The
Guardian, Londres – Presseurop – imagem Patrick
Chappatte
Após três anos de
cortes nas despesas do setor público, a Irlanda parece estar pronta para sair
do programa de ajuda da troika (UE-BCE-FMI) no dia 15 de dezembro, mas a que
preço? O país continua atolado em depressão e com a sua economia em apuros.
A Irlanda está a
ser, uma vez mais, apontada como o aluno exemplar da escola de economia da
austeridade na Europa e o Taoiseach [primeiro-ministro], Enda Kenny, diz que o
seu Governo vai sair
do programa de resgate fixado pela troika, composta pela União Europeia,
pelo Banco Central Europeu e pelo FMI. Kenny afirma que o período de
austeridade está a chegar ao fim.
Estas duas afirmações são claramente questionáveis, e também esclarecedoras quanto a alguns aspetos importantes da situação na Europa.
A política do Governo de Dublin continuará, ainda, a ser ditada pela troika durante muitos anos. Na realidade, a UE já estabeleceu um sistema de execução orçamental, regulamentação do processo orçamental e sanções que consagrará a austeridade permanente para todos os membros do euro. Além disso, passou a ser habitual o FMI criar uma nova linha de crédito, depois de o montante inicial do resgate se ter esgotado, e essa nova linha impõe novas obrigações. Por conseguinte, não é verdade que a austeridade tenha chegado ao fim. Em contrapartida, os ativos e empréstimos detidos pelos bancos irlandeses ficaram tão desvalorizados devido aos problemas económicos que o risco de um novo resgate dos seus credores está a aumentar.
Fracasso dos
Governos de Dublin
Há ainda um motivo de peso pelo qual o que se passa na Irlanda não pode ser reproduzido em países como a Grécia e Portugal. No início da crise, a economia irlandesa era muito mais próspera. E, depois da recessão prolongada vivida na periferia europeia, essa situação mantém-se. Uma medida do fracasso dos sucessivos Governos de Dublin é o facto de as condições de vida terem caído tanto que baixaram para os níveis britânicos, depois de os terem suplantado antes do virar do século passado.
No Reino Unido, são sempre muitas as vozes que querem atribuir todos os males económicos à UE. Contudo, a ameaça de George Osborne [o ministro das Finanças britânico] de manter a austeridade até pelo menos 2018 e insistir no objetivo do excedente orçamental corresponde à austeridade permanente de Bruxelas, Frankfurt e Washington.
A explosão de autorregozijo dos dois lados do Mar da Irlanda é completamente despropositada. Os Governos de Dublin tendem a não possuir a arrogância multissecular da elite política britânica e, por isso, procuram colher aplausos no estrangeiro.
A coligação no
poder – entre o Fine Gael, de direita, e o Partido Trabalhista irlandês –
parece receber palmadinhas nas costas, ou talvez na cabeça, pela previsão de
que as finanças públicas irão passar para aquilo a que se chama um excedente
primário, ou seja, o excedente das finanças públicas, excluindo os encargos com
os pagamentos dos juros [da dívida]. Mas isso é igualmente o que proclamam cada
vez mais os apoiantes dos governos que põem em prática a austeridade em
Portugal e na Grécia e, em grande medida, é desprovido de sentido. A menos que
a taxa de crescimento da economia ultrapasse a fatura crescente dos juros, o
nível da dívida pública torna-se insustentável.
Austeridade não é a
solução
Contudo, por
enquanto, o risco imediato de incumprimento foi substancialmente reduzido. Essa
redução deve-se em parte ao compromisso do BCE de “fazer o que for preciso”
para sustentar o euro. O que quer que alargue para um número ilimitado os
resgates dos credores, essencialmente bancos europeus e britânicos, mas nem um
euro para os governos.
É com esta operação
de suporte de vida para os bancos que agora nos pedem que nos congratulemos. A
festa não deve durar muito, visto que a austeridade está a minar e economia.
Sem investimento, a capacidade produtiva entra em declínio. Na Irlanda, o novo
investimento líquido (depois de deduzidos a depreciação, o desgaste e outros) é
próximo de zero. A economia continua em depressão e um dos efeitos desse facto
é a acumulação de crédito malparado nos bancos de retalho, incluindo os
créditos hipotecários subscritos por pessoas em dificuldades. A austeridade é
inimiga do crescimento e não pode solucionar a crise.
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Presseurop
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