domingo, 27 de maio de 2012

SER CORRUPTO É FÁCIL, BARATO E DÁ MILHÕES




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

Mais uma vez, são tantas que já perdi a conta, a procuradora Maria José Morgado falou de uma coisa que – tanto quanto parece – não existe em Portugal: corrupção.

Diz ela que“a crise cria riscos corruptíveis sérios”. Mas como em Portugal não existe (para os corruptos de ontem, de hoje e de amanhã) crise todos podem continuar a ir à missa, a brincar aos espiões, a gozar com a chipala dos cidadãos que são, na verdade, quem alimenta a porca onde essa gentalha nunca se farta de mamar.

“Se temos pessoas que são mal pagas ao nível da administração e se temos uma administração com uma burocracia impenetrável, temos aqui conjugados factores de alto risco”, afirmou a directora do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) e Procuradora Geral Adjunta do Tribunal da Relação de Lisboa, no final da intervenção que fez no Ciclo de Seminários do Instituto de Estudos Eleitorais da Universidade Lusófona do Porto.

“A corrupção nos países em desenvolvimento entrava tudo, cria pobreza, cria miséria, impede as leis de concorrência de mercado, prejudica as empresas, aumenta os custos das empresas e os bens e serviços tornam-se mais caros”, afirmou Maria José Morgado, defendendo que “o Estado tem que ter mecanismos dissuasores, mas não pode ser um Estado polícia nem totalitário, as instituições é que têm que funcionar, nomeadamente na prioridade das prioridades que é o combate à fraude fiscal associada à corrupção e ao branqueamento de capitais. E isso tem de funcionar sistematicamente, de forma a produzir resultados”.

Maria José Morgado continua a pensar que um dia destes, certamente por acção divina, Portugal se transformará num Estado de Direito. Apesar disso sabe que, no actual estado das coisas, combater de forma eficaz a corrupção é o mesmo que abolir da língua portuguesa as vogais.

Maria José Morgado diz que “o sector empresarial do Estado foi guiado pelo lema do sorvedouro de dinheiros públicos” e fala de “derrapagens das obras públicas”, “protecção anormal de empresas privadas” e das parcerias público-privadas com “características de danosidade” que não se manifestam no resto da Europa.

“Neste pântano de más práticas foi como se o Estado tivesse entregue a chave do galinheiro à raposa” afirmou. Não “foi como se”. Foi mesmo assim. E, além disso, pôs o Povo a alimentar as galinhas e aboliu as licenças de caça às raposas.

A procuradora considerou mesmo que “a crónica má gestão dos dinheiros públicos”, aliada “ao concubinato entre certas empresas e o Estado acabaram por gradualmente destruir a economia e a capacidade de produção de riqueza”, que desembocou no “resvalar da incompetência e do desleixo para formas de corrupção sistémica incontroláveis com o consequente e descontrolável endividamento público”.

A procuradora afirmou também não “estar a falar de corrupção propriamente dita, no sentido do Código Penal, mas de uma patologia de más práticas que criam um plano inclinado que pode dar para tudo, nomeadamente para o desperdício dos dinheiros públicos”.

A confusão legislativa, a dificuldade em fazer prova de corrupção, a falta de meios do Ministério Público, nomeadamente na área informática, foram apresentadas como dificuldades para a acção dos agentes da Justiça nesta área.

A especialização dos tribunais, simplificação legislativa, protecção de testemunhas e da figura do arrependido, especialização dos tribunais, modelo específico de investigação criminal e um financiamento “que respeite a autonomia com uma dotação de verbas compatíveis com as necessidades do Ministério Público e não absolutamente abaixo dessas necessidades e que permita alguma capacidade de actuação ao nível da investigação criminal” foram algumas das propostas apresentadas por Maria José Morgado.

Na recente conferência "Ministério Público e o Combate à Corrupção", promovida pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), Maria José Morgado disse que no topo da pirâmide da corrupção está a "corrupção de Estado" e dos partidos políticos, sendo esta mais difícil de investigar devido ao seu grau de sofisticação.

E se a corrupção fosse crime (será que é?) dir-se-ia que o Estado e os partidos são os principais antros criminosos. Parto, é claro, do “princípio interpretativo” de que a directora do DIAP não estava a ver a pirâmide invertida.

Maria José Morgado disse nessa conferência que não convém esquecer que "os menores salários", com os cortes nos subsídios, "trarão necessariamente maior vulnerabilidade na administração pública e nos serviços do Estado" em matéria de corrupção.

Essa peregrina ideia de querer pôr os corruptos a lutar contra a corrupção é digna do Portugal de hoje. Apesar dos "esforços", traduzidos na produção de legislação, muitas das novas leis "estão viciadas à nascença, com graves defeitos de conceção e formatação", o que as torna "ineficazes".

Não. Não fui eu que o disse, mesmo recorrendo ao “jornalismo interpretativo”. Quem o diz, com todas as letras, é o Sistema Nacional de Integridade (SNI), constituído por entidades públicas e privadas e elementos da sociedade empenhadas no combate à corrupção.

Diz o SNI que o combate à corrupção "está enfraquecido por uma série de deficiências" resultantes da "falta de uma estratégia nacional de combate a esta criminalidade complexa".

"Nenhum Governo até hoje estabeleceu, objectivamente, uma política de combate à corrupção no seu programa eleitoral, limitando-se apenas a enumerar um conjunto de considerandos vagos e de intenções simbólicas", acrescenta o SNI.

Mas do que é que estavam à espera? Que os corruptos lutassem contra a corrupção que, aliás, é uma das suas mais importantes mais-valias? E mesmo que anunciassem medidas, nunca seriam para cumprir. Por algumas coisa Portugal tem tido os primeiros-ministros que mais metem.

O relatório português onde constam estas verdades insere-se numa iniciativa da organização Transparency International, que se desenvolveu noutros 24 países europeus e que em Portugal foi realizado pela associação Transparência e Integridade, centro INTELI - Inteligência e Inovação e Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.

