domingo, 10 de março de 2013

Portugal – Marcelo: PASSOS “ARRANJOU UM BERBICACHO” COM O SALÁRIO MÍNIMO


Pela boca morre... o Coelho


LUCIANO ALVAREZ - Público

O antigo líder abordou também o prefácio de Cavaco Silva, afirmando que não disse nada de novo.

Marcelo Rebelo de Sousa acusou neste domingo o Governo de ter arranjado um “berbicacho” com o salário mínimo numa semana com boas notícias para Portugal.

No seu habitual comentário de domingo na TVI, o antigo Presidente do PSD lembrou os factos de Portugal ter mais tempo para pagar a dívida, a subida dorating do país e as declarações de Durão Barroso sobre o apoio da União Europeia para dar mais um ano ao Governo para cumprir o défice. “O Governo, em vez de explicar as boas notícias, arranjou um berbicacho com o salário mínimo”, afirmou o social-democrata.

O também Conselheiro de Estado de Cavaco Silva lembrou que o PS tinha pedido um aumento do salário mínimo e disse que Passos Coelho, questionado sobre a matéria, teve a pior atitude. O primeiro-ministro disse que o melhor para criar emprego era baixar o salário mínimo, mas que não o iria fazer.

Para Marcelo, numa altura em que colocava na boca de Passos o que ele não disse – que queria baixar o salário mínimo -, apareceu “o inefável António Borges a afirmar que o ideal era baixar os salários. “A oposição apareceu logo a dizer que ele [Borges] estava a dizer em voz alta o que Passos não diz”, acrescentou. “Foi um, dois, três, quatro tiros nos pés”, afirmou.

Nada de novo com Cavaco

Já sobre o prefácio de Cavaco Silva ao livro Roteiros VII, que faz o balanço do último ano da presidência, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou na TVI que o Chefe de Estado disse o que já se sabia e o que sempre pensou.

Resumindo, o antigo líder do PSD diz que Cavaco Silva disse que não vai fazer nada enquanto a troika estiver em Portugal, que é livre para criticar as políticas europeias, que apoia o Governo e que actua nos bastidores para obter consensos. Para Marcelo, o actual Presidente “tem a visão mais minimalista dos poderes presidências” de todos os chefes de Estado que já passaram por Belém na democracia.

Para os que achavam que Cavaco Silva ia demitir o Governo ou algo do género, Marcelo reafirmou: “Ele [Cavaco] é herbívoro, não é carnívoro. Não vai estar refastelado a comer a carne. Come erva.” a avaliação da troika, que deve ser conhecida nos próximo dias, Marcelo diz saber que na tarde deste domingo “houve muita tensão” entre o Governo e os representantes dos credores.

Portugal: HÁ SEMPRE O PASSADO




Pedro Marques Lopes – Diário de Notícias, opinião

Passos Coelho, que no início do seu mandato jurou a pés juntos nunca ir desculpar-se com o passado, passou o debate parlamentar da última quarta-feira a fazê-lo.

Nada de muito surpreendente, não sobra mais nada que se assemelhe, sequer vagamente, a discurso político. O slogan do "vamos atingir os 4,5% de défice custe o que custar" morreu e a bravata do "nem mais tempo nem mais dinheiro" soçobrou à realidade. Já não há metas nem luzes ao fundo do túnel para apontar. Não há reforma digna desse nome, não há dado que não grite o falhanço absoluto do Governo e do plano europeu, que era, como foi repetido, o seu próprio. Nada bateu certo, tudo ficou muito pior.

Com o desaparecimento das narrativas o discurso, que já não era propriamente fluente nem bem estruturado, tornou-se errático, sem sentido. Atiram-se simplesmente uns assuntos para o ar.

Invocam-se os cortes de 4000 milhões de euros que o Estado francês vai fazer para justificar os cortes do mesmo valor que o Governo português tenciona realizar. Uma comparação destas, aliás, só pode ter sido feita por má-fé ou por pura ignorância. Só alguém muito distraído pode acreditar que cortes deste valor em França e em Portugal têm os mesmos efeitos. Alguém que ignore que cortar 4000 milhões de euros no Estado social francês e português não é a mesma coisa. Alguém que não conheça a extensão do Estado Social português e francês. Alguém que não saiba a diferença entre os salários, pensões e prestações sociais em Portugal e em França. De facto, é difícil acreditar que um primeiro-ministro desconhece estas realidades.

Faz-se um discurso sobre o valor do salário mínimo que apenas nos recorda o distanciamento do primeiro-ministro face à realidade das empresas portuguesas e o desconhecimento sobre as razões dos números do desemprego. Disse Passos Coelho que, apesar de não o tencionar baixar, acreditava que o desemprego baixaria se existisse uma redução do salário mínimo.

Não há empresário que possa dizer com verdade ao primeiro-ministro que a sua quinquagésima fonte de preocupação é o valor do salário mínimo. Falarão do custo de electricidade, água, gás; falarão da incomportável carga fiscal; falarão da burocracia, dos licenciamentos e afins; mas sobretudo falarão da impossibilidade de se financiarem e da falta de clientes. Em termos muito simples: não havendo crédito para as empresas funcionarem nem clientes para se vender os produtos não há postos de trabalho. Não existirá um único empresário digno desse nome que lhe diga que se o salário mínimo, com o actual valor, diminuir contratará mais trabalhadores. Mais, existirão seguramente muitos empresários a pedir para que se aumente o salário mínimo como forma de aumentar a procura interna, que, convém recordar, é importante tanto para as empresas que trabalham para o mercado interno como para as que exportam.

Pode haver uns senhores, que de empresários só terão o nome no cartão de visita, que digam que uma diminuição do salário mínimo lhes permitirá manter as suas empresas no mercado. É muito simples: uma empresa que baseie o seu modelo de negócio em baixos salários, no limite precise que estes sejam ainda mais baixos do que 485 euros, já está morta. Como diria o Presidente da Republica, citando talvez La Palisse, "não é com baixos salários que se garante a competitividade das empresas". Existirão sempre Chinas. Um país como Portugal se quer assinar a sua sentença de morte económica basta-lhe apostar num modelo baseado em baixos salários, em baixas qualificações, em produtos com pouco valor acrescentado. O empobrecimento é apenas um dos passos para essa morte.

Já não há discurso. Sobram estes pedaços de coisa nenhuma, desligados de qualquer estratégia ou rumo.

Resta o passado. Vamos nos próximos tempos ouvir falar muito dos erros do passado, e, como bem sabemos, é um tema sem fim. Foram muitos. No passado recente, no menos recente, no ainda menos recente, no início do processo democrático, no Estado Novo, e por aí fora.

Mas é, no fundo, a admissão da derrota. Quando se desiste de lutar, quando não se é capaz de encontrar soluções, há sempre o passado para culpar. O passado, em política, é o último refúgio do fracasso.

