quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Brasil: NEGRAS, MÉDICAS E DOMÉSTICAS

 


No Brasil, a cara define sua profissão, o seu poder e a sua preferência no trânsito da vida profissional. A vinda de tantos médicos e médicas negras para o Brasil é um choque terapêutico para entendermos a profundidade do apartheid brasileiro
 
Marcos Romão – Pragmatismo Político
 
Poderia ser natural em meu Brasil, qualquer criança ou pessoa me perguntar qual a minha profissão, se eu responder, que sou médico, mesmo vestido de branco, feito respondi uma vez à uma balconista negra que me servia café, ela olhou desconfiada e me disse que pensava que eu parecia mais pai de santo, quando lhe afirmei que na verdade sou sociólogo, ela me olhou mais espantada ainda, dizendo, feito o presidente Fernando Henrique?
 
São situações naturais para qualquer negro no Brasil estas que acontecem no dia a dia com a gente, não somos o que somos somos apenas o que nascemos pra ser. Nascemos pra sermos nada ou quase nada.
 
Eu mesmo me flagro volta e meia ao conversar com as pessoas, com uma dúvida interior, que me faz perguntar no íntimo, será que o cara tá acreditando em mim,será que eu estou me apresentando mais do que devia para convencer o cara interlocutor, que eu sou o que sou e tenho a experiência que tenho? Será que não exagero ao me descrever, para convencer ao outro que sou eu mesmo o que sou?
 
Natural prá gente é ser servente, empregado doméstico, supervisor de segurança se estiver de terno e até manobreiro, que alguém entrega a chave enquanto a gente espera a namorada chegar para nos encontrar em um restaurante fino.
Não importa se o interlocutor é negro ou branco, cortamos um dobrado para convencê-lo de que somos o que somos e basta.
 
No meus vinte anos na Europa, quando sentava em um bar, poderia estar ao meu lado uma chanceler da república ou uma empregada doméstica, que se eu não conhecesse pela foto, não saberia quem é quem.
 
Aqui não, se é branco é alguém, se não é branco que nos convença.
 
Aqui no Brasil se tem cara e não se tem cara e a cor da cara ajuda a definir a profissão, a posição e o poder diagnosticado na pessoa que você se confronta. Dependendo da nossa avaliação ou pedimos licença, ou passamos por cima.Quase sempre tem dado certo prá todo mundo. Quando não dá certo e alguém grita racismo, vem logo a desculpa, mas foi um mal entendido, esta não foi a nossa intenção.
 
Aqui a cara define a sua profissão, o seu poder e a sua preferência no trânsito da vida profissional.
 
Até para as crianças que reconhecem tudo no espírito, é um problema identificar uma pessoa negra no seu cotidiano,que não faça parte do universo de pessoas a que esta criança esteja acostumada a ver as pessoas negras.
 
Médicas, engenheiras, arquitetas, presidentas escapam até para estas crianças do universo de domésticas a que elas estão acostumadas a verem suas mães, tias, quando são crianças negras, e babás quando são de crianças brancas que falamos.

Assim quando a jornalista potiguar Micheline Borges causa uma revolta nas redes sociais ao expressar sua opinião sobre os médicos cubanos que estão chegando ao Brasil para trabalhar no programa “Mais Médicos”. “Me perdoem se for preconceito, mas essas médicas cubanas tem uma cara de empregada doméstica”, como afirmou a repórter, me causa um certo espanto, sobre o porque de tanta revolta do público feissebuquiano, quando ela falou o que a maioria destes leitores pensam.

A infeliz cometeu apenas a besteira de confirmar o racismo que a maioria dos brasileiros carregam dentro do coração todos os dias.
 
Ninguém se espanta nem vai para as redes, perguntar por que só tem médicos brancos no Brasil.
 
Todos estão para lá de mal acostumados em verem cenas de filas negras esperando no SUS, e à 8 horas as filas de brancos estacionando os seus carros e descendo para atravessar aqueles mares negros de pessoas humanas de pele preta ou amareladas de fome, que sempre estão a sua espera.
 
Foi chocante assistir a chegada dos médicos cubanos em São Paulo, a foto estampada nos jornais chocou até a mim, homem vivido neste mundo planetário. Deus dos Céus, um monte de mulheres e homens com as caras dos peixeiros de nossas esquinas, fortes como os entregadores de gás do dia a dia, e com aquele olhar afável das nossas queridas empregadas domésticas, isto não estava no meu enredo de vida como um brasileiro negro, pois eram e são todas e todos médicas e médicos.
 
Quiseram os Deuses, via a transversal do comunismo, dar um choque terapêutico no nosso racismo, tão querido como um calo conservado de nossos avós?
 
E ainda aparecem uns jornalistas, que parecem que descobriram a pólvora do racismo brasileiro, a dizerem-se solidários com os cubanos, que sentem vergonha pelo racismo dos médicos brasileiros. Outros, menos jornalistas também sentem vergonha, como se o assunto não fosse com eles.
 
Meu avô sempre dizia, vergonha de quem não se reconhece racista e lágrimas de crocodilos, não acabam com o racismo, nem enchem copo de quem tem sede por justiça e igualdade.
 
Tem mais de 125 anos que nós negros lutamos para termos acesso às escolas e quanto mais estudamos, mais as escolas de “excelência” ficam brancas.
 
Tem mais de 40 anos que lutamos por cotas, levamos 10 anos na justiça, ganhamos mas não levamos a quina, pois universidades como a de São Paulo, sempre arranjam um jeito de não permitirem nossa entrada.
 
Numa esquina perto de minha casa vejo todo dias dois mares de cores crianças se cruzarem,de um lado uma escola privadas, escola de excelência que forma prefeitos e governadores. As crianças brancas atravessam a rua em direção a zona rica da cidade. Do outro lado tem a Escola Pública , que forma as empregadas domésticas e os peixeiros da esquina.
 
As crianças se cruzam, pretas para as favelas e brancas pra os play grounds. Sinto que estamos enchendo um balde furado. Nossas crianças negras estão marcadas para perderem e morrerem.
 
Que a foto desta negrada cubana estampada nos jornais, tenha o mesmo efeito que a foto de Pelé teve na África do Sul, quando publicada na primeira página em 1958. Foi a primeira foto de um negro na primeira página de um jornal da África do Sul. A foto de Pelé inspirou muitos jovens negros da época, como me disse Desmond Tutu, ao verem que elas, crianças negras poderiam ser o que desejassem. Levaram 30 anos e estão conseguindo.
 
A vinda de tantos médicos e médicas negras para o Brasil (apesar de ser tão pouquinho café neste balde de leite que é o sistema de poder curador do Brasil) é mais do que um exemplo de ação para a saúde física de nosso povo racista até nas entranhas, é um choque terapêutico para entendermos a profundidade do apartheid brasileiro.
 
