sexta-feira, 27 de julho de 2012

O BOSQUE EM FLOR



Rui Peralta

Segundo o New York Times um pequeno grupo de agentes da CIA operou no sul da Turquia para decidir quais as forças sírias antigovernamentais sírias receberiam armas. Rifles, lança-granadas, munições e armas antitanque são introduzidos pela fronteira turca através de uma rede constituída pela Irmandade Muçulmana Síria, agentes turcos, da Arabia Saudita e do Qatar. Esta rede clandestina integrada pela CIA é o esforço mais detalhado, até ao momento, da participação dos USA na campanha armada contra o governo sírio. Já em Maio, o Washington Post, tinha publicado que os rebeldes antigovernamentais sírios estavam a receber armamento através dos estados do Golfo. Além disso os USA estão a fornecer aos rebeldes sírios os movimentos das forças armadas governamentais sírias, fornecendo as imagens obtidas por satélite.

Aos poucos os USA foram deixando cair a imagem da ajuda humanitária e de apoio diplomático á oposição síria. Enquanto criticavam a Rússia e o Irão por, supostamente, enviarem armamento às forças armadas sírias, argumentando que a injecçäo de armas podia provocar um incremento da violência no território sírio, foram montando as operações logísticas de suporte aos bandos armados sírios, coordenando esforços com a Turquia e os estados do golfo. Já em Março o Presidente Obama pedira ao Pentágono que preparasse um vasto leque de operações militares inseridas num plano de contingência. O Pentágono respondeu, solícito, abrindo um leque de vastas possibilidades como o lançamento aéreo de ajuda humanitária, a vigilância aérea de tropas sírias (já em curso via satélite) e o estabelecimento de uma zona de exclusão aérea, idêntica á que foi imposta na Líbia em 2011.

O fluxo de armas

Foi exactamente a partir do mês de Março que foi registado um aumento do fluxo de armas e munições aos bandos antigovernamentais sírios, através da fronteira turca, o que provocou um aumento das operações do exército governamental sírio na região fronteiriça com a Turquia. Em Maio o Qatar e a Arábia Saudita financiaram, em milhões de USD, a aquisição de armas, adquiridas no mercado negro da região (Líbano, Turquia e Iraque) e a militares sírios, enquanto a oposição síria entrou em contacto direto com funcionários do Departamento de Estado dos USA, para designar os receptores e os locais de armazenamento.

Paralelemente ao aumento do fluxo de armas, os USA estão a utilizar ex-quadros militares e da CIA, como conselheiros e instrutores dos bandos antigovernamentais sírios. É o caso de Joseph Holliday, ex-oficial da CIA no Afeganistão que é agora “investigador especializado” ao serviço do Exercito Livre Sírio (ELS).

O financiamento da Arábia Saudita

É também o ELS o beneficiado do financiamento saudita. Segundo o Guardian, funcionários sauditas fazem a gestão dos pagamentos de salários aos militares do ELS, uma forma de evitar deserções e aumentar as pressões sobre o governo sírio. Esta operação financeira da Arábia Saudita conta com a participação de altos funcionários dos USA, do Qatar, do Koweit e dos Emiratos Árabes Unidos.

O dinheiro saudita não é só para pagar salários, também paga armas, munições, equipamentos e financia operações logísticas. Com autorização da Turquia, foi estabelecido um centro de comando do ELS em Istambul, que coordena as linhas do financiamento saudita com o ELS e a expensas do governo saudita. No centro trabalham 22 operacionais de nacionalidade síria. Com esses financiamentos foram estabelecidas redes logísticas entre a cidade turca de Reyhanli e a aldeia fronteiriça síria de Altima, por onde entram na Síria as armas, munições e medicamentos, numa região onde predomina o controlo do ELS. O financiamento saudita fez também reavivar a as acçöes do ELS no norte da Síria, região de onde o ELS quase foi erradicado, após ter sofrido pesadas derrotas contra as forças armadas da Síria.

Os salários aos militares e soldados do ELS são pagos em USD e em Euros, pois a libra síria tem estado em queda livre nos últimos meses, o que significa que os seus salários são muito superiores aos das forças armadas governamentais sírias. O senador norte-americano Joe Lieberman, um dos senadores mais activos no apoio á oposição síria, efectuou uma recente viagem ao Líbano e á Arabia Saudita, onde efectuou uma série de reuniões para realçar a importância do financiamento saudita e o pagamento de salários ao ELS e a discussão do alargamento da cooperação entre os estados do golfo, a Turquia, a UE e os USA, no apoio ao ELS e á oposição politica.

A Turquia e a NATO

Respondendo aos anseios do senador Lieberman no sentido da “maior cooperação”, a 26 de Junho o Conselho do Atlântico Norte, o organismo reitor da NATO, abordou a questão Síria, quatro dias depois do abate do F-14 da Força Aérea turca pela artilharia Síria. O pretexto da reunião foi a apresentação de uma petição da Turquia, para que se realizassem consultas, ao abrigo do Artigo 4 do Tratado do Atlântico Norte, que permite o pedido de aliança quando qualquer estado membro sofre ameaças á sua integridade e segurança territorial.

Mas a 25 de Junho, um dia antes da reunião, a Turquia anuncia que ia solicitar á NATO que debatesse o Artigo 5, que compromete a NATO a actuar em caso de agressão a um estado membro. A primeira vez na História da NATO que utilizou-se o artigo 5 foi em Outubro de 2001 e constituiu o fundamento para que os exércitos dos 28 estados membros da NATO e de mais 22 estados se colocassem em prontidão para o Afeganistão. Apelou-se ao Artigo 4 pela primeira vez em 16 de Fevereiro de 2003, também no Conselho do Atlântico Norte e também numa apelação da Turquia em relação ao Iraque. Como consequência foi desencadeada a operação Display Deterrence, que colocou no terreno cinco baterias de misseis Patriot (3 da Holanda e duas dos USA), equipamentos de vigilância, sistemas de aerotransportados de controlo (AWACS, Airborne Warning and Control System), para além da coordenação do Sistema de Defesa Aérea Integrada da NATO e mil soldados, tudo colocado na Turquia e virado para o Iraque. Três semanas depois começaram os bombardeamentos ao Iraque e a invasão terrestre.

