quinta-feira, 30 de abril de 2015

Portugal. VITÓRIAS PERMANENTES E DERROTAS PONTUAIS, por Zillah Branco*



Zillah Branco*

Os que lutaram, através de dezenas de anos, pelo fim da ditadura fascista em Portugal, enfrentando uma dura realidade de sacrifícios e perseguições políticas que impediram a fruição da vida familiar e profissional se houvesse liberdade social no país, certamente hoje se ressentem da "derrota" sofrida pela Revolução dos Cravos que floresceu em 1974.

Em menos de um ano, sob os Governos dirigidos por Vasco Gonçalves, foram abertos os caminhos iniciais de um processo democrático e de dignificação patriótica pela esquerda organizada: fim da colonização, reforma agrária, apoio aos pequenos e médios produtores, nacionalização da banca e das empresas fundamentais ao Estado, legislação em função dos direitos dos cidadãos, organização sindical, legislação trabalhista, escola pública, saúde pública, previdência social, salário mínimo e férias, que se compunham com a defesa ampla da liberdade de expressão, da defesa dos direitos de igualdade social entre homens e mulheres, proteção aos idosos e crianças, combate aos preconceitos raciais e de classe.

Durante este tempo o Partido Socialista, que se apresentara inicialmente como parceiro do PCP, bandeou-se para o combate ao comunismo sob a influência norte-americana e alemã (representadas por Kissinger e Helmut Kohl) e dividiu os militares que haviam dado o golpe fatal à ditadura marcelista. A direita sentiu-se fortalecida para sair das cinzas do fascismo, criou grupos terroristas como o ELP e outros com vestimentas multicoloridas de esquerda radical anti-comunista que serviram de ponta de lança para criar desordens e confundir a população recém saída de um longo período de repressão. A reboque do medo instilado naquele ambiente de liberdade, exigiram uma primeira eleição que os colocou à frente do Governo onde bloquearam as decisões democráticas.

As reformas começaram com a devolução das nacionalizações ao capital privado e estrangeiro, com o fim da reforma agrária e compensações aos proprietários do latifúndio absentista, com a redução do apoio aos serviços sociais. O Governo ficou entregue ao PS que passou a alternar os seus programas com o PSD que o sucedia, dando início na década de 80 à submissão ao projeto da União Europeia de centralizar o governo continental por meio da criação de um Banco Europeu e da moeda única, o Euro. Aos poucos a UE estendeu os seus tentáculos sobre as nações europeias substituindo os seus governos nacionais por verdadeiros "interventores" eleitos pelos povos agora conduzidos por uma imprensa anti-revolucionária, que despejou a cultura norte-americana disfarçada em europeia, para alimentar a fome de conhecimento de uma população que preparada para ser consumista podia comprar televisões e outros apetrechos da modernidade.

No início do século XXI desaparecera o ambiente de luta popular pelas conquistas de Abril, por um desenvolvimento nacional em que o povo era o principal sujeito, motor da produção nacional e da defesa da dignidade patriótica. Reduziu-se o espaço da liberdade com a imposição do modelo europeu de grandes superfícies de mercado e extensas estradas absolutamente inadequadas à vida nacional mas que favoreciam a entrada dos produtos e turistas vindos dos países ricos. O povo, este ficou à espera de algum emprego para os mais velhos, mandando os jovens para a emigração, vivendo nas velhas casas onde cuidam dos netos sem amparo social. Floresceram os agentes da prostituição internacional, do tráfico de drogas e da corrupção dos políticos com poder público. Sentiu-se o peso da derrota.

Os sociais-democratas de turno no governo, sendo eleitos com o apoio dos grupos económicos europeus e os órgãos de informação social orientados para selecionar temas de debate ou entrevistas com base no anti-comunismo ditado pelo Clube de Bildenberg onde são escolhidos os candidatos interventores na política nacional, passaram a esbanjar riquezas em obras faraónicas e a tolher o desenvolvimento de Portugal. O povo, levado pelo cabresto mediático e pelo medo de perder o emprego e a liberdade anunciada  em tempos de revolução, votou nos que vestiam a capa do socialismo.

O Estado foi subordinado aos apadrinhados dos interventores que, abdicando de pensar em português foram contratar assessores estrangeiros para ditar modelos de conhecimento da realidade e de condução ao enriquecimento de uma elite superior que bebe o saber junto ao Conselho da Europa e FMI. Começaram a venda ao desbarato o património nacional, inclusive as velhas construções de Lisboa e os recantos aprazíveis do Alentejo e Algarve, e a privatização dos serviços sociais. A soberania nacional foi oferecida como brinde aos assessores que, para serem contratados, o país pediu créditos que o conduziram à bancarrota. A história do BES, com todo o malabarismo para roubar os contribuintes, estendeu-se a outras instituições. Temos um ex-primeiro ministro preso por crimes de peculato e improbidade administrativa, mas os outros vestiram-se de defensores de Abril em ano de eleições.

A vitória da Revolução dos Cravos, no entanto, prossegue o seu curso histórico no mundo. Como todas as revoluções, desde a revolta de Espártaco, antes da Era Cristã, e depois a Revolução Francesa que se manteve por 15 anos, a Comuna de Paris que durou semanas, a Revolução Soviética que aguentou quase 80 anos, a da China, a do Vietnam, a de Cuba, todas semearam conquistas que alteraram a história mundial fazendo avançar a humanidade contra o poder de uma elite que tem o poder do capital. As revoluções não morrem, deixam as brasas sob as cinzas da destruição causada pela ambição capitalista. Uma lufada de ar livre reacende o movimento histórico com a sua força imbatível.

A Revolução de Abril deixou em Portugal o sentido da justiça social gravado na Constituição e nas leis sociais do trabalho e da segurança social que os interventores da União Europeia fazem tudo para enterrar. Poucos são os países que têm sindicatos da polícia e que o movimento sindical reúne operários, professores, artistas, médicos, funcionários públicos, juízes, pescadores, trabalhadores rurais, enfermeiros e todas as categorias de trabalhadores unidos nas reivindicações. A força revolucionária de Abril está viva e recebe a solidariedade de outros povos que cultivaram as sementes de 1974. A dignificação do trabalho, a defesa patriótica, formou a mentalidade popular com os valores políticos de esquerda que sempre está ao lado dos que sofrem e lutam pela sobrevivência de uma sociedade justa.

O importante é perceber quem vestiu a pele do revolucionário como o lobo a do cordeiro. Tornou-se hábito falar em democracia como um modelo a ser aplicado sobre a sociedade capitalista que mantém a estrutura de exploração de uma elite privilegiada sobre os que trabalham. Os Estados Unidos, que lidera o poder imperialista, escolheu um negro para Presidente demonstrando a ausência de preconceitos para ganhar os votos da população mestiça que predomina no seu território e elevou. Nada mudou na sua política de invasões e destruição para espoliar os povos indefesos, a miséria invadiu as casas da classe média norte-americana e a revolta dos jovens foi liderada pelo terrorismo que a CIA espalhou como modelo nas sociedades árabes para quebrar a sua estabilidade mantida pelos princípios tradicionais.

