Para
que se informe e então avalie, para que se questione e depois o questione, para
que possa elogiar ou criticar, caso pretenda lamentar ou exaltar, o Expresso
traduziu na íntegra o que Varoufakis leu e apresentou na reunião de Eurogrupo
de quinta-feira, que acabou como começou: em desacordo. A leitura
é longa, mas recomendável e necessária para se perceber o que a Europa rejeitou
e o que a Grécia pediu
Nota
de Varoufakis no seu blogue pessoal, onde disponibilizou o discurso: “O
único antídoto para a propaganda e para as 'fugas' malévolas é a transparência.
Depois de tanta desinformação em torno da apresentação que fiz no Eurogrupo da
posição do governo grego, a única resposta é publicar exatamente as palavras
que proferi. Leiam-nas e julguem por si mesmos se as propostas do governo grego
constituem ou não uma base para um acordo”.
Colegas,
Há
cinco meses, na minha primeira intervenção no Eurogrupo, disse-vos que o novo
governo grego enfrentava uma tarefa dupla:
Temos
de ganhar uma moeda preciosa sem desbaratar um importante capital.
A moeda preciosa
que tínhamos de ganhar era um sentimento de confiança, aqui, entre os nossos
parceiros europeus e junto das instituições. Para obter essa moeda
necessitaríamos de um pacote de reformas significativo e um plano de
consolidação fiscal credível.
Quanto
ao capital importante que não podíamos dar-nos ao luxo de
desbaratar, esse era a confiança do povo grego, que teria de ser o pano de
fundo de qualquer programa de reformas acordado que pusesse fim à crise grega.
O pré-requisito para que esse capital não se perdesse era, e continua a ser, um
só: a esperança tangível de que o acordo que levamos para Atenas:
. é
o último a ser forjado em condições de crise;
. compreende um pacote de reformas que põe fim a uma recessão ininterrupta de seis anos;
. não atinge selvaticamente os pobres como as anteriores reformas atingiram;
. torna a nossa dívida sustentável, criando assim perspetivas genuínas do regresso da Grécia aos mercados, terminando a nossa dependência pouco digna dos nossos parceiros para pagar os empréstimos que deles recebemos.
. compreende um pacote de reformas que põe fim a uma recessão ininterrupta de seis anos;
. não atinge selvaticamente os pobres como as anteriores reformas atingiram;
. torna a nossa dívida sustentável, criando assim perspetivas genuínas do regresso da Grécia aos mercados, terminando a nossa dependência pouco digna dos nossos parceiros para pagar os empréstimos que deles recebemos.
Cinco
meses passaram, o fim da estrada está à vista, mas este derradeiro ato de
equilíbrio não se materializou. Sim, no Grupo de Bruxelas estivemos quase.
Quase é quanto? Do lado dos impostos, as posições são realmente próximas,
especialmente para 2015. Para 2016, o fosso restante representa 0,5% do PIB.
Propusemos medidas paramétricas de 2% contra os 2,5% em que as instituições
insistem. Esta diferença de meio por cento propomos eliminá-la através de
medidas administrativas. Seria, digo-vos, um erro tremendo deixar que esta
minúscula diferença causasse danos massivos na integridade da Zona Euro. A
convergência foi também alcançada num vasto leque de questões.
Ainda
assim, não nego que as nossas propostas não instilaram em vós a confiança de
que precisais. E, ao mesmo tempo, as propostas das instituições que o Sr.
Juncker transmitiu ao primeiro-ministro Tsipras não podem gerar a esperança de
que os nossos cidadãos necessitam. Assim, chegámos perto de um impasse.
Assim,
no último minuto e neste estado de negociação, antes de que acontecimentos
incontroláveis tomem conta da situação, temos o dever moral, para não falar do
dever político e económico, de ultrapassar este impasse. Não é altura para
recriminações nem acusações. Os cidadãos europeus responsabilizar-nos-ão
coletivamente, todos os que não conseguirem encontrar uma solução viável.
Mesmo
que, mal orientados por rumores de que a saída da Grécia pode não ser assim tão
terrível, ou que possa até beneficiar o resto da Zona Euro, alguns estejam
resignados a que isso aconteça, é um acontecimento que desencadeará poderes
destrutivos que ninguém pode travar. Os cidadãos de toda a Europa não apontarão
às instituições, mas aos seus ministros das Finanças, aos seus
primeiros-ministros, aos seus presidentes. Ao fim e ao cabo, elegeram-nos para
promover a prosperidade partilhada da Europa e para evitar buracos que
possam ferir a Europa.