Aqui deixo como um exemplo a entrevista que fiz no início do ano com uma médica negra brasileira de minha cidade (VER VÍDEO)
 
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BOLIVIA X BRASIL

 


Rui Martins, Berna – Direto da Redação
 
Berna (Suiça) - Imaginemos o seguinte quadro político em 2014, Dilma perde as eleições, vencidas por José Serra. E, no final do ano, o ministro Joaquim Barbosa encerra o julgamento de José Dirceu, condenado a dez anos de prisão.
 
Aproveitando as festas de fim-de-ano, Dirceu se refugia na embaixada da Bolívia. Seu advogado pede em vão ao governo brasileiro um salvo conduto e Dirceu parece condenado a passar sua vida numa sala da embaixada boliviana, onde se instala toda noite uma cama de campanha, desarmada no dia seguinte às sete da manhã.
 
Até que, utilizando-se de um político boliviano, em visita a Brasília, a embaixada boliviana consegue exfiltrar Dirceu, como chofer de taxi e, assim, ele viaja até chegar à Bolívia. O presidente Serra chama o embaixador boliviano, passa-lhe um sabão, ameaça cortar ajudas, mas Evo Morales condecora o embaixador boliviano, e recebe com festas o dirigente petista em La Paz.
 
A grande imprensa brasileira que hoje chama o ministro-conselheiro Eduardo Sabóia de herói, considera o embaixador boliviano um bandido e um traidor. E os petistas brasileiros que hoje chamam Eduardo Sabóia de vendido, fazem manifestaçõs de regozijo diante da casa do embaixador boliviano.
 
Toda essa históriazinha, talvez de mau gosto, me veio à cabeça, depois de ler os prós e contras publicados em papel ou na Internet sobre a exfiltração do senador boliviano Roger Molina (foto), da Bolívia. Só resta como hipótese plausível, um asilo de Dirceu numa embaixada amiga, no caso de confirmação de sua pena.
 
O diplomata Luiz Paulo Barreto, diretor do Conare, que votou pela extradição de Cesare Battisti, provocando até o risco de instabilidade institucional, quando o STF rejeitou a decisão do ministro da Justiça Tarso Genro dando refúgio a Battisti, publicou um texto, faz algum tempo, sobre asilo.
 
O asilo é coisa muito antiga, já existia nas civilizações antigas, para proteger perseguidos por crimes comuns. Refugiavam-se nos templos religiosos, enquanto não havia as embaixadas. Em nossa época, passaram a existir dois tipos de asilo - o diplomático e o territorial. O espírito do asilo é o de sempre ser concedido a toda pessoa que se considera perseguida e com ameaça de ser presa ou morta.
 
O perseguido vai a uma embaixada e pede asilo que, por uma questão humanitária, é geralmente concedido. Trata-se do asilo diplomático, que, depois de algum tempo, vai se tornar territorial, com a transferência do asilado, protegido, por salvo conduto, ao país que concedeu o asilo. O outro tipo de asilo, ocorre quando o perseguido já pede o asilo dentro do país.
 
Em termos de Direito Internacional, todo país é obrigado a respeitar um asilo concedido, permitindo a saída do asilado com segurança para ir ao país que o acolheu. Foi graças ao asilo que centenas de brasileiros puderam escapar da prisão, logo depois do golpe de Pinochet no Chile, refugiando-se em embaixadas de países amigos. Ali ficaram um curto tempo, eram embaixadas lotadas de asilados. O Chile, apesar da repressiva ditadura de Pinochet, responsável por milhares de mortes, aceitou conceder salvo condutos.
 
Atualmente, o direito de asilo, por tantos séculos respeitado, e que chegou a ser utilizado por Voltaire e Vitor Hugo, vem sendo alvo de restrições, geralmente ditadas pelas grandes potências de direita, como EUA e Inglaterra, mas esse procedimento pode instigar pequenos países a fazerem o mesmo. Embora não tenha ocorrido atos de invasões de embaixadas com asilados, já ocorreu um sério precedente envolvendo o americano Edward Snowden, por ter revelado o mecanismo mundial de espionagem dos EUA.
 
Assim, quando correu a informação de que Snowden tinha embarcado no avião presidencial do boliviano Evo Morales, os EUA conseguiram forçar a União Européia a não permitir o sobrevoo de seu território pelo avião presidencial. Correndo o risco de ficar sem combustível, o avião foi obrigado a descer na capital austríaca, Viena, onde policiais invadiram o aparelho, humilhando o presidente Evo Morales e a delegação boliviana, obrigados a deixar o aparelho para ser feita uma vistoria geral com o objetivo de prender Snowden se ali estivesse.
 
Ora, o asilo diplomático não significa sempre ser concedido dentro de uma embaixada. Pode também ser concedido dentro de um navio, avião ou prédio, que represente o país outorgante do asilo. Ou seja, os EUA desrespeitaram totalmente, em nome de sua segurança nacional, um direito mundial, reconhecido pela ONU e todos os países, ao invadir o avião do boliviano Evo Morales, onde afinal não estava Snowden.
 
Porém, antes dos EUA terem desrespeitado o direito de asilo e humilhado Evo Morales, presidente de um pequeno país, foi o próprio Evo Morales quem tinha desrespeitado o direito de asilo e humilhado o chanceler brasileiro Celso Amorim, pois seus soldados vistoriaram, em La Paz, o avião em que iria viajar o chanceler, pensando que nele estivesse o senador boliviano Roger Molina.
 
Da mesma forma, a Inglaterra desrespeita o direito de asilo concedido pelo Equador ao ativista de Wikileaks, Julian Assange, não concedendo salvo-conduto para que possa ir ao aeroporto e viajar para Quito. Atitude também imitada pela Bolívia, que não concedia salvo-conduto ao senador Molina, para deixar o asilo diplomático, concedido pela presidenta Dilma, e torná-lo territorial, indo viver no Brasil.
 
Faz parte da concessão do asilo não se levar em conta o passado do perseguido. Foi o caso de Ronald Biggs, assaltante do trem pagador de Londres, perseguido pela Inglaterra mas que recebeu oficialmente o asilo concedido pelo Brasil. O presidente hondurenho, derrubado por um golpe, se asilou na embaixada do Brasil, onde tinha condições melhores que o senador boliviano, talvez em decorrência do seu cargo de presidente deposto.
 
O Brasil tem uma tradição, se assim se pode dizer, de conceder asilo a personalidades de direita - assim recebeu Alfredo Strossner, ditador do Paraguai; deu asilo a Marcelo Caetano, derrubado pela Revolução dos Cravos que acabou com o salazarismo em Portugal; e deu asilo ao político francês Georges Bidault, contrário à independência da Argélia e ao general De Gaulle. A concessão do asilo ao boliviano Roger Molina, embora pareça inexplicável pela presidenta Dilma, provavelmente por questões humanitárias, confirma essa regra.
 
