrancar do espectro crónico de subdesenvolvimento.

A União Africana quantas vezes “não foi ttida nem achada” ao longo dos últimos 20 anos post Guerra Fria, por que ninca antes conseguiu um denominador comum a partir da única forma possível, uma plataforma mínima de paz e de renascimento africano?

As iniciativas de paz de Angola em direcção ao Golfo da Guiné, à África Central e aos Grandes Lagos, numa altura em que o “arco de crise” atinge tanto a Nigéria como a República Centro Africana, é uma via cuja equação, em curso, poderá resultar na oportunidade do renascimento africano abrindo espaço ao protagonismo de todos os componentes da SADC e dos que se situam à sua ilharga norte, com as potencialidades económicas e financeiras da África do Sul no seu eixo, algo que nunca antes foi suficientemente aproveitado.

É evidente também que essa vontade é transmissível também na África Central e no Golfo da Guiné: se nos Grandes Lagos é a água e os imensos recursos naturais que são alvo das disputas, no Golfo da Guiné os termos das disputas reflectem geo estratégias e interesses distintos em relação sobretudo ao petróleo e ao gás, numa altura em que a procura é tanta e eles se tornam cada vez mais escassos!

3 – As geo estratégias e geo políticas inteligentes de Angola em prol da paz obrigam os interesses externos ao continente a perfilharem as vocações movidas a partir de Angola e com o concurso cada vez mais alargado dos chefes de estado da SADC, da África Central, do Golfo da Guiné e dos Grandes Lagos.

A agenda da paz abre-se assim à oportunidade de reconversão dos interesses externos movidos pelas potências ocidentais avessas às emergências, cujos impulsos têm a oportunidade de serem atenuados nas disputas subjacentes no continente, particularmente no Sahel e a sul do paralelo transversal entre a Mauritânia e a Somália.

Essa oportunidade estende-se também àqueles que tradicionalmente têm financiado as condutas fundamentalistas sunitas em África, que têm sido parte integrante da expansão do “arco de crise” em direcção a sul e com limites geográficos mais evidentes na Nigéria e na República Centro Africana.

As petro-monarquias arábicas, ao invés de alinhar na desestabilização do continente africano em nome duma fé exacerbada e de interesses alinhados ou articulados com as potências ocidentais, deveriam ajustar-se imediatamente aos esforços de paz, reforçando as pretensões da União Africana e dos seus mais expeditos membros que procuram o renascimento africano.

Os conflitos residuais nos Grandes Lagos são periféricos às sementes e aos impulsos dessoutros conflitos e por isso são equacionáveis na sua resolução, uma oportunidade que os chefes de estado africanos reunidos agora na mini-cimeira de Luanda indiciam não querer perder, demonstrando vontade construtiva em ultrapassar as dificuldades e obstáculos que estão no caminho e se tornaram agora, sob os pontos de vista geo estratégico e geo político, mais perceptíveis que nunca.

O mesmo se passa na África Central e no Golfo da Guiné, tendo em conta os conflitos étnicos e religiosos que afectam sobretudo a Nigéria e a República Centro Africana.

As ameaças da persistência do fundamentalismo islâmico financiado pelas monarquias do petróleo arábicas continua no entanto a persistir e constituem, mesmo em Angola, um factor de risco que não pode deixar de preocupar, pois é uma tentação para aqueles interesses “meio adormecidos” que procuram criar obstáculos à paz, no sentido que o estado angolano tem interpretado em benefício dos povos de todo o continente!

Potências como os Estados Unidos e seus aliados, têm dado provas de ambiguidade, de ingerência e de manipulação ao moverem seus interesses e agentes por dentro das “revoluções coloridas”, das “primaveras árabes” e até de algumas das últimas manobras de desestabilização em Angola, acarretando sempre resultados catastróficos para os povos, em função dos desequilíbrios provocados por essas iniciativas, em exclusivo proveito do capitalismo neo liberal e do cortejo dilecto de suas elites e agenciados afins, dos seus fantoches!

O AFRICOM e a NATO ainda não deram sinais de reconversão e abandono em relação a essas políticas resultantes de alianças e interesses das potências ocidentais (Estados Unidos e União Europeia), pelo que é oportuno lembrar que a chegada da nova embaixadora Hellen LaLime, uma personalidade que transitou pela AFRICOM, impõe uma questão de fundo: o AFRICOM e a NATO vão alinhar com a concertação da paz em África de acordo com a vontade do renascimento africano, ou vão a continuar no pântano do pseudo-combate ao terrorismo (a utilização do fundamentalismo islâmico como um factor de desestabilização que dá oportunidade à implantação de suas próprias forças e ao exercício neo-colonial)?

Os Estados Unuidos vão fortalecer a esquadria das fronteiras africanas, ou vão como no Sudão, alinhar com a sua desagregação fortalecendo a divisão, o tribalismo e os conflitos de todo o tipo, decorrentes ao fim e ao cabo da geo estratégia das potências coloniais europeias?

É justo que África, dadas as experiências seculares amargas que experimentou questione as potências ocidentais sobre essa disjunção, quando o neo colonialismo inibe as potencialidades do renascimento africano!

Ao que vem, a título de exemplo, o Ministro das Relações Exteriores da Alemanha, senhor Frank Walter-Steinmeier, a Luanda, logo a seguir à mini-cimeira?

Essa questão é tanto mais evidente e pertinente quanto, no mesmo dia da mini-cimeira de trabalho sobre os Grandes Lagos em Luanda, chegava ao porto da capital angolana mais uma pequena frota da NATO, desta vez sob bandeira do Reino Unido e sob cobertura do quadro dos seus próprios interesses meio ambíguos meio subversivos no hemisfério sul!

