domingo, 25 de março de 2012

A BATALHA POR UMA RÚSSIA “MULTIPOLAR” – III



Martinho Júnior

Três entidades supra nacionais são levadas em conta pela Rússia a fim de estabelecer nexos de resposta perante os riscos e desafios que afectam todo o continente euro-asiático:
 
- A Organização do Tratado de Segurança Colectiva (OTSC).
- A Organização de Cooperação de Shangai (OCS).
- A Comunidade de Estados Independentes (CEI).
 
A abordagem desses riscos e desafios é feita por Putin, não só no âmbito das relações bilaterais, mas também no âmbito da ONU, do G-20, dos BRICS e dessas Organizações.
 
As questões que se prendem aos países do Cáucaso e do Médio Oriente, em particular neste momento a Síria, o Irão, o Afeganistão e o Paquistão, assim como as questões referentes à península da Coreia, constam entre as suas maiores preocupações.
 
Em relação aos países do Médio Oriente, a Rússia segue a crítica aos métodos e processos que estimularam a partir de interesses externos a “primavera árabe”, buscando alternativas ao abrigo dos conceitos que se prendem com a multi polaridade, mas leva também em particular atenção outros fenómenos, como a droga, no caso do Afeganistão, ou o terrorismo que afecta quer o Afeganistão, quer o Paquistão.
 
Por outro lado, observa a interligação do que se passa no Médio Oriente, com os fenómenos que ocorrem no Cáucaso e na Ásia Central.
 
No que diz respeito ao Irão, Putin adverte:
 
“… O Irão encontra-se actualmente sob a luz dos projectores.
 
Evidentemente que a Rússia está preocupada pela crescente ameaça duma operação militar contra esse país.
 
Se ela se produzir, as consequências serão verdadeiramente desastrosas, sendo impossível imaginar a sua verdadeira amplitude.
 
Estou convencido que este problema deve ser regularizado unicamente por via pacífica.
 
Propomos reconhecer o direito do Irão a desenvolver o seu programa nuclear civil, incluindo a produção de urânio enriquecido, mas é preciso colocar meios de monitorização, a fim de tudo ficar sob o controlo minucioso e fiável da Agência Internacional da Energia Atómica.
 
Se isso for feito, poder-se-ão levantar todas as sanções contra o Irão, incluindo as sanções unilaterais.
 
O ocidente deve abster-se da sua tendência para querer contrariar alguns países.
 
À menor contrariedade ele desencadeia sanções, ou até uma operação militar.
Quero lembrar que nós não estamos mais no século XIX, nem mesmo no século XX”…
 
Quanto ao Afeganistão:
 
“… O futuro do Afeganistão é igualmente preocupante.
 
Nós apoiámos a operação militar destinada a conceder uma ajuda internacional a esse país, mas o contingente militar internacional, sob a égide da OTAN, não tem cumprido com essa missão.
 
O perigo de terrorismo e a ameaça do narco tráfico permanece no Afeganistão.
 
Ao anunciar a retirada de suas tropas desse país em 2014, os Estados Unidos criam nesse país e nos vizinhos bases militares sem mandato algum, sem objectivo claramente definido e sem definir a duração da sua actividade.
 
É evidente que isso não nos convém”…
 
A geo estratégia russa tem contudo como factores privilegiados a sua inter-conexão com a emergência da China, a sua posição em relação aos BRICS, os problemas que se põem com o factor europeu, as relações com os Estados Unidos, as evidências da diplomacia económica e, por fim, o apoio aos russos no estrangeiro e o que se passa com a cultura russa no contexto internacional.
 
Se a emergência da China decorre de forma cada vez mais interligada aos interesses da Rússia à escala global (mas muito particularmente em relação à Sibéria e ao leste), os relacionamentos com a Europa em época de crise estão na ordem do dia pois é um facto que os interesses geo estratégicos da Rússia, no que diz respeito à energia, assume prioridade para com a Europa.
 
Em relação à China, Putin afirma:
 
- Que o crescimento económico da China não é uma ameaça, mas um desafio que comporta um potencial enorme de negócios com repercussões construtivas para a economia da Rússia (conjugando os potenciais tecnológico e industrial dos dois países).
 
- Que ninguém pode assumir o pretexto da China pretender dominar o mundo, por que a China, tal como a Rússia, persegue o objectivo duma ordem mundial equilibrada.
 
- Que a Rússia regularizou com a China todos os problemas políticos cruciais, incluindo o mais importante de todos: o litígio de fronteiras.
 
Por outro lado, é preciso não esquecer que “nós assistimos não somente ao crescimento da China e da Índia, mas ao aumento do papel da região Ásia – Pacífico por inteiro.
 
Nesse contexto as novas perspectivas de trabalho frutuoso oferecem-se no quadro da presidência russa no seio da Cooperação económica pela Ásia – Pacífico (APEC).
 
Em Setembro de 2012 a Rússia acolherá a cimeira da APEC em Vladivostock, onde está a construir infra estruturas modernas, o que contribuirá para o desenvolvimento da Sibéria e do Extremo Oriente russos e permitirá à Rússia juntar-se aos processos dinâmicos de integração no seio duma nova Ásia”.
 
Quanto à Europa, Putin pretende que a Rússia assuma um papel construtivo para fazer face à crise:
 
“No contexto da emergência da China, da Índia e de outras economias, os choques financeiros e económicos que sacodem a Europa, antes oésis de estabilidade e da ordem, não nos deixam indiferentes.
 
A crise da zona Euro diz respeito também à Rússia, levando em consideração que a União Europeia é o maior parceiro económico e comercial do nosso país.
 
É evidente que a situação na Europa é largamente determinante para as perspectivas de desenvolvimento do sistema económico mundial no seu conjunto”.
 
Analisando o relacionamento com os Estados Unidos, Putin salienta:
 
“Estes últimos anos, um grande esforço foi realizado a fim de desenvolver as relações entre a Rússia e os Estados Unidos, todavia a matriz dessas relações não deixou de ser radicalmente transformada e elas continuam a conhecer altos e baixos.
 
Uma tal instabilidade na parceria entre a Rússia e os Estados Unidos é devida, em parte, à perenidade de certos estereótipos e fobias.
 
A maneira como a Rússia é apercebida pelo Congresso norte americano é particularmente reveladora.
 
O problema crucial reside no facto que o diálogo e a cooperação bilateral não se apoiam numa base económica sólida.
 
As trocas comerciais estão longe de estar à altura do potencial das economias russas e americanas.
 