A Turquia é um país quase três vezes mais extenso que a Síria, conta com o apoio dos seus 27 aliados da NATO, tem um exército muito superior em número e em equipamento ao exército sírio. No seu território os USA têm cerca de 90 armas nucleares B61, estacionadas na base aérea de Incirlik, a uns 60 km da costa mediterrânica da Turquia. O primeiro-ministro turco Recep Erdogan desde Abril (dois meses antes do problema ocorrido com o F-14), que menciona as intenções de activar a disposição de ajuda mútua do Artigo 5. Será que querem repetir o ocorrido com o Iraque, em 2003, tendo novamente a Turquia como ´actor no papel de vitima`?

A solução líbia

Para a OTAN a solução líbia é uma solução de sucesso, por isso, com as devidas adequações, pratica nem relação á Síria um envolvimento e uma abordagem idênticos ao que utilizou na Líbia. É evidente que uma intervenção militar na Síria é um caso muito mais complicado que na Líbia, pois para além da capacidade militar da Síria, existem factores como o posicionamento da Federação Russa e da China.

Apesar disso o processo de intervenção continua a avançar, aplicando-se a mesma receita da solução líbia. Neste sentido Hillary Clinton, numa reunião na Turquia, dos chamados países ´Amigos da Síria` - os mesmos que financiam os bandos armados do ELS – foi bastante indelicada, em termos diplomáticos, ao afirmar que a Rússia e a China iriam (passo a citar) ´pagar pelo seu apoio á Síria` (fim de citação). E num frenesim trágico, os USA, os estados do golfo, a Jordânia, a UE e Israel (este de uma forma muito encapotada, por detrás dos USA) financiam o ELS com cada vez mais meios, equipamentos e armamento e recrutando mercenários para o «exército para a libertação e democracia». Tal como aconteceu na Líbia e no apoio oferecido ao Conselho Nacional de Transição. E da mesma forma que ocorreram na Líbia continuam os massacres de inocentes para culpabilizar o governo sírio, com a cobertura e manipulação da comunicação social.

Da guerra indirecta ao ataque directo

Os contornos da escalada começam a definir-se. A fase de guerra indirecta está a chegar ao fim. As acções de desgaste dos bandos armados, com cada vez mais recursos, estão a chegar ao seu ponto máximo de eficiência. O senador John McCain, depois de um encontro com o comandante das Forças Libanesas, apelou á criação de uma zona tampão para o ELS, o que foi de imediato realizado pelos grupos salafistas libaneses e outras milícias islâmicas, que durante o mês de Julho concentraram-se na região de Akkar onde estabeleceram barreiras nas estradas. Por sua vez a Síria organiza diversos exercícios militares terrestres e navais. Ainda recentemente a marinha síria iniciou um exercício de tiro real, com lançamentos de misseis terra-mar, simulando um cenário de defesa perante um ataque vindo do mar.

Os ataques terroristas intensificam-se assim como a guerra de contrainformação. No passado dia 18 de Julho um atentado em Damasco decapitava a Célula de Controlo da Crise, organismo criado pelo governo sírio para controlar a situação de crise vivida desde 2011. O atentado foi reivindicado pelo ELS e pelos salafistas do Esquadrão do Islão, mas constou pelas ruas de Damasco que o atentado fora perpetrado pelas próprias forças de segurança sírias, para evitar um golpe de estado interno, cuja coordenação partia do Célula de Controlo da Crise. Seja como for um facto é que o ELS tem força suficiente e mobilidade, assim como os mercenários salafistas para realizarem acções de grande efeito na capital do país.

Assistimos também nos últimos tempos á deserção de diplomatas, políticos, deputados e á «mudança de campo» de gente até aqui ligada ao regime, assim como a alguns oficiais superiores sírios. Um facto é que o governo endureceu as suas posições. O actual ministro da defesa é Fahd Yassim al-Furayi, um general da linha dura do Partido Baas cujo pensamento revela-se em frases como «amputaremos as mãos dos terroristas». A OTAN parece reagir mal á sua tomada de posse, pois foi desencantar a velha história rebuscada das armas químicas, já utilizada no Iraque e muito falada na Líbia. Sobre o cenário químico sírio a NATO umas vezes fala do perigo do regime usar armas químicas contra a população, noutras refere o perigo de o arsenal químico cair nas mãos da Al-Qaeda e nos últimos dias corre o alerta das armas químicas ficarem com o Hezbollah. Enfim tudo capítulos da mesma novela.

Fontes
Miguel Guaglianone; El Libreto para Siria; http://barometrointernacional.bligoo.com.ve
Ghaleb Kandil; Los detalles del plan estadounidense contra Siria; http://www.voltairenet.org
Naomi Ramirez; No a la intervención; http://www.rebelion.org
-amputara-manos-terroristas/00031342679448959232441.htm
Martin Chulov Ewen MacAskill y John Densky; Saudi Arabia and Syria Rebel Army; The Guardian; 22/07/2012
New York Times, 28/06/2012; 02/07/2012
Washington Post, 12/05/2012

Martin Schulz: “OS DIRIGENTES EUROPEUS ESTÃO DOIS ANOS ATRASADOS”



Presseurop

O euro ainda pode ser salvo, considera Martin Schulz. Mas isso exigiria que os chefes de Estado e dos governos europeus se esforçassem por superar os jogos políticos inerentes à sua função e dessem ouvidos ao Parlamento. Na entrevista concedida ao Presseurop (leia a primeira parte aqui), o presidente do Parlamento Europeu traça a imagem de chefe do Parlamento que quer construir: um contrapoder representante das pessoas perante a Comissão e o Conselho Europeus.

A crise do euro entrou no terceiro verão. A moeda única ainda pode ser salva?

Sim, acho que o euro ainda pode ser salvo. Isso vai depender um pouco da vontade de cada um colocar, finalmente, em prática um sistema de gestão sustentável da Zona Euro. Na última cimeira [do Conselho Europeu, a 28 e 29 de junho], chegámos a acordo numa reunião, à noite, e no dia seguinte, dois governos declararam: "Mas não era isso que queríamos dizer." Incidentes desses são desastrosos. Somos uma zona económica forte, com uma moeda forte – e 17 governos. Isso não pode manter-se.