Já com Cesare Battisti não se tratou de asilo, pois o italiano estava no Brasil clandestinamente e foi preso a pedido da França e depois da Itália. O processo, que se prolongou por mais de quatro anos, discutia se devia ou não ser extraditado e foi resolvido pelo ex-presidente Lula, no seu último dia de governo, negando-se a extradição e concedendo-lhe o direito de viver no Brasil.
 
Portanto, com os elementos acima, fica mais fácil agora para o leitor decidir se o ministro-conselheiro Eduardo Sabóia, diplomata brasileiro em La Paz, agiu corretamente ou não. Se a Bolívia agiu corretamente ao negar conceder salvo-conduto ao senador boliviano, que recebera asilo da presidenta Dilma, e ao humilhar o chanceler Celso Amorim, ao vistoriar seu avião.
 
Quanto a funcionários de departamentos de Polícia e de embaixadas que ajudaram pessoas a fugir, existem casos na própria Suíça, onde o chefe de Polícia, Paul Grunnigen, concedia vistos de entrada aos judeus, desobedecendo ordens do governo e, por isso, perdeu seu emprego e morreu na miséria; em Portugal, o consul-geral Aristides de Sousa Mendes desrespeitou ordens expressas do ditador Salazar, concedendo, na cidade francesa de Bordeaux, vistos para 30 mil judeus fugirem para os EUA. E a própria esposa do diplomata e escritor Guimarães Rosa, Aracy Guimarães Rosa, que trabalhava na chancelaria do Consulado do Brasil, em Hamburgo, concedia vistos para judeus escaparem dos nazistas.
 
*Jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é líder emigrante, membro eleito do Conselho Provisório e do atual Conselho de emigrantes (CRBE) junto ao Itamaraty. Criou os movimentos Brasileirinhos Apátridas e Estado dos Emigrantes, vive em Berna, na Suíça. Escreveu o livro Dinheiro Sujo da Corrupção sobre as contas suíças secretas de Maluf. Colabora com o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência BrPress
 

SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE DECLARA GUERRA A CRIMES FINANCEIROS

 

Deutsche Welle
 
São Tomé e Príncipe dispõe, a partir de agora, de uma lei de combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, adaptada às exigências internacionais.
 
Os deputados da Assembleia Nacional são-tomense já aprovaram a nova lei. Agora, o documento deverá ser promulgado pela Presidência da República. A expectativa é de que até final de 2013 o país esteja legalmente preparado para combater o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo.
 
As mudanças aprovadas pelos deputados da Assembleia Nacional adaptam a lei de combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, em conformidade com as recomendações do GAFI, Grupo de Ação Financeira Internacional. Mas quais são, na prática, as vantagens para o país desta nova lei? Idalino Rita, coordenador da UIF, Unidade de Informação Financeira explicou à DW África: “Consistem em criar um dispositivo eficaz, sólido e eficiente, em conformidade com os regulamentos internacionais”. Idalino Rita acrescenta tratar-se de aumentar a credibilidade internacional do país: “de forma a estimular a comunidade internacional a relacionar com São Tomé e Príncipe”.
 
A nova lei é conforme aos padrões internacionais
 
Das recomendações do GAFI constam o estabelecimento de medidas preventivas, poderes e responsabilidades de todas as instituições intervenientes e as políticas de coordenação. Agora, várias lacunas que existiam na antiga lei 15/2008 ficam sanadas, como disse o coordenador da UIF: “Abrangia branqueamento de capitais, mas não abrangia, por exemplo, questões de financiamento de terrorismo. Tivemos que corrigir”. Esta lei, acrescenta Idalino Rita, sanou todos os males e adotou medidas “de natureza preventiva e repressiva, com realce para a criminalização de branqueamento de capitais, financiamento de terrorismo, bem como de uma maior amplitude e designação das condutas ilícitas relacionadas com este fenómeno”. Idalino Rita salienta que esta lei obriga o cidadão a declarar se está na posse de divisas ou títulos ao portador ao atravessar a fronteira. É um conjunto de novidades que coloca a lei em conformidade com os padrões internacionais, diz.
 
São Tomé quer sair da lista negra
 
Um dos objetivos primordiais que o governo pretende alcançar com a aprovação destes mecanismos é tirar São Tomé e Príncipe da lista negra internacional dos países não cumpridores das normas internacionais. Hélio Almeida, ministro do Plano e Finanças são-tomense, reafirmou a importância para o país de sair do grupo: “São Tomé e Príncipe é uma economia aberta fortemente dependente da ajuda externa nas mais variadas formas. O desiderato em matéria de desenvolvimento económico, que se pretende sustentável, impõe a manutenção de um sistema económico e financeiro estável, transparente e credível e com práticas de negócios isentas de quaisquer suspeitas”. E o ministro explica a importância da conformidade da lei nacional com os padrões e exigências internacionais: “Esses esforços visam reforçar os mecanismos de transparência e a consequente atratividade da economia nacional”.
 
Ainda há muito por fazer
 
Mas o caminho a percorrer ainda é longo. A jurista, Celiza de Deus Lima, defende que a existência desses mecanismos poderá não ter efeito, se não forem levadas também em consideração a formação dos magistrados e agentes de investigação para combater esses crimes: “ O UIF não será bem sucedido na sua tarefa enquanto entidade que recebe denúncias ou as informações - que lhe são fornecidas para poder fazer a triagem e apresentar ao Ministério Público - se não tiver também técnicos preparados e meios para dar o devido tratamento a essas mesmas informações”.
 
Autoria: Edlena Barros (São Tomé) – Edição: Cristina Krippahl / António Rocha
 

“GUINÉ-BISSAU NÃO É UM NARCO-ESTADO”

 

Deutsche Welle
 
O novo diretor da Polícia Judiciária guineense, Armando Namontche, rejeita que a Guiné-Bissau seja um "narco-Estado", mas reconhece que país é "um trampolim" de estupefacientes para outras partes do mundo.
 
O novo diretor nacional da Policia Judiciária (PJ), Armando Namontche, está no cargo desde o início do corrente mês de agosto, depois da demissão de João Biaguê, uma semana antes. Biaguê substituiu em maio deste ano Lucinda Barbosa, exonerada do cargo de diretora geral da PJ, uma das mais importantes estruturas no país do combate ao crime organizado, nomeadamente ao tráfico de droga.
 
Lucinda Barbosa terá colocado o seu lugar à disposição do governo, por, alegadamente, estar a ser alvo de sistemáticas ameaças à sua integridade física e ainda estar com dificuldades para trabalhar por ações deliberadas de "forças de bloqueio".
 