MILHARES DE MANIFESTANTES NAS RUAS DE ESPANHA CONTRA DESEMPREGO E CORRUPÇÃO




Jornal i - Lusa

Cerca de 300 mil pessoas sairam hoje à rua em 60 cidades espanholas para protestar contra a alta taxa de desemprego e a austeridade e para pedir uma regeneração democrática para o nível de corrupção, informa a agência noticiosa Efe.

Um porta-voz da Cúpula Social – uma plataforma que congrega 150 organizações sociais e sindicais e que convocou a manifestação de hoje por toda a Espanha -, indicou que terão saído 300 mil pessoas para as ruas em protesto.

Na capital espanhola, Madrid, registaram-se cerca de 50 mil manifestantes nas ruas, na Catalunha 66 mil, na Comunidade Valenciana 30 mil, ou nas Astúrias cerca de 20 mil pessoas.

Os secretários gerais da Confederacão Sindical de Comissões Obreiras (CCOO), Ignacio Fernández Toxo, e do Sindicato da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Cándido Méndez, encabeçaram a manifestação em Madrid.

Toxo afirmou que a política que o Governo está a seguir é “ditada pela Alemanha” e está a provocar uma inversão da democracia e uma “tempestade perfeita” para o desemprego.

O dirigente sindical Méndez pediu, por seu turno, que o dia de manifestação fosse uma expressão de rejeição “muito clara” à política do Governo, porque, argumenta, está a provocar uma paralisação “brutal” e um distanciamento entre cidadãos e instituições democráticas.

O manifesto, que foi lido nas Portas do Sol, alertou que a corrupção e minam a confiança nas instituições e ameaçam “seriamente” a convivência democrática.

A manifestação mais numerosa foi em Barcelona – com cerca de 60 mil manifestantes, segundo os sindicatos e 20 mil, segundo a polícia espanhola.

Durante o protesto, os manifestantes gritaram contra o progressivo empobrecimento da população, contra os contínuos cortes nos serviços públicos e contra os escândalos da corrupção.

UM MODELO DA ATUAL CRISE DA ZONA EURO: DO CONTÁGIO À INCOERÊNCIA




Yanis Varoufakis

Este artigo oferece aos leitores um modelo analítico coerente da actual Crise da Zona Euro. Começa com uma análise macroeconómica das causas da Crise e depois, o que é mais importante, modela o feedback entre as reacções institucionais e políticas da Europa e o processo de contágio que começou com a Grécia. Para a versão completa do artigo, clicar aqui . O que se segue é um resumo, sem matemática, de cada uma das secções do documento.

1. Introdução: Para um macro-modelo de contágio 

De há três anos a esta parte temos vindo a analisar a Crise da Zona Euro e o contágio dinâmico que levou a zona do euro à beira da desintegração. No entanto, que eu saiba, até agora ninguém propôs um modelo macroeconómico; pelo menos, nenhum que represente o mecanismo dinâmico de feedback entre a Crise e as reacções da Europa (ou a falta delas) a essa Crise. Com este artigo, vou tentar reparar essa falta e apresentar uma análise simples da relação entre: 

(a) uma união monetária cujo modelo eliminou os amortecedores de choques internos, duma vez só, ao mesmo tempo que aumentou a probabilidade e a dimensão duma crise futura; 

(b) uma resposta política à crise (pré-decretada) que envolveu a criação de fundos tóxicos de salvamento que acentuaram a crise; 

(c) os desequilíbrios macroeconómicos subjacentes que na realidade estão a aprofundar-se, tornando assim as estratégias fiscais e monetárias da União Europeia logicamente incoerentes; e 

(d) um Banco Central Europeu cuja intervenção decisiva para proporcionar uma estabilidade financeira a médio prazo (os programas de refinanciamento LTRO e OMT [1] para os bancos da Itália e da Espanha, respectivamente) foi feita à custa de reforçar a desintegração a longo prazo.

2. O Padrão Ouro da Europa 

Montando a cena, e antes de analisar a Crise propriamente dita, a Secção 2 descreve a União Monetária Europeia como uma variante interessante do Padrão Ouro no período entre as duas guerras. Ao contrário de outras explicações da Crise do Euro, que se concentram exclusivamente numa divergência prévia dos custos unitários do trabalho e da competitividade (entre os estados membros excedentários e deficitários), esta análise realça a importância da diferença de níveis da oligopolia (ou concentração) nos sectores avançados em bens de capital segundo a linha divisória dos estados membros excedentários-deficitários. 

O meu argumento é que, dada a falta de alta concentração de conglomerados em rede, globalizantes, das economias deficitárias (que podem transformar automaticamente os influxos de capital em investimentos que reforçam a produtividade), a união monetária ocasionou grandes influxos de capital (a partir dos países excedentários para os deficitários) que, por sua vez, provocaram uma inflação galopante do valor dos activos (por ex. as bolhas do imobiliário) nas economias deficitárias e uma taxa de crescimento que ultrapassou em muito a taxa de acumulação no seu sector de exportações. Em contrapartida, as economias excedentárias (cuja manufactura é por definição mais fortemente oligopolizada) tinham de facto falta de competidores nas nações deficitárias (por ex., países como a Grécia não fabricam automóveis) e, naturalmente, experimentaram simultaneamente (a) altas taxas de investimento no capital que aumentam a produtividade e (b) uma concomitante taxa de crescimento consideravelmente mais baixa. 

Esta combinação de taxas de crescimento ultrapassou (arrastou) as taxas de formação de capital fixo nos países deficitários (excedentários) dando origem a uma tensão entre: 

a realidade económica subjacente de uma recessão a fogo lento em sectores cruciais ao longo da linha divisória entre nações excedentárias-deficitárias, e o crescimento epifenomenal que parece tipificar toda a divisa comum ou o bloco de taxas de câmbio fixas e é impulsionado por uma nova forma de exploração financeira das classes trabalhadora e média

A certa altura, esta tensão entrou em rotura sob os esforços de uma crise financeira importada, que em breve incendiou uma espiral clássica de dívida-deflação com a carga de ajustamento desproporcionadamente colocada em cima dos ombros dos estados membros mais fracos. Foi isto, com efeito, aquilo a que o mundo assistiu no período que antecedeu o Colapso de 1929, e que a ele se seguiu, e é precisamente a esse mesmo processo que assistimos recentemente na zona do euro. É como se os inventores da divisa comum tivessem optado de propósito por não ligar às lições da terrível era entre guerras que conspiraram para causar a maior tragédia da humanidade. 

A Secção 3 prossegue depois à análise com algum pormenor das diferenças entre o Padrão Ouro e a construção da zona euro e proporciona uma análise matemática dos desequilíbrios solidamente incorporados que prepararam a zona euro para uma queda profunda no momento da Contracção do Crédito de 2007 e do choque do Colapso de 2008. 