Reflecte o tratamento dado a cerca de quatro dezenas de entrevistas a personalidades de diferentes sectores de actividades, que vão desde o Provedor de Justiça, a magistrados, juízes, dirigentes de organismos estatais, professores universitários e jornalistas, entre outros.

As iniciativas legislativas tomadas "não têm travado a corrupção, nem têm diminuído o destaque desde fenómeno na comunicação social, nem têm alterado a percepção sobre a incidência e extensão da corrupção na sociedade portuguesa", acrescenta o SNI.

Este resultado surge pela "fraca capacidade", tanto da comunicação social como da sociedade civil, para acompanhar os processos de produção de legislação e "denunciar a má qualidade dos diplomas", acabando por permitir a produção de diplomas "inócuos".

Além de encontrar "falhas graves", a avaliação do SNI conclui que essas lacunas "põem em causa a legitimidade e o desempenho global das instituições".

Na política existe "uma total irresponsabilidade dos eleitos face aos eleitores" e as promessas de combate à corrupção "são abaladas" por leis que permitem o branqueamento de capitais e por declarações de rendimentos e de interesses que "não correspondem à realidade".

Somados, estes factores resultam na "falta de honestidade para com os cidadãos e pela falta de sancionamento" das irregularidades praticadas pelos políticos.

Para acabar com esta realidade, o SNI defende uma maior fiscalização da parte do Parlamento (também ele o alfobre da corrupção) aos registos de interesses de deputados e membros do Governo e o alargamento do regime de incompatibilidades aos membros que integram os gabinetes governamentais.

De vez em quando os portugueses, seja por via directa ou não, resolvem falar de corrupção. Quase sempre, neste como em outros assuntos, apenas mudam as moscas…

Os portugueses são, na generalidade e em teoria, contra a corrupção, mas no dia-a-dia "acabam por pactuar" com "cunhas" e situações de conflito de interesses. Continuo sem saber como é que se pode ser contra algo que, em sentido lato, já é uma “instituição” secular. Falha minha, certamente.

E ainda eu tenho a lata de criticar a corrupção em Angola, quase esquecendo que os poderosos donos da minha terra aprenderem (e se calhar até já são melhores) com os mestres portugueses...

"No nível simbólico, abstracto, toda a gente condena a corrupção, tal como no resto da Europa, mas no nível estratégico, no quotidiano, as pessoas acabam por pactuar com a corrupção, até nos casos mais graves, de suborno", disse o politólogo Luís de Sousa, co-autor, com João Triães, do livro "Corrupção e os portugueses: Atitudes, práticas e valores".

Luís de Sousa dava como exemplo o primeiro lugar registado por Portugal no indicador de um estudo relativo aos contactos que as pessoas assumem ter "para conseguir benefícios ou serviços a que não têm direito".

Não sei o que se chamará ao facto de quando alguém se candidata a um emprego lhe perguntarem a filiação partidária. Será corrupção? E quando dizem que “se fosse filiada no partido teria mais possibilidades”? Ou quando se abrem concursos para cumprir a lei e já se sabe à partida quem vai ocupar o lugar?

Este livro foi apresentado por Paulo Morais, creio que em Julho de 2011, que afirmou que a obra confirma que "os portugueses são algo permissivos" relativamente à corrupção, o que considera ser uma herança da "lógica corporativa do tempo de Salazar".

Se o cidadão anónimo é permissivo por ter sido influenciado pela "lógica corporativa do tempo de Salazar", quem terá influenciado os políticos, os administradores, os banqueiros, os gestores, os patrões que gerem o país?

"A estrutura de poder actual é, basicamente, a estrutura de poder do doutor Oliveira Salazar. É uma estrutura que se mantém e nos asfixia", disse Paulo Morais, realçando que, enquanto perdurar esta lógica, "os grandes interesses ficam na mão do grande capital".

E quem tem força para contrariar o sistema sem, quando der por isso, estar enredado dos pés à cabeça, encostado à parede, com a vida (para já não falar do emprego) em perigo?

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor, compilado em Página Global: E A PROCISSÃO AINDA NÃO CHEGOU AO ADRO

FEIOS, PORCOS E MAUS… SÃO OS SALAFRÁRIOS NOS PODERES




Tribunal de Contas enganado para aprovar autoestradas

Carlos Enes – TVI24

Denúncia feita em relatório de juízes, que apontam dedo a Estradas de Portugal e anterior Governo
Não é um, nem um colectivo de três, como na maioria dos casos. São todos os nove juízes da secção de auditoria a denunciar por unanimidade que o Tribunal de Contas foi enganado e só por isso autorizou a construção de seis parcerias público-privadas, lançadas pelo anterior Governo.

O relatório, aprovado no passado dia 10, põe em causa a legalidade da Autoestrada Transmontana, da Soares da Costa e da FCC, bem como das concessões Douro Interior, do consórcio Aenor/Mota-Engil, do Baixo Alentejo e Algarve Litoral, da Edifer/Dragados, Litoral Oeste, do consórcio MSF/Brisa/Somague, e Baixo Tejo, da Brisa, no valor global de 10 mil milhões de euros.

Nenhuma destas obras podia ter arrancado sem visto do Tribunal de Contas, que foi recusado à primeira tentativa em cinco concessões, com um argumento simples. Entre o concurso e os contratos finais o Estado assumia um prejuízo ilegal de 705 milhões de euros.

A Estradas de Portugal, contudo, endereçou um segundo pedido de visto. Mas, garantem os nove juízes, só teve sucesso porque escondeu ao Tribunal de Contas informação financeira essencial, relativa a contratos paralelos celebrados entre os bancos financiadores, as construtoras privadas e a própria empresa pública, denominados acordos contingentes, que não foram submetidos a visto do Tribunal de Contas.

O relatório de auditoria, a que a TVI teve acesso, é demolidor: «Nesta auditoria, foi detectada a existência de acordos consagrando um conjunto de compensações financeiras devidas às concessionárias sem reservas ou condições».