A crise do euro foi objeto de 25 cimeiras e de "decisões históricas", que de históricas só têm o nome. A situação provoca a cólera dos cidadãos, descontentes por verem os governos da Europa obstinados em manter o status quo. O que diria aos cidadãos europeus, para que não deixem de acreditar na Europa?

Tento dirigir mensagens positivas aos cidadãos e cidadãs europeus. Digo-lhes que, se quisermos, se agirmos em conjunto, podemos ser muito fortes. E se não agirmos juntos, se nos fracionarmos em unidades independentes, com a Alemanha sendo o maior país e Malta o mais pequeno, tornar-nos-emos um joguete dos interesses de outras regiões do planeta.

Costumamos falar de países "emergentes", como o Brasil, a África do Sul, a Índia, a China... Espero, para o bem dos europeus, que não venhamos rapidamente a falar de nações "imergentes". Para evitar isso, precisamos de uma Europa forte e unida.

O problema não são as instituições, mas a relutância em unir-se, manifestada pelos chefes dos governos, não só da Zona Euro, mas de todos os 27 Estados-membros. Esta relutância resulta do fosso ideológico que existe no Conselho, onde se defrontam, de um lado, a visão apresentada pela Alemanha e também pela Holanda, a Finlândia e mais alguns – "Não vamos pagar pelos outros" – e, do outro, a noção de que apenas uma partilha da dívida pode ser solução para os nossos problemas, representada por países que exageram no sentido oposto. Mas se não formos capazes de construir uma ponte entre essas duas posições e encontrar um compromisso sólido, vamos caminhar para tempos difíceis. É isto que tenho para dizer aos eleitores e eleitoras.

Quer fazer do Parlamento uma instituição capaz de enfrentar o Conselho de Chefes de Estado e de Governo. O que seria melhor para a Europa, se dependesse do Parlamento?

Agimos por maiorias claras. Vou-lhe dar três exemplos. Há dois anos, o Parlamento pediu e apresentou um pacto de investimento de 1% do PIB da Zona Euro. A proposta foi rejeitada [pelo Conselho]. No ano passado, votou a favor de um imposto sobre operações financeiras, com 570 votos a favor – uma maioria como nunca tinha visto, saída de todos os grupos. Teve o mesmo fim, rejeitada. Finalmente, há dois anos, o Parlamento solicitou, por uma maioria esmagadora, uma união bancária. Mais uma vez, a proposta foi recusada.

E hoje, com um atraso de 24 meses, o Conselho Europeu decide criar uma união bancária, um imposto sobre transações financeiras e um pacto de crescimento de 1% – e quer que lhe atiremos flores. São as mesmas ideias que o Parlamento lhes propôs e que os chefes de Estado e de Governo arrogantemente recusaram. Com isso, perdemos 2 anos. Em suma: o Parlamento Europeu funciona; os chefes de Governo é que, infelizmente, não.

Ninguém se importa com o significado de uma abstenção recorde nas eleições europeias, de 5 em 5 anos. Como fazer para que essa consulta não seja mais uma oportunidade para os eleitores se manifestarem contra os governos nacionais?

Acho que é a primeira vez, em eleições europeias, que alguns candidatos apresentam a sua linha política por toda a Europa. Há, portanto, um candidato dos socialistas, um dos conservadores, ouro dos democratas liberais, dos verdes, etc., a concorrer à presidência da Comissão. Isso vai originar campanhas eleitorais em que se opõem programas e indivíduos. E, finalmente, deixa de se tratar de governos nacionais: a questão é saber se a Europa vai ser governada à esquerda ou à direita.

A UE CONTINUA A SER UM CLUBE SELETIVO





A UE já tem 27 membros e há mais alguns a bater-lhe à porta. Será que o processo de alargamento está a comprometer os seus princípios fundadores e a sua própria energia? A resposta do semanário "De Groene Amsterdammer", na sua série sobre os euromitos.


A metáfora do comboio sem travões. O receio de uma União Europeia que inclua entre os seus Estados-Membros não apenas a Turquia, mas também a Ucrânia, a Geórgia e o Longe-de-tudo. Impossível de governar, fraca devido às diferenças culturais e em matéria de desenvolvimento económico.

Esse receio é alimentado pelo facto de não existir efetivamente uma fronteira oriental clara e de o alargamento parecer ser a tarefa central da União. A paz, a segurança e a estabilidade através da integração. Depois de 1989, o alargamento para além dos 12 Estados-membros [de então] tinha que ser feito a qualquer preço, apesar de toda a gente saber que alguns dos países candidatos ainda não estavam preparados para a adesão.

Há quem considere que, ao fazer-se isso, se pôs o carro à frente dos bois. Não apenas porque se confirmou de facto que o alargamento é apenas uma questão política, mas também porque o caráter da União se alterou a tal ponto, que acrescentar mais países não iria alterar grandemente a situação.

Assim: estão em curso negociações oficiais de adesão com quatro outros países candidatos (Croácia, Macedónia, Montenegro e Sérvia) e mais dois Estados dos Balcãs são elegíveis (Albânia e Bósnia-Herzegovina, se esta não explodir entretanto). Esses países situam-se praticamente no coração da Europa. "Além disso", diz o cientista político belga Hendrik Vos, "se os países fizerem os trabalhos de casa que lhes pedimos para fazerem há alguns anos, será difícil dizer-lhes para esperarem mais um pouco."

Pergunta-se muitas vezes se os limites são determinados pela geografia, pela democracia, pelos políticos ou pelos eleitores. A resposta é: por todos eles. É por isso que a ideia de a União se alargar ilimitadamente não é justa..

Todos os parlamentos nacionais têm direito de veto

Comecemos pela geografia. Talvez não haja uma fronteira oriental, mas a fronteira sul é bem clara. No que se refere à democracia, são sempre referidos os critérios de Copenhaga, os requisitos de adesão, como o Estado de direito, eleições justas, o respeito pelos direitos humanos e um conceito vago como a "comunidade de valores".

Segundo os eurófilos, a Europa pode acolher os países que estejam dispostos a adotar esses valores. Mas, segundo Josef Janning, diretor de estudos do grupo de reflexão European Policy Center e partidário do alargamento, isso também significa que a Rússia e a Turquia, por exemplo, nunca se tornarão membros. "Porque se consideram especiais e não querem submeter-se às regras de terceiros."