A paz galvanizadora do renascimento africano, é o objectivo historicamente mais legítimo para África na presente conjuntura e é sequência lógica das vitórias do movimento de libertação contra o colonialismo, o fascismo, o “apartheid” e todas as respectivas sequelas!

O que a Unão Europeia vai preferir e optar a 2 e 3 de Abril de 2014, na sua cimeira com África?

Foto: Uma visão de paz pan-africanista levou à mini-cimeira de Luanda alguns dos principais chefes de estado interessados no renascimento africano; a foto é histórica.

A consultar (Martinho Júnior):
- Rapidinhas do Martinho nº 16 – OTAN, o crime mais que perfeito – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/05/rapidinhas-do-martinho-16.html
- Rapidinhas do Martinho nº 28 – A “conferência do Pentágono para África” – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-28.html
- Rapidinhas do Martinho nº 34 – Riscos acrescidos para África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-34.html
- Rapidinhas do Martinho nº 36 – Salvar a Paz em África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-36.html
- Rapidinhas do Martinho nº 42 – As novas grilhetas de África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/09/rapidinhas-do-martinho-42.html
- Rapidinhas do Martinho nº 45 – A SADC pode-se tornar numa “outra África”? – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/09/rapidinhas-do-martinho-45.html
- Rapidinhas do Martinho nº 49 – Resgatar África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/10/rapidinhas-do-martinho-49.html
- Rapidinhas do Martinho nº 60 – Esqueceram que a terra é a nossa Mãe – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/11/rapidinhas-do-martinho-60.html
- Os “gendarmes” da colonização de África no século XXI – http://paginaglobal.blogspot.com/2013/04/os-gendarmes-da-colonizacao-de-africa.html
A consultar:
- Íntegra do discurso do Presidente da República na cimeira da CGG em Malabo –
- Discurso pronunciado pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, na abertura da mini-cimeira de Luanda, da CIRGL – http://www.portalangop.co.ao/angola/pt_pt/noticias/politica/2014/2/13/Discurso-Presidente-Republica-abertura-mini-cimeira-CIRGL,4059b2c6-9525-4c62-9101-46285fd8b197.html

AUMENTAM CASOS DE TUBERCULOSE EM LUANDA



Jornal de Angola

O Hospital Sanatório de Luanda registou este ano 1.590 novos casos de tuberculose, mais 279 do que mesmo período de 2013, disse à Angop o director administrativo daquela unidade sanitária.

Manuel da Cruz afirmou que o aumento se deve ao deficiente saneamento do meio e ao consumo exagerado de bebidas alcoólicas e tabaco.O VIH, referiu, também contribui para o aumento dos casos de tuberculose por ser uma “doença oportunista que pode afectar as vítimas da sida”.

Este ano, declarou, foram atendidas 242 pessoas com tuberculose e VIH/Sida. 

O Hospital Sanatório atende também pessoas que apenas têm ou o vírus da sida ou outra doença, como a malária e hipertensão, no âmbito de um programa que destinado a oferecer à população dos bairros próximos da unidade quaisquer serviços de saúde.

No mesmo período, o estabelecimento de saúde notificou 314 casos de VIH contra 569 no mesmo espaço de tempo de 2013.

Aquele número está entre os 20.­771 casos atendidos em consultas externas no primeiro trimestre contra 14.196 em 2013.

Manuel da Cruz lamentou a “morte desnecessária” de doentes com tuberculose, que abandonam a medicação no início do tratamento devido à aparente impressão de melhoria do quadro clínico, negligência que pode provocar resistência da doença aos medicamentos.

“A tuberculose tem cura desde que o doente siga de forma obediente a prescrição médica até ao fim do tratamento”, disse. O abandono de alguns doentes pelos familiares, realçou, está entre os maiores constrangimentos registados por sobrecarregar os encargos suportados pelo hospital.

Até segunda-feira de manhã estavam internados 302 doentes, número que cresceu devido à abertura há 15 dias de duas enfermarias.

Situação no continente

O director regional da Organização Mundial da Saúde para África afirmou que a tendência crescente de casos de tuberculose no continente foi travada devido ao aumento da taxa de tratamento adequado. 

Numa mensagem, por ocasião do Dia Mundial de Luta contra a Tuberculose, assinalado na segunda-feira, Luís Sambo sublinhou que a taxa de mortalidade e o número de pessoas que não terminam o tratamento continuam em queda.

O representante da OMS apelou à união da região africana à comunidade global em torno do lema da efeméride para este ano, que é “Alcançar os Três Milhões”, número de casos da doênçaque se presume não estão diagnosticados.

Luís Sambo alertou que a epidemia em África é fortemente impulsionada pela pobreza e pela infecção simultânea com o VIH. 

As pessoas pobres que vivem com o VIH têm maiores probabilidades de contrair igualmente a tuberculose, referiu.

Foto: Kindala Manuel

MINISTRO ALEMÃO EM LUANDA



Jornal de Angola

O ministro dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Frank-Walter Streinmeier, encontra-se desde a noite de ontem em Luanda para cumprir uma visita oficial a Angola, no âmbito do reforço das relações de cooperação entre os dois países.

O Ministério das Relações Exteriores em comunicado refere que, durante a sua visita, Frank-Walter Streinmeier é recebido pelo chefe da diplomacia angolana, Georges Chikoti, e pelo ministro da Economia, Abraão Gourgel.

Antes do seu regresso, previsto para a noite de hoje, Streinmeier deve manter encontros em separado com o líder da UNITA, Isaías Samakuva, e com empresários alemães.