Na comemoração do 25 de Abril no Parlamento Português, os partidos de direita louvaram a Revolução dos Cravos substituindo o sentimento impregnado pela participação do povo pela "inteligência e eficiência" que julgam ser os únicos que as têm. Típico complexo de superioridade de uma elite que está longe de conhecer a realidade do seu povo expressa pelos políticos de esquerda. Vestirão a pele revolucionária para quem não conhece a falta de ética e de patriotismo que procuram ocultar. "Cuidado com as imitações!" 

* Zillah Branco (na foto) Cientista Social, consultora do Cebrapaz. Tem experiência de vida e trabalho no Brasil, Chile, Portugal e Cabo Verde.

Portugal. EX-DIRETOR DO MAI ACUSADO EM PROCESSO DE CORRUPÇÃO




O processo em causa parte da investigação a adjudicações em obras públicas. O Ministério Público deduziu acusação contra 12 arguidos, um deles é o ex-diretor-geral do Ministério da Administração Interna que estava em prisão preventiva há um ano.

A revelação é feita pela Procuradoria-Geral da República que em comunicado explica que "aos arguidos foram imputados, na acusação, vários crimes de corrupção ativa e passiva, participação económica em negócio, branqueamento, abuso de poder e falsificação de documento. Entre os acusados encontra-se um ex-diretor-geral de Infraestruturas e Equipamentos do MAI.

O ex-diretor-geral de Infraestruturas e Equipamentos do MAI João Alberto Correia, detido a 29 de abril de 2014, a quem foi aplicada a prisão preventiva como medida de coação, há um ano, a 01 de maio, pelo juiz Carlos Alexandre, depois de ouvido no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), fica agora sujeito a prisão domiciliária, com pulseira eletrónica.

"Em síntese, ficou indiciado que os arguidos atuaram concertadamente no sentido de beneficiar determinados empresários, mediante a adjudicação de contratos públicos em violação das normas da contratação pública e em prejuízo do princípio da livre concorrência", explica a nota da PGR.

O mesmo comunicado adianta que a investigação concluiu que, da conduta dos arguidos agora acusados, resultaram "prejuízos financeiros ao Estado, superiores a 909.660,98 euros".

"Os valores cobrados foram intencionalmente inflacionados, de modo a permitir a obtenção de mais-valias indevidas para os arguidos, incluindo o ex-director-geral da Direção-Geral de Infraestruturas e Equipamentos (DGIE)", refere a PGR, que acrescenta que o Ministério Público pediu indemnização para "reparação dos prejuízos causados ao erário público".

Das buscas no decurso do inquérito resultaram apreensões de "grande quantidade de documentos", nas instalações da DGIE.

Foram também inquiridas cerca de 70 testemunhas numa investigação que contou com o apoio da Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária.

TSF

Portugal. PILOTOS DA TAP MANTÊM GREVE DE DEZ DIAS




Representante do sindicato dos pilotos culpa Governo e administração da TAP. Hélder Santinhos lamentou, em conferência de imprensa, que trabalhadores tenham sido “obrigados” a parar.

A esperança de uma suspensão da greve dos pilotos da TAP não se tornou realidade. Apesar de uma reunião de última hora entre sindicato e administração, a paragem mantém-se.

“Os pilotos lamentam ter sido obrigados pelo Governo e pela TAP a chegar à greve”, disse o representante sindical Hélder Santinhos em conferência de imprensa, acrescentando que “a responsabilidade do estado atual não é dos trabalhadores”.

“Ao fim de três meses, o SPAC verificou que as negociações eram um logro”, diz o sindicato dos pilotos e afirma: “Não podemos aceitar uma redução dos nossos salários”.
Os representantes dos pilotos acusam a TAP de não dar “contrapartidas suficientes” e de “fazer concessões que não são simétricas para toda a gente”.

Apesar da falta de acordo, sindicato garante que a companhia vai sobreviver: “A TAP é um tesouro que vai ser preservado”, conclui Hélder Santinhos.

Notícias ao Minuto

Guiné-Bissau. MINISTÉRIO DA SAÚDE DESMENTE SUSPEITA DE ÉBOLA




O responsável pediu o reforço dos "níveis de prevenção e de higiene"

O director-geral de Saúde da Guiné-Bissau, Nicolau Almeida, desmentiu esta quinta-feira a existência de casos suspeitos de Ébola no país, concretamente na região de Tombali, que faz fronteira com a Guiné-Conacri.

"Dadas as informações que estão a ser veiculadas sobre a existência de casos da doença pelo vírus Ébola na Guiné-Bissau (...), o Ministério da Saúde Pública informa que, até à data, não existe nenhum caso confirmado ou suspeito da doença no país", declarou Nicolau Almeida em conferência de imprensa, em Bissau.

O responsável reconheceu ser "fundamental manter os níveis de prevenção" e pediu o reforço dos "níveis de prevenção e de higiene".

Na última semana, o representante da Organização Mundial da Saúde (OMS) na Guiné-Bissau, Ayigan Koffi, afirmou ter a sensação de que existe "um certo relaxamento" em termos de medidas de prevenção do vírus Ébola no país, referindo que em certos locais públicos já não há baldes de água para a lavagem das mãos e se existirem esses dispositivos a população nem sequer se dá ao trabalho de os utilizar.

Afirmou ainda que em certos casos há baldes com água, mas já não existe lixivia nem sabão para a lavagem das mãos.

O director-geral de promoção da Saúde guineense não comentou as afirmações do representante da OMS.

Lusa, em jornal i

Ânimos exaltados na corrida à presidência da Câmara do Comércio da Guiné-Bissau




A Câmara de Comércio guineense vai a votos a 10 de Maio. O presidente cessante Braima Camará e o empresário Braima Canté são, para já, os candidatos confirmados. O empresário Mama Saliu Lamba deixou a corrida à presidência e ameaçou criar uma nova Câmara de Comércio.

O empresário guineense Mama Saliu Lamba anunciou, esta quinta-feira, que já não vai concorrer à liderança da Câmara de Comércio, Indústria, Agricultura e Serviços (CCIAS) e admitiu criar uma nova instituição por discordar da forma como o presidente cessante, Braima Camará tem dirigido a câmara.

Saliu Lamba, o actual vice-presidente da CCIAS para as relações internacionais, acusou Braima Camará de não prestar contas aos associados e afirmou que não vale a pena concorrer "tendo em conta que a câmara existente é politizada", apontando que "não há separação das águas". De recordar que Braima Camará é deputado ao Parlamento e um dos conselheiros do Presidente guineense, José Mario Vaz.