E passemos aos políticos. "É preciso ver até onde vai a governabilidade funcional e com quantos países é possível fazermos leis em conjunto", diz Vos, que escreveu dois livros sobre o processo de tomada de decisões na UE. Este limite parece ter sido atingido.

Além disso, os Parlamentos nacionais têm direito de veto. O que significa que, em última análise, a opinião pública constitui o derradeiro travão ao alargamento. E, em muitos países, a população já não apoia a grande Europa. Os tempos em que a adesão podia ser comprada através do crescimento económico acabaram.


Angola: ENTREVISTA COM LUATY BEIRÃO



Maka Angola

Numa tarde amena, em Lisboa, o Maka Angola sentou-se à conversa com Luaty Beirão, músico de hip hop, também conhecido como Ikonoklasta e como Brigadeiro Mata Frakus. Filho de João Beirão, antigo presidente da Fundação José Eduardo dos Santos (FESA), Luaty é também um conhecido participante do movimento jovem de contestação que tem vindo a crescer em Angola desde 2011.

Luaty: Nasci em Luanda, a 19 de Novembro de 1981. Vim para a Europa, para estudar, quando concluí o ensino médio. O meu pai era do Huambo. A minha mãe de Luanda. Do lado do meu pai nunca conheci família nenhuma porque o irmão dele faleceu antes de eu nascer. É um lado mais solitário, o lado da família do meu pai, que não conheci nem avôs, nem tios, nem primos. Do lado da minha mãe, a minha avó é de Luanda mas o meu avô é do Lubango. Já os bisavós, sei que havia uns que vinham de Aveiro, outros que já nasceram lá [no Lubango]. Portanto, já venho de uma terceira geração de angolanos, nascidos em Angola.

Maka: Onde e o que estudou?

Luaty: Escolhi a Inglaterra. Queria estar num sítio onde pudesse aprender o mais possível, onde pudesse estar em contacto com uma língua diferente, com pessoas de vários pontos do mundo. Fiz os meus três anos na Inglaterra [em Plymouth], tirei a minha licenciatura, em engenharia electrotécnica.

Maka: E como foi a sua experiência?

Luaty: Foi muito boa. Uma vez fora de Angola é que eu senti a necessidade mais de me reivindicar como angolano e de me conhecer como angolano.

Maka: Como assim?

Luaty: Lembro-me de um episódio interessante com uma amiga do Ghana. Ela perguntou-me qual era a língua africana que eu falava e eu disse que nenhuma. Ela perguntou qual era a nossa língua e eu disse português. E ela disse: “Sim, sim, mas isso é a língua oficial. Mas depois existem as línguas de Angola. Qual é a língua que tu falas?” E eu respondi que nenhuma. E ela disse: “Como é que tu queres ser africano? Só porque nasceste lá?” Eu quis justificar que nós, em Angola, procurámos destribalizar, dar uma noção de unicidade, de identidade comum. Mas, ao mesmo tempo, não podia negar que era prejudicial relegar as nossas línguas ao esquecimento e não termos aprendido mais esse elemento cultural que nos identificasse. Senti-me um bocado diminuído perante os meus colegas africanos.

(Risos)

E ainda não corrigi isso. Mas é um objectivo de vida, aprender pelo menos uma das línguas nacionais. Eu tenho até alguma facilidade em línguas, então quero aprender Kimbundu que é da minha região, mas porque não outra também?

Maka: Para além da música, que outros interesses tinha?

Luaty: A música, para mim, sempre foi um escape, sempre foi uma maneira de libertar coisas que eu tinha dentro. Eu não queria tirar a pureza dessa coisa, dependendo dela financeiramente. Ia acabar por deturpar a minha maneira de encarar a arte e a música. Então sempre quis mantê-la nesse canto de não dependência financeira.

[O meu interesse] era mais no ramo da política. Comecei a interessar-me pela maneira como funcionavam as coisas. E na altura comuniquei ao meu pai que queria fazer ciências políticas e ele perguntou-me porquê. Eu disse que queria perceber o mundo. Ele disse-me: “Se queres perceber o mundo então faz economia.” E eu acatei e não me arrependo.

Foi o que eu fiz em França, fiz outra licenciatura, em economia.

Nessa altura, os estudantes universitários, por todo o país, bloquearam as universidades [em protesto]. E, então, eu participei nesse bloqueio, mais por uma questão de solidariedade.

Maka: E foi aí que começou um pouco a sua de consciência cívica?

Luaty: Não, eu já tinha estado numa manifestação na Inglaterra, em que saímos de Plymouth para Londres. Foi a primeira grande manifestação depois do fim da Segunda Guerra Mundial, com um milhão e tal, dois milhões de pessoas nas ruas de Londres por causa da guerra no Iraque.

Maka: Isso foi em Março de 2003.

Luaty: Exacto. Aquilo despertou em mim sensações e emoções fortes. França foi a segunda experiência. Também foi assim muito intenso porque bloquear a universidade, dormir lá dentro. Fiquei lá a dormir durante duas semanas.

Maka: E então terminou a licenciatura em economia, em França, e depois voltou para Luanda?

Luaty: Exactamente. Sempre a meio do curso tem aquele… Não sei se a palavra existe em português, que é aquele homesickness…

Maka: Saudades da terra.

Luaty: Pois, eu já estava a sentir a chamada, que estava na hora. Também o meu pai morreu, entretanto, em 2006. Estava já com muita vontade de voltar para o meu país.

Maka: Falemos dessa viagem de regresso a Angola. Foi a pé e à boleia de Lisboa até Luanda….

Luaty: Exacto.

Maka: Ao contrário dos milhares de emigrantes africanos que tentam alcançar a Europa, fez o percurso inverso. Qual foi a motivação?

Luaty: As limitações que me impunha eram sempre o perigo e as doenças e os animais selvagens… E eu nunca achei que nenhum desses pretextos fosse bom o suficiente para me desmotivar.