Os juízes denunciam que o Estado assumiu obrigações financeiras sem as deixar explícitas nos contratos. «Estes acordos não foram referenciados nesses contratos nem sequer indicados como seus anexos». E sem as comunicar ao tribunal nos pedidos de visto. «Também não foram juntos aos processos do segundo pedido de fiscalização prévia do Tribunal de Contas»

Ora, essas compensações são ilegais e, caso tivessem sido conhecidas pelos juízes, teriam conduzido ao chumbo dos projectos, como recentemente aconteceu com o TGV.

«Este tribunal alerta para a falta de fundamentação legal destas compensações contingentes. Caso os respectivos pagamentos venham a ocorrer, podem constituir infracções financeiras puníveis». Esta grave denúncia do Tribunal de Contas estava pronta num relatório que esteve para ser aprovado ainda antes das eleições legislativas, como a TVI noticiou há um ano.

O novo documento, que agora revelamos, é ainda mais demolidor para o anterior Governo e para a então administração da Estradas de Portugal. «Assinala-se a significativa falta de transparência do processo».

Caso BPN na AR: Finanças dizem que documentos do inquérito são confidenciais



Económico - Lusa

O Ministério das Finanças classificou como "confidenciais" os documentos enviados à comissão de inquérito ao BPN.

O Ministério das Finanças classificou como "confidenciais" os documentos enviados à comissão de inquérito ao BPN, obrigando os deputados a consultar os textos numa sala específica e proibindo-os de fazer cópias, o que já causou filas de espera.

No total, são 13 dossiers que estão numa sala, sob o olhar atento de um funcionário parlamentar.

A informação só está acessível aos 17 deputados da comissão de inquérito e aos assessores dos grupos parlamentares que os auxiliam. No entanto, os documentos não podem ser fotocopiados ou digitalizados, estando apenas autorizada a sua consulta.

Nota Página Global: É mais que evidente todo este confidencialismo: o povinho não pode saber das maroscas que fazem os de colarinho branco desde Belém a São Bento, passando por outros da mesma laia. Salafrários nos Poderes!

Não há homem com eles no sítio para furar o confidencialismo? Ou será crime? Pois. Isso seria crime (eventualmente). O que estão a querer esconder é que não é crime... Pois não. Ah, pois não...

Portugal: FECHAM 19 A 12 EMPRESAS POR DIA NA REGIÃO DE LISBOA



Económico - Lusa

União das Associações de Comércio e Serviços (UACS) disse hoje que fecham diariamente 10 a 12 empresas em Lisboa.

A UACS alertou também para uma quebra de 40% nas vendas no primeiro trimestre, em comparação com o mesmo período de 2011.

"A nível nacional estão a fechar diariamente 100 empresas. Em Lisboa, que é um dos grandes centros, desde o início do ano que têm vindo a fechar 10 a 12 empresas por dia. Temos muitas empresas com 50 e 60 anos que com esta quebra drástica estão muito preocupadas com o futuro", afirmou à Agência Lusa a presidente da UACS de Lisboa, Carla Salsinha.

"A partir de janeiro sentimos uma quebra a pique, pois os portugueses começaram a ter um rendimento mensal menor. Depois, há também um certo receio em relação ao dia de amanhã e as pessoas estão travar ao máximo o consumo e a cortar em tudo o que não sejam bens de primeira necessidade. Infelizmente não se perspetiva um resto de ano diferente", lamentou.

O CABO ANSELMO E SOLEDAD BARRETT




Urariano Mota*, Recife – Direto da Redação

Recife (PE) - A Comissão de Anistia teve esta semana uma sessão histórica, daquelas que fazem a gente dizer “um anúncio distante de justiça se faz na terra”. Na terça-feira, quando se negou qualquer reparação para o cabo Anselmo, os crimes do agente infiltrado voltaram à tona, e com eles também voltou o nosso livro “Soledad no Recife”, publicado pela Boitempo. Divulgo aqui uma página do livro, escrito sob uma pesquisa histórica, documental, de tal modo que difícil nele é separar o factual da imaginação literária. A página a seguir fala do horror e da surpresa de Soledad, ao descobrir entre os policiais a cara do marido, o agente duplo a quem amava:

“A cara de Anselmo, no conjunto dos sinais, Soledad não via. Não tanto porque a desconfiança nunca lhe houvesse batido à percepção. Mas porque isso era tão horrível, que o seu senso estético repugnava. Uma coisa que o seu peito de justiça não queria nem podia aceitar. E recuava, no mesmo passo em que os indícios cresciam. Mas o Cartório de Registro dos Sonhos existe, ainda que fora do domínio civil de uma cidade. Ele existe ao lado dos lugares onde se bebe, come-se e se morre. Os seus documentos, se não têm efeitos legais, recuperam no real os direitos. Os sonhos, quando muito fortes, os pesadelos, quando inescapáveis, tornam-se tangíveis. Houve então um momento em Soledad, houve um espaço e lugar nas suas antevisões, em que se passou do antes para o agora, sem mediação para o horror que jamais havia se apresentado com a sua cara. Nas representações anteriores, nos indícios, não se mostrava assim tão claro.

- Por quê? Por quê?!

A pergunta que Soledad não se fizera diante das imagens que a perseguiam nos últimos meses, por quê?, qual a razão delas, agora à luz do dia em Boa Viagem, em uma butique da ensolarada praia de Boa Viagem, aonde ela foi para vender roupas, onde ela está com Pauline, ali, sob a prazenteira luz física do Brasil, a pergunta pelas razões dos sonhos e pesadelos que ela não se fizera, agora vêm com um susto, um terror, diante do real bruto. José Anselmo dos Santos se encontra entre os homens que lhe batem na cabeça com armas e punhos.

- Por quê? Por quê?