Saliu Lamba declarou, ainda, que "o sector privado guineense precisa de uma câmara interlocutora válida e credível que aceite prestar contas".

Em finais de fevereiro, Mama Saliu Lamba apresentou a sua candidatura em Bissau, enquanto o empresário Braima Canté a apresentou na vila de Safim, nos arredores da capital guineense. Saliu Lamba é empresário do sector dos combustíveis e Braima Canté dedica-se ao comércio da castanha do caju.

As eleições na Camara do Comércio serão no dia 10 de maio, como nos conta Mussá Baldé, correspondente em Bissau.

Senado da Guiné Equatorial prepara entrada na Assembleia Parlamentar da CPLP




Luanda, 28 abr (Lusa) - A presidente do senado da Guiné Equatorial, Teresa Asangono, está em Luanda para acertar a entrada formal daquele órgão na Assembleia Parlamentar da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (AP-CPLP).

O assunto está a ser abordado na capital angolana no âmbito de dois dias de reuniões dos grupos nacionais daquele órgão e que, entre outros assuntos, vão preparar a Assembleia Parlamentar da organização, agendada para este ano, no Brasil.

"Os vossos contributos, nem que seja neste primeiro contacto, a recolha de informações que possam permitir no futuro uma maior e melhor integração do parlamento da Guiné Equatorial na grande família que já passamos a ser a Assembleia Parlamentar da CPLP, ajudarão certamente a que se atinjam os objetivos da nossa organização", afirmou a primeira vice-presidente da Assembleia Nacional de Angola, Joana Lina.

A presidente do senado da Guiné Equatorial reuniu-se na segunda-feira, no arranque dos trabalhos desta reunião da AP-CPLP, com o presidente da Assembleia Nacional angolana, Fernando da Piedade Dias dos Santos, para abordar a formalização da admissão àquele órgão, bem como as relações bilaterais entre ambos os países.

"Falamos da formalização da participação da Guiné Equatorial na Assembleia Parlamentar da CPLP", disse, aos jornalistas, Teresa Asangono.

A Guiné Equatorial tornou-se em julho de 2014 no nono país a integrar a CPLP, comunidade formada ainda por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

Os grupos parlamentares dos sete países representados em Luanda - o Brasil está ausente destas reuniões - estão também a analisar as implicações legais resultantes da instalação do secretariado permanente daquele órgão em Luanda e o perfil do secretário-geral.

A agenda de trabalhos reserva para hoje o balanço da aplicação das recomendações da V reunião da AP-CPLP e a análise da proposta do Plano de Trabalho da organização para o período 2015-2017.

PVJ // JPS

Angola. O PONTO DA SITUAÇÃO DO CASO KALUPETEKA


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Folha 8 digital (ao) – 01 maio 2015

Comecemos por fazer o ponto da si­tuação.

Em 16 de Abril deste ano, sete polícias da Po­lícia Nacional de Angola (PNA), com patente, fo­ram barbaramente assassi­nados por fiéis da seita Sé­timo Dia a Luz do Mundo, em condições ainda hoje não esclarecidas. Além disso, dois outros polícias morreram dos seus feri­mentos alguns dias depois.

Esta tragédia aconteceu no Monte Sumi localizado a 25 quilómetros da cida­de de Caála, na província do Huambo, sul de Ango­la. Nesse local tinham-se reunido em um acampamento improvisado mais de 3.000 fiéis da referida seita, também conhecida pelo nome do seu líder supremo, o “profeta Kalu­peteka” que, entre outras ideias esquisitas, incitava vivamente os seus segui­dores a deixar as suas ca­sas e a segui-lo e a recusar qualquer forma de vaci­nação, fazendo notar que não valia a pena, porque o fim do mundo, terá lugar o mais tardar no final de 2015.

E assim tinham feito os que ali estavam no Mon­te Sumi, acampados em condições precárias, a “comer verduras” en­quanto esperavam calma e religiosamente o fim do mundo.

O profeta tinha calcado o risco. Um mandado de prisão foi emitido em seu nome e a PNA tinha-se deslocado ao simbólico mas verdadeiro lugar do culto para o prender e encarcerar.

Não vamos repetir aqui o que dizem as várias ver­sões sobre o caso, apenas aludiremos à relação ofi­cial que anuncia que nove polícias foram assassi­nados perto da cidade da Caála, ao que se junta uma referência lacónica à resposta imediata das forças policiais apoiadas pelas Forças Armadas Angolanas (FAA).

De facto, não obstante essas notícias terem re­velado que a operação foi muito musculada, elas não mencionavam o nú­mero de mortos do lado dos fiéis. De início não ha­via mortos, depois eram 13, enfim, passaram a ser 20 vítimas, escolhidas a dedo por terem participado directamente no assas­sinato dos polícias.

À parte este não rela­to dos acontecimentos, a mídia estatal apenas anunciou que o profeta Kalupeteka foi preso com seu filho e alguns dos seus seguidores. Nada mais, nem mesmo disse que o estado de sítio tinha sido declarado na região.

O que fica da versão da PNA

Vamos esquecer, até mais ampla informação, a ver­são não oficial, que indi­ca ter havido genocídio, poremos tudo em dúvida. Mas não podemos calar que durante 12 dias foi decretado um black-out total na região.

Isso é um facto indesmen­tível. Toda a zona do cul­to, monte do Sumi onde decorreu o drama e matas adjacentes, foram declara­das “Zona Militar”, onde ninguém tinha o direito de entrar, ninguém tinha o direito de sair. A rondar por cima do local giravam os helicópteros, a ameaçar, anúncios davam a saber que os que prevaricassem seriam mortos a tiro.

Outro facto indesmentível é a caça às bruxas con­tra os fiéis mais chegados ao “profeta Kalupeteca”, cujo desaparecimento, até à hora do fecho do nosso jornal, ninguém é capaz de explicar.

O que resta deste “Caso” é a opacidade, por um lado, a inexistência de um rela­tório exacto daquilo que se passou no terreno, o que poderia legitimar o re­curso ao argumento da le­gítima defesa, e, por outro, a questão levantada por um jurista da nossa praça no facebook. «Finalmente, o que há de perigo social num conjunto de indiví­duos que decide livremen­te abandonar a sociedade para embrenhar-se nas matas? Onde é que está a Lei que proíbe essa condu­ta? Ou também já inventa­ram o CRIME DE FUGA? Portanto, para um analista sem “contaminações po­lítico-partidárias” parece difícil perceber onde é que as autoridades se apegam para condenarem as ac­ções missionárias de José Kalupeteka».