Armando Namontche, que assume agora o cargo, depois da saída de João Biaguê, é Procurador-Geral Adjunto e, entre outros cargos, já desempenhou as funções de presidente do Tribunal de Contas. Magistrado formado em Direito, em Cuba, em entrevista à DW África, Namontche prometeu "uma luta tenaz" contra fenómenos como a corrupção, o crime organizado, a impunidade e o tráfico de drogas.
 
De acordo com o relatório anual da Agência Internacional de Controlo de Drogas da ONU, o golpe de Estado na Guiné-Bissau, em abril de 2012, provocou mudanças que podem afetar a luta contra o tráfico de drogas naquela zona do mundo, devido à instabilidade do país. Segundo a agência da ONU, a Guiné-Bissau tem atraído mais a atenção dos traficantes, constituindo já o centro do comércio da cocaína nesta sub-região.
 
Também a agência da ONU anti-narcotráfico e crime organizado (UNODC) considerou este ano a Guiné-Bissau como país da África Ocidental mais afetado pela ingerência do narcotráfico na governação. Em entrevista à DW África, no entanto, Armando Namontche rejeita esta visão.

DW África: Pode-se afirmar que a Guiné-Bissau é um "narco-Estado"?

Armando Namontche (AN): É um problema de que se fala, o tráfico de droga. Mas, na verdade, na Guiné-Bissau, não se pode afirmar isso com toda a firmeza. A Polícia Judiciária faz o seu trabalho através dos seus colegas. Por exemplo, na semana passada, prendemos um rapaz que veio do Brasil, engolindo cocaína, que já expulsou 37 cápsulas. As pessoas saem da América, vêm para a Guiné-Bissau e depois para a Europa. E nós perguntamos: mas porque é que os países europeus são mais desenvolvidos? As pessoas passam por Portugal, por Espanha, e não se conseguem detetar. Mas nós, sem meios, sem aparelhos sofisticados, conseguimos identificar alguns casos. Não se trata, como se fala, de grandes volumes. Pode ser que o país esteja a ser utilizado como um "trampolim", mas nós não concordamos com a ideia de que a Guiné-Bissau é "um narco-Estado".
 
DW África: Isto quer dizer que o tráfico que se faz neste momento não é tão relevante como nos anos anteriores?

AN: Não digo que não seja relevante, porque, se alguém for apanhado com cocaína, trata-se de um crime internacional. Ou seja, tem a mesma importância a apreensão de uma pessoa na posse de um grama ou de um quilo, porque é um crime que está identificado. Mas não é tão grave como se fala o problema da droga na Guiné-Bissau.
 
DW África: Neste momento, como é que está a lidar com a situação da impunidade que tem minado o processo de desenvolvimento no país?

AN: Fala-se de impunidade porque os nossos tribunais são lentos. Imagine: um processo que está a ser investigado desde 2009, até agora não foi concluído. As pessoas ficam na expetativa e falam de impunidade mas é preciso haver confiança nos nossos tribunais. Algum dia serão conhecidos os supostos autores materiais ou mandantes.

DW áfrica: Nos últimos tempos, muita gente tem recorrido à justiça pelas próprias mãos. Os guineenses parecem já não acreditar na justiça dos tribunais...

AN: Isto não pode constituir um motivo para fazer justiça pelas próprias mãos. Compreendo que quando alguém tem um ente querido que foi assassinado brutalmente fique preocupada à espera que se faça justiça. Principalmente naqueles casos que se passaram há muito tempo e até agora os suspeitos não foram julgados e os tribunais não têm provas. Portanto, quando estas coisas acontecem as pessoas ficam perplexas. E dizem que há impunidade. O nosso objetivo é combatê-la.
 
Autoria: Braima Darame (Bissau) – Edição: Maria João Pinto / António Rocha
 

Angola: QUEIXA DE PERSEGUIÇÃO DE DAVID MENDES CHUMBADA PELA UA

 

Deutsche Welle
 
Ministério das Relações Exteriores de Angola anunciou que a Comissão dos Direitos Humanos da União Africana considerou improcedente a queixa-crime de David Mendes (à direita, na foto) contra o Estado angolano.
 
O Ministério das Relações Exteriores de Angola pôs a circular um comunicado dando a conhecer que a Comissão dos Direitos Humanos da União Africana (UA) considerou improcedente a queixa-crime apresentada pelo advogado David Mendes contra o Estado angolano, por alegada perseguição política que colocava em risco a sua vida, desde que anunciou a sua candidatura às eleições gerais de 2012.
 
Esta queixa foi apresentada depois de David Mendes introduzir uma outra queixa-crime junto da Procuradoria-Geral da República contra o chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, por alegadamente possuir diversas contas bancárias no exterior, com montantes obtidos de forma ilícita.

Segundo o ministério encarregue da diplomacia angolana, a comissão da UA faz notar que o queixoso não prestou quaisquer provas em apoio às suas acusações e, enquanto proeminente advogado em Angola, devia apresentar provas concretas e demonstrar de forma suficiente que as suas alegações estavam devidamente fundamentadas.
 
Comunicado é manipulador, diz David Mendes
 
Contactado pela DW África, o político e advogado David Mendes rebate o comunicado do governo angolano, alegando haver uma deturpação da decisão da comissão da UA, com objectivo de descredibilizar a sua imagem. "Podem ter faltado alguns elementos, porque faltou coordenação para que todos os elementos existentes pudessem sustentar a acusação", afirma o advogado, explicando, no entanto, que "não é verdade que não há provas". "Há insuficiência de provas: são duas coisas diferentes".
 
"Os elementos de provas que possuímos não estavam na posse dos nossos companheiros da Comissão de Direitos Humanos", explica o político.

David Mendes afirma tratar-se de um comunicado que visa manipular a opinião pública, com o principal propósito de transmitir a ideia de que as denúncias de corrupção contra o presidente José Eduardo dos Santos "nao têm qualquer fundamento".

"Estamos a reagir a este comunicado manipulado feito pelo ministério para enganar a opinião pública, para que pessoas menos atentas pensem que se está a relacionar com o processo que estamos a desencadear contra o presidente ds República", afirma o advogado.

AJPD questiona: Porquê publicitar este caso?
 
A Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), ligada à defesa dos direitos humanos, já reagiu ao comunicado do governo de Luanda. A diretora da associação, Lúcia da Silveira, afirma ser normal que a União Africana considere improcedente este processo, como também pode vir a condenar o Estado angolano em outros processos ainda em curso naquele organismo.
 
"Da mesma forma que a comissão decidiu que não havia matéria para seguir com o caso, podia ter decidido que havia. Assim como noutros casos que foram apresentados à comissão e que ainda estão por decidir", afirma. "É normal, não entendo o porquê de tanto alarido", considera Lúcia da Silveira.