A visita a Angola é a última etapa de um périplo que o chefe da diplomacia alemã começou em Addis Abeba, Etiópia, com passagem por Dar es Salaam, Tanzânia. Trata-se da primeira deslocação de Frank-Walter Streinmeier a África no seu segundo mandato à frente da diplomacia alemã. 

A Embaixada alemã em Luanda refere em comunicado que com o périplo a Alemanha quer sublinhar a importância que os países africanos emergentes representam como parceiros para a solução dos desafios globais.

“A Alemanha considera os Estados africanos como actores importantes na política internacional e com eles quer trocar experiências mais intensamente. O Governo Federal alemão aprecia esse desenvolvimento por parte dos países africanos e o estabelecimento de uma arquitectura africana de paz e segurança”, diz o comunicado.

O documento destaca o facto de a viagem do ministro alemão ter lugar alguns dias antes da Cimeira entre a União Euopeia e África, a 2 e 3 de Abril, em Bruxelas. A visita serve para “enfatizar a extensão do compromisso alemão em África nas áreas política, económica e social”.

As relações entre Angola e a Alemanha têm vindo a conhecer um notável incremento nos últimos anos, sobretudo no domínio eonómico, com a visita da chanceler Angela Merkel.

Foto AFP

Brasil: COMO UM PARLAMENTAR ADQUIRE PODER DE CHANTAGEM?



Maria Inês Nassif – Carta Maior

A resposta é: pela capacidade que dispõe de comprar aliados. O poder de chantagem é uma teia que se estende de baixo para cima, chegando até a Presidência.

É quase um dèjá vu a grave crise que sacode a base aliada do governo da presidenta Dilma Rousseff. A forma como o sistema político brasileiro tende tradicionalmente a fragmentar a representação parlamentar, e também a incentivar uma luta fratricida entre candidatos do mesmo partido ou da mesma coligação nas eleições para a Câmara dos Deputados, fatalmente leva a atritos semelhantes no início das articulações para a composição de chapas e coligações. São as movimentações feitas a partir de agora que definirão as posições de cada um no cenário eleitoral que será oficializado em junho, nas convenções partidárias, e definido em outubro, nas eleições do dia 4 de outubro.

Os candidatos a presidente têm direito a um segundo turno. Os que disputam as eleições parlamentares, não. O destino deles é selado na primeira eleição (que ocorrerá este ano em 5 de outubro). A vantagem que eles têm sobre os candidatos a cargos executivos são os 21 dias entre a sua eleição e a do presidente da República, se a decisão sobre o mandato presidencial for para um segundo turno. É tempo suficiente para um deputado eleito se redimir com o candidato a presidente com mais chances de vitória e se aliar a ele, não sem antes garantir posições que permitam a ele manter uma máquina de captar apoios à eleição seguinte.

É lógico que a regra se aplica aos eleitos pela política tradicional, que dependem de uma cadeia de favores para manter o fluxo de dinheiro para campanhas caras e alianças igualmente onerosas no âmbito municipal. O apoio a grupos políticos no interior do Estado é fundamental para esses parlamentares. É também importante o acesso a bunkers urbanos – periferias dominadas por grupos criminosos, ou comunidades religiosas com acesso a grande número de pessoas. Para tudo isso, é preciso ter poder econômico.

É preciso saber como isso acontece para entender, por exemplo, o poder de que dispõe o líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), e os interesses que o movem no papel de deflagrador permanente de crises – pelo menos nos últimos meses.

Existe uma discussão sobre a legitimidade das emendas parlamentares – aquelas definidas por deputados e senadores, aprovadas no Orçamento e que devem ser liberadas pelo presidente da República para chegar ao seu destino. Teoricamente, nada há de errado no fato de o deputado ou senador levar uma melhoria para o município que o apoia – uma ponte, uma estrada, um açude ou qualquer obra que resulte num benefício para a população local. Existem indícios contundentes, todavia, de que as emendas são o principal combustível, e a principal fonte de corrupção, de um bom número de parlamentares que rezam pela cartilha da política tradicional.

Entenda-se como político tradicional aquele cujos interesses eleitorais e particulares se sobrepõem aos interesses públicos, e com isso substituem um vínculo orgânico, político e ideológico, com partidos e eleitores, por negociações privadas de coisa públicas (como emendas parlamentares) para conseguir dinheiro para comprar apoios e votos.

Falamos aqui em tese, não de deputados específicos. A investigação de como agem, e dos limites legais da ação política desses parlamentares, compete ao Ministério Público, à Polícia Federal – e, depois de uma denúncia formal, à Justiça.

Vamos, por suposição, pegar o caso do deputado X. Ele é eleito por um partido forte nacionalmente, mas fraco regionalmente, com dinheiro trazido de esquemas mais diretos de corrupção – por exemplo, o obtido em cargos executivos. O fato de ter dinheiro – de preferência para se eleger e fazer esse favor a mais alguns de sua chapa – o credenciam a ser escolhido na convenção. Uma vez eleito, organiza-se para garantir a eleição para o mandato seguinte.

O esquema do deputado X é o trivial. Como este parlamentar não tem grande acesso ao partido nacional, nem muitos parlamentares que beneficiem de seu jogo, negocia emendas. Os projetos das obras vêm prontos, de empresas interessadas em fazê-los. Essas empresas destinam parte do dinheiro auferido pela obra (ou serviço) para a campanha seguinte do deputado X, que ao final de seu mandato terá dinheiro suficiente para enfrentar novas eleições. Garantiu o seu.

O deputado Y, no entanto, é mais ambicioso. Com um esquema quase profissional de negociação de emendas e favores, tem um caixa que permite a ele financiar a sua eleição, a eleição de prefeitos na sua base e de muitos parlamentares, tanto de seu Estado como de outros, de seu partido e dos demais. A sua máquina de captação permite, além de simplesmente arrecadar e distribuir dinheiro para eleição de terceiros, agenciar relações entre políticos e empresas.