Passa-se o mesmo com os investimentos bilaterais”…
 
Uma especial relevância concedeu Putin à entrada da Rússia na Organização Mundial do Comércio e à eminente entrada na Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE), bem como aos constrangimentos nas relações económicas e comerciais com os países do leste europeu.
 
No futuro, o papel da Rússia na gestão da água doce à escala global, será um dos factores geo estratégicos previstos por Putin para as próximas décadas.
 
Esse é um dos factores inter relacionados com a imensidão do território russo e a multiplicidade de questões que isso coloca no continente euro-asiático.
 
A emergência russa associada à dos outros BRICS e a emergência de outras economias dispersas por vários continentes (a angolana incluída), constituem por si aspirações visando um maior equilíbrio nos relacionamentos internacionais, um esforço no sentido de implementar melhores condições de vida para toda a humanidade.
 
Políticas neo liberais com tendência uni polar estão a tornar-se cada vez mais nocivas a essas emergências, pois muitas delas se vêem a braços com a necessidade de políticas diversificadas: desde a construção de infra estruturas e estruturas, até à necessidade de acautelar equilíbrios internos que revertam em maior estabilidade.
 
Há-de chegar a altura em que a socialização dos novos ganhos se traduzirá numa redução das assimetrias e num maior respeito para com a Terra, apesar dos constrangimentos impostos pela hegemonia uni polar ao longo de muitas décadas e particularmente após a IIª Guerra Mundial!

Gravura: Mapa dos países que compõem a Organização de Cooperação de Shangai.
 
Ler ainda:
- “A Rússia e a evolução do mundo” (http://www.voltairenet.org/La-Russie-et-l-evolution-du-monde).
- “A Ásia – Pacífico adquire uma nova dimensão” (http://www.voltairenet.org/La-Russie-et-l-evolution-du-monde,172990).


FOME E ESPECULAÇÃO




Carmelo Ruiz Marrero, San Juan – Opera Mundi

São dadas várias explicações, incluindo os desastres meteorológicos – inundações e secas – relacionados à mudança climática, ao boom dos biocombustíveis, à subida do preço do petróleo e ao aumento da demanda de carne e de grãos das crescentes classes médias da China e da Índia. Porém, há outro fato muito mais importante, que é ignorado na maioria das análises: a especulação por parte de investidores, que veem nos alimentos um novo horizonte de lucro.

Segundo a autora e analista catalã Esther Vivas (ver aqui, em espanhol), em meados de 2010, “a especulação alimentar golpeava de novo e o preço dos alimentos voltava a subir”, pelo que “os especuladores sentiram-se incentivados a pedir novos empréstimos e a comprar mercadorias que, de maneira previsível, subiriam rapidamente de valor. Os próprios bancos, fundos de alto risco, etc., que causaram a crise das hipotecas subprime são, atualmente, os responsáveis pela especulação com as matérias-primas e o aumento do preço da comida, aproveitando-se de mercados globais de mercadorias profundamente desregularizados”.

“O desmedido fluxo de capitais especulativos distorce os mercados de tal forma que já não servem para a composição de preços dos alimentos”, sustenta a campanha Direito à Alimentação (ver aqui, em espanhol). “Os mercados de futuro não refletem a situação real de oferta e procura nos mercados agrícolas e seus preços não convergem com os do mercado varejista, nem proporcionam uma cobertura efetiva contra as flutuações. A falta de convergência nos preços e a alta volatilidade têm feito com que os mercados de futuro sobre matérias-primas agrícolas sejam pouco fiáveis quanto à estimativa dos preços e de pouca utilidade na gestão de risco para produtores e consumidores.”

E, o que é um especulador? É quem nem produz e nem usa a mercadoria; porém, arrisca capital, comprando e vendendo contratos a futuro da mercadoria em questão, com o objetivo de lucrar a partir da variação em seu preço. O contrato a futuro é basicamente uma aposta sobre a que preço uma mercadoria determinada subirá ou baixará.

O especulador não trabalha na economia do mundo real, na qual se vendem bens e serviços para o benefício da sociedade; mas trabalha no que se conhece como economia financeira. “A economia financeira é a que cria dinheiro por meio da especulação com o dinheiro, sem mediar a produção de algo que, em seguida, se vende; isto é, sem que exista quase nenhum intercâmbio de matéria, trabalho e energia”, informa um documento educativo de Direito à Alimentação. “Na economia financeira, por exemplo, se compram ações para tentar vendê-las mais tarde, obtendo com isto um benefício sem ter contribuído para a sociedade.”

Sempre houve especulação; porém, como resultado da desregulação de anos recentes, esta aumentou a uma velocidade alarmante. Entre 2003 e 2008, o investimento em índices vinculados ao negócio das matérias-primas se multiplicou por vinte, subindo de US$ 13 bilhões para US$ 260 bilhões. Quando há tanta especulação, os postulados da economia liberal clássica de oferta e procura já não têm aplicabilidade.

Diz o relator das Nações Unidas sobre o direito à alimentação, Olivier de Schutter, “quando chegam as informações sobre os incêndios na Rússia ou o excesso de chuvas no Canadá, alguns operadores preferem não vender imediatamente, enquanto os compradores buscam comprar o mais rápido possível”. O Instituto para a Política Agrícola e de Comércio dos Estados Unidos (ver aqui, em inglês) atribui à especulação até 31% da subida do preço do milho, em julho de 2008. E se não é pela especulação, de que outro modo se pode explicar que o preço do arroz a futuro subiu 31% em umas poucas horas em 31 de março de 2008? Como explicar que o trigo subiu 46% entre 10 de janeiro e 26 de fevereiro de 2008, aumento que caiu quase na totalidade em maio e, subiu para 21% no início de junho, para em agosto baixar outra vez?

Torna-se cada vez mais claro que, para entender a crise alimentar, temos que regular os mercados financeiros e dar um “basta” nos especuladores. Porém, para os neoliberais, tal proposta é impensável. Citamos o economista Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de Economia: “O fundamentalismo de mercado neoliberal sempre tem sido uma doutrina política que serve a determinados interesses. Nunca esteve respaldado pela teoria econômica. E, como deveria ter ficado claro, tampouco está respaldado pela experiência histórica. Aprender esta lição talvez seja um raio de luz em meio às nuvens que agora empanam a economia mundial”.

* Carmelo Ruiz Marrero é jornalista, educador ambiental e diretor do Projeto de Biosegurança de Porto Rico. Publicado originalmente no site Adital.

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Portugal: Discurso de Passos Coelho foi "irrealista" – BE



RBV (SMA) - Lusa

Lisboa, 25 mar (Lusa) - O líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Luís Fazenda, considerou hoje que o discurso de Pedro Passos Coelho no encerramento do congresso do PSD não reflete a realidade que os portugueses vivem.