Eu saí [de Lisboa] com 115 euros, que era tudo o que eu tinha, mais quatro t-shirts, dois ou três calcões, um saco de dois quilos de frutos secos que seriam a minha refeição quando não aparecesse outra coisa. Mas fui com plena confiança que eu ia encontrar, porque eu conheço a natureza da gente simples de África, de todos os países africanos, que é igual à gente simples um bocado por todo o mundo. E fui com plena confiança que ia encontrar essa solidariedade. E encontrei todos os dias. Ao ponto de eu não ter conseguido começar o segundo saco de frutos secos… (Risos)

Maka: E chegou a Luanda ainda com um saco de frutos secos?

Luaty: Com um saco cheio de frutos secos, depois de seis meses. Portanto foi mesmo inenarrável, a emoção de cada encontro, cada pessoa, cada personagem, cada individualidade com quem me cruzei. Logicamente que havia aqueles menos preocupados em dar-me boleia, ao ver um mulato aí maluco, de mochila, calção curto, à beira da estrada. E, só por curiosidade, deixa lá ver o que é que esse gajo quer. Alguns tentavam pedir dinheiro. Quando eu recusava: “Sobe na mesma.”

Maka: E as pessoas manifestavam surpresa quando dizia que viaja para Luanda à boleia?

Luaty: Sim.

Maka: Sobretudo logo ali em Marrocos…

Luaty: Quanto mais me aproximava, menos surpresa causava mas ali, longe, disseram: “Nunca vai chegar lá, aqui nunca ninguém te apanha.” Esses que diziam “Nunca ninguém vai te dar boleia” eram os que me davam boleia. Eu dizia: “Mas tu deste boleia…”. E respondiam: “Mais ninguém te vai dar boleia!” Corri os meus riscos.

Maka: Mas qual era a sua grande motivação para fazer a viagem? Não era só chegar de Lisboa a Luanda…

Luaty: Não. Era palmilhar por terra o máximo de países africanos possíveis, beber da experiência, enriquecer-me espiritualmente. Eu não sou crente, mas acredito no ser humano, acredito que existe a bondade ainda suficiente para nos inspirar, para nos servir de combustível, para sermos também pessoas melhores. E isso para mim é que é a manifestação do divino. Porque não tenho religião, não acredito em Deus, sou ateu, mas acredito nos seres humanos. Então foi essa busca da bondade do ser humano, essa partilha, esse encontro que eu sabia que iria marcar-me de uma maneira que até hoje não percebo plenamente.

Maka: Sente-se de alguma forma dividido entre ser angolano e ser português? Se houver um jogo de futebol entre Portugal e Angola quem apoia?

Luaty: Angola! É assim, eu não me sinto nada dividido. Eu sinto-me bem aqui [Portugal], acho que este é um país lindo. Dentro do universo europeu, são das pessoas mais simpáticas. Eu, quando tenho de defender Portugal em algum sítio são estas as razões. Para além de ser um país pequeno, fácil de visitar, que tem paisagens fantásticas, tem dos povos mais simpáticos da Europa, se não for o mais simpático que eu conheço.

Mas eu nunca tive essa cena de sentir a mesma paixão e o mesmo fervor e o mesmo orgulho patriota por Portugal.

Não é uma coisa de recusar nada, é simplesmente….

Maka: Onde o seu coração bate?

Luaty: Exactamente, não bate da mesma maneira.

Maka: E sendo angolano mas também português, sente que em Angola também é branco, mestiço ou mulato? Como se identifica racialmente? Sente que as pessoas olham para si de uma maneira diferente do que se fosse negro?

Luaty: Sem dúvida.

Maka: Como?

Luaty: Foi muito difícil lidar com isso durante a minha infância. Eu era chamado todo o tipo de nomes. Lembro-me de ter ouvido coisas muito feias. Mulato canga massa [milho torrado], esquebra [restos] de colono. Esses termos assim bastante ofensivos que magoavam. E que magoam.

Maka: E isso era por causa da côr da sua pele?

Luaty: Sim. Porque conotava-se o branco ao português, o branco ao estrangeiro opressor, o branco ao cooperante que, uma vez terminado o colonialismo, já tinha regressado [a Angola] para continuar a levar só os cheques de volta para a sua terra. Isso explica-se historicamente. Mas quem nasceu agora não quer saber da História, quer saber o que está a constatar. O branco continua a ser rico, continua a ter os melhores empregos, independentemente de ser angolano ou não. Foi o que o colono deixou aqui. Isso é tentar justificar o injustificável, não é? Porque coisas tão básicas como o racismo são só fruto da ignorância. Mas a ignorância existe.

Aprendi a lidar com isso e, finalmente, percebo. Não aceito, mas percebo. Ainda assim eu acho que é um assunto que tem de ser tratado com a máxima urgência porque é um assunto sobre o qual se prefere fazer tabu ou guardar silêncio como se não existisse.

Maka: E sente que tem de provar, continuamente, o seu valor como angolano?

Luaty: Não, não, eu já não me preocupo mais com isso. Quando era mais jovem sentia isso, ao ponto de omitir ou ter alguns problemas com a questão da dupla nacionalidade, que podia legitimar esse argumento… Agora não tenho o mínimo problema com isso. E não sinto que tenha de provar mais nada. Eu faço a minha música. Na minha música eu transpareço aquilo que sou, a minha essência, o meu coração, a minha consciência. E sinto que, tornando público quem sou, através da música, estou a cumprir com o meu papel.

Maka: Neste momento a música em Angola está a ter um papel importante como instrumento de contestação, com músicos como você, o MC K e muitos outros com quem também colabora. Como chegou ao universo da música interventiva, da música com carga social?

Luaty: A minha música sempre reflectiu o meu estado de espírito. Chateado quando estou chateado, a dizer os meus disparates quando estou muito chateado ou quando era simplesmente um jovem e… era bastante disparatado, dizia bastante mais asneiras. A música também reflectia isso.

E durante alguns anos a minha música era o hip hop, era um hip hop para rappers, era música para rappers, não era uma música transversal que podia ser ouvida por toda a gente, era para quem percebia os códigos do hip hop. Mas depois fui amadurecendo.

Maka: Quando começou a fazer música?

Luaty: Desde 94, eu tinha 13 anos. Comecei a rabiscar coisas, a brincar ao músico. No entanto nem o meu pai nem a minha mãe sabiam, até que uma das músicas que eu fiz, já cá na Europa, chegou ao meu pai por um amigo, um grande amigo seu.