3. A Grécia e os fundos tóxicos de salvamento FEEF-MEE [2] 

Nesta terceira secção, o artigo analisa o significado da Grécia: Começa com a observação de que, na sua tentativa de fazer parar a queda das obrigações (quando o sector público grego se tornou insolvente), de impedir a perspectiva de incumprimento de um estado membro dentro da zona euro, e de preservar o princípio de Dívidas Perfeitamente Separáveis sobre o qual foi fundada a zona euro os líderes da Europa avançaram com uma complexa estrutura de empréstimos. Assim, a maior linha de crédito da história humana foi alargada à Grécia falida através de um estranho empréstimo composto por muitos empréstimos bilaterais (um empréstimo entre cada um dos outros dezasseis membros estados e a Grécia, um entre o FMI e a Grécia e um entre o BCE e a Grécia). 

Enquanto o tomador do empréstimo, a Grécia, pagava uma taxa de juro única (excepcionalmente alta, pelo menos no início) aos seus prestamistas europeus (e uma taxa consideravelmente mais baixa ao FMI), cada um dos estados membros que emprestou à Grécia tinha a sua própria, taxa de juro separada em linha com os rendimentos (yields) dos seus próprios títulos governamentais. Assim quando, dias depois de instaurado o Grande Resgate grego Mk1, a Europa constituiu o FEEF (Fundo Europeu de Estabilidade Financeira) para, supostamente, proteger o resto das soberanias vulneráveis da zona euro (i.e. a Irlanda e Portugal, mas também a Itália e a Espanha), de uma forma que incorporasse a estrutura do empréstimo grego. Em resumo, os títulos que o FEEF estava para emitir reflectiam esta manta de retalhos de empréstimos separados e separáveis, parecendo-se assim com instrumentos de dívida tóxicos tipo CDO [3] . 

Antes de se instituir o FEEF, a única instituição que caracterizava a área da divisa comum era o BCE; um banco central que não tinha mandato para actuar como emprestador de último recurso (nem para os bancos da zona euro nem para as suas soberanias). Por isso, quando a contracção de crédito atingiu a Europa, já estava montada a cena para uma bancarrota sequencial de soberanias e de sistemas bancários. Notoriamente, para amparar o edifício em ruínas, os líderes da Europa ergueram em volta dele as escoras dos fundos de salvação (o FEEF-MEE) financiadas por títulos tóxicos tipo derivativos que continham a semente de um contágio mais rápido! 

4. O contágio reforçado pelo FEEF 

Em consonância com artigos que têm aparecido regularmente neste blogue nos meses e anos passados (por ex. ver aqui e aqui ), a quarta secção do artigo explica precisamente (e através de um modelo matemático coerente) a minha afirmação de que os títulos tóxicos emitidos pelas novas instituições foram de facto de natureza tóxica, tipo CDO, e como é que a sua própria estrutura deu à Crise outro giro rápido, acabando na insolvência da Itália e da Espanha e, inevitavelmente, nas duas intervenções em 2012 do Sr. Draghi, o presidente do BCE. 

5. O Pacto Fiscal e os programas 'extraordinários' (LTRO & TMD) do BCE 

A somar à toxicidade dos títulos do FEEF-MEE, que possibilitaram (em vez de impedirem) o processo de contágio, a Europa fez mais uma coisa para aprofundar a Crise. Introduziu o Pacto Fiscal, altamente contraccionário, em tempos de recessão, garantindo assim a insustentabilidade do processo de consolidação orçamental. Com efeito, a secção demonstra geometricamente que a única forma de a zona euro poder ter êxito no seu plano orçamental sob as condições vigentes de grandes poupanças líquidas no sector privado, era, se quisesse voltar-se com êxito para um fanatismo mercantilista – que tanto os países excedentários como os deficitários desenvolvessem substanciais contas correntes excedentárias com o resto do mundo. 

Muito importante, a Secção 5 liga a análise da toxicidade do FEEF-MEE (ver Secção 4) aos desequilíbrios estruturais nos sectores reais da macroeconomia da zona do euro, acentuados pelo Pacto Fiscal. Também oferece uma interpretação nova para o impacto das duas principais intervenções políticas do Sr. Draghi, o LTRO e o TMD. Em particular, mostra, através de um simples diagrama de fases (através de um sistema de duas equações diferenciais), como o 'Efeito Draghi' acalmou o mercado interbancário e o mercado de acções enquanto 'permitiu' que as placas tectónicas por baixo dessa 'superfície' continuassem a funcionar para a desintegração da zona do euro. 

A secção conclui, resumindo sucintamente, com a sugestão de que nunca antes na história económica à incoerência lógica foi dada uma expressão constitucional (o Pacto Fiscal) que a realidade vai fatalmente destruir. 

6. Conclusão 

Apresento aqui a conclusão do artigo na sua totalidade: 

A zona euro foi fundada sobre dois princípios. 

Princípio 1 : Que o seu banco central fosse explicitamente proibido de actuar como um prestamista de último recurso (para estados e/ou bancos que enfrentam a insolvência). 

Princípio 2 : O princípio de Dívidas Soberanas Perfeitamente Separáveis.

Assim sendo, estava montada a cena para o contágio na sequência de uma crise financeira que podia facilmente levar a que alguns sistemas bancários nacionais e estados titubeassem sequencialmente à beira da falência. A reacção da Europa foi fundar uma nova instituição, FEEF-MEE, para contrair empréstimos por conta dos seus estados membros (ainda) solventes a fim de impedir incumprimentos soberanos. Infelizmente, a estrutura desse 'veículo de fins especiais' foi tal que, com os seus títulos impregnados com o cheiro de derivativos tóxicos, provocou um contágio mais profundo e mais rápido. A certa altura, numa proposta para impedir a desintegração da União Monetária Europeia, o BCE avançou. Mas, para ser autorizado a avançar (com os seus programas LTRO e TMD), o BCE teve que entrar primeiro num Negócio Faustiano com os países excedentários: Em troca de ser libertado da proibição de actuar como um prestamista de último recurso, o BCE tinha que se comprometer a usar os seus poderes coercivos a fim de impor a maior austeridade aos estados membros mais fracos. E assim a 'solução' com base no BCE piora o quebra-cabeças macroeconómico fundamental da zona euro a fim de impor uma estabilidade temporária no mercado interbancário e no mercado de acções. 

Este artigo propõe um modelo analítico simples do acima exposto. A sua conclusão é que, nesta fase da Crise da Zona Euro, a intervenção do BCE suspendeu o contágio à custa de uma maior incoerência macroeconómica. E como esta última, inevitavelmente, reforça sempre a primeira, todas as celebrações acerca da domesticação da Crise vão revelar-se provavelmente uma pura tontice. 