Depois de algum tempo operando dessa forma, o deputado Y conhece as necessidades mais primitivas dos políticos a que serve e ter a liderança sobre eles, não apenas porque seus interesses coincidem, como pelo fato de saber dos mais escusos segredos de um número considerável deles.

Esse deputado Y tem o poder de mobilizar grande número de parlamentares e provocar crises. E este é o seu segredo para conseguir levar tanta gente num jogo de chantagem que atende principalmente a seus interesses privados.

É uma descrição grosseira de como homens públicos se rendem tão facilmente a interesses privados, mas não está nem um pouco longe da realidade da política tradicional brasileira. A descrição desse mecanismo de financiamento político do Legislativo, contudo, explica por que pessoas com tão pouco senso público conseguem credenciais para nomear ministros ou diretores de estatais. O poder de chantagem é uma teia que se estende de baixo, da base de apoio parlamentar de um governo, para cima, até a Presidência da República. Não é apenas da presidenta Dilma Rousseff, mas de todos os eleitores do país que têm o poder de seu voto relativizado pelo poder econômico desses parlamentares.

Brasil – UM MISTÉRIO: COMO ALCKMIN SOBREVIVE À SUA MEDIOCRIDADE?




O governador paulista, Geraldo Alckmin, é um político raro: ao contrário da maioria, ele fez sua carreira aparecendo o menos possível na mídia, fugindo de qualquer tema polêmico, se escondendo de tudo e de todos. É um notável exemplo de alguém absolutamente medíocre que deu certo, que chegou lá. Um caso inexplicável de sucesso - a marca de seu governo é o nada, o vazio. Não elege prioridades, não ostenta bandeiras, não contribui com uma ideia para o desenvolvimento do país, não faz um discurso digno de nota - suas frases quase não têm verbo, são como slogans publicitários. 

É para ser estudado...

Mas a cada dia que passa a sua (indi)gestão, tão bem maquiada pelo silêncio estrondoso da imprensa, sofre pequenos abalos, mínimas fissuras, como os casos recentes do escândalo do metrô e o colapso do abastecimento de água.

Incrível como ele ainda sobrevive a tais calamidades.

Só a benevolência da mídia, a escandalosa blindagem que se construiu em torno de sua figura, o controle da Assembleia Legislativa e a lealdade e união de seu grupo político podem explicar como Alckmin não é hoje um cadáver político insepulto e tenha grandes chances de ser reeleito.

Sua última declaração pública, a respeito do estudo que mostra que a Polícia Militar paulista mata três vezes mais negros que brancos, é um primor de canalhice - nada que contrarie outras que foram dadas sobre o tema da segurança pública, principalmente:

"A academia de Polícia Militar do Barro Branco é muito rigorosa. A formação dos nossos policiais é muito rigorosa. Há cursos voltados à questão de direitos humanos, respeito às pessoas. A polícia de São Paulo é extremamente preparada. Ela faz cumprir a lei, mas com respeito às pessoas", disse o governador, com a convicção dos piores atores canastrões que o cinema já produziu.

O governador do Estado mais rico e importante da federação afirmar uma coisa dessas, é, por si só, uma prova de que São Paulo está sendo governado por um lunático, por um sujeito que não vive a realidade, está em outro mundo.

Mas se fosse só isso...

Os sintomas dessa perturbação mental de Alckmin são visíveis ainda nas reiteradas vezes em que iludiu a opinião pública ao dizer que não haverá racionamento de água em São Paulo - quando ele já ocorre de fato nos bairros mais pobres -, em sua inação para pelo menos tentar reverter o quadro de colapso no abastecimento, e, agora, em sua mudez em relação a esse acinte à população que foi a propaganda radiofônica do Metrô que diz que trem superlotado é ótimo porque permite que os manos xavequem as minas.

E o pior de tudo é que não dá para afirmar que esse é o fundo do poço.

Com a eleição se aproximando, é bem provável que a ansiedade e o nervosismo provoquem manifestações ainda mais graves em Sua Excelência.

Na foto: Alckmin, um governo marcado pelo nada absoluto.  -Marcelo Camargo/ABr

Brasil - ÁGUA: UM BEM COMUM




Mundo já vive crise no abastecimento de água, mas faz de conta que não

Nada como um verão tórrido e seco, como este de 2014, para a gente pensar na bendita água. Isto é particularmente relevante para São Paulo e Rio de Janeiro

Cândido Grzybowski (*) – Carta Maior

A água bem merece um dia seu no nosso calendário, o 22 de março. Este reconhecimento só se deu em 1993, após a Eco-92. No fundo, deveríamos celebrar a água todos os dias, o dia inteiro. Mas só lembramos dela na sua falta ou no seu excesso. Quem vive em territórios áridos ou semiáridos, dada a sua relativa escassez, organiza a vida em torno à água. No Brasil, isto vale para a grande Região Nordeste, que possui 30% da população brasileira e só 3% da água. São seculares as secas no Nordeste, tanto quanto a nossa incapacidade de gerir a questão. Afinal, no nosso semiárido até chove mais do que na Argélia, por exemplo. Por que, com mais água, nosso povo sofre tanto?
 
Açudes, represas e poços foram feitos ao longo do tempo para estocar água, mas muito investimento acabou sendo privatizado pelo nosso secular patrimonialismo, que beneficia sistematicamente os grandes proprietários de terras. Mas, há que se reconhecer, é no Nordeste rural que, nos anos recentes, se desenvolve a experiência participativa mais promissora de gestão da água: a Articulação do Semiárido Nordestino, com a experiência de construção comunitária de cisternas familiares coletoras de águas das chuvas, já mais de 500 mil.