Enfim, restam os resquí­cios mais que evidentes da incompatibilidade entre Kimbundus e Ovimbun­dus, o que nos valeu uma guerra de quase 30 anos, seguida de um calar de armas que não é paz e o perigo de caminharmos a passos largos para um genocídio como o que acon­teceu no Rwanda

Cada vez mais perto do Rwanda

*Rwanda: Na década de 1960, seguindo o processo de descolonização do pós­-Segunda Guerra, o terri­tório ruandês foi deixado pelos belgas. Em quase meio século de dominação, ódio entre as duas etnias transformara aque­la região em uma bomba prestes a explodir. Cer­cados por uma série de problemas, a maioria hutu passou a atribuir todas as mazelas da nação à popu­lação tutsi.

Angola: depois de múlti­plas escaramuças mortí­feras entre os três grandes Movimentos angolanos de libertação (FNLA; MPLA e UNITA), sobrou o anta­gonismo extremo entre os dois últimos que atingiu os píncaros do ódio e redun­dou numa guerra que du­rou 27 anos e era caracteri­zada por um antagonismo irredutível entre os chefes de duas etnias dominantes em território nacional, de um lado os Kimbundu, do outro os Ovimbundu.

*Rwanda: pressionados pelo revanchismo, os tut­sis abandonaram o país e formaram imensos campos de refugiados no Uganda. Mesmo assim, os tutsis e alguns hutus mo­derados organizaram-se politicamente com o in­tuito de derrubar o gover­no do presidente Juvenal Habyarimana e retornar ao país. Com o passar do tempo, esta mobilização deu origem à Frente Pa­triótica Ruandense (FPR), liderada por Paul Kagame. Tudo isto se passava gra­ças em boa parte a auxílio exógeno, a começar pelo das grandes potência oci­dentais.

Angola: os Kimbundo, du­rante os 27 anos que durou a guerra, não conseguiram eliminar os Ovimbundo, tendo mesmo estes últi­mos ocupado e, por assim dizer, fundado um Estado independente dentro de um espaço territorial de mais de 3/5 do território de Angola. Mas, no seio da comunidade dominada pelos Kimbundu, a incita­ção à violência e à destruição das tropas Ovimbun­du foi crescendo, graças em boa parte ao auxílio exógeno, a começar pelo de grandes potências, nomeadamente Rússia, Estados Unidos e Israel. 

*Rwanda: Em Outubro de1990 , a Frente Patriótica Rwandesa, composta por exilados tutsis expulsos do país pelos hutus com o apoio do exército, invade o Rwanda pela fronteira com o Uganda. Em 1993, os dois países firmam um acordo de paz – o acordo de Arusha. Cria-se em Ruanda um governo de transição, composto por hutus e tutsis.

Angola: no meio de uma guerra que se arrastava há quase 20 anos sem se poder ver luz no fundo do túnel.gerado por tanto sentimento hostil, em 1994 foi firmado um acordo de paz em Lusaka entre Kimbundus e Ovimbun­dus, a partir do qual se formou um Governo provisório de Reconciliação Nacional. Mas o acordo não foi teve força nem fundamentos práticos para resolver o conflito. *Rwanda: Na década de 1990, vários incidentes demarcavam a clara insus­tentabilidade da relação entre tutsis e hutus. No ano de 1993, um acordo de paz entre o governo e os membros do FPR não teve forças para resolver o conflito. O ponto alto des­sa tensão ocorreu no dia 6 de abril de 1994, quando um atentado derrubou o avião que transportava o presidente. Imediatamen­te, a acção foi atribuída aos tutsis ligados ao FPR.

Angola: A partir do início do século XXI, essencial­mente graças aos resulta­dos práticos do bilionário “Caso Angola Gate” e as preciosas ajudas de origem exógena, nomeadamen­te concedida por Israel e USA, a liderança Kimbun­du instalada em Luanda pôs em prática uma feroz caça ao homem no sul de Angola, que redundou na descoberta do paradei­ro, perseguição e matan­ça do chefe Ovimbundu. 

*Rwanda: A seguir à mor­te de Habyarimana, na cidade de Kigali, capital do Rwanda, membros da guarda presidencial or­ganizaram as primeiras perseguições contra os tutsis e hutus moderados que formavam o grupo de oposição política no país. A partir daí, com as tropas hutus treinadas e equipa­das pelo exército ruandês, os apelos à confrontação e à “caça aos tutsis” tor­naram-se mais explícitos, sobretudo a partir do mês de abril, em que se fez circular o boato de que a minoria tutsi planejava o genocídio dos hútus.

Angola: se antes de ins­taurada a paz em 2002, a palavra de ordem, gene­ralizada pela Intelligentzia do governo Kimbundo de Luanda, era a luta sem tréguas aos Ovimbundu (“Vamos mastigá-los”, vociferou um general nos ecrãs da TPA em pleno tempo de guerra). Depois veio a chamada paz. Uma vez instaurada, raríssimas foram as vezes em que um discurso do presiden­te Dos Santos não fizesse referência ao espectro da guerra que, para ele, em todo o caso, só poderá ser declarada pelo lado dos Ovimbundus. E, enquanto esse refrão é repetido ve­zes sem conta por outros altos dignitários do “governo”, a arraia-miúda e as forças da autoridade es­parsas por todo o territó­rio nacional, perseguem, maltratam, ameaçam e matam Ovimbundos, pe­rante o olhar indiferente do Executivo.


"Quando as seitas são benéficas para o MPLA, tornam-se bem-vindas", diz Rafael Marques




Em entrevista à DW África, o jornalista e ativista Rafael Marques falou sobre o caso do Huambo e criticou a ação das autoridades e a ausência de um inquérito para apurar o que se passou realmente.

Na província angolana do Huambo continua a haver mortes no contexto do caso Kalupeteka. De acordo com o site Maka Angola, cerca de 30 aldeões foram mortos na última segunda-feira (27.04) durante uma operação policial que procurava crentes da seita “Sétimo Dia - A Luz do Mundo”, liderada por José Kalupeteka. As informações sobre este caso são contraditórias, e há uma grande discrepância em relação ao número de vítimas. Também não existem ainda sinais de uma comissão de inquérito independente.

A DW África entrevistou Rafael Marques, jornalista e ativista angolano dos direitos humanos, que falou sobre a forma como o caso está a ser tratado.

DW África: Como é que se pode esclarecer definitivamente o que aconteceu?