A ativista cívica da AJPD estranha que o governo angolano esteja a publicitar este assunto, quando não o fez na altura em que foi condenado pela União Africana por ter expulso de forma ilegal alguns gambianos que residiam em Angola. "Admiro-me pelo facto de o governo angolano não ter publicitado uma condenação por parte da comissão em relação a este caso. E agora fazem publicidade deste caso específico."
 
"Claramente há uma intenção de denegrir a imagem de David Mendes", conclui a ativista.

A DW África contatou, sem sucesso, o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros e o gabinete do ministro Gorge Chicoty.
 
Autoria: Nelson Sul D’Angola - Edição: Maria João Pinto / António Rocha
 

Angola: O próprio monopólio é a prova da corrupção e de que a Forbes tem razão

 

Diário Angolano
 
Por que o mercado de Telecomunicação em Angola é dominado pelos filhos do Presidente, quando no Mercado Financeiro existem 22 bancos funcionando!?( Pergunta feita pelo Jornalista Reginaldo Silva).
 
Essa é a pergunta que nem a corrupção estaria à altura de responder. O mercado de comunicação e telecomunicação é muito mais promissório para qualquer investidor nacional e estrangeiro. Sem contar que é uma área a mais para se dar emprego a milhares de jovens num país que precisa se desenvolver. Mas o mesmo foi reduzido a um mercado em que os que dominam (vendem) são os filhos do Presidente da República.
 
É uma área de serviços e produtos que só a inteligência massiva, a adesão a educação e o aprimoramento desta trariam grandes lucros sociais ao país, tirando milhares de pessoas do subdesenvolvimento.
 
Como disse o jornalista, até hoje ninguém entende por que esse mercado é de duas pessoas ou empresas.
 
Vários posts foram jogados na internet desmentindo as denuncias de Rafael Marques com relação ao enriquecimento ilícito de Isabel dos Santos; funcionários do Governo que deveriam prestar serviços a população trabalhando com isenção, dedicam-se a fazer propaganda a um partido e a uma empresária, de maneira ilícita, violando explicitamente as leis. Vieram ao público desmentir o que alegadamente a FORBES anunciou e não conseguiu provar.
 
A própria empresária Isabel dos Santos desmentiu no Club-k as supostas irregularidades de enriquecimento.
 
Respondemos todos os desmentidos, tanto dos bajuladores, e dos criminosos que vivem defendendo esse regime corrupto; assim como o desmentido da filha do Presidente de Angola Isabel dos Santos, que para mim nunca foi e é empresaria nenhuma! Senão alguém que é usada para desviar fundos públicos em nome de uma suposta atividade empresarial, ela como todos os seus irmãos.
 
Vimos aqui desmentir o desmentido de que o próprio monopólio das empresas de telecomunicação em Angola é uma das provas evidente e explícita de que todas as acusações contra o Governo Angolano, contra o Presidente José Eduardo dos Santos e sua família, contra o Estado angolano (a maior instituição corrupta do país).
 
O monopólio é um dos fatos que ainda desmonta toda máquina propagandista que o regime tem protagonizado ilegalmente para continuar promovendo bandidos no poder.
 
Nelo de Carvalho, Club-K, 20 de agosto de 2013
 

Angola – UNITA: DESERÇÕES SÃO “CORRUPÇÃO POLÍTICA”

 

Diário Angolano
 
Na mesma data em que Kamalata Numa escreveu uma proclamação política de candidatura à presidência da UNITA na qual realça o espírito fundador de Muangai, o secretário-geral da UNITA, Vitorino Nhany, conduziu uma conferência de imprensa colocando a tónica nas “deserções” do partido.
 
“Os quadros inúteis na UNITA são aproveitados pelo partido no poder, isso não se chama deserção, chama-se corrupção política”, disse Vitorino Nhany, na linha de Isaías Samakuva que recentemente exortou os seus companheiros a saírem do partido, se essa for a sua vontade.
 
Deserções, dissidências e suspensões foram expressões muito ouvidas numa altura em que a situação de Nfuca Muzemba, secretário-geral da JURA, o braço juvenil da UNITA, continua indefinida quase um mês depois de ter sido “preventivamente suspenso” por um prazo não superior a oito dias, acusado de violar os estatutos do partido e de corrupção activa e passiva. Kamalata Numa, também em rota de colisão com o presidente Samakuva, diz no documento do passado dia 19: “A camada superior da classe média sempre traiu os aliados de luta e é o que está a acontecer também aqui em Angola!” Numa considera que o partido deve ir ao encontro da classe média, “conquistá-la e transformá-la em força principal na condução da Revolução Democrática”.
 
Mas Vitorino Nhany não ficou atrás em pureza ideológica, atirando para os jornalistas uma clássica citação marxista: “temos de resolver o aspecto principal da contradição principal”, considerando “secundárias” as actuais contradições no seio do seu partido. Mas foi em latim clássico que o secretário-geral da UNITA informou que o mês de reflexão lançado por Isaías Samakuva tem por lema “quo vadis Angola”.
 
Jornal de Angola, 22 de agosto de 2013
 
Leia mais em Diário Angolano

O IRÃO PODE SER A MAIS REFINADA HERANÇA DE OBAMA

 

Melkulangara Bhadrakumar [*]
 
O presidente Barack Obama está a estabelecer um novo precedente na história da América como potência imperialista.

Ele está quase a desculpar-se antes de ordenar um ataque militar contra um país soberano com o qual os Estados Unidos não estão em guerra e que não ofendeu nem remotamente interesses e preocupações vitais da América.

A administração Obama publicita antecipadamente que os EUA farão um ataque militar "limitado" à Síria. Desejou mesmo informar previamente quando se pode esperar o referido ataque – mais provavelmente na quinta-feira. Quem poderia por em dúvida que Obama é um estadista humano e respeitoso?

Por ataque "limitado", Obama quer dizer que não atacará directamente paióis de armas químicas mas apenas os seus "sistemas de entrega", o que significa a Força Aérea Síria e as unidades do Exército capazes de efectuar um ataque com a arma química. Na verdade, os que estiverem no comando das forças armadas do país, e portanto nos sistemas de "comando e controle" das forças armadas sírias, também serão alvejados.

Em suma, o plano por trás do ataque "limitado" é degradar as forças armadas sírias. O objectivo político é claro. A administração Obama insiste em que não se trata de uma "mudança de regime". O que isso significa é que os EUA e seus aliados teriam esperança de que, ao ficarem sob a imensa pressão da morte e da destruição, as forças armadas sírias possam finalmente começar a questionar a qualidade da liderança do presidente Bashar Al-Assad, o que, por sua vez, podia levar a um golpe contra ele que não será uma "mudança de regime" e ainda assim uma "mudança de regime" suficiente.