O
nosso mandato político é encontrar um compromisso honroso e trabalhável. É
assim tão difícil conseguir isto? Achamos que não. Há poucos dias, Olivier
Blanchard, o economista-chefe do FMI, publicou um artigo intitulado
"Grécia: um acordo credível vai requerer decisões difíceis de todas as
partes". Tem razão. As quatro palavras significativas são "de todas
as partes". O Dr. Blanchard acrescentava que: "no coração das
negociações está uma questão simples. Que ajustamento tem de ser feito pela
Grécia, que ajustamento tem de ser feito pelos seus credores oficiais?".
Que
a Grécia precisa de se ajustar não há dúvidas. A questão, porém, não é a
quantidade de ajustamento que a Grécia precisa de fazer. É, pelo contrário, que
tipo de ajustamento. Se por "ajustamento" queremos dizer consolidação
fiscal, cortes de salários e pensões e aumento das taxas de juro, é claro que
fizemos mais disso do que qualquer outro país em tempo de paz.
. o
défice fiscal, estrutural ou ciclicamente ajustado do setor público passou a
superavit à custa de um ajustamento de 20% que bateu recordes mundiais;
. os salários caíram 37%;
. as pensões foram reduzidas até 48%;
. o número de funcionários públicos diminui em 30%;
. o consumo caiu 33%;
. até o crónico défice corrente do país caiu 16%.
. os salários caíram 37%;
. as pensões foram reduzidas até 48%;
. o número de funcionários públicos diminui em 30%;
. o consumo caiu 33%;
. até o crónico défice corrente do país caiu 16%.
Ninguém
pode dizer que a Grécia não se ajustou às suas novas circunstâncias, do
pós-2008. Mas o que podemos dizer é que este gigantesco ajustamento, necessário
ou não, criou mais problemas do que resolveu:
. o
PIB agregado real caiu 27%, enquanto o PIB nominal continuou a cair
quadrimestre sim, quadrimestre não ao longo de 18 quadrimestres sem parar até
hoje;
. o desemprego disparou para os 27%;
. o trabalho não-declarado atingiu os 34%;
. a banca trabalha sob empréstimos não-produtivos que excedem em valor os 40%;
. a dívida pública ultrapassa os 180% do PIB;
. as pessoas jovens e bem qualificadas abandonam a Grécia aos magotes;
. a pobreza, a fome e a falta de energia registaram aumentos normalmente associados a estados de guerra;
. o investimento na capacidade produtiva evaporou-se.
. o desemprego disparou para os 27%;
. o trabalho não-declarado atingiu os 34%;
. a banca trabalha sob empréstimos não-produtivos que excedem em valor os 40%;
. a dívida pública ultrapassa os 180% do PIB;
. as pessoas jovens e bem qualificadas abandonam a Grécia aos magotes;
. a pobreza, a fome e a falta de energia registaram aumentos normalmente associados a estados de guerra;
. o investimento na capacidade produtiva evaporou-se.
Portanto,
a primeira parte da pergunta do Dr. Blanchard - "que ajustamento tem de
ser feito pela Grécia?" - precisa de ser respondida. A Grécia precisa de
uma grande dose de ajustamento. Mas não do mesmo tipo que teve no passado.
Precisamos de mais reformas, não precisamos de mais cortes. Por exemplo,
. precisamos
de nos ajustar a uma nova cultura de pagamento de impostos, não de elevar as
taxas do IVA, que reforçam o incentivo para fugir ao pagamento e conduzem os
cidadãos respeitadores da lei a uma maior pobreza;
. precisamos de tornar o sistema de pensões sustentável, erradicando o trabalho não remunerado, minimizando as reformas antecipadas, eliminando a fraude no fundo de pensões, fazendo aumentar o emprego - não erradicando a tranche solidária das mais baixas das baixas pensões, como as instituições exigem, empurrando dessa forma os mais pobres dos pobres para uma pobreza ainda maior e convocando uma hostilidade popular massiva contra outro conjunto de ditas reformas.
. precisamos de tornar o sistema de pensões sustentável, erradicando o trabalho não remunerado, minimizando as reformas antecipadas, eliminando a fraude no fundo de pensões, fazendo aumentar o emprego - não erradicando a tranche solidária das mais baixas das baixas pensões, como as instituições exigem, empurrando dessa forma os mais pobres dos pobres para uma pobreza ainda maior e convocando uma hostilidade popular massiva contra outro conjunto de ditas reformas.