05/Março/2012

N.T. 
[1] LTRO – Long-Term Refinancing Operation (Operação de Refinanciamento a Longo Prazo); TMD – Transacções Monetárias Directas 
[2] FEEF – Fundo Europeu de Estabilização Financeira; MEE – Mecanismo Europeu de Estabilidade 
[3] CDO – Collateralized debt obligations (Obrigações colateralizadas de dívida) 

O original encontra-se em yanisvaroufakis.eu/... . Tradução de Margarida Ferreira. 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

UE - BANCOS: BONIFICAÇÕES INTOLERÁVEIS




THE GUARDIAN, LONDRES – Presseurop – imagem Olle

Após os chocantes financiamentos de resgates de bancos europeus que não conseguiram desencadear o crescimento económico, um novo espírito está a varrer o continente. A maré virou-se contra os excessos dos executivos. A opinião pública quer vingança e os banqueiros só se podem recriminar a si mesmos, escreve um colunista britânico.


Os camponeses estão a revoltar-se por toda a Europa. Querem a cabeça dos banqueiros e estão dispostos a consegui-la. Até agora, a resposta popular à crise do crédito tem sido de perplexidade geral e brandura nos castigos exigidos. Os bancos convenceram as populações de que foi tudo um azar do destino. Por outro lado, são grandes de mais para falir e os seus dirigentes bons de mais para pagar pelos prejuízos. Durante quatro anos, os bancos britânicos receberam quase 500 biliões de libras [mais de €580 biliões] de dinheiro público e novas emissões de moeda. Recuperaram bem e mantiveram-se ricos – enquanto todos os demais ficaram pobres.

Os tempos agora estão a mudar. Os bancos e o Governo não conseguiram, nem uns nem o outro, a recuperação económica. O povo quer vingança e teve-a – paradoxalmente – no Parlamento Europeu. Ali, foi determinado que os banqueiros da UE não podem receber bonificações superiores aos respetivos salários, ou duas vezes maiores, desde que os acionistas aprovem. Isto aplica-se a qualquer banco de qualquer território da UE e aos bancos de fora da União que trabalhem no seu território.

A indefensável causa britânica

Entretanto, um referendo suíço exige que os executivos obtenham a aprovação explícita dos acionistas para a estipulação dos seus salários, com proibição de bonificações de ingresso e de saída. A Holanda está a ponderar restringir o limite dos prémios a 20%. Mesmo a não intervencionista Grã-Bretanha tem agora a Associação Nacional de Fundos de Pensões a exigir que os conselhos de administração mantenham os aumentos dos salários dos executivos abaixo da inflação.

O outrora omnipresente grupo de pressão da finança europeia foi praticamente neutralizado, dada a escala do escândalo. O Governo alemão cedeu ao Parlamento Europeu, por pressão da oposição social-democrata, na sequência da revelação de que o Deutsche Bank tinha cortado €40 milhões à bonificação de um corretor envolvido no escândalo da manipulação das taxas Libor [conhecido em julho de 2012], o que implica um montante original inacreditável. A campanha suíça do referendo surgiu depois de se saber que a empresa farmacêutica Novartis tinha dado ao seu presidente demissionário um bónus de 72 milhões de francos suíços [quase €60 milhões]. Cerca de 68% dos suíços votaram favoravelmente a nova proposta.

Só na Grã-Bretanha os ministros ainda dançam ao som da música dos banqueiros. No mês passado, os executivos do Royal Bank of Scotland passaram por cima do seu acionista estatal e atribuíram-se 600 milhões de libras [quase €700 milhões] em bónus, depois de apresentarem perdas de cinco mil milhões de libras no exercício de 2012. O deficitário Lloyds foi aos cofres e atribuiu aos funcionários de topo 365 milhões de libras de prémio [quase €425 milhões]. A holding de lavagem de dinheiro HSBC anunciou que 78 dos seus executivos londrinos iam levar para casa mais de um milhão de libras cada um [€1,16 milhões]. Todos dizem que os prémios não têm qualquer implicação em multas ou prejuízos, que é o que dizem sempre. O ministro das Finanças britânico, George Osborne, foi humilhado em Bruxelasna terça-feira por ter ido defender a sua indefensável causa.

Bonificações astronómicas: um roubo?

No ano passado, a tão apregoada "primavera acionista" da City de Londres não levou a lugar nenhum. As revoltas contra a remuneração dos executivos da multinacional de publicidade e consultoria WPP, do banco Barclays, do grupo de comunicação Trinity Mirror e de várias outras empresas tiveram pouco impacto. Enquanto as remunerações globais estagnaram, as dos altos executivos cresceram 12%. As sondagens revelam que a opinião pública é esmagadoramente hostil aos pagamentos dos executivos. Só o Governo e o presidente da Câmara de Londres se interpõem entre os muito ricos e uma opinião pública enraivecida. A revolta dos camponeses significa que nem mesmo os ministros britânicos podem desafiar a opinião pública para sempre.

A verdade é que a comunidade bancária gerou esta sede de vingança durante mais de quatro anos, sem se importar. Desde a década de 1980 e da desregulamentação financeira, auferiram de montantes inimagináveis em qualquer outra área de atividade.
Isto não tem nada a ver com mercado livre, mas com um grupo restrito de gente da alta finança. Os banqueiros modernos auferem “proventos económicos” a explorar cartéis oligopólicos de serviços financeiros, mantendo os acionistas à margem. Os prémios astronómicos dos corretores são retornos assimétricos, em dinheiro que pertence realmente a depositantes e acionistas, que com ele cobrem os riscos. Em qualquer outro negócio, essas bonificações seriam consideradas um roubo à empresa.

Nenhum sinal de remorso

Não há associações tão ferozes na defesa dos seus interesses como as das profissões dos ricos. Como vimos esta semana com os advogados, cortem-se-lhes as benesses e ameaçam logo repercutir as perdas sobre os pobres, a economia, o governo, toda a gente.
Os bancos berram que o teto imposto às bonificações fará a sua avidez "sair do país". Parece um exagero. Mas as restrições da UE podem provocar uma retirada dos grandes financeiros da muito regulada Europa para as Américas e a Ásia, o que não seria uma notícia totalmente boa para a Grã-Bretanha: a finança tem sido o setor de maior desenvolvimento do último quarto de século. Mas o mais provável é as atividades mais tóxicas irem embora com eles, e com isso não se perde nada.

Para todos os efeitos, a culpa é dos bancos. Aproximaram demasiado as suas asas douradas do sol e ele derreteu-lhas. Só têm uma coisa a seu favor: a cultura de ganância da City não foi nada comparada com a cultura de inépcia do Banco de Inglaterra e do Ministério das Finanças. Desbarataram o dinheiro. Nunca na história económica britânica se desperdiçou tanto e numa causa tão infrutífera. E continua a não se ver nenhum sinal de remorso.