A experiência do Iraque ensinou os EUA acerca da importância crucial de manter intacta tanto quanto possível as estruturas e instituições do estado – leia-se, as forças armadas, o establishment de segurança e a burocracia – num país mesmo quando o seu regime muda de mãos de acordo com a vontade americana.

O risco envolvido é grande porque, implícita a esta situação está tanto aquilo que "se sabe que se sabe" como o que "o que não se sabe e é desconhecido", como advertiu certa vez o antigo secretário da Defesa Donald Rumsfeld. Para citar a declaração à imprensa de Rumsfeld em Fevereiro de 2002: "Há saberes conhecidos; há coisas que sabemos que sabemos. Há incógnitas conhecidas, isto é, há coisas que agora sabemos que não sabemos. Mas também existem incógnitas desconhecidas – há coisas que não sabemos que não sabemos".

Rumsfeld falava então no contexto do Iraque, onde o seu prognóstico era que os principais perigos da confrontação vinham das "incógnitas desconhecidas", que eram ameaças de Saddam, as quais eram completamente imprevisíveis.

Isto é suficiente para dizer que está muito longe de ser claro se a administração Obama terá êxito em alcançar seu objectivo, porque só "o que é sabidamente conhecido" na Síria é que é substancial. Mas o que está claro num sentido muito mais vasto e profundo é o seguinte.

Primeiro: este movimento para atacar a Síria decorre de um plano mestre que os EUA (e a NATO) pretenderam desde o princípio que não existia. A arte da dissimulação foi aperfeiçoada ao ponto supremo. Os EUA fizeram uma viragem abrupta em relação ao caminho que conduzia a Genebra 2 sem se incomodarem sequer a explicar porque, enquanto unilateralmente concluíam sem qualquer evidência concreta que o governo sírio deveria ser considerado como responsável pelos mais recentes ataques com armas químicas perto de Damasco.

Segundo: quando os tempos são difíceis, os EUA unem seus aliados e formam uma "coligação de vontades". A desordem que terá havido entre por um lado os EUA e por outro seus aliados do Golfo Pérsico (e Israel) sobre a mudança de regime no Egipto afinal de contas foi apenas uma pequena altercação entre vendedores num mercado de peixe. Quando surge a necessidade e chega o momento, eles infalivelmente movem-se juntos como uma alcateia de lobos.

Terceiro: os EUA interpretam unilateralmente o direito internacional e não tem estados de alma quanto a lançar ataques militares sem um mandato do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Se bem que praticando uma democracia, a qual esposa os valores da democracia "inclusiva", as administrações estado-unidenses actuam sem considerar a opinião pública interna. Segundo inquéritos de opinião nos EUA, nem mesmo dez por cento do povo americano quer que o seu país seja envolvido por qualquer meio na guerra civil da Síria.

Quarto: Obama tem estado a lançar poeira nos olhos da opinião pública mundial ao criar a impressão de que não haverá mais "Afeganistões" e "Iraques" e que ainda cambaleia de sofrimento quando mais um saco de cadáver chega da guerra afegã e tem de assinar a carta de condolências à família enlutada. A invasão estado-unidense do Iraque resultou na morte de centenas de milhares de civis inocentes. Mas isso não deixa nenhuma cicatriz na sensibilidade de Obama.

Contudo, a mais profunda lição resultante de tudo isto desde quando os EUA começaram a contagem decrescente do ataque à Síria está alhures. Por que a Síria, por que não a Coreia do Norte?

A resposta é clara. Como os analistas militares da CNN se esforçam por explicar, isto vai ser uma operação militar que não incorre em riscos de baixas estado-unidenses. O ataque à Síria será encenado a partir do mar azul com mísseis de cruzeiro – nem mesmo aviões tripulados por pilotos dos EUA por temor de que sejam abatidos.

Os analistas americanos explicam que as forças armadas sírias já estão super-tensas após dois anos de combate aos rebeldes por todo o país. Eles assinalam que a Síria nem mesmo pôde retaliar contra repetidos ataques aéreos israelenses – algo impensável há apenas um par de anos.

Em suma, a Síria não tem poder dissuasor. É aqui que Kim Il-Sung e Kim Jong-il demonstraram ser líderes visionários. Eles deixaram como herança à actual liderança de Kim Jong-un em Piongiang um poder dissuasor que fará a administração Obama pensar não duas vezes mas várias vezes antes de lançar um ataque militar contra a Coreia do Norte. É exactamente aqui que o pai de Bashar parece ter vacilado.

Agora, isto para o Irão torna-se uma peça dramatúrgica com uma moral. Naturalmente, o regime iraniano respeita com muita seriedade os decretos islâmicos (
fatwas ) transmitidos pelo seu Líder Espiritual e Supremo Líder no sentido de não iniciar um programa de armas nucleares. Mas, será sábio assim fazer?

Afinal de contas, temos de estar vivos antes de podermos pensar na observância de decretos islâmicos – mesmo os persas. A questão é: o iminente ataque dos EUA à Síria deveria ser uma campainha de despertador para o regime iraniano – alertando-a para a luta existencial que está pela frente.

Como poderá Teerão considerar seriamente a palavra de Obama? Só na semana passada emergiu oficialmente dos materiais de arquivo dos EUA que o golpe de 1953 contra Mohamed Mossadeq foi uma operação da CIA; e que os horrendos ataques com armas químicas das forças de Saddam Hussein foram efectuados com dados cruciais de inteligência provenientes da CIA.

Alguma coisa realmente mudou sob Obama? A liderança iraniana precisa ponderar calmamente e colectivamente.

Seja qual for o resultado do iminente ataque dos EUA à Síria, o qual está destinado a ter trágicas consequências, Teerão deveria tomar uma decisão crucial para salvaguardar-se contra tal agressão. O único meio com que pode fazer isso será tendo o poder dissuasivo que a Coreia do Norte possui, o qual mantém os predadores à distância.

A opinião pública mundial entenderá. Os mansos também têm direito moral a defenderem-se – ainda que estejam longe de herdarem a terra como Deus profetizou. Conceda ser isto a mais refinada herança a ser deixada pelo presidente Obama – um Irão nuclear.
 
Ver também:
 

ELEIÇÕES ALEMÃS 2013: QUE QUESTÕES EUROPEIAS VÃO A VOTOS?

 


Linkiesta, Milão – Presseurop – imagem Christo Komarnitski
 
Apesar da vitória de Angela Merkel parecer garantida, as eleições alemãs têm muito a dizer-nos. De facto, os resultados deverão dar resposta a muitas questões em aberto sobre o futuro da economia e das instituições europeias.
 