Rafael Marques (RM): É importante em primeiro lugar afirmar que os números que estão a ser apresentados não são contraditórios. Os primeiros dados a que eu tive acesso, e eu falei com militares e agentes policiais que estiveram envolvidos na operação, apontavam para que no primeiro dia, poucas horas depois de terem iniciado o fogo, já havia mais de 200 mortos. Depende do que as pessoas estão a dizer: houve umas que tiveram os dados horas depois do incidente, outras que tiveram dias depois, e então os números foram crescendo, por isso é que eu não vejo uma contradição. É óbvio que para nós termos certezas sobre estes números é necessário que se faça uma investigação. Na minha modesta análise, uma vez que o Governo continua a impedir o acesso de membros da sociedade civil, jornalistas e outras figuras independentes, e até mesmo da população em geral à área sinistrada, é legítimo que as pessoas avancem os números que têm, porque o Governo controla a informação e diz que não houve massacre porque não permite que as pessoas lá cheguem.

DW África: A oposição, a sociedade civil e outros citam testemunhas entretanto não identificadas, provavelmente por medo de represálias. Como é que este caso pode deixar de ter um caráter de boato, e passar a ser tratado devidamente?

RM: As pessoas estão a tentar tratar a questão com seriedade. Eu, por exemplo, falei com muitas pessoas, mas eu não posso dizer que falei com a ministra A, com o agente da polícia B, com um membro da sociedade civil ou com o sobrevivente tal, porque isto oferece um grande perigo para estas pessoas. Há dias, por exemplo, os serviços de segurança começaram a fazer vistoria dos telefones dos soldados e dos agentes policiais envolvidos na operação para apagarem as imagens, e algumas destas imagens foram tornadas públicas.

Então as pessoas têm dados concretos, sabem os nomes. As pessoas que estavam fugidas nas matas estão a chegar a Luanda e a outros pontos do país, onde estão a falar, mas há um medo grande porque as operações de caça a membros da seita do Kalupeteka estão a estender-se por várias partes do país, sobretudo no centro-sul, onde a violência política tem sempre uma justificação, porque pode sempre ser apontada como sendo instigada pela UNITA, que durante muitos anos teve ali os seus principais bastiões.

DW África: As autoridades têm pautado a sua atuação por um postura ambígua, em que nalguns momentos mostram abertura e disponibilidade, e noutros barram a sociedade civil e a oposição. Como vê isso?

RM: Não é uma posição ambígua, é uma posição de controlo de poder. Naquilo que interessa o Governo demonstrar que até permite alguma abertura, assim o faz. Onde essa abertura entre em conflito com as suas más práticas, fecham. E a democracia não pode ter a vontade de um Governo abrir e fechar de acordo com o seu livre arbítrio.

DW África: A morte dos agentes da polícia coloca em causa a estrutura da polícia angolana no que diz respeito à força e competência, e ela é vista como um dos principais instrumentos de repressão em Angola. A resposta violenta da polícia neste caso é uma tentativa de repor a imagem e força deste órgão?

RM: É uma ação premeditada, e é uma ação pela qual os altos dirigentes da polícia nacional do Governo provincial do Huambo, e outros que estiveram envolvidos, tarde ou cedo deverão ser responsabilizados, e deverão ser chamados a prestar declarações sobre o seu envolvimento e sobre que tipo de ordens é que deram. Quando o Presidente falou concretamente que esta seita tem que ser desmantelada e que tem de haver caça, não explicou que não se devem perseguir as pessoas. Não está a haver da parte das autoridades quaisquer medidas para fazer um inquérito sobre o que correu mal nessa operação, e sobre como é que a polícia teve tanta liberdade para chacinar tantas pessoas da forma como o fez.

DW África: Relativamente à liberdade religiosa, que efeitos pode ter este caso para outras religiões consideradas ilegais pelo Governo angolano?

RM: Eu publiquei uma foto no texto sobre o Kalupeteka do secretário provincial do MPLA nas eleições de 2012, com vários líderes dessas seitas religiosas. Quando estas seitas são benéficas para o angariamento de votos, para a ascensão do poder político do MPLA, elas são muito bem-vindas e são usadas para esse efeito. Quando estas seitas se tornam desobedientes em relação ao poder político, aí já se tornam perigosas e já são apelidadas de fundamentalistas.

UNITA pede inquérito à ONU sobre as mortes no Huambo

O maior partido da oposição solicitou à Organização das Nações Unidas (ONU) a realização de um inquérito rigoroso e imparcial sobre as mortes na província do Huambo. A UNITA condenou os assassínios, o clima de terror que se instalou e as violações de direitos humanos que terão sido levadas a cabo pelas autoridades.

As declarações constam de um comunicado divulgado nesta quinta-feira (30.04), após uma reunião extraordinária do Comité Permanente da Comissão Política do partido.

A UNITA reforçou ainda que apesar de as autoridades governamentais do Huambo terem autorizado a visita dos deputados ao local do crime, esta acabou por ser impedida.

O comandante provincial do Huambo da Polícia Nacional, Elias Livulo, voltou a declarar que os confrontos entre a polícia e a seita “Sétimo dia – A Luz do Mundo” provocou a morte de 13 civis e de nove polícias, e desafiou a UNITA, que afirmou que o número de vítimas mortais foi de 1.080, a apresentar provas da sua acusação.

Nádia Issufo – Deutsche Welle

CASO KALUPETEKA É SINÓNIMO DOS PROBLEMAS DA IMPRENSA EM ANGOLA…




Diz secretária-geral do sindicato dos jornalistas

No domingo, assinala-se o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. A cobertura dos confrontos entre a polícia e a seita "A Luz do Mundo" é bom exemplo das dificuldades dos jornalistas angolanos, acha Luísa Rogério.

O dia 3 de maio é o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Nas vésperas, a ONG norte-americana Freedom House publicou um relatório que não é animador. A organização diz que 2014 foi o pior ano para a liberdade de imprensa da última década - globalmente, segundo a Freedom House, os jornalistas enfrentam pressões de várias frentes - dos governos, de grupos radicais, que usam radicais usam tácticas cada vez mais agressivas para intimidar os jornalistas, e dos próprios donos dos meios de comunicação.

Entre os países africanos de língua oficial portuguesa, Cabo Verde e São Tome e Príncipe foram os únicos países que a Freedom House classificou como livres. Moçambique e Guiné-Bissau são países considerados como "parcialmente livres" e Angola como "não livre".

A DW África conversou com a secretária-geral do Sindicato dos Jornalistas de Angola, Luísa Rogério, sobre o estado da liberdade de imprensa no país e sobre a cobertura mediática dos confrontos na província angolana do Huambo entre membros da seita "A Luz do Mundo" e a polícia.

DW África: Está preocupada com a questão da liberdade de imprensa em Angola?

Luísa Rogério (LR): Estou profundamente preocupada, porque a liberdade de imprensa em tempos idos era uma questão diretamente relacionada aos poderes públicos - ou políticos, se preferirmos. Agora, o poder económico e outros fatores fazem com que a liberdade de imprensa seja cada vez mais reduzida.