Pauline está muda e petrificada, incapaz de correr e falar. Soledad olha para os olhos do homem que pensara ser o seu companheiro, e isso, essa realidade, o pesadelo por guardar uma altura ética jamais mostrou. O pesadelo fora incapaz de exibir toda a crueza. Anselmo não sorri agora, sorrirá depois, quando lhe perguntarem

- Você dorme bem?

- Putz, tranquilamente.

Ou mais textualmente:

- Você dorme tranquilo? Nunca sentiu pesadelo durante a noite? Não tem remorso pelo que fez?

- Absolutamente (risos)....

Por enquanto, não, agora na butique em Boa Viagem ele não ri, embora a cena lhe pareça um tanto cômica.

- Por quê? Por quê?

Ele apenas assiste ao espancamento e suplício. Como uma prova de que é contra esses terroristas.

‘Eu tomei conhecimento de que seis corpos se encontravam no necrotério.... em um barril estava Soledad Barret Viedma. Ela estava despida, tinha muito sangue nas coxas, nas pernas. No fundo do barril se encontrava também um feto’.

Quando Mércia Albuquerque declarou essas palavras, não era mais advogada de presos e perseguidos políticos. Estava em 1996, 23 anos depois do inferno. Mércia estava acostumada ao feio e ao terror, ela conhecia há muito a crueldade, porque havia sido defensora de torturados no Recife. Ainda assim, ela, que tanto vira e testemunhara, durante o depoimento na Secretaria de Justiça de Pernambuco falou entre lágrimas, com a pressão sangüínea alterada em suas artérias. Dura e endurecida pela visão de pessoas e corpos desfigurados, o pesadelo de 1973 ainda a perseguia: ‘Soledad estava com os olhos muito abertos, com uma expressão muito grande de terror’.

No depoimento da advogada não há uma descrição técnica dos corpos destruídos, derramados no necrotério. Mércia Albuquerque é uma pessoa se fraterniza e confraterniza com pessoas. ‘Eu fiquei horrorizada. Como Soledad estava em pé, com os braços ao lado do corpo, eu tirei a minha anágua e coloquei no pescoço dela’. Distante dos manuais exatos da Medicina Legal, a advogada Mércia não se refere a cadáveres, mas a gente. Chama-a pelos nomes, Pauline, Jarbas, Eudaldo, Evaldo, Manuel, Soledad. Recorda a situação vexatória em que estavam – porque eram homens e mulheres – despidos. O seu relato é como um flagrante desmontável, da morte para a vida. É como o instante de um filme, a que pudéssemos retroceder imagem por imagem, e com o retorno de cadáveres a pessoas, retornássemos à câmara de sofrimento. ‘A boca de Soledad estava entreaberta’ “.

* É pernambucano, jornalista e autor de "Soledad no Recife", recriação dos últimos dias de Soledad Barret, mulher do cabo Anselmo, executada pela equipe do Delegado Fleury com o auxílio de Anselmo.

Brasil: Mulheres tiram a roupa na Marcha das Vadias em protesto contra violência




Protesto, que aconteceu em SP, Rio, Brasília e em outras cidades, quer alertar contra o preconceito de culpar a vítima pelo abuso sexual

Mais de mil mulheres foram às ruas no Rio de Janeiro e em São Paulo neste sábado para protestar contra a violência sexual e contra o preconceito de culpar a vítima pelo abuso sexual. A segunda edição da Marcha das Vadias também aconteceu em outras cidades: Brasília, Belo Horizonte, Vitória, São Carlos (SP) e Sorocaba (SP). A manifestação tem origem no “Slut Walk”, um protesto mundial que começou após um policial, no Canadá, dizer que, para evitar estupros, as mulheres deveriam deixar de se "vestir como vadias".

Em São Paulo, de acordo com estimativa da Polícia Militar, 700 pessoas participaram da manifestação. A concentração aconteceu na Praça do Ciclista, no canteiro central da Avenida Paulista, próximo à Rua da Consolação. A manifestação percorreu toda a Rua Augusta, até a Praça da República.

A passeata foi marcada pela irreverência de grande parte das participantes, que desfilaram usando roupas íntimas e até mesmo nuas da cintura para cima, com o corpo coberto por pinturas e palavras de ordem: “Livre!”, “Liberdade” etc. Outras usavam roupas consideradas provocantes.

O ato foi pacífico. Só no Rio, houve uma confusão entre os manifestantes e a Guarda Municipal, que logo foi resolvida. Segurando cartazes a favor do aborto e contra o machismo, cerca de mil manifestantes marcharam na orla de Copacabana, segundo estimativa dos organizadores. A PM estimou em 400.

De acordo com a historiadora Gabriela Alves, que auxiliou na organização em São Paulo, o movimento não teve uma liderança centralizada e os participantes foram mobilizados pelas redes sociais.
 
Mesmo em minoria, era possível ver alguns homens no protesto. Felipe Pessoa, pesquisador, disse que participou da marcha porque a sociedade ainda tem valores machistas que são repressores até para o homem. “O homem tem que ser o machão, o pegador, e o feminismo vem libertar o homem desse modelo. Tanto a mulher deve ser respeitada e ter liberdade quanto o homem, que pode ser delicado e ter sensibilidade”.
 
No Rio, as integrantes do movimento, usando pouca roupa e maquiagem chamativa, cantavam slogans como “eu só quero é ser feliz, andar tranqüilamente com a roupa que escolhi, e poder assegurar, de burca ou de short, todos vão me respeitar” ou ainda “a nossa luta é por respeito, mulher não é só bunda e peito”.
 
Uma das organizadoras da marcha no Rio, Jandira Queiroz, disse à Agência Brasil que o objetivo dos protestos é chamar a atenção nacional para “um fenômeno muito negativo na nossa sociedade, que é o tamanho da violência sexual no país”.
 