Nas
nossas propostas às instituições oferecemos:
. uma
extensa (mas otimizada) agenda de privatizações abrangendo o período entre 2015
e 2025;
. a criação de uma autoridade de Impostos e Alfândegas completamente independente (sob a égide e supervisão do Parlamento)
. um Conselho Fiscal que supervisione o orçamento do Estado;
. um programa a curto prazo que limite o crédito mal parado e gira empréstimos não produtivos
. reformas dos códigos do processo judicial e civil
. liberalização de vários mercados de produtos e serviços (com salvaguardas para os valores da classe média e profissões que deles fazem parte e parcela do tecido social);
. reformas da administração pública (introduzindo sistemas limpos de avaliação dos funcionários, reduzindo custos não-salariais, modernizando e unificando as carreiras do setor público).
. a criação de uma autoridade de Impostos e Alfândegas completamente independente (sob a égide e supervisão do Parlamento)
. um Conselho Fiscal que supervisione o orçamento do Estado;
. um programa a curto prazo que limite o crédito mal parado e gira empréstimos não produtivos
. reformas dos códigos do processo judicial e civil
. liberalização de vários mercados de produtos e serviços (com salvaguardas para os valores da classe média e profissões que deles fazem parte e parcela do tecido social);
. reformas da administração pública (introduzindo sistemas limpos de avaliação dos funcionários, reduzindo custos não-salariais, modernizando e unificando as carreiras do setor público).
Juntamente
com estas reformas, as autoridades gregas pediram à OCDE que ajudasse Atenas a
desenhar, implementar e monitorizar uma segunda série de reformas.
Quarta-feira, encontrei-me com o secretário-geral da OCDE, o Sr. Angel Gurria,
e a sua equipa para anunciar esta agenda conjunta de reformas, completada com
um mapa específico:
. um
grande movimento anticorrupção e instituições relevantes para o apoiar;
. liberalização do setor da construção, incluindo o mercado e padrões de materiais de construção;
. liberalização do comércio por grosso;
. código de práticas dos media, eletrónicos e impressos;
. centros de negócios na hora que erradiquem os obstáculos burocráticos ao negócio na Grécia;
. reforma do sistema de pensões - onde a ênfase esteja num estudo completo, atual e a longo prazo, no faseamento das reformas antecipadas, na redução dos custos operacionais dos fundos de pensões, na consolidação da segurança social - em vez de nos meros cortes de pensões.
. liberalização do setor da construção, incluindo o mercado e padrões de materiais de construção;
. liberalização do comércio por grosso;
. código de práticas dos media, eletrónicos e impressos;
. centros de negócios na hora que erradiquem os obstáculos burocráticos ao negócio na Grécia;
. reforma do sistema de pensões - onde a ênfase esteja num estudo completo, atual e a longo prazo, no faseamento das reformas antecipadas, na redução dos custos operacionais dos fundos de pensões, na consolidação da segurança social - em vez de nos meros cortes de pensões.
Sim,
colegas, os gregos precisam de se ajustar mais. Precisamos desesperadamente de
reformas profundas. Mas exorto-vos a levarem seriamente em consideração esta
importante diferença entre:
. reformas
que ataquem ineficiências ou comportamentos parasitas e oportunistas,
e
. mudanças de parâmetros que aumentem as taxas de juro e reduzem os benefícios dos mais fracos.
e
. mudanças de parâmetros que aumentem as taxas de juro e reduzem os benefícios dos mais fracos.
Precisamos
muito mais de reformas reais e muito menos de reformas de parâmetros.
Muito
se disse e escreveu acerca do nosso "recuo" na reforma do mercado de
trabalho e quanto à nossa determinação para reintroduzir a proteção dos
trabalhadores assalariados através da negociação coletiva. Será isto uma
fixação de esquerda nossa que faz perigar a eficiência? Não, colegas, não é.
Veja-se por exemplo a provação dos jovens trabalhadores em várias cadeias de
lojas que são despedidos quando se avizinha o seu 24º aniversário, para que os
empregadores possam contratar funcionários mais jovens e assim evitar
pagar-lhes o salário mínimo normal que é inferior para empregados menores de 24
anos. Ou vejam o caso dos empregados que são contratados em part time por 300
euros ao mês, mas são obrigados a trabalhar a tempo inteiro e são ameaçados com
a dispensa se se queixarem. Sem contratação coletiva, estes abusos abundam com
efeitos nefastos na concorrência (uma vez que os patrões decentes competem em
desvantagem com os que não têm escrúpulos), mas também com efeitos negativos
nos fundos de pensões e na receita pública. Alguém seriamente pensa que a
introdução de uma negociação laboral bem concebida, em colaboração com a OIT e
a OCDE, constitui "reversão das reformas", um exemplo de
"recuo"?