Traduzido por Ana Cardoso Pires

Espanha: MILHARES DE MANIFESTANTES PERCORREM MADRID CONTRA A AUSTERIDADE




JMG – VC - Lusa

Milhares de pessoas participam hoje numa manifestação em Madrid convocada para o meio-dia (11:00 em Lisboa) por uma plataforma sindical contra a política de austeridade e o desemprego, em defesa dos serviços públicos e da regeneração da democracia.

A manifestação arrancou com 20 minutos de atraso e passará pela Praça de Neptuno e a Porta do Sol.

O protesto foi convocado pela plataforma sindical, que integra 150 organizações sindicais e sociais, e é encabeçado pelos secretários-gerais de CCOO (Confederación Sindical de Comisiones Obreras), Ignacio Fernández Toxo, da UGT, Cándido Méndez, e do USO (Unión Sindical Obrera), Julio Salazar.

As organizações reivindicam uma mudança "radical e urgente" na orientação das políticas económicas tanto na Europa como em Espanha, considerando que a luta contra a crise fracassou e só levou ao agravamento dos problemas de cidadania.

Portugal: SE O GOVERNO NÃO CAI A BEM É PORQUE SÓ CAIRÁ A MAL?




Tiago Mota Saraiva – Jornal i, opinião

E se, no passado sábado, depois de ter sido lida a moção de censura popular aos governos da troika, tivesse havido um apelo para que o povo tomasse o Palácio de Belém? Se tenho para mim que uma parte das pessoas teria regressado a casa, acho que a esmagadora maioria seguiria para Belém. Mais, seria possível que muitos, pelo país fora, decidissem acorrer a Lisboa nos dias subsequentes. Muito provavelmente os dias subsequentes seriam de enorme tensão, a que não faltariam actos de pessoas desesperadas, de quem nada tem a perder.

Mas se o apelo não aconteceu, também me parece que no plano das manifestações pacíficas pouco mais há a fazer. Os rios que Pacheco Pereira caracterizou já se juntaram e as suas margens estão largas como nunca.

O facto de, nem o governo nem o Presidente da República, retirarem as consequências políticas da onda de manifestações que varreu o país no dia 2 de Março, transforma Portugal num barril de pólvora. Cavaco Silva não pode tomar-nos por parvos ao dizer que as manifestações devem ser escutadas quando o que se exige é uma matéria da sua exclusiva competência: a demissão deste governo. Para o evitar, a única resposta política que o governo podia ter dado era convocar uma manifestação em defesa da sua política, na tentativa de mostrar algum apoio popular, de que todos os governos em regimes democráticos dependem. Não o tendo feito, à beira de anunciar novos e violentos cortes e com um Presidente da República a insistir em tomar-nos por parvos, temo o pior.

Escreve ao sábado  

Movimento da Sociedade Civil da Guiné-Bissau discute instabilidade com os militares




MB – VM - Lusa

Bissau, 08 mar (Lusa) - O Movimento da Sociedade Civil da Guiné-Bissau organiza a partir de hoje e até dia 15 encontros com os militares para falar das causas da instabilidade no país, disse à Lusa Mamadu Quetá, vice-presidente da organização.

De acordo com Mamadu Quetá, que é também o porta-voz do Movimento da Sociedade Civil guineense (plataforma que congrega mais de cem organizações), pretende-se juntar na mesma sala os militares, os políticos, os líderes religiosos e tradicionais, a juventude e as mulheres para falarem "olhos nos olhos das causas da instabilidade" no país.

"Depois de várias situações de conflito que o país conheceu, onde os principais protagonistas foram os militares, há uma desconfiança visível da sociedade civil em relação aos militares. É preciso reverter isso na base do diálogo e concertação permanente", defendeu Quetá.

A ideia, adiantou o porta-voz do Movimento da Sociedade Civil, "é pôr toda a gente a explicar na sua perspetiva quem é o responsável pela instabilidade", mas sempre "num clima de respeito".

"Alguns apontam os militares e outros os políticos como responsáveis pela instabilidade e numa mesa vai-se discutir isso de forma franca", observou, assinalando que a iniciativa, patrocinada pelo Presidente de transição, Serifo Nhamadjo, visa dar uma nova imagem do país.

"Estamos a trabalhar para a emergência de cultura de paz no país e desta forma criar um clima de confiança entre os militares e a sociedade civil", defendeu o porta-voz do movimento.

Os encontros, que devem ser iniciados hoje na cidade de Buba, sul do país, vão decorrer também em Mansoa, Bafatá e Bissau. As conclusões serão remetidas às autoridades do país, aos líderes políticos e aos representantes das instituições da comunidade internacional, afirmou Mamadu Quetá.

PUBLICAÇÃO RACISTA NA INTERNET CAUSA MAL-ESTAR JUNTO DOS CABO-VERDIANOS




A Semana (cv)

Um “post” na rede social facebook com comentários racistas está a causar mal-estar no seio da comunidade cabo-verdiana, particularmente da camada feminina. A publicação já suscitou vários comentários de pessoas que lamentam que a autora, que apelida o nosso país de “lixo africano”, esteja mal informada sobre aquilo que se passa por cá.

A internauta, que se identifica como Gio Ferreira, pede aos cabo-verdianos que tenham “vergonha na cara, pois, agem como brancos e olham para os outros africanos como se fossem qualquer coisa de superiores, só porque têm a pele mais clara". Na verdade diz, "são claramente a vergonha de África”.

Descambando para outras ofensas, sobretudo à camada feminina, a autora alega que “as estudantes cabo-verdianas vestem-se como prostitutas, mini-saias que mais parecem cintos. Só falam crioulo e não se interessam pela cultura do país acolhedor”.

Para além de considerar Cabo Verde um “lixo africano", diz ainda que os portugueses gostam de visitar o nosso país porque aqui encontram praias e sexo gratuito já que a escrava de pele clara está sempre pronta para procriar com o branco e originar filhos ainda mais claros em relação a progenitora”.

Nesta saga de insultos nem as nossas avós e bisavós escapam. A autora relata que a nossa pele clara é fruto do homem branco que a noite ia ao barracão para as violar.

O “post” e os respectivos comentários podem ser consultados na página de Arjen Ruben Martins no facebook.

Angola: CONTRIBUIÇÃO DA MULHER




José Ribeiro – Jornal de Angola, opinião

Pátria e Liberdade são palavras femininas e no vocabulário da democracia angolana representam valores primordiais e inspiração das sucessivas gerações que ao longo dos séculos recusaram a submissão. A bem amada Mátria Angolana está projectada em todas as mulheres que sofreram, lutaram, venceram e inscreveram os seus nomes na eternidade. A Mulher Angolana é mais do que um exemplo de luta, sacrifícios até aos limites da força humana, fonte da vida e da esperança. As mulheres são acima de tudo bandeiras de paz e reconciliação.