 
Desde o início da crise da zona euro, as eleições federais alemãs são o acontecimento mais esperado de todos – excetuando, talvez, o Conselho Europeu de junho de 2012. O dia 22 de setembro, data do escrutínio alemão, poderá ser um ponto de viragem na crise do euro.
 
A Comissão Europeia diz-se tranquila. Os bancos de investimento, por seu lado, acreditam na vitória de Angela Merkel mas mantêm-se prudentes. Porque existem quatro incógnitas: a união bancária; o crescimento na zona euro; o futuro da Grécia e o futuro da moeda única. Todas estas questões passam por Berlim.
 
Angela Merkel é dada como vencedora. Segundo as últimas sondagens, realizadas pelas empresas Emnid, Forschungsgruppe Wahlen e Infratest dimap, o partido da chanceler, a União Democrata Cristã (CDU), obterá mais de 40% dos votos – enquanto o seu adversário do Partido Social-Democrata (SPD), Peer Steinbrück, conseguirá cerca de 25%. Tem, por isso, uma margem de segurança considerável.
 
Segundo o Deutsche Bank, “a vitória de Merkel é um dado adquirido”. Morgan Stanley partilha este ponto de vista. Até maio passado, o banco pensava que assistiríamos a uma grande liquidação na zona euro após as eleições alemãs. Se mudou de opinião, apesar da fragilidade dos alicerces na região, é porque a liquidez continua a afluir aos mercados financeiros mundiais, graças à Reserva Federal, ao Banco do Japão e ao Banco de Inglaterra.
 
A nova ordem monetária – feita de expansão quantitativa, de taxas de juro baixas e de medidas extraordinárias – poderá vir a ser benéfica para a Alemanha e, consequentemente, para a zona euro. Além disso, os investidores não se entregarão, necessariamente, a enormes vendas após 22 de setembro.
 
Reformas a passo de caracol
 
Nos corredores das instituições europeias reina a tranquilidade. Um funcionário da Comissão declarou ao Linkiesta: “Toda esta euforia a propósito das eleições alemãs só existe para os jornalistas. O caminho com que a UE se comprometeu para sair da crise está traçado e claramente definido”. Por outras palavras, mesmo em caso de vitória de Steinbrück, muito pouco mudaria porque “o objetivo continua a ser o de uma Europa e de uma zona euro mais sólidas do que nunca”.
 
O mesmo funcionário reconhece que houve, é certo, “diversos erros cometidos durante a conceção do euro”, mas afirma que ao seguir o caminho com que se comprometeu em 2011, com a criação do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF), a UE conseguirá “melhorar o conjunto do sistema até ao fim da década”. E será realmente assim?
 
A nova arquitetura europeia ainda parece deixar muito a desejar. A atual paralisia dos mercados financeiros deve-se às operações conduzidas pelo Banco Central Europeu (BCE) durante o ano passado. E diz respeito, especialmente, à criação das operações monetárias sem reservas (OMT), as operações de aquisição de títulos do Tesouro no mercado obrigacionista secundário para apoiar os países sob pressão. Mas dois hedge funds, o londrino Brevan Howard e o americano Bridgewater, defendem que as eleições alemãs marcarão um ponto de viragem na crise. Uma má viragem.
 
Para o Brevan Howard, uma vitória de Merkel irá abrandar o processo de reforma da zona euro. Um receio compreensível, se olharmos ao passo de caracol a que caminham as reformas destes últimos dois anos. A culpa é do Bundesrat, o Conselho Federal alemão, que tem de aprovar todas as despesas administrativas da Alemanha, incluindo as contribuições para os fundos de resgate dos Estados, o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE).
 
Sustentabilidade grega é uma miragem
 
As questões por resolver continuam a ser várias. A primeira é a da união bancária. Ou melhor, de um sistema que colocará os bancos da UE sob a supervisão do BCE. O objetivo é evitar os choques ligados às posições opacas, parcialmente protegidas pelas autoridades financeiras nacionais. Tão indispensável como é lenta a sua concretização, a união bancária tem ainda de ultrapassar duas dificuldades: as reticências dos bancos alemães em serem colocados sob o controlo do BCE e as diversas dúvidas de Berlim quanto aos fundos de garantia dos depósitos bancários. E são precisamente esses dois aspetos que poderão, brevemente, suscitar os principais diferendos entre a Alemanha e os outros membros da zona euro.
 
A segunda grande dificuldade é a do reequilíbrio entre o centro e a periferia da zona euro. Cabe igualmente a Berlim encontrar um novo modelo de desenvolvimento para a zona euro, em especial para combater aquilo que os economistas consideram como uma verdadeira praga: o desemprego.
 
E depois, há também a Grécia. A sustentabilidade da sua dívida soberana ainda é uma miragem, e há cada vez mais vozes que se levantam para dizer que uma nova reestruturação também o é. Desta vez, o “haircut”, ou dito de outra maneira, a desvalorização do valor nominal das obrigações da carteira, atingiria os credores institucionais. O corte abrangeria, assim, 70% das obrigações da Grécia – correspondente à parte detida pelas instituições, do BCE ao Fundo Monetário Internacional (FMI). […]
 
Por fim, a última grande questão: como repensar a zona euro? Se, por um lado, a união bancária pode constituir uma etapa importante para a futura estabilidade financeira, por outro, a prioridade é rever a estrutura, e talvez a composição, da zona euro. Isso implica igualmente uma revisão profunda das instituições europeias e uma eventual transferência de soberania dos Estados-membros. O problema, nesse caso, será convencer os contribuintes alemães.
 
Uma tarefa difícil após o resgate da Grécia, da Irlanda, de Portugal, de Chipre e dos bancos espanhóis. Dito isto, nestes últimos meses, Angela Merkel parece gozar de uma aura bastante maior do que no passado. Será suficiente para fazer dormir profundamente os investidores? Provavelmente não. A menos que Berlim decida verdadeiramente tomar a liderança, num gesto claro e decidido, de uma zona euro desorientada.
 
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UCRÂNIA: KIEV NUMA ENCRUZILHADA

 


Polska The Times, Varsóvia – Presseurop – imagem Kazanevski
 
Moscovo está a aumentar a pressão sobre Kiev, para evitar que a Ucrânia assine um acordo de associação com a União Europeia, que transmitiria uma mensagem clara de que o país quer sair da esfera de influência da Rússia. Mas até que ponto está realmente disposto a dar esse passo?
 
 
“A associação com a União Europeia irá contribuir para a formação da Ucrânia como um Estado europeu moderno”, assim falou o Presidente Viktor Yanukovich, no discurso do 22º aniversário da independência do país, a 24 de agosto.
 