Nada, porém, como um verão tórrido e seco, como este de 2014, para a gente pensar na bendita água. Isto é particularmente relevante para as duas maiores regiões metropolitanas do Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro. Para milhões de pessoas a água faltou nas torneiras e chuveiros. As notícias e as imagens alarmantes de represas vazias e o inevitável racionamento, especialmente em São Paulo, apavoram. A enorme estiagem significa também reservatórios hidrelétricos no limite e possibilidade de falta de eletricidade logo aí. Enfim, é a água mostrando que está nas nossas vidas mais do que a gente pensa.

Mas também esquecemos. Estamos vendo imagens de enormes inundações na Região Amazônica. Como seria bom se tanta água fosse melhor distribuída. No entanto, esquecemos que em dezembro, alguns meses atrás, as inundações foram aqui na Região Sudeste. A Baixada, na área metropolitana do Rio, foi devastada por duas enxurradas antes do Natal. O pior aconteceu no Espírito Santo, que quase virou mar. Bem, agora a seca. Será que isto tudo são catástrofes? Ou não sabemos lidar com a água?  

A água e a vida

Não existe vida sem água. E a água mal gerida por nós pode significar morte. É tão simples e trágico assim!  A água ocupa um dos lugares centrais no ciclo da vida e do conjunto de sistemas ambientais que regulam a vida, o clima e a própria integridade do planeta Terra.

A água é tão presente no nosso cotidiano que a gente só lembra dela quando falta. É como o ar que respiramos, nunca pode faltar. Mas como somos negligentes com a água! Esperamos que ela flua, venha até nós e passe, pronto. Esquecemos que sem ela não há vida, nenhuma vida. No nosso modo de vida, ainda mais em grandes metrópoles, vivemos um cotidiano sem pensar na água,  como se não fosse algo relacionado a uma condição vital, que deveria estar no centro da própria organização social urbana.

Como recurso natural, a água é um estoque dado, uma quantidade na natureza de tamanho determinado: 97,5% da água forma os mares, mas só uma pequeníssima parcela da água doce restante é disponível para consumo, pois muita água está congelada ou armazenada no alto de cordilheiras e na Antártica (O GLOBO, 2014, P.14). A água doce seria suficiente não fosse a forma predatória como a utilizamos. Ela se mantem e renova num ciclo ambiental definido: dos estoques em aquíferos flui para nascentes, córregos, riachos, rios e deságua no mar, evapora, forma nuvens, chove, irriga a terra e alimenta os aquíferos, e o ciclo recomeça. Isto, de um modo simplificado, mostra o funcionamento de um dos sistemas mais essenciais e, ao mesmo tempo, mais ameaçados hoje em dia, que está no centro das mudanças climáticas.  A água é um sistema ambiental complexo, que afeta outros sistemas fundamentais e é por eles afetado: atmosfera e clima, biodiversidade e florestas, oceanos e evaporação. A água fresca, tão essencial, como estoque dado, precisa se renovar no seu ciclo natural.

São afetados e interagem com a água, condicionando, portanto, a vida, toda a vida, mudanças provocadas pela ação humana sobre o meio ambiente: as mudanças climáticas, a acidificação dos oceanos, as emissões de aerosol e o buraco de ozônio, o uso da terra, a perda da biodiversidade, a composição química do meio ambiente (poluição). Hoje a humanidade é uma força que afeta o funcionamento do conjunto dos sistemas ambientais vitais, ultrapassando os umbrais do tolerável para que eles funcionem e não provoquem mudanças imprevisíveis e irreversíveis.

Tomando o exemplo da água, precisamos pensar como formamos o nosso habitat humano, os territórios em que nos organizamos como sociedade. Talvez o exemplo mais emblemático dessa distorção seja o da água mesmo. As águas, pelo seu próprio ciclo, são complexos sistemas de drenagem com suas bacias hidrográficas. Elas estão no centro natural de territórios de todo planeta. No entanto, ao longo da história, tendemos a transformar as bacias em fronteiras humanas, ao invés sistemas naturais integradores. Quantos rios no mundo não passam de fronteiras entre países! E pior, mesmo no interior de Estados, muitos rios e baciais são fronteiras naturais entre divisões territoriais, chegando até a pequenas unidades administrativas, como os municípios entre nós.

Enfim, neste exemplo sobre a água é possível examinar a tragédia que a ação humana pode provocar. Estamos diante de uma ruptura insustentável entre humanidade e natureza, isto na religião, na filosofia, na economia, na política, na organização social e no conjunto de nossas práticas pela sobrevivência. Negamos a nossa própria condição de natureza e nos consideramos acima dela, feitos para dominá-la, para violar os seus segredos, segundo Bacon. Agredimos a natureza sem ética, como que negando a ela o direito de ser o que é. O desastre está na nossa porta. A ruptura entre natureza e seres humanos é a causa da insustentabilidade do modo de vida que temos. A água é o exemplo mais palpável.

A crise mundial da água

Já estamos vivendo a crise mundial da água, mas fazemos de conta que não. A humanidade é a principal causa de mudança no ciclo de água fresca, que torna possível a vida no planeta Terra. Hoje, estima-se que 80% dos rios no mundo estão em perigo e 25% deles chegam secos antes de desaguar no mar, o que se soma ao fato de já termos passado do limite natural na acidificação dos oceanos (RISILIANCE ALLIANCE,  2012). Nunca é demais lembrar aqui a tragédia do rio Jordão, no centro da guerra territorial entre Palestina e Israel, que chega seco ao mar Mediterrâneo devido ao uso intenso de suas águas para irrigação pelos israelitas. A antiga União Soviética, devido ao intenso uso agrícola, secou um imenso lago na Europa Central.