As mulheres angolanas sabem donde lhes vem a força, a coragem e a dignidade. São elas que renovam as gerações, constroem futuros e dão expressão à liberdade. Para desempenhar responsavelmente o seu papel social e histórico, precisam de ser mais corajosas do que os outros actores sociais, mais fortes do que todos. E assim constroem a dignidade que as catapultou para a primeira linha do desenvolvimento sustentado que hoje construímos a pulso, na mesma medida em que no passado apoiaram estoicamente a luta pela Independência Nacional.

A Mulher Angolana soube sempre qual o seu papel na construção de uma pátria livre e democrática. Milhões de heroínas anónimas foram capazes de resistir à frustração, ao medo e ao desânimo, quando forças estrangeiras ditavam as leis e submetiam todo um povo. Em cada lar angolano, das cubatas mais humildes às casas dos subúrbios das grandes cidades, havia sempre a presença forte da mulher, ao mesmo tempo companheira, mãe, trabalhadora incansável para garantir o sustento dos filhos e em muitos casos, sobretudo depois de 1961, a sua educação básica, média e superior.

Mulheres que nunca foram à escola faziam das tripas coração para que os seus filhos fossem instruídos. Tinha eclodido a Luta Armada de Libertação Nacional e elas sabiam que o processo era imparável. No dia da liberdade, todos os filhos de Angola eram necessários para dirigir o país e para o fazerem com competência tinham que estudar.

Quando chegou a hora da Independência Nacional, Angola tinha poucas mulheres alfabetizadas. Mas todas as mães tinham em casa, com orgulho, os diplomas dos seus filhos, conseguido a ferros ao longo dos anos.

Este contributo da Mulher Angolana foi inestimável para a Angola que nasceu em 11 de Novembro de 1975. Mas além do seu papel social, muitas mulheres pegaram em armas para lutar pela liberdade e muitas deram as suas vidas pela causa da Independência.

Neste quadro, nunca foi necessário impor quotas para a promoção do género. Na direcção política e militar da luta de libertação sempre estiveram mulheres que se impuseram pelo seu mérito, coragem, responsabilidade e sabedoria. Na Angola independente sempre existiram mulheres nos mais altos cargos do aparelho de Estado. E à medida em que maior número de mulheres chegou às escolas e fez uma carreira académica, aumentou, de ano para ano, o número de deputadas, magistradas, ministras, governadoras, secretárias de Estado, embaixadoras, professoras, técnicas de saúde, militares, operárias especializadas.

Os angolanos têm orgulho na democracia que estão a construir e onde a Mulher tem um papel decisivo. Estamos na vanguarda dos países com mais mulheres em lugares de decisão no aparelho de Estado, mas também na gestão de empresas e no papel relevantíssimo de empresárias. Algumas mulheres angolanas, numa década, atingiram expressão mundial na economia e nos negócios.

Face a esta realidade foi sem surpresa que a Assembleia Nacional aprovou a Lei Contra a Violência Doméstica. Hoje temos um país inteiro empenhado na luta contra a violência no lar que atinge, sobretudo, crianças e mulheres. Há uma mobilização nacional e um movimento cada vez mais forte para que a Mulher Angolana que não foi à escola na altura própria aproveite as inúmeras ofertas de alfabetização, de Norte a Sul do país. As nossas escolas médias e superiores têm hoje mais alunas do que alunos. E o número de licenciados segue a mesma tendência. Há cada vez mais mulheres licenciadas no mercado de trabalho.

A aprovação da Lei Contra a Violência Doméstica tem um carácter preventivo. Em comparação com os países mais desenvolvidos do “primeiro mundo” Angola tem taxas baixíssimas de violência doméstica. E no contexto do continente africano estamos seguramente na vanguarda. Se fizermos uma análise cuidadosa verificamos que a violência no lar tem pouca expressão entre nós. E só foram tomadas medidas de fundo porque dado o papel da mulher na sociedade, a existência de um caso já é demasiado. Em Angola, Pátria e Liberdade são nomes de Mulher.

Moçambique: O PROBLEMA É DO TOPO




Verdade (mz) - editorial

Algumas situações são bastante difíceis de entender, e outras, na verdade, são demonstrações cabais da falta de traquejo e de entendimento. É deprimente encontrar pessoas com um certo grau de escolaridade a exercerem certas funções nas instituições públicas, que não sabem que todos os cidadãos têm direito à informação e atendimento.

E o pior ainda é que não sabem que existe algo denominado Constituição da República, onde estão garantidos os deveres, os direitos e as liberdades fundamentais dos cidadãos moçambicanos.

As diversas instituições que compõem o sector público são uma verdadeira lástima. Para além da morosidade insuportável no atendimento ao público, está vivamente patente um sistema letárgico institucionalizado tornando, de certo modo, as instituições num antro de inaptos mentais que se vangloriam da sua soberba. Por um lado, há um sistema de reclamações que não funciona de modo algum e que deixa o cidadão sem alternativa quando, porventura, se sente lesado ou mal atendido.

O acesso à informação nessas instituições por parte de um cidadão comum é um verdadeiro martírio, porque é-lhe negado inescrupulosamente. Trata-se de informações que servem para que o cidadão não saia por aí a fazer comentários ou a tratar de certos assuntos ligados àquela instituição de forma equivocada.

Tudo porque as instituições são compostas por uma multidão de papagaios, ditos funcionários públicos, mal-humorados que passam o tempo todo a cantar desarmonicamente que não estão autorizados a falar, e o mais caricato é que não sabem quem está autorizado e quem autoriza. São desculpas enfadonhas que, de uma maneira ou de outra, mancham a imagem de uma instituição que deveria servir condignamente todos cidadãos sem excepção.

Hoje em dia, fazer-se a uma unidade sanitária para se obter cuidados médicos ou qualquer outra instituição pública para se tratar de algum expediente é o mesmo que se tentar escalar o monte Binga de costas. Porque os funcionários públicos colocaram na cabeça que estão ali para fazer favores aos utentes.

Diga-se, em abono da verdade, o relaxamento dos funcionários deve-se à falta de verticalidade por parte dos utentes em apontar as coisas e as respectivas pessoas quando não fazem os seus trabalhos com o devido apuro, e também a ausência de um princípio deontológico capaz de despertar a consciência dos funcionários e que escancare nas suas caras que o funcionário não faz favor a ninguém, mas foi empregue para servir o público profissionalmente.

Contudo, para que tal vingasse seria necessário que os dirigentes deste país servissem, de facto, o público. Ou seja, que trabalhassem em prol dos moçambicanos. Porque, na verdade, o comportamento do funcionário público (sem generalizar) reflecte a forma como somos governados.

O dirigente faz um favor ao povo e serve-se deste para legitimar as suas fantasias mais recalcadas. O funcionário público, em última análise, é o rosto visível da podridão. O exemplo veio do topo e, para mudarmos o funcionário público, é bom que mudemos o topo.