Com Agência Brasil
 

Sindicato anuncia queixa formal por falta de apoio na chegada do contingente de Timor-Leste



PL - Lusa

Lisboa, 27 mai (Lusa) -- O Sindicato Nacional da PSP anunciou hoje vai apresentar queixa formal pela "falta de apoio logístico" à chegada do contingente da PSP de Timor-Leste a Lisboa e pelo curto descanso dos agentes até entrarem ao serviço.

Em declarações à agência Lusa, Armando Ferreira, dirigente do SINAPOL, revelou que segunda-feira segue para o ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, e para a direção nacional da PSP um protesto oficial.

Em causa está a chegada, na madrugada de hoje, de um contingente da PSP e GNR ao aeroporto militar de Figo Maduro, em Lisboa.

Segundo o dirigente sindical, enquanto os agentes da polícia, depois de "22 horas de viagem", carregaram malas "durante uma hora num trajeto superior a 200 metros", os militares da guarda tiveram apoio logístico.

Dada a proibição de viatura privadas no espaço militar, a GNR disponibilizou os seus autocarros, que têm permissão para recolher as bagagens na área da pista de aterragem, notou Armando Ferreira.

Há um ano, no regresso de um anterior contingente, o SINAPOL recebeu informações sobre a situação e, por isso, na madrugada de hoje deslocou-se ao local para testemunhar a chegada dos agentes da PSP.

"É, de facto, uma falha da PSP e que não deveria acontecer porque a instituição tem os meios", criticou o dirigente sindical, lembrando que as bagagens dos agentes pesam até 200 ou 300 quilos, uma vez que estes estiveram um ano em Timor-Leste.

Armando Ferreira realçou ainda que muitos dos agentes que hoje chegaram acrescentaram outra viajem até à área onde trabalham.

"Alguns viajaram mais três ou quatro horas de carro e amanhã (segunda-feira), às 09:00, são forçados a apresentarem-se ao serviço. Os agentes deviam ter pelo menos um dia para descansar", afirmou o sindicalista.

Novo instituto Camões a funcionar "em pleno" até final de junho - secretário de Estado



JYF (SBR) – Lusa, com foto

Paris, 27 mai (Lusa) - O secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação afirmou hoje que o novo Camões - Instituto da Cooperação e da Língua estará a funcionar "em pleno" até ao final de junho.

Luís Brites Pereira disse à agência Lusa que o processo de fusão entre o Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento (IPAD) e o Instituto Camões está a cumprir o calendário estabelecido no âmbito do Programa de Redução e Melhoria da Administração Central, e lembrou que as duas instituições têm continuado a funcionar.

"Temos uma lei orgânica, estão a ser trabalhados os estatutos, já foi nomeada a presidente do conselho diretivo, e, para breve, teremos também os restantes membros do conselho diretivo. Até ao fim do mês de junho teremos, em princípio, a maior parte dessas tarefas concluídas", acrescentou.

Nessa altura, disse ainda, cessam as duas antigas instituições e o novo Camões passa a funcionar "em pleno".

Luís Brites Pereira falou esta tarde à agência Lusa nos arredores de Paris, à margem da festa franco-portuguesa de Pontault-Combault, na qual participou.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros, que tutela as políticas de cooperação e de promoção da língua e da cultura anunciou, em novembro, a fusão entre o IPAD e o Instituto Camões.

A 30 de janeiro, foi publicada a lei orgânica do novo Camões - Instituto da Cooperação e da Língua, que terá, no próximo ano, uma dotação orçamental de 61,6 milhões de euros.

Ministro nega "qualquer problema" à chegada do contingente de PSP de Timor Leste



MYV (PL) - Lusa

Vila do Conde, 27 de mai (Lusa) - O ministro da Administração Interna negou hoje a existência de "qualquer problema na chegada do contingente da PSP de Timor-Leste".

Miguel Macedo falava à Lusa após o Sindicato Nacional da PSP ter anunciado que vai apresentar queixa formal pela "falta de apoio logístico" à chegada do contingente da PSP de Timor-Leste a Lisboa e pelo curto descanso dos agentes até entrarem ao serviço.

Em declarações à agência Lusa, Armando Ferreira, dirigente do SINAPOL, revelou que segunda-feira segue para o ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, e para a direção nacional da PSP um protesto oficial.

Mas Miguel Macedo, que hoje participou nas comemorações nacionais do Dia do Bombeiro, em Vila do Conde, disse ter contactado a Direção Nacional da PSP que lhe garantiu "não haver qualquer tipo de problema".

Aliás, Miguel Macedo avançou ainda que "foi garantido o transporte a todos" os militares.

A polémica surgiu após a chegada, na madrugada de hoje, de um contingente da PSP e GNR ao aeroporto militar de Figo Maduro, em Lisboa.

Ex-chefe do estado-maior das Forças Armadas da Guiné-Bissau detido no Senegal



A Semana (cv)

O almirante José Zamora Induta, ex-chefe do estado-maior das Forças Armadas da Guiné-Bissau, foi preso esta semana em Casamança, no sul do Senegal. Induta foi afastado em 2010 pelo seu adjunto, o general António Indjai, considerado um dos líderes do golpe de Estado de 12 de Abril.

“Na noite de quinta para sexta-feira, a brigada de investigação da polícia interpelou Zamora Induta e três outras pessoas", indicou à agência AFP fonte próxima da polícia de Ziguinchor, a principal cidade de Casamança, uma região que faz fronteira com a Guiné-Bissau.

Zamora Induta tinha-se refugiado na representação diplomática da União Europeia a 18 de Março, na noite da primeira volta das eleições presidenciais, dizendo temer pela sua vida, após o assassínio do coronel Samba Djalo, ex-responsável pelos serviços de informações militares.

O presidente da comissão eleitoral, Desejado Lima da Costa, e o ex-ministro do Interior Fernando Gomes refugiaram-se também na representação da UE, após o golpe de Estado e foram detidos no Senegal juntamente com o almirante, por não terem documentos oficiais.