Segundo Maude Barlow, do Council of Canadians, a cada dia jogamos de esgoto e de resíduos industriais e agrícolas no sistema mundial de águas o equivalente ao peso mundial de toda a população humana (2 milhões de toneladas). A indústria de mineração no mundo deixa nos territórios, como veneno, o equivalente a cerca de 800 trilhões de litros, a cada ano. Estima-se que  um terço de todo o fluxo de água é usado hoje para a produção de agroenergia, água suficiente para satisfazer a necessidade de toda a população mundial. Por isto, a água é uma das maiores ameaças ecológicas para a humanidade. A água contaminada mata mais crianças por dia do que HIV-AIDS, malária e as guerras juntas (BARLOW, 2010).

Não falta água, nós é que criamos a escassez de água pelo modo com que a usamos. Devido a escassez criada, a água se transformou num negócio global. Por que? Para que? Nada mais emblemático do absurdo do negócio da água do que o trágico acidente no grande túnel de passagem entre Itália e França no Mont Blanc, anos atrás. O acidente foi provocado por dois caminhões... carregados de água, um da Itália para a França e outro da França para a Itália! 

Estamos diante de um eminente risco da água virar mais uma commodity, de ser transformada em um produto comercializável, que se adquire pelo preço determinado de quem a explora. Aliás, isto é precisamente o que está sendo proposto sob o belo nome de economia verde e sustentável, que estende o domínio do capitalismo e dos mercados a toda a natureza e seus chamados “serviços”. Está em jogo o próprio direito de viver. Cobrar taxa para que a água jorre na torneira de casa, um direito fundamental, já é discutível. Mas ter que pagar pelo monopólio privado da água é estar submetido a uma violação absurda de um direito básico.  

A gradativa escassez gerada e a mercantilização da água afetam tudo na vida humana e na natureza: a diversidade de culturas humanas, a biodiversidade natural, o alimento, a segurança ecológica e o funcionamento dos sistemas ambientais, que vão do sequestro de carbono da atmosfera, da resiliência dos sistemas aquáticos e terrestres, à regulação do clima. A água, num certo sentido, resume nela a crise do desenvolvimento que temos, que produz luxo e lixo ao mesmo tempo, tudo em nome da acumulação de riquezas.

As lutas pela água

Neste final de verão e início de outono, entre tantas questões que alimentam as inquietações do nosso cotidiano, surgiu a questão do uso das águas do rio Paraíba do Sul. Com nascentes em São Paulo, mas correndo em direção ao Nordeste, sendo o principal rio e atravessando todo o Estado do Rio de Janeiro, suas águas viraram uma controvérsia federativa. Com falta de água, São Paulo quer interligar a bacia do Paraíba do Sul ao sistema Cantareira, que abastece a Grande São Paulo, hoje sob ameaça de “estresse” hídrico. Sem entrar nos meandros técnicos, o fato soa como uma ameaça,  uma guerra federativa. Por que? Não desenvolvemos uma cultura de gerir nossas águas como um bem comum.
  
A água já está no centro de importantes conflitos sociais pelo mundo. A lista de exemplos é longa. Basta lembrar alguns. Além da disputa do rio Jordão entre Palestina e Israel, importa lembrar aqui a questão do Tibet, ocupado militarmente pela China por causa exatamente da água, pois os dois grandes rios chineses são abastecidos naturalmente pelo degelo das montanhas do Himalaia. Em 2000, devido à tentativa de privatização do abastecimento de água em Cochabamba, na Bolívia, explodiu a guerra popular pela água, obrigando o governo a rever a sua decisão. Na Índia, alastrou-se um grande movimento contra a Coca-Cola, devido ao crescente controle dessa multinacional de refrigerantes de fontes naturais de água fresca, logo num país onde a água não é exatamente abundante. Cabe lembrar que a Coca-Cola usava 3 litros de água fresca para produzir 1 litro de seu refrigerante. Foi em Mumbai, na Índia, em 2004, durante o Fórum Social Mundial, que a comercialização da Coca-Cola foi proibida no espaço de realização do evento. Talvez isto tenha ajudado a empresa a adotar práticas um pouquinho mais responsáveis, pois em 2009, conforme publicação da própria empresa, se consumia 2,04 litros de água para cada litro de produto (COCA-COLA, sd). 

Mas a água não é só disputada pelo seu consumo imediato. Ela representa complexos sistemas, que muitas vezes são agredidos em nome do desenvolvimento. No momento, é possível ver isto na questão que envolve a construção das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, e de Belo Monte, no Xingu.  O uso da água para gerar energia elétrica é uma forma de extrativismo agressivo social e ambientalmente, apesar de ser contabilizada como energia limpa nas estatísticas do país. Para construir hidrelétricas é preciso agredir o rio e o que ele significa para a população que vê no rio agredido uma parte fundamental de seu território e seu modo de vida. Na bacia do Xingu vivem importantes povos indígenas, com seu direito ao território reconhecido em nossa constituição democrática.