SEGUNDA GUERRA DA COREIA É INEVITÁVEL, afirma governo norte-coreano




Opera Mundi – São Paulo

Declaração vem um dia depois de o Conselho de Segurança aprovar novas sanções contra a nação comunista

A Coreia do Norte considera inevitável uma Segunda Guerra da Coreia, de acordo com nota da agência estatal KCNA.  O país adotou essa portura após a manutenção das atividades militares entre EUA e Coreia do Sul e a renovação das sanções que o Conselho de Segurança impôs à nação comunista nesta quinta-feira (07/03).

Um porta-voz do Ministério do Exterior emitiu declaração dizendo que os EUA estão se esforçando para provocar uma guerra nuclear ao reprimir a Coreia do Norte – para assim “controlar a península coreana inteira e assegurar um porto seguro enquanto avança na Eurásia“. Um comício foi organizado na Praça Kim Il-Sung com cidadãos, militares e oficias do governo, chegando a 100 mil pessoas, segundo a agência.


Além disso, o país confirmou que está encerrando todos os pactos de não agressão e de desarmamento nuclear que tem com o vizinho do sul e que vai fechar a fronteira entre os dois países, sublinhando que responderá com “retaliações esmagadoras".

A medida do governo comunista é uma resposta à resolução 2.094 do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), que estabelece sanções ao país.



A resolução atinge diplomatas norte-coreanos, transferências de dinheiro e acesso a bens de luxo. As sanções também incluem congelamento de ativos e proibição de viagens internacionais envolvendo três indivíduos e duas companhias ligadas às Forças Armadas norte-coreanas.

A ação punitiva da ONU se deu em resposta a um teste nuclear feito pelos norte-coreanos em 12 de fevereiro deste ano.

 A Coreia do Norte informou também que os exercícios militares conjuntos feitos pelos Estados Unidos representam uma preparação para um ataque nuclear preventivo contra o país.

As manobras militares conjuntas de Coreia do Sul e Estados Unidos, chamadas de “Foal Eagle”, foram iniciadas na região em 1º de março e irão até 30 de abril, com 10 mil tropas dos EUA e 200 mil da Coreia do Sul. A próxima ação militar, chamada de “Key Resolve”, envolverá 10 mil tropas sul-coreanas e 3.500 norte-americanas e treinará prontidão de defesa.

Apesar de Seul creditar as operações como anuais e defensivas, Pyongyang as denuncia como “uma ação irresponsável e perigosa” que desestabilizará ainda mais a situação. Em nota da KCNA, um trabalhador dos correios, Pak Um Gyong, diz que “os inimigos nunca conseguem esconder a verdade de um ato criminal imperdoável de trazer o perigo de uma guerra nuclear”.

O apoio da China às últimas decisões do Conselho de Segurança são vistas com ceticismo por alguns especialistas. Marcus Noland, do Instituto Peterson para Economia Internacional, disse a The Guardian que “se o governo chinês realmente escolhesse forçar a resolução 2094, poderia interromper, se não finalizar, as atividades de proliferação nuclear da Coreia do Norte. Infelizmente, porém, se comportamentos anteriores servem de guia, isso é improvável de acontecer“. O embaixador chinês na ONU, Li Baodong, disse a repórteres que Pequim desejava “completa implementação“ da resolução.

* Com informações de Agência Brasil, KCNA e The Guardian

A AMÉRICA DO SUL APÓS HUGO CHÁVEZ




Em depoimento sobre o líder venezuelano recém falecido, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirma que "a história registrará, com justiça, o papel que ele desempenhou na integração latino-americana e sul-americana, e a importância de seu governo para o povo pobre de seu país".

Luiz Inácio Lula da Silva – Carta Maior

O presidente Hugo Chávez foi muito importante para a América Latina e deixa um grande legado. A história registrará, com justiça, o papel que ele desempenhou na integração latino-americana e sul-americana, e a importância de seu governo para o povo pobre de seu país. Mas, antes que a história se encarregue disso, é importante que tenhamos clareza da importância de Chávez no cenário político nacional e internacional. Somente assim poderemos definir as tarefas que se colocarão à nossa frente para que avancemos e consolidemos os avanços obtidos nesta última década, agora sem a ajuda de sua energia inesgotável e de sua convicção profunda no potencial da integração dos países da América Latina e nas transformações sociais necessárias no seu país para debelar a miséria de seu povo. Suas "misiones" sociais, especialmente na área da saúde e da habitação popular, foram bem sucedidas em melhorar as condições de vida de milhões de venezuelanos.

As pessoas não precisam concordar com tudo que Chávez falava. Tenho que admitir que o presidente venezuelano era uma figura polêmica, que não fugia ao debate e para o qual não existiam temas tabus. E preciso admitir que, muitas vezes, eu achava que seria mais prudente que ele não tentasse falar sobre tudo. Mas essa era uma característica pessoal de Chávez que não deve, nem de longe, ofuscar as suas qualidades. 

Pode-se também discordar ideologicamente de Chávez: ele não fez opções políticas fáceis e tinha enorme convicção de suas decisões. 

Mas ninguém minimamente honesto pode desconhecer o grau de companheirismo, de confiança e mesmo de amor que ele sentia pela causa da integração da América Latina, pela integração da América do Sul e pelos pobres da Venezuela. Poucos dirigentes e líderes políticos, dos muitos que conheci em minha vida, acreditavam tanto na construção da unidade sul-americana e latino-americana como ele.

Junto com Chávez criamos a Unasul (União de Nações Sul-Americanas), que integra 12 países do continente. Em 2010, a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) saiu do papel e ganhou forma jurídica - e isso não teria sido possível sem o empenho de Chávez. O Banco do Sul, um banco de desenvolvimento da Unasul, não seria possível sem a participação do líder venezuelano. Foi junto com ele também que conseguimos formar a Cúpula América do Sul-África (ASA) e a Cúpula América do Sul-Oriente Médio.

Por isso mesmo que a contribuição de Chávez ao seu país e ao projeto de integração da América do Sul e da América Latina não se extinguirá com sua morte. Se um homem público morre sem deixar ideias, quando o seu corpo físico acaba, acaba o homem. Não é o caso de Chávez, que foi uma figura tão forte que suas ideias permanecerão discutidas nas academias, nos sindicatos, nos partidos políticos e em qualquer lugar que exista uma pessoa preocupada com a justiça social e com a igualdade de poder entre os povos no cenário internacional. E talvez venham a inspirar outros jovens no futuro, como a vida do herói da independência Simon Bolívar inspirou o próprio Chávez. Isso no campo das ideias. 

No cenário político onde essas ideias são debatidas, disputadas e podem virar realidade, todavia, ficar sem Chávez exigirá empenho e vontade para que os ideais do líder venezuelano não sejam lembrados, no futuro, apenas no papel.