(Risos)

E aí ele descobriu. Ligou-me para a Inglaterra: “Ouve lá, tu és o Brigadeiro Mata Ratos?” Eu fiquei muito encabulado….

Maka: Foi uma maneira boa de ele descobrir…

Luaty: Sim, por outros. Foi, foi bué fixe.

Sempre foram as minhas preocupações postas em papel, postas em música, que era um espelho perfeito daquilo que era a minha alma. Então, naturalmente, quando comecei a ter essas preocupações, de descobrir… quando comecei a questionar-me [sobre] a minha existência e os meus privilégios, a minha música começou também a reflectir isso.

A consciência e a intervenção política passaram a ser cada vez mais presentes, mesmo nas músicas que supostamente são inofensivas eu não consigo deixar de ter uma piadinha, algo tendencioso.

O Cuca… O ritmo é tão para cima, mas ainda assim eu quis fazer uma história engraçada mas sem descurar a minha preocupação. Mas lá está, não é muito consciente, é instintivo.

Maka: Passou a tomar consciência das desigualdades sociais, dos problemas políticos quando regressou a Angola. Mas os seus amigos eram as mesmas pessoas ou passou a frequentar outros círculos por via da música?

Luaty: Sim, na verdade eu fui-me tornando cada vez mais isolado, fui-me isolando mais das pessoas. No meu processo de crescimento distanciei-me da maior parte das pessoas que eu conhecia, que eram do meu meio e que preferiram continuar a ser fechadas e tapadas e estúpidas e a viver a sua vida despreocupadamente…

Maka: Pessoas um pouco mais privilegiadas, económica e socialmente?

Luaty: Sim, sim. Porque deixei de ter assunto para falar com elas. Deixei de me sentir próximo delas e a simpatia não chega para as pessoas serem amigas. Estar num sítio onde as pessoas só conseguem falar de coisas supérfluas e fúteis, chega uma altura que basta. Fui-me distanciando das pessoas, naturalmente. E foram aparecendo pessoas novas, claro.

Maka: Mas voltando à música…

Luaty: A música de intervenção neste momento, nos últimos anos em Angola, é quase única e exclusivamente o hip hop, um braço dentro do hip hop. É uma corrente que existe desde o fim dos anos 90, princípio dos anos 2000. Portanto, estabeleceu-se ali uma certa corrente que ao longo de 15 anos influenciou uma boa parte daquela juventude. Eu fui confrontado agora com os efeitos e a influência que a música pode ter na mente das pessoas e em que é que ela se materializou com o início dos protestos em Angola.

Chegamos ao ponto de se cobrar. “Onde é que estão os revolucionários do estúdio, que nos fazem vir até aqui e nos formaram? Onde estão? É só cantar?” Houve ali aquele momento de cobrança aos artistas que não estavam presentes. E há sempre.

Então senti que, se calhar, aquilo [a música de intervenção] começou a dar os seus frutos, começou a mostrar que realmente contribuiu para a formação intelectual e cívica da nossa juventude.

Maka: Quem eram esses músicos?

Luaty: Um grupo essencial, para mim são os Filhos da Ala Este. Esse grupo foi um ponto de viragem para mim. É uma grande referência desse momento que se viveu. Eles também eram vítimas de um bocado da falta de qualidade musical nos instrumentais mas com uma tal capacidade descritiva… Tão bem escrito, tão forte que conseguia prescindir de tudo o resto. Emocionou-me mesmo, ao ponto de me fazer sentir estúpido na minha soberba de privilegiado que sempre teve acesso a tudo e mais alguma coisa; [de alguém] que sempre teve o preconceito de que quem vive no gueto não tem acesso à educação e é estúpido, é burro, é analfabeto.

Ser confrontado com cinco (acho que eram cinco ou seis) jovens com um tal discernimento, uma tal clareza de ideias, eu senti-me um autêntico ignorante. Eles tiveram essa força com a música deles. Fizeram-me sentir estúpido e totalmente desconhecedor do país.

Depois apareceu o MC K, também influenciado por esse grupo. O MC K apareceu no fim dos anos 90, lançou o primeiro álbum em 2002 mas já vinha fazendo algumas coisinhas.

E foram aparecendo outros grupos, não tão vincados, não tão directos, desses que conseguiram ter algum nome como os Hemoglobina, Flagelo Urbano.

Ainda aparecem raros casos de grande talento individual, casos dignos de referência como o Phay Grande ou o Mona Dya Kidi, que é das últimas coisas que apareceu aí muito interessantes, muito inteligente, uma maneira de rimar muito dele e com uma mensagem consistente.

Maka: O dia 7 de Março de 2011 ficou marcado por uma manifestação que acabou por não acontecer. Foram presos logo quando se juntaram na praça. Há uma espécie de antes e depois do dia 7 de Março de 2011?

Luaty: Acho que sim. Acho que é justo dizer isso, afirmar isso dessa maneira. Não foi a primeira vez que se fez uma manifestação em Angola. Já houve outros bravos, corajosos antes deste grupo de jovens que desafiaram todas essa ameaças. Houve manifestações de estudantes, invariavelmente dispersadas a tiro. Só estavam a reclamar fins de greves, porque as greves faziam com que os estudantes que tinham cursos de cinco anos e que nunca tivessem chumbado tivessem acabado por fazer 10 [anos].

Maka: Greves de professores?

Luaty: Greves dos professores. Dispersados a tiros. Houve uma manifestação de pessoas, cujas casas foram demolidas, que tentaram chegar à Cidade Alta, também foram dispersadas a tiro.

Esses exemplos, apesar de se tentarem abafar, foram chegando e deixaram sementes. Não podemos esquecer essas pessoas. O 7 de Março foi um momento muito particular. Estavámos a viver aquele momento especial no norte de África. As pessoas ganharam esperança, viram pessoas que estavam em situações similares com presidentes tão longevos como o nosso e, em alguns dias, conseguirem livrar-se deles. Foi uma chama, foi uma esperança que apareceu naquele momento.