“Desejamos que as autoridades senegalesas nos ajudem a fazê-los regressar à pátria, onde há agora condições para garantir a sua segurança”, disse um oficial do exército da Guiné-Bissau à AFP, sublinhando que já estão a decorrer os processos diplomáticos de repatriamento.

PRIMEIRO-MINISTRO DA GUINÉ-BISSAU VAI A ANGOLA



Ditadura do Consenso

O primeiro-ministro da Guiné- Bissau deposto no golpe de Estado de 12 de Abril, Carlos Gomes Júnior, deve chegar dentro de dias a Luanda, no prosseguimento do esforço diplomático que desenvolve “para a reposição da legalidade democrática no país”.

Em Lisboa desde quarta-feira, juntamente com Raimundo Pereira, o presidente interino deposto, Gomes Júnior disse em declarações à Lusa que, a partir de agora, os dois irão actuar em separado, pelo que seguirá para Luanda “logo que tenha luz verde”, acompanhado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros do governo deposto, Mamadu Djaló Pires.

“Faltam ainda uns contactos, mas seguirei para Luanda logo que tenha luz verde, com o ministro Djaló Pires, o mais tardar na próxima semana”, afirmou o chefe do Governo eleito e deposto da Guiné-Bissau. Sobre o destino de Raimundo Pereira, Gomes Júnior nada concretizou, limitando-se a referir que estão a ser feitos contactos e que haverá “mais iniciativas a nível diplomático para o restabelecimento da legalidade democrática na Guiné- Bissau”, o que inclui o regresso à ordem constitucional vigente a 11 de Abril, anterior ao golpe militar.

“SE NÃO SAIRMOS DO ATOLEIRO TEREMOS UMA EUROPA DE EXTREMA-DIREITA”




Ana Tudela Flores - Más Público - Carta Maior

A política de austeridade e de precarização do emprego capitaneada por Angela Merkel levou a um desespero social que alimenta as tendências mais radicais. Ou a Europa reage agora ou será tarde, diz Ignacio Ramonet, diretor do Le Monde Diplomatique em espanhol. "Na França temos cerca de 28% do eleitorado votando numa extrema direita que recusa a Europa e o euro. O respeito das normas está a levar a uma situação insustentável. Victor Hugo dizia que não há nada mais poderoso que uma ideia para a qual chegou o momento", diz Ramonet.

Madri - O otimismo transparece na voz de Ignacio Ramonet e viaja até este lado do telefone. O diretor do “Le Monde Diplomatique” em espanhol, que há 14 anos advertiu que a globalização financeira estava criando o seu próprio Estado e gerando sociedades sem poder, sonha com esperança. Precisamente agora, quando se estão a cumprir um após outro os maus augúrios daquele seu editorial, “Desarmar os mercados financeiros”, que foi semente do movimento Attac. A política de austeridade e de precarização do emprego capitaneada por Angela Merkel levou a um desespero social que alimenta as tendências mais radicais. Ou a Europa reage agora ou será tarde. Ramonet crê que reagirá.

“Reorientar a Europa para o desemprego, o futuro e o crescimento”. As palavras de Hollande, recentemente eleito presidente da França, falam de uma mudança de rumo que parecia impossível. Há vida para além dos mercados?

A proposta de Hollande chega num bom momento. Se tivesse dito há um ano que não apoiava o pacto fiscal (promovido por Merkel), não teria funcionado. Hollande não fala do crescimento que Draghi (presidente do BCE) defende, baseado na precarização do emprego para ganhar competitividade e nas curas de austeridade. Hollande defende o crescimento com estímulo por parte da União Europeia. É o momento, porque há países submetidos a duras reformas extraordinárias com os governos a viver nos limites dessas políticas.

Os próprios mercados veem que só austeridade não serve. Por isso, houve tanto apoio, ativo ou passivo, a Hollande. Prova disso é o caso do Governo espanhol, que desejava a vitória do socialista porque lhe dará oxigénio para pagar a dívida em mais anos sem asfixiar a economia.

Como se financia o crescimento?

Os Estados estão endividados e não podem endividar-se mais. Mas a UE como tal, não. Pode endividar-se e emprestar aos Estados ou financiar obras que criem emprego.

A banca está falida. Se lhe injetam dinheiro a 1% a partir do BCE e com ele compra dívida de países com rentabilidade maior, paga-se com impostos. É sustentável?

A diferença entre o 1% que a banca paga pelo dinheiro e os 6% que recebe pela dívida da Espanha, por exemplo, leva a uma situação na qual não se poderá pagar essa dívida, que se converterá na principal questão do orçamento. Creio que há cada vez mais consenso para que o BCE empreste diretamente aos Estados. Os Estatutos do banco central não lhe permitem, e nisso apoiam-se os alemães, mas encontramo-nos numa situação de exceção e há que impor uma decisão política. Os Estatutos são pura burocracia.

Porque vão ceder se se negaram até agora?

Porque já há sociedades que estão se sublevando. Na Grécia disparou o voto extremo. Na França temos cerca de 28% do eleitorado votando numa extrema direita que recusa a Europa e o euro. O respeito das normas está a levar a uma situação insustentável. Victor Hugo dizia que não há nada mais poderoso que uma ideia para a qual chegou o momento.

Está a Alemanha nesse momento?

A Alemanha prevê crescer este ano a 1% e começa a temer que, se as economias europeias não compram os seus produtos, a sua situação vai piorar. Os sindicatos lançaram uma ofensiva para pedir um aumento de salários. O trabalho alemão, que já é o mais caro da Europa, será ainda mais caro e terá mais dificuldade em vender os seus produtos. Os próprios dirigentes vão juntar-se à petição de crescimento.

Draghi advertiu que o país que reduzir a austeridade será imediatamente castigado pelo mercado. Hollande aguentará?

Eu penso que assistiremos a uma mobilização popular em França para que Hollande não repita os erros dos sociais-democratas de Grécia, Portugal e Espanha. O problema já não é só económico, mas sim político. Se não sairmos do atoleiro dos mercados, vamos ter uma Europa de extrema direita daqui a cinco anos.