Pode haver [diferentes] níveis de liberdade de imprensa. Podemos falar de graus de liberdade de imprensa em Luanda. Mas na maioria das províncias essa tal liberdade gradual não se reflete, até porque falta um elemento fundamental, que é o pluralismo. Continua a haver uma concentração na maioria das províncias: os meios de comunicação social estão todos nas mãos do Estado. Então há um certo "acompanhamento" que faz com que estejamos muito preocupados a nível provincial com essa liberdade com muitas limitações. Ao fim e ao cabo, não sei se podemos falar sem constrangimentos de liberdade de imprensa em Angola.

DW África: Disse numa crónica no site Redeangola relativamente ao caso de Kalupeteka, que a falta de informação e a inacessibilidade do lugar dos confrontos para os jornalistas têm contribuído para aumentar a especulação. Há perspetiva para que esta situação mude brevemente?

LR: Até agora pelo menos não vejo nenhum sinal para que a situação mude a favor dos jornalistas e da transparência. Neste momento, estou no Huambo e ainda não fiz muitos contatos e não andei muito, mas pelas indicações que tenho a situação não mudou significativamente. Portanto, o silêncio e a cortina de penumbra em torno do caso contribuem para a especulação.

Houve muitos jornalistas que vieram ao Huambo. Mas pelo que sei, nenhum deles conseguiu obter qualquer informação de uma fonte oficial que permitisse destapar este véu que cobre o caso Kalupeteka. É um caso, que por si só é sinónimo de toda cobertura mediática e de como andamos.

DW África: Como avalia a forma de como este caso até agora tem sido tratado pela imprensa?

LR: Mau, mas não por causa da imprensa, mas precisamente por causa das péssimas informações. A imprensa não tem dados.

É necessário que estas fontes, que tem domínio da situação no terreno, nomeadamente o Governo provincial, as autoridades policiais e eventualmente os militares (não sabemos exatamente até que ponto o exército teve intervenção no caso), se abram e que digam o que realmente se está a passar. E além de falarem é fundamental que os jornalistas tenham acesso ao local, às vítimas e aos familiares. Porque a sensação que tenho aqui no Huambo é que existe um grande receio de comentar sobre o caso.

Guilherme Correia da Silva – Deutsche Welle

“ONDE HÁ DINHEIRO GOVERNO DE MOÇAMBIQUE CORRE ATRÁS”, justiça ambiental



Adérito Caldeira – Verdade (mz), em Tema de Fundo

A Justiça Ambiental não se cansa de alertar, e não é de hoje: a indústria extractiva, o agro-negócio, a barragem de Mphanda Nkuwa e o REDD contribuem negativamente para as mudanças climáticas. As precipitações extremas que ocorrem no planeta, Moçambique ainda se refaz das últimas cheias, são só um dos impactos. O Governo de Filipe Nyusi nos documentos propõe-se a “garantir a gestão e uso sustentável dos recursos do ar, da terra, da água e do subsolo” mas, no Moçambique real, intensifica a exploração do carvão mineral, a agricultura intensiva ocupa cada vez mais terra dos pequenos camponeses e a segunda hidroeléctrica do rio Zambeze está mesmo para ser construída.

“A questão de Mpanda Nkuwa é uma questão sem sentido nenhum, vai destruir o rio, vai destruir o delta (…) vai produzir energia para quê e para quem?” questiona Anabela Lemos, directora da organização não-governamental Justiça Ambiental, que há mais de uma década se bate por melhorar a consciência ambiental dos moçambicanos e pela conservação e gestão sustentável dos recursos naturais.

Em entrevista ao @Verdade, a ambientalista não tem dúvidas que a hidroeléctrica, além dos problemas ambientais que vai criar, “não vai dar energia nenhuma para o povo” mas antes é para fornecer energia aos grandes projectos que continuam a ser a prioridade do Governo.

Anabela Lemos acrescenta que Moçambique não tem falta de energia, “temos Cahora Bassa da qual vendemos a maioria da energia a África do Sul, e depois vamos comprá-la! Nós temos soluções de energias renováveis, temos de pensar na descentralização da energia. Nampula podia ser uma província completamente auto-sustentável com energia solar e de vento.”

A directora da Justiça Ambiental refere que em várias partes do mundo as grandes barragens estão a ser abandonadas. “No ano passado 74 barragens foram demolidas nos Estados Unidos da América”. A nossa entrevistada afirma que Mpanda Nkuwa não é economicamente viável e alerta, mais uma vez, que as mudanças climáticas vão causar uma pressão enorme nos rios, pois “vamos construir barragens para energia quando temos outras soluções para energia, a água é muito mais importante!”

“ProSavana é que não vai produzir comida”

Relativamente à produção de comida, segundo as estatísticas oficiais, Moçambique tem tido que importar cada vez mais alimentos. Anabela Lemos acredita que o sector familiar só não produz mais porque tem receio de que os alimentos apodreçam pois não há transporte para o escoamento da produção até aos mercados. Em relação aos grandes projectos de agricultura comercial, é peremptória: “Nós podemos perfeitamente ser auto-suficientes e sermos soberanos na nossa alimentação sem necessitarmos do ProSavana”.

A posição é secundada por Vanessa Cabanelas, também da Justiça Ambiental, que acredita que existe produção de alimentos e os camponeses sabem como produzir, mesmo com o agravamento das mudanças climáticas. “Para a questão da agricultura familiar mencionam que vão usar os extensionistas rurais, mas a extensão rural é falada há anos: porque é que não funcionou até hoje? Porque não há investimento para isso, porque não há uma vontade real de desenvolver a agricultura familiar. De aproveitar aquilo que há de bom e potenciar. Eles (os agricultores familiares) podem produzir, mas para que é que vão produzir mais neste momento, se produzem mais é para apodrecer. Não há mercados, não há vias de escoamento, não há condições, não há apoio, não há créditos. Como é que esta gente vai desenvolver?”.

Vanessa Cabanelas destaca também que o “ProSavana é que não vai produzir comida, vai produzir commodities para a exportação, portanto não vai alimentar ninguém”, e acrescenta que mesmo antes de estar em operação este megaprojecto agrário, do Governo de Moçambique, apoiado pelos Governos do Japão e do Brasil, já está a causar prejuízos aos moçambicanos. “O que não estamos a ver é os custos de todos estes estudos e consultorias que estão a ser feitos, de onde vem esses consultores, estamos a dar dinheiro a quem? No fundo estamos a pedir dinheiro, a endividar-nos, para dar emprego a eles mesmos, porque não são os moçambicanos que estão a fazer estes estudos”.

“Onde há dinheiro Moçambique corre atrás”

A falta de transparência do Governo, particularmente em relação aos processos de concessões de direitos sobre a terra e licenças ambientas às grandes empresas, e a forma como são efectuadas as consultas às comunidades é outra das batalhas da Justiça Ambiental.