"Foi um discurso carregado de otimismo económico que não condiz com o momento da crise, com o aumento do desemprego, com a acentuada redução de salários e redução de prestações sociais", disse Luís Fazenda, numa conferência de imprensa, em Lisboa.

O Congresso do PSD terminou hoje com um discurso do líder, Pedro Passos Coelho, virado para o país e com "uma palavra de esperança" aos portugueses, mas onde também quis comprometer PS e restante oposição para o que disse ser o desafio da reconstrução nacional.

Ao longo de uma hora, Pedro Passos Coelho passou em revista as várias áreas da governação, desde a economia, justiça às matérias europeias, afirmou que o Governo quer acabar com os privilégios dos setores mais protegidos da sociedade e procurou desfazer a ideia de que os sacrifícios que estão a ser pedidos aos portugueses não são para todos.

Luís Fazenda, numa reação ao discurso de Passos Coelho, considerou que o otimismo foi "restrito ao Pavilhão Atlântico", onde decorreu o congresso, porque o que o "cidadão comum" sente é diferente.

"Foi um congresso que não trouxe novidades, não trouxe perspetivas concretas face ao futuro, foi um discurso irrealista (...) O Congresso não trouxe uma proposta concreta para a economia, para o crescimento, não teve uma proposta de fundo sobre a Europa, sobre o crescimento", acrescentou.

"Foi um congresso perfeitamente vazio. O que se esperaria de um congresso de um partido liderante seria a apresentação de propostas concretas", disse ainda Luís Fazenda.

O responsável bloquista explicou ainda que o BE não compareceu ao congresso do PSD, porque tal não faria sentido.

"O espaço natural de confronto e de diálogo com os partidos do poder é na Assembleia da República. Participar num ritual dos partidos de poder para depois dizer mal desses partidos, não faria sentido", afirmou Luís Fazenda.
O XXXIV Congresso do PSD, que decorreu em Lisboa, teve início na sexta-feira e terminou hoje.

Portugal: Violência. Polícias atribuem responsabilidade a quem deu ordem de actuar



Ricardo Paz Barroso – i online

“As imagens são muito fortes para que a PSP não faça nada”, reconheceu o porta-voz.

A condenação foi unânime

“Quando dão a ordem para avançar, é quase impossível travar-nos, já não ouvimos ninguém, deixa de haver uma linha de pensamento, e a questão de serem fotojornalistas ou cidadãos nem se nos coloca naquele momento: a nossa função é limpar o local”, confessou ao i um agente do Corpo de Intervenção (CI) que pediu o anonimato.

Depois da escalada de violência entre PSP e manifestantes na greve geral de quinta-feira, com uma detenção e três feridos (dois deles fotojornalistas), ontem foi a vez da escalada mediática das consequências. E a condenação pública foi unânime.

Mesmo a PSP, através do seu porta-voz, Paulo Flor, reconheceu aos jornalistas que “as imagens são muito fortes para que a PSP não faça nada”, referindo-se às fotografias e vídeos que ontem circularam mundo fora, via redes sociais e a imprensa. Emblemática passou a ser a fotografia da Reuters em que um agente espanca uma fotojornalista da AFP, Patrícia de Melo Moreira, também colaboradora do i. Paulo Flor revelou ainda que a PSP “já está a recolher todas as imagens e notícias para analisar o sucedido”, pois “quer perceber o que se passou”.

Patrícia de Melo Moreira foi agredida por agentes da Equipa de Intervenção Rápida da PSP, mas já o fotojornalista da Lusa, José Sena Goulão, que recebeu assistência hospitalar, foi agredido por três elementos do CI, que actuou depois de perdido o controlo. “E bateram para magoar”, garantiu Sena Goulão.

Segundo Ricardo Noronha, uma testemunha ouvida pelo i, “tanto o polícia agressor como a fotojornalista agredida já nos acompanhavam desde a praça do Saldanha, era impossível o agente não saber quem ela era quando a agrediu no Chiado”. Segundo Noronha, os incidentes surgiram “quando a PSP tentou deter um dos manifestantes”. Os restantes “tentaram pacificamente impedir e foi aí que a PSP começou à bastonada”. A resposta “foi o arremesso de garrafas de água e cerveja”, seguindo-se “a entrada da polícia de choque, que até senhoras de idade agrediu”.

Não só a PSP vai averiguar internamente as decisões que levaram a esta violência. Também a Inspecção-Geral da Administração Interna o vai fazer. Estes inquéritos juntam-se aos de 24 de Novembro de 2011, data da última greve geral, em que também se registaram agressões policiais, uma delas também a um colaborador do i, o fotojornalista Eduardo Martins. Segundo fonte policial, “um inquérito deste género demora no mínimo seis meses, mas pode ir até ano e meio, pois ouvem-se todos os envolvidos, polícias e queixosos”.

Os processos de averiguação “são prejudiciais para os agentes, a suspeita de irregularidades afecta a carreira, o que até trava os agentes mais impulsivos”, revelou o mesmo agente do Corpo de Intervenção. “Tenho a certeza de que, 20 minutos depois da bastonada à jornalista, o agente arrependeu-se e muito, pois a cara dele está nos jornais”, acrescentou.

Este polícia de choque lembrou que “na greve de 24 de Novembro detivemos um homem que estava a dar pontapés nas grades frente à Assembleia da República, mas quando já estava algemado disse que pertencia às brigadas de investigação criminal da PSP”. Recordou o episódio a rir para lembrar que “às vezes basta um polícia para lançar a confusão, basta uma acção individual precipitada para tudo descambar, pois estamos ali muitas horas, sem saber se vamos entrar em acção, é stressante”. Este agente não tem dúvidas de “que a violência das manifestações vai aumentar a partir daqui”. Ainda assim, garantiu que “as chefias recomendam- -nos sempre calma, pois não querem raspanetes do director nacional [da PSP], que por sua vez não quer raspanetes do ministro [da Administração Interna]”.

Repúdio Ontem foi dia de “repúdio”. Cerca de 80 jornalistas, muitos deles da Agência Lusa, cuja direcção de informação apresentou queixa pela agressão a Goulão, estiveram frente à Direcção Nacional da PSP em protesto. Entregaram uma carta a repudiar a acção policial e exigiram desculpas formais.

Também o Sindicato de Jornalistas (SJ) pediu um inquérito “rigoroso” e “condenou a acção policial”. Quanto à sugestão feita pela comissária Carla Duarte, da PSP, para que os jornalistas passem a usar coletes, o SJ diz que o uso de coletes não pode tornar-se lei, pois “os jornalistas passam a ser um alvo a abater”.