Também há movimentos de mudança como o 15-M.

O que vimos no ano passado como o 15-M foi muito emocionante, toda uma geração a protestar com uma conceção muito exigente e pura da política e da democracia. É lamentável que essa gigantesca energia, por desconfiança para com a política, não tenha encontrado um modo de permanecer como movimento reconhecível, com organização e liderança. Na minha opinião, o sentimento de asco para com a política de muitos jovens conduziu-os a um erro tático, por não se organizarem como formação, e a outro estratégico, porque não têm ferramenta, nem direta nem indireta, de conquista de poder.

Que solução vê para o desemprego juvenil?

Está a perder-se uma geração inteira, apesar de ser a melhor formada da história dos nossos países. É um tremendo desperdício humano e é urgente encontrar soluções com imaginação, lançar planos de reindustrialização e de relocalização, um grande plano Marshall de emprego para a juventude. A Europa está socialmente destruída, como o esteve materialmente após a II Guerra Mundial.

Perde-se a geração melhor formada e força-se a que a próxima já não o seja. Por quê?

Todos os movimentos neoliberais cortaram na educação. É a renúncia a um dos fundamentos da democracia, a igualdade de oportunidades, e isso é insuportável. A classe média está-se a desclassificar, um fenómeno que não conhecíamos. Deixa-se de pertencer a uma classe à qual se chegou com gerações de esforços.

Quanto vai custar recuperar esse caminho?

Há que refletir porque, pouco a pouco e de forma silenciosa, foram-nos encerrando numa estrutura política em que as decisões são muito limitadas, na qual uma mudança de Governo não muda grande coisa porque se aplicam regras que não se podem modificar. Assistimos a uma redução da democracia e a uma preponderância do poder financeiro sobre o político. O Mecanismo Europeu de Estabilidade, que é uma prisão jurídica, está a ser ratificado sem debate.

Não foi mudado nada do sistema financeiro.

Se não se controlar os mercados, não sairemos disto. Há que regulamentá-los, dissociar a banca de poupança da especulativa, impor impostos sobre os rendimentos de capital como existem sobre o trabalho e dotar-se de um sistema que permita aos políticos pôr limites ao mercado. Ou acontece isso ou passaremos a uma nova estrutura política desconhecida até agora.

(*) Publicado em Más Público.org, tradução de Carlos Santos para Esquerda.net

OBSERVADORES NÃO CONSEGUEM DETER GUERRA CIVIL NA SÍRIA



Deutsche Welle

Plano tecido por Kofi Annan para cessar conflitos na Síria ainda não conseguiu acabar com a violência no país. Observadores da ONU não podem fazer nada e não há alternativa realista ao plano de Annan.

Tropas do governo sírio e combatentes da oposição continuam torturando, assassinando e abusando da violência no país. A cada dia são registrados tiroteios, bombardeios e atentados.

Um ataque com tanques de guerra a prédios residenciais em Hula, a noroeste de Horms, centro dos protestos, morreram mais de 90 pessoas entre sexta-feira (25/05) e sábado (26/05), entre elas 32 crianças. Segundo informações fornecidas por ativistas, tropas do regime Assad atacaram a localidade de Taldo com canhões e morteiros.

A trégua, prevista pelo plano de Annan e teoricamente em vigor desde abril último, definitivamente só existe no papel. Cada vez mais combatentes da oposição estão se armando. Em uma declaração, o Exército Sírio Livre exigiu da ONU que acabe imediatamente com o conflito. Caso contrário, também não iria mais respeitar a trégua.

Uma comissão de inquérito da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas já temia, antes dos recentes acontecimentos, uma "militarização crescente" do conflito. Tendo em vista os terríveis massacres desde o início dos protestos no país, o major-general Robert Mood, coordenador da missão dos observadores da ONU na Síria, fala de uma "tragédia brutal".

300 observadores para todo o país

Em meados de maio, Mood havia se pronunciado com otimismo sobre a missão, prevendo um "apaziguamento imediato da situação" após a chegada dos observadores. Hoje, 260 já estão no país. A Alemanha também pretende participar da missão, com o envio de até 10 militares.

A tropa desarmada da ONU tem por função fiscalizar a implementação do Plano de Seis Pontos desenvolvido por Kofi Annan e pela Liga Árabe para a Síria. O plano prevê a retomada do diálogo político, o acesso ao país a ajuda humanitária, a libertação de presos políticos, a liberdade de ir e vir para jornalistas, bem como a liberdade de reunião e manifestação para a população em geral. Até agora, o regime não respeitou ainda de fato estas exigências, diz Corina Hauswedell, do Centro Internacional de Conversão, sediado em Bonn.

O presidente sírio, Bashar al Assad, queria, pelo que tudo indica, apenas ganhar tempo. Seu "sim" ao plano de Annan diminuiu, pelo menos a princípio, a pressão internacional sobre Damasco. Para pôr realmente um fim no conflito, Assad teria, contudo, que renunciar ou pelo menos entregar parte do poder à oposição.

"Mas isso certamente não está nos planos do regime", analisa Hauswedell. Em vez disso, as tropas do governo continuam atacando com intensa brutalidade oposicionistas e manifestantes, como pôde ser observado no massacre em Hula.

Maior pressão sobre o regime

Rolf Mützenich, porta-voz para questões de política externa da bancada do Partido Social Democrata (SPD), na Alemanha, também duvida da disposição de Assad em selar acordos. Por isso, diz ele, a pressão sobre o governo deveria aumentar: "Eu desejaria que o Conselho de Segurança da ONU optasse por uma resolução, a fim de exercer maior pressão sobre o regime", diz Mützenich. No entanto, o Conselho encontra-se dividido, pois a China e a Rússia, países com poder de veto, defenderam o regime de Assad nos últimos meses, impedindo desta forma uma postura mais rígida contra a Síria.