As nossas entrevistadas citam o exemplo da introdução em Moçambique do REDD, Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal, que foi defendido pelo Governo anterior como uma forma de aliviar a pobreza dos moçambicanos através da conservação e aumento das áreas florestais. Mas, enquanto a sociedade civil procurava entender o que isso era, e procurava envolver as comunidades que estão a ser directamente enganadas com a promessa de benefícios financeiros, o Conselho de Ministros de Armando Guebuza aprovou, quase sorrateiramente, o Regulamento dos Procedimentos para a Aprovação de projectos REDD+.

Segundo a Justiça Ambiental, “o REDD foi basicamente concebido como um escape para os poluidores de países industrializados poderem continuar a poluir enquanto assumem que a poluição é compensada com florestas noutros lugares” pois não reduz as emissões e é apenas um projecto de comércio de carbono.

As ambientalistas acrescentam que “o REDD não detém o desmatamento e incentiva a conversão de florestas em plantações de monoculturas de árvores” representando “uma grande ameaça para a segurança da terra, água e alimentação em África, pois é um plano de usurpação de terra à escala continental.”

“Todo o processo do REDD foi um processo para preparação para implementação, foi um processo para dizer como vamos implementar. Nunca discutimos se queríamos implementar, mas já estamos a discutir como vamos implementar, porquê? Porque o Banco Mundial acenou com dinheiro e o nosso Governo correu para apanhá-lo. O que tem acontecido em Moçambique, com todos estes mecanismos, é que há dinheiro e onde há dinheiro Moçambique corre atrás”, afirma Vanessa Cabanelas.

Super Ministério

Relativamente à transformação do Ministério para a Coordenação da Acção Ambiental em Ministério da Terra e Ambiente a ONG Justiça Ambiental considera positivo e enaltece a posição do Ministro Celso Correia que, como uma das suas primeiras decisões, públicas, mandou parar as consultas públicas em Palma, na província de Cabo Delgado onde vai ser instalado o próximo megaprojecto, para ver o que se estava a passar, mas espera para ver como é que vão ser geridas estas três áreas cheias de problemas.

“A questão da terra e ambiente estão interligadas de uma maneira, não podemos dizer que o desenvolvimento rural não esteja mas, pelo menos para nós, (Justiça Ambiental), pode criar contradições. O desenvolvimento rural pode ter impactos nas questões da terra e nas questões do ambiente”, refere Anabela Lemos que no entanto questiona como vão resolvidos os problemas que já vêm de outros ministérios. Não está claro ainda se o Ministério vai focar no desenvolvimento rural em pequena escala ou em grande escala.

Vanessa Cabanela diz que a terra junta com o ambiente era o que pretendia a ONG; contudo, “a junção da terra, ambiente e desenvolvimento rural é positivo mas fica um superministério, carregado de problemas que já vêm herdados dos anteriores”.

As dúvidas também são várias. “Como essa gestão vai ser feita? Por outro lado é uma aposta grande, é juntar muita coisa que neste momento está carregada de problemas e juntar tudo num mesmo sítio. Como vai ser essa junção? Mas depois de termos o desenvolvimento rural junto mas depois temos a segurança alimentar do outro lado com o Ministério da Agricultura. Como vai ser essa ligação? O Ministério da Agricultura já tinha outros problemas”, questiona a ambientalista.

Moçambique. FRACA PRECIPITAÇÃO COLOCA MACHANGA EM RISCO DE PASSAR FOME




Maputo, 29 Abr (AIM) - O sector de agricultura na província central de Sofala, anunciou terça-feira, na cidade da Beira, que a estiagem que assolou Machanga entre os meses de Janeiro e Março, está a colocar este distrito de Moçambique à beira da fome, estimando-se que a situação venha a afectar 2.551 famílias camponesas.

Edson de Almeida, chefe dos Serviços Provinciais de Agricultura de Sofala, é citado pelo jornal
Diário de Moçambique, a revelar que a situação de Machanga é considerada crítica, pois a produção da primeira época também ficou afectada.

Segundo a fonte, 25 por cento da área cultivada, calculada em 26.209 hectares, é dada como perdida.

Como não choveu, os camponeses não voltaram a colocar sementes no solo, facto que afectará os rendimentos da primeira época, nomeadamente das culturas do arroz, milho e mexoeira, disse Edson de Almeida.

A fonte apontou que o sector da Agricultura vai monitorar a segurança alimentar, particularmente no distrito de Machanga, para aferir com mais precisão o impacto que a estiagem provocou na presente época agrícola.

Para além de Machanga, oito distritos de Sofala, nomeadamente Caia, Chemba, Cheringoma, Chibabava, Dondo, Marínguè, Marromeu e Muanza, segundo Almeida,
caminham para a fome, uma vez que as reservas alimentares não suportarão mais de um mês, enquanto Gorongosa, Búzi e Nhamatanda possuem comida que pode ser consumida por mais de 30 dias.

Pode-se dar o caso de os oito distritos não se ressentirem da fome, uma vez que as famílias camponesas têm culturas em campo, cujas colheitas iniciam no presente mês de Abril. Nos princípios do próximo mês, iremos fazer um levantamento em todos os distritos, com o objectivo de aferir a duração das reservas alimentares, cujas colheitas irão acontecer no corrente mês de Abril, explicou Edson de Almeida.

As necessidades apontam para 516,7 toneladas de semente diversa, mas a disponibilidade actual é de cerca de 267.7 toneladas, existindo um défice na ordem de 275,6 toneladas, com maior peso para a batata e feijões.

Como alternativa, a fonte revelou que o sector está a trabalhar com várias organizações, com destaque para o Projecto de Desenvolvimento de Irrigação Sustentável (PROIRI), para colmatar o défice que se regista na componente de sementes de forma a não comprometer a campanha.

Temos dois cenários na presente safra agrícola, sendo boa nas zonas centro e norte de Sofala, apesar de algumas perdas devido as inundações e razoável na região sul da província, devido à queda irregular e má distribuição da chuva que resultou em estiagem, principalmente no distrito de Machanga, explicou Edson de Almeida.

(AIM) MAD/SG

Moçambique. HOMENAGEM A EMMANUEL SITHOLE: Graça Machel apela à unidade africana




Graça Machel, antiga primeira-dama de Moçambique, apelou à unidade africana no serviço fúnebre de Emmanuel Sithole (Manuel Jossias de seu nome verdadeiro), um dos cidadãos moçambicanos vítimas da violência xenófoba no país vizinho. Graça Machel apelidou o brutal assassinato do moçambicano de “um símbolo do que não deve acontecer novamente”.

Pelo menos sete pessoas morreram na sequência de ataques a estrangeiros e suas propriedades iniciados há duas semanas, na África do Sul.