Interessante lembrar aqui o caso de Itaipu, hidrelétrica construída pela ditadura nos anos 70 do século passado. O Rio Paraná, em Itaipu, é fronteira entre Paraguai e Brasil. Para usá-lo na produção de energia foi importante um acordo que divide ao meio, entre os dois países, a energia produzida. Mas como ficou a população a ser “inundada”? Eram milhares de pequenos produtores familiares só do lado brasileiro. O processo de exclusão da área foi feito à força, com indenizações que não garantiam a reprodução das mesmas condições de vida em outro lugar. Surgiu, então, o movimento dos atingidos por barragens e, dado que havia sem-terra, o MST tem uma da origens por lá. Acontece que ninguém pensou nos índios Guaranis, ocupantes ancestrais de todo o território. Só depois, muito depois, é que a questão mereceu atenção e foram cedidos territórios específicos para os Guaranis. Mas o interessante é como a questão da água do rio mudou no decurso do tempo. Usina hidrelétrica depende de água como qualquer ser vivo. O Oeste do Paraná é uma das áreas de maior intensidade de exploração agrícola e pecuária intensiva. O assoreamento do lago de Itaipu avançava espantosamente.
 
Foi por iniciativa da própria Itaipu que, desde 2003, se desenvolve o exemplar programa “Cultivando Água Boa”, de sustentabilidade das águas e do modo de vida dos municípios brasileiros do entorno. Á água, ontem agredida e usada como mero recurso, hoje é cuidada, das microbacias dos rios, que alimentam o lago, ao alimento orgânico produzido para as escolas da região.

Enfim, existem conflitos sociais porque a água é de algum modo ameaçada como bem comum, que está aí no centro de toda a vida. O aprisionamento da água para o seu uso privado, para a sua mercantilização direta ou na forma de minérios, energia, insumo na produção agrícola e industrial, é o que a torna escassa e motivo de disputa. Na verdade, hoje em dia, todos os conflitos de água se referem a territórios específicos, territórios entendidos como as condições dadas, as naturais e as criadas pela ação humana passada, e os modos de vida atuais que os organizam. Aí a água pode ser tratada como um mero recurso natural, na visão de empresas e, muitas vezes, governos, ou como um bem essencial à própria vida de quem aí vive. A disputa, simplificadamente, é entre tais visões diametralmente opostas.

A Água como bem comum

Aqui é essencial destacar a água como bem comum fundamental da vida, de toda vida. Os bens comuns, ou simplesmente comuns, são parte intrínseca da integridade das condições de vida de todos e todas. São bens comuns: o próprio planeta Terra,  a atmosfera (o ar e o clima), o espaço sideral (órbitas geoestacionárias) e o espectro de ondas (para frequências de comunicação), a biodiversidade, as terras férteis, as montanhas, os oceanos, os rios, as águas....Bens que existem em um estoque dado. São também comuns bens produzidos como a língua e a cultura, o conhecimento, a informação, a internet... , todos bens que se multiplicam e se enriquecem com o seu uso humano. A cidade, como um conjunto coletivo, é um bem comum, convivendo com propriedades privadas  de casas, apartamentos, casas comerciais e de serviços, indústrias, em seu interior. Nenhum bem é comum por si, torna-se comum, faz-se comum pelas relações sociais (ver: VIEIRA, 2012; HELFRICH et alii, 2009; GRZYBOWSKI, 2011).

O que faz um bem ser comum é o indispensável compartilhamento e o necessário cuidado. A percepção da necessidade de compartilhar e cuidar de certos bens leva os grupos humanos a se organizar e a tratá-los como comuns. Por isto é que socialmente se criam bens comuns. Voltar a tornar comum o que foi privatizado está no centro de muitas indignações e insurgências pelo mundo. O caso da água é um dos mais evidentes e emergentes hoje em dia. A água só é garantida de fato quando tratada como bem comum. No Fórum Social Mundial, ainda na primeira edição em 2001, em Porto Alegre, começou a se formar a rede mundial do direito à água como bem comum, uma das maiores redes de cidadania no mundo. Na luta contra a privatização e pela volta a formas de tratar a água como bem comum vale lembrar aqui os casos de Roma e de Paris, hoje com o abastecimento de água sob a gestão da municipalidade e sob controle direto cidadão.

Ser comum é ser um direito coletivo. Não é uma questão de propriedade. Não é “de ninguém”, mas de todos. Não é só ser público que garante ser de todos. O ar é comum porque é de todos, mas é difícil imaginá-lo público ou, ainda mais difícil, privado.  A rua é comum porque pública, também de todos, mas temos experiências de sobra sobre a sua privatização, com cancelas e guardas armados. A água é um direito coletivo porque comum, só que pode ser privatizada na medida em que pode ser aprisionada. Não é automático que a gestão pública da água a trate como um bem comum, mas estar sobre gestão pública muda a natureza do conflito pelo direito coletivo à água.

O privado é o que é controlado privadamente, segundo interesses particulares. O que é público, controlado ou não pelo Estado, deve atender a interesses coletivos, de todas e todos. Mas para isto necessariamente precisa ser visto e tratado como um comum, um direito igual de todos e todas da coletividade. Só a cidadania em ação pode garantir o caráter comum de um bem.  A água merece ser mais do que uma tragédia, por sua falta ou excesso. Está no hora de instituirmos publicamente a água como um bem comum. Não esqueçamos que somos gestores de 12% da água doce do mundo!

Para finalizar

Toda a minha análise sobre a água tem como referência o indispensável tratamento que devemos a ela como um bem comum vital. Devemos trazê-la para a agenda pública, para o centro da ação cidadã. Não vamos conseguir enfrentar nossos problemas de justiça social e ambiental sem resgatar a água do seu aprisionamento como recurso na produção e como mercadoria rara por agressivas forças privatizantes. Mas não vamos progredir muito sem lutar para que o Estado garanta o caráter comum da água, como bem a ser compartilhado entre todos e todas, sem discriminações e exclusões.

(*) Sociólogo, diretor do Ibase

(**) Este artigo é uma adaptação e atualização de palestra do autor no Seminário “Sustentabilidade – Múltiplos Olhares: Água e Saneamento & Resíduos Sólidos”, organizado pelo Museu Ciência e Vida, Fundação CECIERJ, Duque de Caxias, 07/11/2012.