Voltando
por instantes à questão das pensões de reforma, muito foi feito para que as
pensões contem por mais do que contavam no passado; tanto quanto 16% do PIB.
Mas consideremos o seguinte: as pensões diminuíram 40% e o número de
pensionistas mantém-se estável. Portanto, os gastos com pensões diminuíram, não
aumentaram. Esses 16% do PIB não se devem a gastar mais em pensões, mas, pelo
contrário, à dramática queda do PIB que trouxe com ela uma igualmente dramática
redução nas contribuições devido à perda de empregos e ao crescimento do
trabalho informal não-declarado.
O
nosso alegado recuo na "reforma das pensões" é que suspendemos a
ulterior redução das pensões que já perderam 40% do seu valor, enquanto os
preços dos bens e serviços de que os pensionistas precisam, isto é,
medicamentos, mal foram alterados. Considerem este facto relativamente
desconhecido: cerca de um milhão de famílias gregas sobrevive hoje à custa da
magra pensão de um avô ou de uma avó, dado que o resto da família está
desempregada num país onde apenas 9% dos desempregados recebem qualquer
subsídio de desemprego. Cortar essa única, solitária pensão corresponde a
lançar uma família nas ruas.
É
por isso que continuamos a dizer às instituições que sim, precisamos de uma
reforma do sistema de pensões, mas não, não podemos cortar 1% do PIB às pensões
sem causar uma nova e massiva miséria e mais um ciclo recessivo, uma vez que
estes 1,8 mil milhões multiplicados por um grande multiplicador fiscal (de até
1,5) é retirado do fluxo circular da receita. Se ainda existissem grandes
pensões, cujo corte faria diferença a nível fiscal, cortá-las-íamos. Mas a
distribuição das pensões está tão comprimida que poupanças dessa magnitude
teriam de ir comer nas pensões dos mais pobres. É por esta razão, suponho, que
as instituições nos pedem para eliminarmos o complemento solidário de reforma
para os mais pobres dos pobres. E é por essa razão que contrapropomos reformas
decentes: uma redução drástica, quase eliminação, das reformas antecipadas,
consolidação dos fundos de pensões e intervenções no mercado de trabalho que reduzam
o trabalho na economia paralela.
Reformas
estruturais promovem o crescimento potencial. Mas meros cortes numa economia
como a grega só promovem a recessão. A Grécia deve ajustar-se através da
introdução de reformas genuínas. Mas ao mesmo tempo, voltando à resposta à
pergunta do Dr. Blanchard, as instituições têm de ajustar as suas definições de
reforma promotora do crescimento - para reconhecerem que cortes de parâmetros e
aumentos de impostos não são reformas e que, pelo menos no caso da Grécia, minaram
o crescimento económico.
Alguns
colegas notaram no passado, e podem voltar a fazê-lo, que as nossas pensões são
demasiado altas em comparação com os idosos dos seus países e que é inaceitável
que o governo grego espere que eles mantenham o nosso nível de pensões de
reforma. Deixem-me ser claro acerca disto: nunca vos pediremos para subsidiarem
o nosso Estado, os nossos salários, as nossas reformas, a nossa despesa
pública. O Estado grego vive dentro dos seus meios. Nos últimos cinco meses
conseguimos mesmo, apesar de termos zero acesso aos mercados, pagar aos nossos
credores. Tencionamos continuar a pagar.
Compreendo
as preocupações de que o nosso governo possa cair de novo no défice primário e
que é essa a razão que leva as instituições a pressionarem-nos para aceitar
grandes aumentos do IVA e grandes cortes nas reformas. Embora seja nosso
entender que um acordo viável seria suficiente para fazer disparar a atividade
económica o suficiente para produzir um saudável superavit primário, percebo
perfeitamente bem que os nossos credores e parceiros possam ter razões para ser
céticos e exigir salvaguardas; uma apólice de seguro contra o eventual resvalar
do nosso governo para o desperdício de recursos. É o que está por detrás do
apelo do Dr. Blanchard ao governo grego para que ofereça "medidas
verdadeiramente credíveis". Então, ouçam esta ideia. Uma "medida
verdadeiramente credível".
Em
vez de se discutir meio ponto percentual de medidas (ou se estas medidas
fiscais devem ser ou não do tipo paramétrico), que tal uma reforma mais
profunda, mais abrangente, mais permanente? Um teto para o défice que seja
legislado e monitorizado pelo Conselho Fiscal independente com que nós e as
instituições já concordámos. O Conselho Fiscal monitorizaria a execução do orçamento
de Estado numa base semanal, lançaria avisos se uma meta de superavit primário
parecesse estar a ser violada e, em certas ocasiões, lançaria reduções
automáticas horizontais a todos os níveis para evitar a derrapagem abaixo do
limiar previamente acordado. Dessa forma está ativado um sistema de alerta que
assegura a solvência do Estado grego enquanto o governo grego mantém o seu
espaço político de que precisa para manter a soberania e ser capaz de governar
num contexto democrático. Este é um firme propósito que o nosso governo
implementará imediatamente após um acordo.