Mas ninguém estava a ligar. Quem fez alarido, quem fez a confusão toda foi o próprio regime. Tanta confusão à volta daquilo. Ameaçou as pessoas, então isso teve o efeito inverso em alguns de nós.

Maka: Tem havido uma mudança na táctica do regime. Começou por organizar contra-manifestações para mostrar que o povo estava do lado do MPLA, e depois passou a reprimir apenas, com violência e o surgimento das milícias. O que se passa?

Luaty: É o que está a acontecer. [As autoridades] mudaram de estratégia.

Maka: Vocês são ameaçados, espancados e alguns raptados. Há tentativas de suborno?

Luaty: Acho que já desistiram das tentativas de suborno.

Maka: Foi-lhe feita alguma a si, em particular?

Luaty: Não. Eu estava ausente nessa altura. Foi antes da manifestação de 3 de Setembro. Foi feita pelo general Tavares que, na altura, era administrador do município do Sambizanga. Chamou-nos e tentou negociar connosco e chegou ao ponto de – eu estou a relatar o que me contaram a mim – ter despejado chaves de carrinhas à frente [do grupo] e, de uma daquelas caixas de resmas de papel, ter despejado dólares. Eram US $70 mil e disse que tinham mais US $200 mil quando concordássemos em abortar a manifestação e admitir em público que não sei o quê, e não sei o quê mais… Os meus colegas não aceitaram. Mas a partir daí começou justamente o plano B, o recurso à violência descarada, que tem sido uma constante agora com raptos.Temos dois jovens que estão raptados, até hoje ninguém sabe deles. Ameaças às famílias… Isso já era previsível.

Maka: Tem alguma expectativa em relação ao acto eleitoral?

Luaty: A fraude já começou a ser preparada. Está bem claro aos olhos de toda a gente. Eles [o partido no poder], desde o início do processo, estão a tentar impingir a sua vontade contrariamente ao espírito da lei que eles próprios se esforçaram por fazer aprovar. Lei, Constituição, discussão na Assembleia são meros actos de maquilhagem. Eles não têm consideração nenhuma por nada disso. O MPLA vai ganhar, porque a nossa oposição é muito frouxa. Se conseguirem levar, como estão a conseguir, todas essas ilegalidades avante. E conseguem.

Maka: Recentemente, a 11 de Junho deste ano, você foi preso à chegada a Lisboa, proveniente de Angola, por ter sido encontrada cocaína na sua bagagem. O que tem a dizer?

Luaty: Sim. É conhecimento generalizado das práticas utilizadas, sobretudo com pessoas que têm esse tipo de posicionamentos, tão declarado, tão aberto, sem tabus, e que sejam contra o poder instituído. Eu próprio, tirando esta última vez, das últimas vezes que viajei, viajei sem bagagem de porão, só com a mochila. Desta vez arrisquei-me e dei-me mal. Dei-me mal entre aspas, porque tendo sido a tentativa deles tão frustrada e a manipulação tão grosseira, acabaram por ser eles [o regime] a sair mal na fotografia e a darem um bocado mais de visibilidade àquilo que nós estamos a fazer.

Maka: Como está o caso?

Luaty: Neste momento eu tenho a liberdade de ir para onde eu quiser desde que notifique as autoridades [portuguesas] se este período for superior a cinco dias. Logicamente que me limita um bocado não ter a certeza, não puder saber… Isto tem a ver com a data de marcação do julgamento. Tenho que poder estar disponível para estar cá quando for convocado para ser presente ao tribunal. Vou continuar a fazer a minha vida normalmente, porque isso me foi permitido, me foi dada essa possibilidade com esta medida de coação. E, neste momento, o caso está a ser investigado pelo Ministério Público.

Maka: Como foi tratado pela justiça portuguesa?

Luaty: Quando cheguei a casa e vi alguns comentários, algumas premonições por parte de alguns comentadores no ciber-espaço, achei que foram precipitados e injustos tendo em conta o tratamento que eu tive. Fiz questão de citar isso num vídeo onde explico o que se passou, porque [as autoridades portuguesas] foram exemplares, foram impecáveis. Não há nada a apontar. Não tenho razões de queixa. É sem dúvida uma sensação que fui mais do que bem tratado, com dignidade e com humanismo.

Maka: Regressa a Angola?

Luaty: Volto sim. Dia 26 de Julho.

Angola: Maior representação de sempre e o sonho de uma medalha no judo



EL - Lusa

Luanda, 26 jul (Lusa) - Angola participa nos Jogos Olímpicos com a maior delegação de sempre, com 34 atletas distribuídos por sete modalidades e o sonho de uma medalha está nas mãos da judoca Antónia de Fátima "Faia", porta-estandarte na cerimónia de abertura de Londres2012.

A desilusão para os Jogos Olímpicos foi a seleção masculina de basquetebol, 10 vezes campeã do continente africano e que não conseguiu qualificar-se.

A esperança de uma medalha está na prestação de Antónia "Faia", que no último Campeonato do Mundo de judo, disputado em Bucareste, onde alcançou a medalha de bronze, na categoria de -70 kg.

As outras modalidades em que vão competir atletas angolanos - 29 mulheres e cinco homens - são basquetebol e andebol feminino, natação, atletismo, canoagem e boxe.

Vai ser a oitava vez que Angola compete nos Jogos Olímpicos, depois de se ter estreado em Moscovo (1980), Seul (1988), Barcelona (1992), Atlanta (1996), Sydney (2000), Atenas (2004) e Pequim (2008).

A 27.ª edição dos Jogos Olímpicos decorre entre 27 de julho e 12 de agosto.

Jogos Olímpicos: DOIS MARATONISTAS TIMORENSES PROCURAM CHEGAR AO FIM



PA - Lusa

Londres, 26 jul (Lusa) - Timor-Leste vai estar representado nos Jogos Olímpicos de 2012 por dois maratonistas, Augusto Ramos e Juventina Napoleão, para quem a presença em Londres já é uma vitória e terminar a prova será uma medalha.

Sem mínimos para obter qualificação, os dois timorenses beneficiaram de "wild cards" para estarem na capital britânica, a forma que o Comité Olímpico Internacional (COI) utiliza para dar oportunidade aos países menos desenvolvidos e assegurar a universalidade dos Jogos.