Referências
• BARLOW, Maude. “Every now and then in history, the race takes a collective step forward in ist evolution”. On the Commons. 2010 (Disponível em: <http://onthecommons.org-commons-future-already-here>. Acesso em 15 out 2012)
• COCA-COLA Brasil. Guia de Sustentabilidade. sd
• GRZYBOWSKI, Cândido. Caminhos e descaminhos para a biocivilização. Rio de Janeiro, Ibase, 2011 (Disponível em <http://www.ibase.br/pt/wp-content/uploads/2011/08/Caminhos-descaminhos.pdf>
• HELFRICH, Silke et alii. Biens Communs – La prospérité par le partage. Berlin, Heinrich Böll Stiftung, 2009.
• O GLOBO. Amanhã. Rio de Janeiro, 11/03/2014
• RESILIENCE ALLIANCE. Planetary Boundaries: exploring the safe operatin space for humanity. Ecology and Society. London, v.14 (Disponível em <www.ecologyandsociety.org/vol14/art32> Acesso em 15 out 2012)
• VIEIRA, Miguel Said. Bens comuns intelectuais e bens comuns globais: uma breve revisão crítica. São Paulo, Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2012. 

O QUE A POLÓNIA QUER DA UCRÂNIA?



Kira Kalinina – Voz da Rússia

A Polônia está entre os países que com maior insistência e em alta voz se manifestam pela integração europeia da Ucrânia. Com a ajuda da situação na Ucrânia, a Polônia tenta consolidar na UE posições de um país que tenha influência na Europa de Leste.

Contudo, o MRE da Polônia não reagiu ainda à proposta do político russo Vladimir Zhirinovsky. A integração dos territórios ucranianos na Polônia, que poderiam ser reclamados pelos poloneses, significaria para o país não apenas problemas financeiros, mas provocaria também o descontentamento absoluto da população.

Segunda-feira, representantes do Partido Liberal Democrata (LDPR, na sigla russa) dirigido por Vladimir Zhirinovsky, enviaram mensagens aos dirigentes da Polônia, Romênia e Hungria, propondo estudar uma variante de divisão da Ucrânia. O partido considera que esta seja a única saída da situação que se formou no país.

“Regiões ucranianas ocidentais têm a vontade de separar-se da Ucrânia, porque não veem o futuro, enquanto ânimos negativos reinam entre a população. As pessoas querem mudar lá, onde possam viver tranquilamente – para a Rússia, Polônia, Romênia”, declarou o coordenador da filial do LDPR de Moscou, Boris Chernyshev. Suas palavras são confirmadas pelos comunicados de que cerca de 40 famílias de checos de Volyn se dirigiram às autoridades checas, solicitando mudar para a República Tcheca por razões de segurança. No entanto, o pedido foi recusado.

“Atualmente, o governo não planeja conceder qualquer ajuda multilateral por não haver suficientes argumentos para isso. Se houver uma escalada considerável da situação, poderemos rever a nossa decisão”, declarou o ministro das Relações Exteriores da República Tcheca, Lubomir Zaoralek.

O MRE da Polônia também não respondeu à mensagem do LDPR com a proposta de convocar um referendo sobre a integração de uma parte da Ucrânia, comunicou Chernyshev:

“Ficam calados por enquanto, mas, a meu ver, há muito que a sua alma tem um vislumbre de esperança de unir-se novamente com as regiões influenciadas anteriormente pela Polônia. A Europa tem medo de anunciar estas propostas. A União Europeia pesa sobre estes países que receiam aplicar uma política independente.”

Mas a influência da UE não é o único fator que aflige os sonhos sobre uma Polônia do mar ao mar, ou seja do Báltico ao mar Negro. A integração de novos territórios provoca também uma carga financeira adicional. Outro grande problema consiste na convivência de poloneses e ucranianos num país, aponta Agnieszka Wolk-Laniewska, jornalista polonesa:

“A cultura polonesa tem profundamente um sentimento de que estes territórios pertencem à Polônia. Os políticos polacos são envolvidos emocionalmente no conflito entre a Rússia e Ucrânia. E o governo polonês tenta combater pela Ucrânia. Mas ninguém dirá que entre os poloneses e ucranianos se formaram quaisquer relações amigáveis. Penso que tudo é ao contrário. Historicamente, temos reclamações recíprocas. É por isso que os poloneses comuns são indiferentes em relação aos acontecimentos na Ucrânia. Mas, por outro lado, a mídia polaca conduz uma guerra premeditada contra a Rússia.”

Nesse contexto, o governo polonês ganhará muito mais da adesão da Ucrânia à UE. Um mercado de venda, uma mão-de-obra barata e um patrocínio sempre proporcionam dividendos. Provavelmente, é por isso que a Polônia faz avançar com tenacidade o projeto de “integração europeia da Ucrânia” e tenta convencer a Ucrânia e a Europa da grande importância desse projeto para cada parte.

Bandeiras russas estão hasteadas sobre todas as unidades militares na Crimeia




Em todas as 193 unidades militares acontonadas no território da República da Crimeia foram içadas as bandeiras da Rússia, segundo relatou o chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Rússia, General de Exército Valeri Guerasimov.

De acordo com Guerasimov, todos os soldados que manifestaram o desejo de continuar o serviço nas Forças Armadas ucranianas, entregaram as armas para armazenagem vigiada e permanecem fora das bases militares, preparando-se para uma viagem organizada com pertences pessoais à Ucrânia.

Voz da Rússia - Foto: RIA Novosti

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