E apesar de acrescentar de seguida que as boas relações com a Rússia também eram vitais, a própria sequência em que mencionou as questões manifestava claramente de que lado sopra o vento em Kiev, por estes dias. Com uma população de 44 milhões de habitantes e um território que faz dele o maior país situado, na sua totalidade, na Europa, a Ucrânia enfrenta uma escolha histórica entre um acordo de associação com Bruxelas e um tratado alfandegário com Moscovo. Como os documentos propostos são mutuamente exclusivos, Kiev tem de tomar uma decisão estratégica. A não assinatura do acordo negociado com a União Europeia antes do final do ano fará congelar o processo de integração por vários anos, se não mesmo suspendê-lo por tempo indeterminado. Em termos práticos, isso significa que a Ucrânia terá escolhido o vizinho oriental para parceiro estratégico.
 
Não há acordo sem reformas
 
A União Europeia está disposta a assinar um acordo de associação, com três condições: que a Ucrânia reveja os regulamentos de defesa pública, adote um código eleitoral seguindo as recomendações do Conselho da Europa e resolva o problema da aplicação seletiva da lei. Tudo coisas ao alcance de Yanukovich – as duas primeiras podem ser rapidamente submetidas à Duma, dominada como está pelo seu Partido das Regiões; a terceira será considerada cumprida quando a antiga primeira-ministra, Yulia Tymochenko, for libertada da prisão, o que não é impossível, tendo em vista a anterior libertação do seu colaborador próximo, Yuri Lutsenko, no início deste ano.
 
Evidentemente, há que ter em conta que o líder ucraniano é imprevisível e pode mudar de ideias a qualquer momento. Mas, por agora, parece realmente determinado a fechar negócio com a União Europeia no próximo outono.
 
“A não ser que ele mude de ideias, o acordo de associação deve ser assinado em novembro”, disse o deputado Paweł Zalewski (Plataforma Cívica), especialista em assuntos ucranianos, ao Polska Times. Contudo, frisou, a Rússia vai tentar minar o processo.
 
“Moscovo vai tentar criar uma atmosfera de tensão e de confronto, na esperança de que, mesmo que a Ucrânia consiga aguentar-se, a União Europeia não consiga suportar a pressão”, declarou o deputado Paweł Kowal (A Polónia Está Primeiro, de direita), que liderou a missão de acompanhamento do Parlamento Europeu à Ucrânia durante as eleições gerais de 2012.
 
Moscovo já iniciou o processo de “amaciamento” da Ucrânia. A comunidade cultural e civilizacional dos dois países foi destacada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, que visitou Kiev para participar nas celebrações do 1025º aniversário do batismo de Kievan Rus. No entanto, a visita não teve o impacto esperado, pelo que Moscovo substituiu a cenoura pelo pau, dando início a uma guerra comercial, com bloqueio à importação de determinados bens ucranianos.
 
Uma repetição da Geórgia?
 
A crise aduaneira foi resolvida em relativamente pouco tempo, principalmente com a ajuda da União Europeia, mas muitos especialistas acreditam que isto foi só o começo. Pavel Nuss, dirigente da Associação Cívica para a Salvação da Ucrânia, sugeriu recentemente que a Rússia irá encetar tentativas de desestabilização da Ucrânia, já em setembro, utilizando os seus agentes influentes para incitar os ucranianos contra a tendência para a Europa. “Há uma forte probabilidade de o conflito se transformar em guerra”, escreveu Nuss, ao evocar a invasão russa da Geórgia em 2008, poucos meses depois de a Cimeira de Bucareste definir que a Geórgia e a Ucrânia acabariam por ser admitidas na aliança militar ocidental. Mesmo que o Kremlin não vá tão longe neste momento, não se podem descartar grandes provocações, como o corte do fornecimento de gás. Na verdade, a Rússia já usou a “arma do gás” contra a Ucrânia, por duas vezes: em 2006 e 2009.
 
Outro cenário possível é a Rússia tentar garantir que as eleições presidenciais na Ucrânia, em 2015, sejam ganhas por um candidato da sua confiança. “O próximo Presidente poderia, então, revogar o processo de associação”, sugere Paweł Zalewski.
 
“A Ucrânia não é o único país a sentir a pressão a aumentar. A Rússia também tem estado a pressionar a Arménia e a Moldávia, no sentido de esquecerem qualquer acordo com Bruxelas”, comenta o deputado Jacek Saryusz-Wolski (Plataforma Cívica), vice-presidente da Euronest, a componente parlamentar da proposta Parceria Oriental, composta por membros do Parlamento Europeu e dos parlamentos dos países do Leste Europeu.
 
Os últimos meses que antecedem a cimeira da Parceria Oriental, a realizar em novembro, deverão ser marcados por um crescente conflito diplomático. A Polónia será um dos principais palcos, porque é o Estado que tem maior interesse no êxito do acordo União Europeia-Ucrânia. Os russos sabem disso, pelo que não é impossível que tentem enfraquecer a posição política do Governo polaco nas negociações finais. O Kremlin já provou a sua habilidade para pôr os políticos polacos uns contra os outros em várias ocasiões; a mais recente foi em abril, quando um ministro polaco foi demitido devido a um memorando sobre gás, assinado com a Gazprom.
 
Visto da Ucrânia
 
Nenhum sinal de degelo na guerra fria com a Rússia
 
Os controlos aduaneiros aplicados durante uma semana inteira, este mês, foram introduzidos no dia 14 de agosto pela Rússia e visavam as importações de bens ucranianos. Esta sanção, que criou filas enormes nas fronteiras rodoviárias e ferroviárias, não convenceu Kiev a afastar-se da Europa, escreve o jornal ucraniano Den.
 
O bloqueio, que pretendia dissuadir a Ucrânia de assinar um acordo de associação com a UE e fazê-la aderir a uma união aduaneira com a Rússia deu origem a várias queixas, incluindo uma da Comissão Europeia, que considerou as táticas utilizadas como “inaceitáveis”.
 
Viacheslav Yutkin, o presidente do conselho de administração do Prominvestbank, revela ao Den:
 
Penso que este tipo de ação não vai incentivar, de forma alguma, a Ucrânia a aderir à união aduaneira. Pelo contrário, pode provocar uma reação inversa e prejudicar a Rússia. Acho que a maioria dos russos partilha o meu ponto de vista, uma vez que este conflito comercial mostra o que não deve ser feito e está a assumir uma postura errada. Todos os sinais apontam para uma “guerra”.
 
Para o jornal de Kiev, a intimidação russa está condenada ao fracasso porque se a Ucrânia virasse as costas à UE, provocaria uma crise política no seio do país e o [Presidente Viktor Yanukovych] deixaria de ter qualquer hipótese de ganhar as eleições presidenciais.
 
Entretanto, o jornal adianta que os meios de comunicação russos preveem que, se o conflito continuar, o serviço de imigração russo poderá recorrer à expulsão em massa de trabalhadores ucranianos.
 
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