Já o ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, quer uma reunião com o SJ e com os directores de informação para definir as regras que identifiquem os jornalistas.


Opinião Página Global

O parágrafo de abertura nas primeiras palavras explicativas do agente da PSP é bem elucidativo de como funcionam. E nós a pensar que eles eram pessoas: “Quando dão a ordem para avançar, é quase impossível travar-nos, já não ouvimos ninguém, deixa de haver uma linha de pensamento, e a questão de serem fotojornalistas ou cidadãos nem se nos coloca naquele momento: a nossa função é limpar o local”, confessou ao i um agente do Corpo de Intervenção (CI) que pediu o anonimato.”

Ao ler isto devemos ficar a saber de que estão mesmo a referir-se a seres irracionais, a cães de fila ou a qualquer outro animal bestializado, a máquinas, que depois de ordenarem “ataca” já não reage a mais nada e ataca mesmo. Se a ordem for “mata”, matam mesmo, e assim sucessivamente.

No caso referido pelo agente (máquina) dizem-lhes “limpa” e eles limpam sem nenhuma espécie de raciocínio. Até podem "limpar" o sebo, a vida, e será um dano colateral. Agem tipo bestas ou máquinas robotizadas. De humanos nada têm, razão por que não devemos esperar estarmos a lidar com seres humanos mas sim com potenciais objetos-abjetos obedientes como mastins que até assassinam se lhes for ordenado.

Não deixa de ser estranho que apesar de máquinas saibam reivindicar direitos e mordomias privilegiadas, incluindo serem tratados como pessoas. Coisa que vimos agora que de facto não são, pelo dito, pelo visto, pelos ferimentos infligidos, pelo défice de democracia que causam, violação dos Direitos Humanos, etc. 

Para quem tinha dúvidas disso pode passar a ter certezas. Melhor será pedir ao ministro da tutela que repare as máquinas PSP e lhes introduza componentes, um chip, algo que os torne mais semelhantes a seres humanos nas reações e em tudo que convier (um pouco de massa encefálica será benéfico), que se instruam a viver em democracia e não em ditadura mascarada de democracia.  Decerto que essa adaptação não sairá muito dispendiosa e sempre seria mais agradável ter umas máquinas PSP pagas por todos nós que tivessem algumas semelhanças a humanos e total respeito pela humanidade. (Redação PG – HS)

UM GOLPE DOS “PATRÕES” DA LÍNGUA




Cândido Lince – Jornal de Angola, opinião

Há coisas que, de tão vergonhosas, até o diabo foge delas. Pópilas! Vejam só o atrevimento!

De há alguns dias a esta parte, o Word 2007 do meu computador, ferramenta que utilizo para escrever os meus textos, passou, automaticamente, a assinalar erros ortográficos em palavras, que eu tinha a plena convicção de estarem correctamente escritas. Pensei até que a selecção para a configuração ortográfica do português de Portugal tivesse “emigrado” para o Brasil. Mas não. Emprestando um pouco mais da minha atenção e paciência a este assunto, questionando, também, outras pessoas, conclui que, através de algumas das actualizações automáticas, sem me pedirem qualquer opinião sobre o assunto, passaram-me a impor um novo dicionário da língua portuguesa de Portugal, quando o antigo corrector ortográfico se encontra ainda em uso. Se não foi por feitiço que isto aconteceu, então andou, de certeza, aqui, uma mãozinha marota.

O meu país, Angola, tem, por opção e não por imposição, o orgulho de ter a Língua Portuguesa como língua oficial e de escolaridade. Uma língua que, a par de outras línguas africanas, é património de todos os angolanos que a falam, independentemente do facto de a terem adquirido como primeira ou segunda língua.

Angola assinou o novo acordo ortográfico, mas, por razões de ordem, essencialmente, científica e cultural, ainda não o ratificou e tem todo o direito de querer voltar a discuti-lo, pelo facto de, em alguns aspectos, não se rever nele. De nenhum modo terá de ser obrigado a consumi-lo, tal como, no seu todo, o mesmo se apresenta.

Moçambique também não ratificou o novo acordo ortográfico e há outros países africanos de expressão portuguesa que, apesar de o terem feito, juridicamente, ainda vão a tempo de reponderar sobre determinados aspectos. Em Portugal, por exemplo, o novo acordo ortográfico terá, oficialmente, de conviver com o antigo, pelo menos, até 2015. Assim sendo, o acordo ortográfico de 1945 mantem-se ainda em vigor.

O que terá levado a Microsoft a impor o novo acordo ortográfico de língua portuguesa à margem da lei e sem alternativa de escolha por parte dos seus utentes? Um novo acordo bastante contestado, sobretudo, ao nível dos académicos, agora imposto, por via electrónica, mais por conveniência de interesses obscuros do que por estratégia de divulgação da própria língua, como dita o discurso político?

Nos dias de hoje, não me parece que seja através da força, com o uso de golpes baixos, que teremos de ser forçados a aceitar o novo acordo ortográfico de língua portuguesa. Aproveitar o facto de os PALOP não terem ainda um parque editorial à altura, para, automaticamente, nos forçarem a aceitar um acordo onde, para além dos erros e das situações duvidosas, são mais as excepções que as regras, é uma má opção estratégica, com consequências a curto, médio e longo prazo e com sérios prejuízos para a própria Língua Portuguesa. O novo acordo, para ser validado e dignificado, terá de ser rectificado para não conviver com resistências de todo o tipo. Terá de entrar, em cada país, pela porta grande da frente e nunca, sorrateiramente, pela porta pequena dos fundos. Para tal, se torna necessário que todos os países participem dele, para que todos os países se revejam no mesmo, já que a língua portuguesa é de todos os países membros, que compõem a CPLP.

Angola e os outros países africanos de expressão portuguesa, bem como ainda Timor Leste, não têm de ser usados como caixa de ressonância de problemas que não lhes dizem respeito, nem, tão pouco, terão de ser sujeitos a imposições sub-reptícias de tipo neocolonial, sob o protesto da necessidade de uma unificação linguística, que, como todos sabemos, não passa, desde o início, de um falso pressuposto.

Face aos embaraços constatados no novo acordo, não só em Angola, mas também em Portugal, no Brasil e em outros países da Comunidade, só os asnáticos fogem para a frente e procuram impor pela força o que não conseguem convencer pelo uso da argumentação. O jeitinho do “tomem lá o Acordo e não piem”, é uma forma muito pouco urbana, democrática e sensata de tentar resolver o problema. Assim, dificilmente, em português, seremos capazes de nos entender.