Na Venezuela, os simpatizantes de Chávez, para manter o seu legado, vão ter pela frente um trabalho de construção de institucionalidades. Terão que trabalhar para dar mais organicidade ao sistema político, tornar o poder mais plural, conversar com outras forças e fortalecer sindicatos e partidos. A unidade do país dependerá desse esforço. 

É preciso garantir as conquistas obtidas até agora. Essa é, sem dúvida, a aspiração de todos os venezuelanos, sejam eles de oposição ou de situação, militares ou civis, católicos ou evangélicos, ricos ou pobres... Todos precisam compreender que somente a paz e a democracia vão permitir que se realize o potencial de um país tão promissor quanto a Venezuela. 

É preciso garantir instituições multilaterais fortes para garantir definitivamente a consagração da unidade da América do Sul. Chávez não estará nas reuniões de cúpula sul-americanas, mas seus ideais e o governo venezuelano lá estarão. A convivência democrática na diversidade dos líderes dos governos da América do Sul e Latina, é a certeza da construção da unidade política, econômica, social e cultural da América do Sul e da América Latina, que tanto precisamos. Um caminho sem retorno. E, quanto mais fortes formos, mais teremos força para negociar a nossa participação da América do Sul nos fóruns internacionais, e sobretudo, para democratizar os órgãos multilaterais, como a ONU, o Banco Mundial e o FMI, que ainda respondem à realidade internacional do fim da Segunda Guerra Mundial e não ao mundo de hoje.

Certamente Chávez fará falta. Ele era uma figura muito forte e ímpar, capaz de fazer amizades e se comunicar como poucos líderes. Precisamos ter a sabedoria de tirar da passagem dele pela Terra e pelo governo da Venezuela as contribuições que podem resultar na consagração da unidade latino-americana. E tenho a certeza de que todos os governantes da região farão um grande esforço para que isso aconteça. 

Carismático e idiossincrático, capaz de fazer amigos com facilidade e de se comunicar com as massas como poucos outros líderes, Chávez vai fazer falta. Eu, pessoalmente, guardarei para sempre a relação de amizade e parceria que durante os oito anos em que trabalhamos juntos como presidentes, produziu tantos benefícios para o Brasil e para a Venezuela e para os povos de nossos países.

Celso Amorim: 'Fui testemunha do esforço de Chávez para diversificar economia'




Em entrevista à Carta Maior, o ministro da Defesa do Brasil, Celso Amorim, fala sobre sua convivência com Hugo Chávez, iniciada em 2003, quando assumiu o posto de chanceler do governo Lula. Nesse período marcado por episódios turbulentos, como os que levaram à criação do Grupo de Amigos da Venezuela, a Unasul saiu do papel e o país de Chávez aderiu ao Mercosul. Por Marcel Gomes

Marcel Gomes - Carta Maior

São Paulo - Neste momento em que se intensificam as análises sobre o legado do presidente venezuelano Hugo Chávez, morto na terça-feira (5), uma das críticas recorrentes, inclusive entre simpatizantes, é a dependência econômica do país em relação às exportações de petróleo. 

Estima-se que a indústria petroleira da Venezuela seja responsável por um terço do Produto Interno Bruto (PIB) e responda por 80% da receita de exportações do país.

Segundo o ministro da Defesa do Brasil, Celso Amorim, que conviveu com o venezuelano desde 2003, quando assumiu o Ministério das Relações Exteriores do governo Lula, engana-se quem ache que Chávez não enxergava essa dependência e não tenha trabalhado para reduzi-la.

"Fui testemunha do esforço do presidente Chávez para diversificar a economia", disse Amorim à Carta Maior, por telefone, nesta quarta-feira (6). Segundo o ministro, até mesmo o governo brasileiro ajudou nessa direção. "Chávez buscou acordos com a ABDI, a Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial, que montou um escritório lá, e com a Embrapa", afirmou. 

"A preocupação dele não era apenas fomentar a indústria, mas também a produção de alimentos", contou Amorim. O ministro disse que não tem dados no momento para dimensionar o resultado dessas iniciativas, mas admite que em um país com grande oferta de petróleo "tudo fica mais difícil, é natural que a economia se volte sempre para a commodity".

Liderança

De sua longa convivência com Hugo Chávez, Celso Amorim se recorda "de um grande líder apaixonado por suas ideias". Ideias como a do atendimento aos mais pobres e da integração da América Latina, esta parcialmente materializada pela criação da União das Nações Sul-americanas (Unasul), em 2008, um projeto ao qual Amorim se dedicou ativamente. 

Das negociações para conformação da Unasul, para entrada da Venezuela no Mercosul e para outros projetos bi ou multilaterais, o ministro brasileiro relata “conversas difíceis” com Chávez, em que os chanceleres eram cobrados pelo ritmo "mais lento" das negociações.

"Ele dizia muitas vezes que o importante era o acordo político. Nesse momento, tentávamos mostrar as dificuldades, dar um choque de realidade. Há muita diversidade na América do Sul, alguns países buscam fazer políticas para a integração, outros acreditam que basta reduzir as tarifas que o problema está resolvido", explicou o ministro.

Mas isso não significa que Chávez não adotasse medidas pragmáticas quando necessário, conta Amorim. Diante da crise política no país entre 2002 e 2003, após a tentativa de golpe contra seu governo, o então presidente venezuelano aceitou a criação do Grupo de Amigos da Venezuela e permitiu a presença de observadores internacionais nas eleições.

"O presidente Lula estava iniciando seu mandato e foi necessário muito diálogo para que o Grupo de Amigos funcionasse. E Chávez reagiu positivamente à ideia", lembra o ministro. Eram momentos em que o mandatário venezuelano, apesar de sua personalidade assertiva, sobressaía-se pela "acuidade intelectual" e valorizava opiniões divergentes. 

Amorim recorda-se de um episódio que comprovaria isso: 

"A entrada da Venezuela no Mercosul foi um processo demorado, porque havia muitos detalhes para discutir, toda a questão da política comercial. Nas reuniões, Chávez reclamava da burocracia, dizia que o acordo político já estava fechado. Então eu pedi que ele escutasse uma história. Um rei na Grécia antiga queria aprender geometria e perguntou quem era o maior especialista no assunto. Responderam que era Euclides, que acabou convocado para a tarefa. Euclides, então, foi até o rei com uma pilha de livros repletos de postulados, axiomas e teoremas. Mas o rei disse que não estava interessado em tudo aquilo, que queria saber logo as conclusões. Então Euclides explicou: 'não existe estrada real na geometria'. Minutos depois Chávez foi interrompido por assessores para discutir um outro acordo comercial. Questionado sobre um item, afirmou ao assessor que ele já estava previsto em um dos artigos. Então olhou pra mim e disse: 'já estou aprendendo geometria'".

Fotos: EBC 

Mais lidas da semana