Dado
que o nosso governo nunca mais precisará de pedir emprestado dinheiro aos
vossos contribuintes nem aos contribuintes que estão atrás do FMI, não faz
sentido um debate entre Estados-membros que competem para ver quem tem
pensionistas mais pobres, instigando um nivelamento por baixo. Em vez disso, o
debate avança para os pagamentos da dívida. Quão grandes têm de ser os nossos
superavits? Alguém acredita seriamente que a taxa de crescimento é independente
do conjunto de metas primárias? O FMI sabe bem que os dois números andam juntos
e é por isso que a dívida pública grega deve ser olhada de uma só vez.
O
nosso grande serviço da dívida deveria ser encarado como uma grande labilidade
fiscal infundada. Embora seja verdade que as partes EFSF e GLF da nossa dívida
têm maturidades elevadas e a taxa de juro não é grande, a labilidade fiscal
infundada do Estado grego, a nossa dívida, constitui um componente poderoso que
impede hoje a recuperação e o investimento. Refiro-me aos 27 mil milhões de
obrigações ainda detidos pelo BCE. É uma labilidade infundada a curto prazo que
os potenciais investidores na Grécia olham e viram costas porque podem ver o
fosso de fundos que esta parte da dívida cria instantaneamente e porque
reconhecem que estes 27 mil milhões na contabilidade do BCE travam a Grécia e
não a deixam aproveitar o programa de financiamento do BCE quando este programa
está em desenvolvimento e atinge a sua máxima capacidade para vir em auxílio
dos países ameaçados pela deflação. É uma cruel ironia que o país mais afetado
pela deflação seja precisamente o que é excluído do remédio antideflacionário
do BCE. E é excluído por causa destes 27 mil milhões.
A
nossa proposta é simples, eficaz e mutuamente vantajosa. Não propomos mais
dinheiro, nem um euro para o nosso Estado. Imaginem o seguinte acordo em três
partes a anunciar nos próximos poucos dias:
Parte
1: Reformas profundas, incluindo o plafonamento do défice que já
mencionei.
Parte
2: Racionalização do calendário de pagamentos da dívida grega segundo as
seguintes linhas. Primeiro, para efetuar uma RECOMPRA DA DÍVIDA, a Grécia pede
um novo empréstimo ao ESM, depois compra as obrigações ao BCE e retira-as. Para
renegociar este novo empréstimo, concordamos que a agenda de reformas profundas
é a condição comum para completar com êxito o atual programa e para assegurar o
novo acordo ESM que entra em prática imediatamente depois e corre em
concorrência com o continuado programa FMI até ao final de 2016. Os fundos a
curto prazo assentes no cumprimento do programa corrente e no financiamento a
longo prazo é completado com o retorno dos lucros SMP, ascendendo a 9 mil dos
restantes 27 mil milhões, que vão para uma conta usada para satisfazer os
pagamentos da Grécia ao FMI.
Parte
3: Um programa de investimentos que impulsione a economia grega, fundado
no Plano Juncker, o Banco de Investimento Europeu - com quem já estamos em
conversações - o EBRD e outros parceiros que serão convidados a participar
também em ligação com o nosso programa de privatizações e o estabelecimento de
um banco de desenvolvimento que procure desenvolver, reformar e colateralizar
bens públicos, incluindo propriedades imobiliárias.
Alguém
duvida verdadeiramente de que este anúncio em três partes mudaria
dramaticamente o espírito, inspiraria os gregos a trabalharem duramente na
esperança de um futuro melhor, convidaria investidores para um país cuja Bolsa
caiu tanto e daria confiança aos europeus de que a Europa pode, no momento
decisivo, fazer as coisas certas?
Colegas,
nesta encruzilhada é perigosamente fácil pensar que não há nada a fazer. Não
caiamos na armadilha deste estado de espírito. Podemos forjar ainda um bom
acordo. O nosso governo está de pé, com ideias e com a determinação de cultivar
as duas formas de confiança necessárias para pôr fim ao drama grego: a vossa
confiança em nós e a confiança do nosso povo na capacidade da Europa para
produzir políticas que joguem a seu favor e não contra ele.
Expresso
– foto Francois Lenoir/Reuters