O MPLA liderou não só a libertação de África, mas também (nunca se esqueçam) da Europa




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

De vez em quando o MPLA sente necessidade de tentar reescrever a história, julgando ser dono da verdade e fazendo dos outros autênticos matumbos.

Como todos sabem, e nem era preciso ser o MPLA a dizer, foi o partido de Eduardo dos Santos que construiu África e que, entre outras nobres causas, libertou a Europa do jugo do Hitler. Crê-se até que nos arquivos do regime existe o original da procuração passada por Deus a Agostinho Neto em que o nomeava o seu único representante na Terra.

Entre fronteiras continentais, o MPLA também foi decisivo para tudo. Segundo o tenente-general que em 2009 comandava a V Divisão das Forças Armadas Angolanas (FAA), estacionada na Região Militar Sul, António Valeriano, a guerra em Angola foi imposta pelo regime racista sul-africano de então.

"Esta postura visava a manutenção do status quo ocupacionista do território namibiano, retardando a independência do país, ao mesmo tempo que se perpetuava o regime de Apartheid na África do Sul, pois Angola assumira-se como trincheira a favor dos povos subjugados, tão logo adquiriu a sua soberania", argumentou o oficial-general.

António Valeriano explicou que no universo das grandes batalhas, a ocorrida no martirizado município do Kuito Kuanavale, em 1988, constituiu pedra de toque para a derrota do invasor, cuja estratégia visava o derrube da autoridade legalmente instituída, após 11 de Novembro de 1975, com a proclamação da Independência Nacional.

Esta da autoridade legalmente instituída deveria ter suporte, digo eu, nos Acordos do Alvor. Não foi assim. Mas também o que é que isso importa se o poder foi dado por Portugal ao MPLA, esquecendo que a FNLA e a UNITA também lá estavam? Lisboa nada mais podia fazer, de facto. Os portugueses não poderiam esquecer que foi o MPLA que ajudou o seu país a libertar-se de várias opressões, nomeadamente da espanhola…

Para António Valeriano, o exército governamental, no direito e obrigação constitucionalmente atribuídos, concentraram esforços na defesa da soberania e integridade da pátria e, naquela parcela do território nacional, infligiu baixas consideráveis ao invasor. E não terá mesmo conquistado Pretória porque os comandantes já estavam cheios de saudades da família.

Falar de exército governamental quando se tratava das FAPLA, braço armado do MPLA, e de militares estrangeiros, entre os quais russos, cubanos, portugueses e brasileiros, parece algo desonesto, pelo menos do ponto de vista intelectual. Só parece. Desde logo porque foram só soldados do regime que derrotaram tudo quanto lhes aparecia pela frente, desde hienas a mabecos. Aliás, o que se julgou serem soldados estrangeiros eram homens das FAPLA disfarçados para apanhar o inimigo com as calças na mão.

"Foi a bravura, heroicidade e sentido patriótico dos angolanos que vergou os racistas sul-africanos, levando-os a assinar o acordo de Nova Iorque, juntamente com Angola e Cuba, aos 22 de Dezembro de 1988", recordou António Valeriano, acrescentado que se pode então encetar "a descolonização da Namíbia, a abolição do Apartheid na África do Sul e, consequentemente, a regularização política total da região Austral do continente".

Heroicidade dos angolanos? Para começar, havia angolanos de um e do outro lado da barricada. Além disso, os angolanos das FAPLA foram apenas carne para os canhões utilizados por cubanos, russos e outros que tais. Não, não foi nada disso – reconheço. Os angolanos só estavam de um lado, os que estavam do outro eram da UNITA e esses, como todos sabem, não eram angolanos e ainda está por confirmar se eram mesmo pessoas.

Deixando de lado as diatribes do MPLA e a sua atávica degenerescência intelectual, registe-se que, ao contrário do que diz António Valeriano, a batalha do Kuito Kuanavale foi um rotundo fracasso para o MPLA/governo, por muito que digam o contrário, por muito que ponham os sipaios do regime a escrever algo diferente.

Os objectivos do avanço dos exércitos da coligação FAPLA, sobretudo mas não só russos e cubanos, eram desalojar a UNITA da mítica Jamba e empurrar os sul-africanos que encontrassem para a Namíbia ou mesmo para além da Namíbia.

Algum desses objectivos foi alcançado? A UNITA foi derrotada e expulsa da Jamba? Os sul-africanos que a apoiavam foram empurrados para a Namíbia? A resposta é não, não e não.

E quais foram as consequências desta tão violenta batalha?

Os cubanos retiraram de Angola, a África do Sul saiu da Namíbia e esta obteve a sua independência mas nas condições ditadas pelos sul-africanos (nenhum dos interesses económicos da África do Sul na Namíbia foram tocados, a Namíbia continuou dentro do sistema aduaneiro sul-africano, o porto de Walbis Bay continuou administrado pela África do Sul).

E quanto a Angola, quais foram os resultados da famosa batalha?

Primeiro o MPLA aceitou negociar com a UNITA, o que até aí tinha recusado, pelo meio ainda tentou de novo chegar à Jamba (operação que foi chamada "Último assalto" onde foi derrotado de novo), depois foi obrigado a admitir o pluripartidarismo e eleições, o que a UNITA pedia desde… 1975.

Em resumo o MPLA/governo angolano não atingiu nenhum dos objectivos e pelo contrário teve de aceitar as condições impostas pelos adversários no terreno.

O MPLA tenta transformar pela propaganda uma derrota em vitória visando três objectivos:

Tentar reescrever e mascarar a História, operação a que o MPLA/governo angolano recorre frequentemente, como ultimamente se tem provado.

Provocar a UNITA/oposição angolana, porque a uma ditadura dá sempre jeito que haja reacção violenta.

Dar, como já acontece, uma mãozinha ao Presidente do ANC, Jacob Zuma, que necessita de se agarrar a este tipo de populismo, e do dinheiro do petróleo angolano, para se manter na Presidência da África do Sul.

Foto: Helicóptero russo capturado na batalha de Kuito Kuanavale e usado pelas FALA (UNITA)

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor, compilado em Página Global: MINISTRO QUE SE PREZE ESTENDE A MÃO AO MPLA

Angola: O PATRIOTISMO DE SAMAKUVA




José Ribeiro – Jornal de Angola, opinião, em A Palavra ao Diretor

O líder da UNITA, Isaías Samakuva, em vez de revelar aos angolanos os seus projectos e propostas para o país, foi para o estrangeiro difamar o Presidente da República, o Poder Judicial e os jornalistas.