A responsabilidade de Augusto Ramos, de 25 anos, e Juventina Napoleão, de 23, é representar bem o país na quarta presença de Timor em Jogos Olímpicos e, para ajudá-los nessa tarefa, contam com o apoio de um português, Nelson Silva, responsável pela preparação de ambos os atletas, que estiveram duas semanas em estágio no Porto, antes da partida para Londres.

Nelson Silva, destacado para Timor-Leste como militar a GNR, criou raízes por lá e foi convidado a ficar pelo presidente de timorense, Ramos Horta, responsabilizando-se pela criação de uma equipa de BTT e outra de atletismo e pela formação de treinadores.

O estágio proporcionado pela Universidade do Porto permitiu a Augusto Ramos e Juventina Napoleão, além da adaptação ao clima e ao fuso horário, tomar contacto com novos métodos de treino, o mesmo acontecendo com o treinador António Costa, que os acompanha.

Augusto Ramos tem como melhor registo 2:30 horas, recorde timorense, e Juventina Napoleão procura melhorar a sua marca de 3:05. Nelson Silva faria um balanço positivo se um e outro terminassem as corridas em boas condições e com novos recordes nacionais.

A maratona feminina realiza-se a 05 de agosto e a masculina a 12, no dia de encerramento dos Jogos Olímpicos, cuja cerimónia de abertura está marcada para sexta-feira, 27 de Julho.

- Foto em Sapo TL

Jogos Olímpicos - Moçambique: Kurt Couto é única esperança de medalha



PMA - Lusa

Maputo, 26 jul (Lusa) - Moçambique vai participar nos Jogos Olímpicos Londres2012 com seis atletas, mas as expetativas de uma medalha estão depositadas em Kurt Couto, nos 100 metros barreiras, disse à Lusa o vice-presidente do Comité Olímpico Nacional (CON) moçambicano.

O país será representado em Londres pelos atletas Kurt Couto, Sylvia Panguene (100 metros barreiras), Juliano Máquina (pugilismo) Neuso Sigaúque (judo) e pelos nadadores Chakil Camal (100 metros livres) e Jéssica Vieira (50 e 100 metros livres).

Segundo Aníbal Manave, apenas o velocista Kurt Couto e o pugilista Neuso Sigaúque vão competir por terem conseguido os mínimos exigidos na fase de qualificação, enquanto os restantes atletas estarão presentes em Londres ao abrigo das vagas a que o país tem direito no âmbito da solidariedade olímpica.

"Temos algum otimismo em relação aos atletas que conseguiram os mínimos para a qualificação aos jogos, mas as expetativas são baixas em relação aos atletas que vão lá ao abrigo da solidariedade olímpica", declarou o vice-presidente do COM, que é igualmente chefe da missão olímpica moçambicana a Londres.

Com duas participações olímpicas, Atenas2004 e Pequim 2008, e medalha de bronze nos Jogos Africanos de 2011, Kurt Couto é a maior esperança de Moçambique na conquista de uma medalha em Londres.

Se conseguir, passará a ser o segundo moçambicano a chegar ao pódio, depois de a atleta Maria de Lurdes Mutola, já retirada, ter conquistado o ouro dos 800 metros em Sydney2000 e o bronze em Atlanta1996.

Os Jogos Olímpicos de Londres começam no dia 27 e terminam a 12 de agosto.

Jogos Olímpicos - Cabo Verde: Três atletas e uma qualificação direta inédita



CLI - Lusa

Cidade da Praia, 27 jul (Lusa) - A judoca cabo-verdiana Adisângela Moniz (+78 quilogramas) é a primeira atleta de Cabo Verde a qualificar-se diretamente para uns Jogos Olímpicos, que se realizam de 27 de julho a 12 de agosto, em Londres.

Após doze anos de "wild cards" (convites de solidariedade olímpica), Cabo Verde participa este ano pela quinta vez nos Jogos Olímpicos, mas a primeira com uma atleta que conseguiu qualificar-se para participar na competição.

O arquipélago iniciou a sua participação nos jogos olímpicos de Atlanta (EUA, 1996), esteve em Sydney, Atenas e Pequim, mas sempre através de "wild cards", convites especiais dirigidos aos comités olímpicos dos países que não conseguiram os mínimos necessários para garantir a vaga nos jogos olímpicos.

Em declarações à agência Lusa, o presidente do Comité Olímpico Cabo-Verdiano (COC), Franklin Palma, indicou que Adisângela Moniz qualificou-se pela quota africana.

Além da judoca Adisângela Moniz, Cabo Verde participa ainda nos Jogos com Rubem Sança, no atletismo (5.000 metros) e Lidiane Lopes, que competirá nos 100 metros feminino, ambos a convite da organização, face às "muitas dificuldades" em preparar atletas para a alta competição, disse Franklim Palma.

"A preparação foi um tanto ou quanto tumultuosa, porque temos ainda algumas lacunas e, infelizmente, não temos conseguido os mínimos para a participação. Quando assim acontece, a participação é possível através de convites especiais dirigidos aos comités olímpicos nacionais que, por sua vez, propõe os atletas", disse.

A falta de infraestruturas desportivas para preparar os atletas, nomeadamente no domínio do atletismo, é uma das lacunas apontadas por Franklin Palma para a fraca prestação dos atletas cabo-verdianos nas competições de qualificação.

"Isso tinha a ver com a própria situação do país. A primeira pista olímpica de atletismo tivemo-la há cerca de três meses e já participamos nos Jogos Olímpicos há 12 anos. Para ter atletas capazes de competir, temos de ter infraestruturas desportivas. Mas acredito que, em 2016, teremos melhores condições de participar", explicou.

Para já, a aposta do COC é nos atletas cabo-verdianos que vivem atualmente fora do país, mas sem descurar, contudo, os residentes.

Para os Jogos Olímpicos deste ano, Franklin Palma disse esperar primeiramente "uma boa prestação" dos atletas.

"Para nós, significa primeiro que os atletas iniciem e terminem as respetivas provas. Claro que espreitamos bons resultados, sobretudo nos 5.000 metros, já que o atleta tem tido uma excelente preparação. Mas são jogos olímpicos com atletas de alto nível que vêm de países com melhores condições", indicou.

Mais lidas da semana