Num discurso emocionado em Joanesburgo, Graça Machel, que foi também primeira-dama da África do Sul, disse que a violência recente deve ser “uma chamada de atenção” para toda a região da África Austral.

O serviço fúnebre, que marcou o início da transladação do corpo para Moçambique, teve lugar no emblemático município de Alexandra, onde Emmanuel Sithole foi morto por quatro homens.

Por entre aplausos da multidão presente no acto, Graça Machel promoveu a aceitação de todas as nacionalidades.

“Eu sou sul-africana. Eu sou moçambicana. Eu sou zambiana. Eu sou zimbabweana”, disse ela, acrescentando que “a migração está no nosso sangue. As fronteiras foram criadas pelos colonizadores. Elas não significam nada para nós, porque nós somos um”.

Graça descreveu a recente onda de violência como uma “expressão de ódio pelo próprio que foi inculcada pelo sistema de apartheid”.

A activista moçambicana dos direitos humanos enfatizou que ataques semelhantes aconteceriam de novo, a menos que os países da região sejam capazes de providenciar melhores oportunidades económicas aos seus povos.

Após o seu discurso, a ex-primeira-dama ficou “banhada” de lágrimas, segundo o correspondente da BBC no local.

Emmanuel Sithole foi agredido e esfaqueado no município de Alexandra, arredores de Joanesburgo, no dia 18 de Abril.

O seu assassinato, registado por um fotojornalista, chocou a nação e o mundo e causou indignação global.

Inicialmente, ele foi identificado pela imprensa como Emmanuel Sithole, mas o Presidente Sul-africano, Jacob Zuma, desde então, revelou o seu nome verdadeiro como sendo Manuel Jossias.

Quatro suspeitos compareceram perante o tribunal na semana passada acusados do assassinato do moçambicano. A audiência do caso foi adiada para 4 de Maio.

Notícias (mz)

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“CASO MIDO MACIE”: Família agastada com a demora na compensação - A família do malogrado taxista moçambicano Mido Macie, assassinado por nove agentes da Polícia sul-africana em 2013, chamou ontem o “Notícias” para manifestar o seu descontentamento face à demora no pagamento da indemnização por parte das entidades do Governo do país vizinho.

A XENOFOBIA SUL-AFRICANA



Notícias (mz), editorial

Moçambique responsabilizou publicamente o Governo sul-africano pelos episódios de violência xenófoba protagonizada contra cidadãos estrangeiros radicados naquele país vizinho.

Depois de uma primeira abordagem marcada por discursos dispersos de repúdio e reprovação aos actos, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Oldemiro Balói, usou, esta semana, o pódio da Conferência Ásia/África, realizada em Jakarta, na Indonésia, para apontar o dedo às autoridades sul-africanas, chamando-as à responsabilidade pela frustração a que muitos cidadãos daquele país estão votados por não sentirem melhorias na sua vida, fazendo-os desenvolver um sentimento de ódio contra aqueles que um dia lhes deram a mão na luta contra o “apartheid”.

É verdade que o Presidente da República, Filipe Nyusi, já tinha manifestado, em vários momentos, a sua repulsa ao fenómeno, mas a posição apresentada pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros em Jakarta, numa cimeira em que estava em representação do Chefe do Estado, foi, em nossa opinião, o protesto que todos moçambicanos esperavam do seu Governo, no exercício do seu direito à indignação perante um fenómeno que é uma afronta ao espírito e filosofia da integração regional e livre circulação de pessoas e bens, inscritas na carta da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC).

Até podíamos considerar que o posicionamento das autoridades moçambicanas tardou a chegar, mas era necessário que ele chegasse, quanto mais não fosse para alimentar a sensação de segurança e protecção dos moçambicanos, mesmo aqueles que, da vaga de violência, perderam muito do que construíram ao longo de anos de trabalho e sacrifício, longe da sua terra, e muitas vezes longe, também, dos seus familiares.

Em menos de duas semanas, mais de mil e quinhentos moçambicanos regressaram ao país fugindo da violência xenófoba que, tendo começado na cidade de Durban, rapidamente se propagou por outras regiões da África do Sul, incluindo os populosos e pobres bairros de Joanesburgo, onde há uma grande concentração de cidadãos moçambicanos.

Parte destes cidadãos regressou ao país por meios próprios, e outra fê-lo com apoio do Governo que se tem desdobrado, é preciso reconhecer, para garantir não só que aqueles concidadãos sejam recebidos com dignidade, como também que sejam rapidamente encaminhados para as respectivas zonas de origem, junto das suas famílias.

É muita gente afectada pelo fenómeno, muitas famílias abaladas na sua estrutura, considerando que, na sua fuga precipitada, muitos não puderam levar o essencial dos seus haveres, que certamente acabaram vandalizados ou espoliados pelos atacantes.

Mesmo assumindo que não está nas nossas atribuições julgar os actos governativos das autoridades sul-africanas, não resistimos à tentação de lamentar que o Governo de Jacob Zuma não se tenha posicionado energicamente contra algumas das vozes que se levantaram contra a presença de estrangeiros na África do Sul, em discursos que, para nós, foram a gota que fez transbordar o copo de frustrações dos sul-africanos, muitos dos quais vivem em situação de pobreza degradante.

Apreciamos o facto de o Rei Zwelethini ter aceite levantar-se da cadeira para explicar-se ao mundo, o que de uma ou de outra maneira representa o reconhecimento do alcance danoso que o seu discurso teve no seio dos sul-africanos pobres, e do impacto negativo que teve na vida de muitos estrangeiros que ficarão marcados pelo resto da sua vida.

Também nos refresca, de alguma maneira, o facto de o Governo sul-africano estar a dar sinais de preocupação em limpar a sua imagem perante o mundo, sobretudo perante os países cujos cidadãos sofreram na pele os efeitos da violência xenófoba. Está claro que em muitos casos aquela violência abriu feridas profundas na história das relações entre os sul-africanos e outros povos da região, uma sequela que vai levar o seu tempo para sarar.

O que nós entendemos é que, mais do que todo o exercício diplomático que a África do Sul possa fazer junto da comunidade internacional e dos países africanos em particular, será necessário que o Governo de Jacob Zuma ponha em marcha medidas efectivas para acabar com as desigualdades sociais naquele país, que na nossa opinião são a mãe da pobreza que estimula o ódio e a violência.

Os moçambicanos continuam exasperados com a situação, mas a nossa convicção é de que rapidamente se vão refazer do susto, porque o mesmo empenho no trabalho que faz deles um povo admirado por uns e odiado por outros será o mesmo que os fará reerguer-se dos escombros da violência xenófoba e partir para novas batalhas e conquistas.

*Publicado no Notícias (mz) em 24 abril 2015

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