As próximas eleições não são fáceis para Samakuva. Consciente, talvez, de que nas eleições os seus actos e palavras vão ter um efeito mais devastador do que no acto eleitoral de 2008, o líder pôs de parte a sua condição de angolano e foi para um país estrangeiro atacar quem lhe deu tudo. Até somas elevadas de dinheiro, que em vez de serem aplicadas num projecto político coerente, foram devoradas por quem apenas pensa nos seus interesses pessoais e em fazer fortuna à custa do sofrimento dos angolanos.

Isaías Samakuva comprou, com o dinheiro dos nossos impostos, espaço num dos jornais mais caros dos EUA, o “Washington Post”, para desonrar a sua pátria e espezinhar os seus compatriotas. No meio, até acusa o sector público da comunicação social, os jornalistas, de “serem perseguidos” e de “fazerem propaganda” do governo. Isaías Samakuva sabe que o Jornal de Angola tem as suas páginas totalmente abertas à UNITA e que não deixou, uma só vez, de cobrir as actividades do partido para as quais foi convocado. Que prove o contrário e que diga aos angolanos, em Angola, quem são os jornalistas perseguidos pelas autoridades por darem a sua opinião.

Se alguém tem razão de queixa, somos nós, os jornalistas. O líder da UNITA nunca ao Jornal de Angola revela a sua agenda política e nem sequer se digna informar das suas actividades no estrangeiro. Presumo que os restantes órgãos de comunicação social do sector empresarial do Estado estão nas mesmas condições. A UNITA comporta-se com a comunicação social como se ainda estivesse no tempo dos “lobbies”. Faz da democracia um bicho de sete cabeças, ignora a transparência e é incapaz de sair do labirinto onde mergulhou.

Só sabemos que Samakuva está em Portugal, nos EUA ou qualquer outro país estrangeiro, pelo eco da web. Ele sonega a informação aos órgãos de informação angolanos, num reprovável exercício de obstaculização do direito a informar, informar-se e ser informado garantido pela Constituição. O líder da UNITA tem dificuldade em perceber que o Jornal de Angola é lido por muitos milhares de angolanos e que muitos desses leitores são da UNITA. Gente de todos os partidos e de todas as classes sociais ouve a RNA e vê a TPA. Por isso, quando Samakuva nos está a sonegar a informação, está a desrespeitar todos esses cidadãos que têm o direito a ser informados com verdade e não com a propaganda dos lobbies e jornalistas pagos à linha e ao segundo.

Mas o mais grave, porque é novo na prática do líder da Oposição, foi a forma grosseira e profundamente injusta como se referiu ao Poder Judicial em Angola. Samakuva, no espaço comprado no jornal “Washington Post”, insultou todos os magistrados, judiciais e do Ministério Público, reduziu a sua actividade a lixo. Quem insulta e calunia o Chefe de Estado e seus familiares, não faz a mínima ideia do que é o jogo democrático. E quem trata os magistrados judiciais como se fossem candongueiros da Justiça, das duas uma: ou está fora do jogo democrático ou a mais na política.

Isaías Samakuva é o líder da Oposição, o que lhe dá especiais responsabilidades, porque tem um papel insubstituível no regime democrático. Mas também é membro de pleno direito do Conselho da República, um órgão de consulta do Chefe de Estado. Salvo melhor opinião, é ele quem merece ter o maior espaço na imprensa, mas se isso não acontece a responsabilidade é apenas sua. Os insultos e calúnias proferidos por Samakuva na publicidade paga no jornal dos EUA, é deslealdade. Foi um ataque traiçoeiro a quem deve, pelo menos, lealdade institucional.

Os eleitores angolanos devem estar perplexos com este comportanento. Mas os apoiantes da UNITA não estão melhor. Ao verem que o seu líder oscila entre o insulto e o desprezo pelas instituições democráticas, têm razões para se preocuparem. A escassos seis meses das eleições, Samakuva vai dizer aos americanos que o Presidente da República de Angola não presta, os juízes são vendidos e os jornalistas uma cambada de propagandistas. Não sei se naquelas paragens o levam a sério. Mas em Angola seguramente que vai ser julgado. Esse julgamento é feito, implacavelmente, pelos eleitores.

Os desafios que temos pela frente exigem excepcional força humana. Mas se o maior partido da Oposição só tem para dar um contributo de baixa política, então os do costume vão ter de se empenhar ainda mais.

PARLAMENTO ALEMÃO NÃO RECONHECE GENOCÍDIO NA NAMÍBIA



Deutsche Welle

O Parlamento alemão se recusa a reconhecer como genocídio o massacre cometido por tropas alemãs contra o povo herero, no que é hoje a Namíbia, em 1904. Para analistas, a decisão emperra no âmbito económico.

A 2 de outubro de 1904, o comandante das tropas alemãs no que era então o Sudoeste Africano Alemão, General Lothar von Trotha, promulgou uma ordem que viria a ser infame. Nela, anunciava que qualquer herero, armado ou não, encontrado dentro das fronteiras alemãs, seria abatido. E acrescentava que não seriam poupadas mulheres e crianças.

O povo herero foi obrigado a fugir para o deserto, o que equivaleu a uma pena de morte: entre 70 mil a 100 mil hereros e namas pereceram nos anos seguintes, a grande maioria da população destas etnias no território colonial alemão.

Associações e ONGs pedem reconhecimento

As associações das vítimas namibianas, assim como organizações não-governamentais alemãs, há muito exigem o reconhecimento deste massacre como genocídio. Em finais de fevereiro, o grupo parlamentar do Partido A Esquerda (Die Linke), introduziu um pedido neste sentido, apresentado pelo deputado Niema Movassat.

"Centenas de milhares de pessoas foram enforcadas e abatidas a tiro. Foram expulsos para o deserto e impedidos de aceder a fontes, morrendo de sede. Foram condenadas a trabalhos forçados em campos de concentração. Há que assumir a responsabilidade pelo sucedido. Nunca foi reconhecido que se tratou de genocídio. Nunca houve um pedido de perdão oficial", declara o deputado.

Matthias Basedau, especialista em assuntos africanos do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (GIGA), em Hamburgo, considera que a hesitação alemã tem a sua raiz em considerações de ordem económica.

A Namíbia é hoje considerada pelos alemães sobretudo um destino turístico. O especialista considera que "se em vez disso a Namíbia fosse um parceiro económico importante, o problema seria tratado de maneira muito diferente".

Propostas rejeitadas no Parlamento

Entretanto, os dois outros partidos na oposição em Berlim, os sociais-democratas (SPD) e os Verdes (Die Grüne), apresentaram a sua própria proposta ao Parlamento. Ela lembra que o governo de coligação SPD/Verdes no início da década instaurou um fundo de assistência aos familiares das vítimas, que, no entanto, nunca chegou a arrancar. Agora, os partidos querem reanimar este fundo e dotá-lo de mais meios.

Mas a maioria governamental rejeitou as duas propostas. Egon Jüttner, deputado da União Democrata-Cristã (CDU) da chanceler, Angela Merkel, argumenta que passou demasiado tempo sobre o sucedido.

"A convenção que pune o genocídio só foi promulgada em 1948. A Alemanha aderiu em 1955. É por isso que o governo não reconhece oficialmente o sucedido como genocídio. É claro que temos que ajudar a Namíbia, e as reparações passam pela assistência ao desenvolvimento. Numa base per capita, a Namíbia é o país que mais recebe assistência alemã", defende.

Mas para Henning Melber, analista especializado na Namíbia da Fundação sueca Dag Hammarskjöld, que viveu muitos anos no país africano, no entanto, esta história ainda não chegou ao fim. "Na Namíbia existe uma sensibilidade colectiva muito forte para as injustiças cometidas, para além de uma tradição de oralidade importante. O sofrimento das vítimas fará parte do imaginário colectivo namibiano ainda por muitos e longos anos", diz.

Autora: Cristina Krippahl - Edição: Cris Vieira / Renate Krieger

COMO O SISTEMA FERROVIÁRIO DA ARGENTINA FOI SAQUEADO




Francisco Luque - De Buenos Aires – Carta Maior

A rede ferroviária estatal argentina tinha 40.000 km e nela trabalhavam 190.000 empregados. Era a mais extensa da América Latina e, de certo modo, a coluna vertebral de um país. A história do desmonte desse sistema começa nos anos 60, quando montadoras estadunidenses e o Banco Mundial impulsionaram o Plano Larkin para desarmar a rede ferroviária do país, chegando até a reforma do Estado dos anos 90, quando o neoliberal Carlos Menem desmontou o Estado, privatizando todo seu patrimônio. O artigo é de Francisco Luque.

Buenos Aires - Ao se completar um mês do trágico acidente ferroviário da linha Sarmiento, na Estação de Once, em Buenos Aires, que deixou 51 mortos e 703 feridos - três deles continuam hospitalizados -, ainda escuta-se o barulho. O barulho das famílias das vítimas que pedem maior celeridade à justiça para esclarecer as causas diretas do acidente e estabelecer quem foram os responsáveis. Também o ruído de uma sociedade ainda chocada que quinta-feira pela manhã, às 8h30min, a mesma hora da colisão, fez soar as buzinas de seus carros em lembrança das vítimas. Mas há outro ruído, talvez mais permanente e profundo, e é o ruído do saque do qual foi objeto o sistema ferroviário argentino.

A Justiça argentina investiga as responsabilidades imediatas da tragédia, mas para os especialistas, as causas que produziram este acidente estão nos processos sociais e econômicos que a Argentina viveu nos últimos 60 anos. A busca chega até aos anos sessenta, quando as montadoras estadunidenses instaladas na Argentina, impulsionaram o Plano Larkin – implementado por sua vez pelo Banco Mundial, para desarmar a rede ferroviária argentina –, até a reforma do Estado dos anos noventa, quando o neoliberal Menem desmontou o Estado, privatizando - saqueando?- todo seu patrimônio.

Historicamente, a rede ferroviária estatal argentina tinha 40.000 km e nela trabalhavam 190.000 empregados. Era a mais extensa da América Latina e era, de certo modo, a coluna vertebral de um país. A Argentina havia se estruturado em povoados que nasceram ao longo desses trilhos. Era um país solidário e inclusivo, com acesso aos centros nevrálgicos de produção e participação nas definições sobre um conceito de país.

O saque começou na ditadura de 1976, quando não só se usurpavam vidas, mas também bens. Era a destruição planejada do Estado e do patrimônio nacional acumulado durante o século XX com o objetivo de consolidar o capital financeiro e os grupos econômicos.

Quando a ditadura se instalou, a condução da área de Transporte ficou radicada no Ministério de Economia através da Secretaria de Transporte e Obras Públicas. Ali se elaborou um plano de ação para retomar as medidas de racionalização recomendadas 15 anos antes pelo Plano Larkin para pôr em prática a privatização periférica (vazamento lento e progressivo, somado à terceirização de investimentos, atividades e serviços de empresas privadas) da estatal Ferrocarriles Argentinos. O resultado? Fechamento de ramais antieconômicos, supressão de trens de passageiros de baixa utilização, fechamento de oficinas redundantes, fechamento de estações, supressão da tração a vapor, etc.

Entre 1976 e 1980 foram abandonadas cerca de 600 estações, reduziram-se trens de passageiros interurbanos e locais do interior em 30% e fecharam-se 5500 km de linhas secundárias. Só nas oficinas, a quantidade de pessoal reduziu-se de 155 mil empregados em 1976 para 97 mil em 1980, segundo o livro “Nueva Historia del Ferrocarril en Argentina”, de Mario López e Jorge Waddol. A desconexão do país e a intensa eliminação de oficinas contribuíram para a decadência e desaparição de uns 700 povoados, e a aceleração da pobreza e da desigualdade.

Com Menem, nos anos 90, e a influência do neoliberalismo em escala planetária, decidiu-se arrasar com o sistema de trens e aplicou-se a célebre frase do presidente: “Cirurgia maior sem anestesia”. 600 povoados desapareceram. Oitenta mil trabalhadores ferroviários foram despedidos. A imprensa fiel ao período de “pizza com champanhe” informava que os trens perdiam um milhão de dólares diários sobre uma rede de 35.000km. Havia que fechá-la ou privatizar o pouco que restava. Foi a amostra feroz da cumplicidade do poder político com os grupos econômicos.

Na atualidade subsistem uns 7.000km de vias maltratados e trens que não podem avançar a mais de 40 km por hora. Cerca de 20.000 pessoas trabalham no ramo. A maioria dos vagões tem entre 40 e 50 anos; os trilhos são instáveis, as janelas quebram e não são consertadas, as portas não fecham.

Néstor Kirchner herdou a pior crise econômica da história da Argentina. E muito não pôde fazer com respeito aos trens, entendido como um serviço público indispensável. Manteve-se um funcionamento deficiente compensado com uma tarifa congelada – quase simbólica -, outorgando subsídios à concessionárias, administradores do funcionamento - sem os controles adequados. Recuperaram-se alguns ramais ferroviários, mas sem melhoras em infraestrutura e adquiriu-se material descartado em seus países de origem pelos anos de uso.

“Os subsídios às empresas privadas sem controles efetivos do Estado são mais uma página sombria na continuação de um “Estado Hood Robin”, como o batizou outrora o jornalista Horacio Verbitsky, onde se paga para que continuem crescendo empresas privadas à custa de cada argentino. Em outras palavras, “se tira do pobre para dar ao rico”, sustenta a analista Maria Seoane.

As empresas concessionárias foram a grande dor de cabeça do sistema ferroviário nos últimos tempos. Como bem aponta o jornalista Hernán Brienza: “a política de subsídios pensada desde 2003 para que milhões de argentinos humildes possam viajar a preços irrisórios acabou sendo letal em mãos do grupo concessionário que mais controle e poder tem sobre os trens”. Grupos empresariais beneficiados como o da família Cirigliano, concessionária do Trem Sarmiento TBA, entre outras, teve um crescimento econômico exponencial durante os últimos anos, e, como afirma Edgardo Reynoso, secretário da União Ferroviária, os trens da linha dos Cirigliano continuam circulando "à beira do desastre". Esta concessionária está sob intervenção do Estado desde o acidente.

Para a classe trabalhadora, a solução é clara: que os concessionários vão embora e que se reestatizem todos os trens em uma empresa só, sob o controle dos trabalhadores e dos usuários. Essa é a única possibilidade de solução para o atual estado calamitoso da ferrovia, sustentam.

Passado um mês da tragédia de Once, entre aplausos, buzinas e pedidos de "justiça", centenas de pessoas protestaram na estação de trens pedindo o esclarecimento do acidente.

Tradução: Libório Junior

Dilma viaja neste domingo para a Índia e deve ficar uma semana fora do Brasil




Correio do Brasil, com ABr - de Brasília

A presidenta Dilma Rousseff viaja neste domingo às 23h para Nova Delhi, na Índia, onde participa da 4ª reunião do bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (Brics). Em discussão as questões relativas aos temas econômicos e financeiros, além de políticas de segurança e paz, assim como o esforço conjunto para o desenvolvimento sustentável, como proposta para redução da pobreza. No dia 31, ela deve estar de volta ao Brasil.

Dilma viaja acompanhada por uma comitiva de cerca de 60 empresários brasileiros. Nas reuniões em Nova Delhi estarão presentes também os presidentes Dmitri Medvedev (Rússia), Hu Jintao (China) e Jacob Zuma (África do Sul), e o primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh. O Brics se reúne no momento em que ainda há incertezas devido à crise econômica internacional que ainda causa impactos na Europa e nos Estados Unidos.

Na reunião do dia 29, o primeiro-ministro da Índia se prepara para apresentar a proposta de criação de um banco de desenvolvimento do bloco. Os indianos defendem que a nova instituição bancária seja uma espécie de alternativa ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

Porém, o processo para criação e consolidação da instituição deve ser longo e demorado, por isso os líderes políticos deverão assinar apenas uma declaração sinalizando a disposição em criar um grupo técnico para dar início aos trabalhos de instauração do banco.

Os esforços, segundo os negociadores brasileiros, são mostrar para a comunidade internacional que o bloco pode ser referência no cenário econômico e político (internacional). Todos os líderes dos países querem ampliar as relações comerciais internas e externas incentivando a expansão dos mercados exportadores e importadores.

Para o Brasil, é fundamental indicar que o mercado exportador brasileiro não se limita aos produtos agrícolas. Na comitiva presidencial, há empresários dos mais diversos setores, incluindo tecnologia de ponta. Todos participarão do Fórum Empresarial que reúne representantes dos países que integram o bloco.

A intenção é que os presidentes e o primeiro-ministro da Índia assinem uma declaração que fixa a determinação do Brics de ampliar os acordos bilaterais, por intermédio de suas instituições bancárias de desenvolvimento econômico, utilizando moedas locais. No caso do Brasil, o acordo será firmado com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Também deve ser aprovado um texto em defesa da paz e da segurança no Oriente Médio e no Norte da África. Os destaques deverão ser a Síria, em decorrência do agravamento da situação de violência no país, e o acirramento das tensões no Afeganistão, depois do massacre de civis por um sargento norte-americano.

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Emigrantes portugueses viajam para o Brasil sem data de regresso



i online - Lusa

Aproveitar a oportunidade enquanto dura e seguir as tendências do mercado de trabalho são os objetivo dos emigrantes portugueses que chegam ao Brasil sem data marcada para voltar à terra natal.

Os motivos para a indefinição, no entanto, são diferentes: há portugueses que decidiram estabelecer-se no Brasil, existem os que querem voltar logo que for possível e ainda os que deixam a decisão para mais tarde.

"Vou estar aqui tanto tempo quanto queira e faça sentido. Mudamos tanto que, invariavelmente, esses prazos e metas não se cumprem", afirma o engenheiro e gerente de negócios de uma empresa de marketing digital, Ricardo Croner Bastos, 32 anos.

Bastos desembarcou no Brasil em junho de 2011, após um ano sabático em que fez um MBA em Setúbal. Antes disso, trabalhou e estudou na Alemanha e na Inglaterra. "Quando estava em Portugal, na minha casa, pensei em ficar. Mas a crise instalada no país espanta essa vontade", conta.

O arquiteto Marcos Abreu, 28 anos, saiu do Porto e chegou ao Brasil há cerca de um mês, mas já traça uma meta temporal para o seu regresso. "Penso em ficar uns dois, três anos, até a situação em Portugal melhorar", conta.

Ao mesmo tempo, Abreu realça que tem um "desafio novo" em São Paulo, pois vai assumir a coordenação de projetos, e os rumos profissionais podem tornar uma ideia definida em algo incerto: "Só o futuro me dirá", completa.

Já empresário Miguel Gonçalves Português de Assis, 33 anos, quer fincar raízes no país americano. Sócio do irmão numa empresa que organiza eventos internacionais, mudou-se para São Paulo em julho do ano passado, com a mulher, para abrir uma nova sede do negócio.

Sem pensar em voltar para Portugal, Assis diz esperar ter filhos brasileiros. "O Brasil é um país que agora sorri para pessoas empreendedoras, mas elas têm de trabalhar bastante", afirma.

Para ajudar os compatriotas a enfrentar a falta de informação e a burocracia brasileiras, criou o grupo "Nova Geração de Patrícios" no Facebook, sem fins lucrativos, que conta com trocas de experiências entre portugueses. A página, que começou com 20 membros, conta hoje com mais de 1.350 pessoas.

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