Diante das complexas relações de poder dentro do Conselho de Segurança da ONU, alguns oposicionistas sírios pleiteiam um ataque militar ao país sem a aprovação do grêmio. Mützenich, por sua vez, rejeita esta possibilidade: "Ações unilaterais, levadas a cabo sem a legitimação do Direito internacional, não vão de forma alguma solucionar a situação", diz o político. E o governo alemão defende uma postura semelhante. De qualquer forma, há, no momento, pouca disposição internacional no que diz respeito a uma intervenção militar na Síria.

"Não" ao fornecimento de armas para a oposição

A pesquisadora Hauswedell também rejeita o fornecimento de armas para a oposição. "Acreditamos que esta seja uma política kamikaze, também no sentido de uma regulamentação pacífica". Já agora países da região do Golfo Pérsico, como a Arábia Saudita, o Catar e os Emirados Árabes Unidos apoiam a oposição financeiramente. Teoricamente, o dinheiro é destinado ao pagamento do soldo dos rebeldes. No entanto, não se pode afirmar com segurança que esses recursos não estejam sendo de forma alguma destinados à compra de armas.

Corinna Hauswedell acha que ainda está muito cedo para abdicar do plano de Annan. "Não há, no momento, nenhum outro caminho viável", diz ela. Mützenich também acredita que é preciso manter os pés no chão. "Este é, no momento, o único plano no qual a comunidade internacional pelo menos tenta ir adiante. Infelizmente precisamos nos contentar com aquilo que está sendo viável no cenário internacional", completa Mützenich.

Segundo ele, é preciso esperar para ver como a situação se desenvolverá depois que a missão estiver completa, com seus 300 observadores no país.

Mas uma coisa está clara para o major-general Robert Mood, diretor da missão de observadores da ONU na Síria: "Se os lados envolvidos no conflito não quiserem dar de fato uma chance para o diálogo, nós observadores não teremos como acabar com a violência a longo prazo, não importa quantos sejamos", conclui.

Autor: Nils Naumann (sv) - Revisão: Roselaine Wandscheer

O 67º ANIVERSÁRIO DA VITÓRIA SOBRE O NAZI-FASCISMO





Nenhum fato político pode ser julgado fora da época e das circunstâncias nas quais aconteceu. Ninguém conhece sequer um por cento da fabulosa história do homem; mas, graças a ela, conhecemos acontecimentos que vão além dos limites do imaginável.

O privilégio de ter conhecido pessoas, inclusive lugares nos quais aconteceram alguns dos fatos vinculados à histórica batalha, incrementava o interesse com que esperava este ano a comemoração.

A colossal façanha foi fruto do heroísmo de um conjunto de povos que a revolução e o socialismo tinham unido e entrelaçado para acabar com a brutal exploração que o mundo tinha suportado ao longo de milênios. Os russos sempre estiveram orgulhosos por terem chefiado aquela revolução e pelos sacrifícios que fizeram para realizá-la.

Este importantíssimo aniversário da vitória não podia ser compreendido sob o sinal de uma bandeira e de um nome diferente daquele que presidiu o heroísmo dos combatentes da Grande Guerra Pátria. Sem dúvidas, ficava algo intocável e inesquecível: o hino sob cujas inesquecíveis notas milhões de homens e mulheres desafiaram a morte, e aniquilaram os invasores que quiseram impor mil anos de nazismo e de holocausto a toda a humanidade.

Com essas idéias na mente, desfrutei as horas que dediquei à parada militar mais organizada e marcial que jamais imaginei, protagonizada por homens formados nas universidades militares russas.

Os ianques e os exércitos sanguinários da NATO, com certeza, não podiam imaginar que os crimes cometidos no Afeganistão, no Iraque e na Líbia; os ataques contra o Paquistão e a Síria; as ameaças contra o Irã e contra outros países do Oriente Médio; as bases militares na América Latina, África e Ásia; poderiam ser levadas a cabo sem que o mundo tivesse consciência da isólita e descabelada ameaça.

Como os impérios esquecem rapidamente as lições da história!

A técnica militar exibida em Moscou no dia 9 de maio, mostrava a impressionante capacidade da Federação da Rússia para oferecer uma resposta adequada e variável aos mais sofisticados meios convencionais e nucleares do imperialismo.

Foi o ato que esperávamos no glorioso aniversário da vitória soviética contra o fascismo.

Fidel Castro Ruz - 10 de maio de 2012

#Yosoy132: levante estudantil motiva "primavera mexicana" antes das eleições




Federico Mastrogiovanni, Cidade do México – Opera Mundi

Em uma sociedade sufocada pela violência, movimento espontâneo arrebata as estruturas do país

No México, a campanha para as eleições presidenciais de 1 de julho caminhava sem emoções. Após um mandato de cinco anos de Felipe Calderón, conquistado após suspeitas de fraude e marcado pelo salto da violência do crime organizado, a população parecia apática. Até que chegou o dia 11 de maio. Em uma universidade privada, aos gritos de “Assassino!” e “Fora daqui”, centenas de estudantes da UIA (Universidade Iberoamericana), instituição jesuíta bastante influente e considerada um baluarte conservador, expulsaram o candidato do PRI (Partido Revolucionário Institucional), Enrique Peña Nieto.

Dali em diante, um movimento espotâneo, denominado “Yo Soy 132” (Eu sou 132), arrebatou o México. Predominantemente juvenil, apesar de reunir integrantes de todas as camadas da população em seus protestos – nas ruas e nas redes sociais –, a movimentação que surpreendeu o país acendeu as esperanças de que uma “primavera mexicana” está em curso.

Tido pela grande maioria dos meios de comunicação mexicanos como o favorito, até antes da campanha presidencial, Peña Nieto foi pego de surpresa. Os estudantes lembraram os seis anos do massacre de Atenco, quando uma operação policial no Estado de México, cujo governador era o presidenciável, deflagrou uma repressão brutal para desarticular a FPDT (Frente de Povos em Defesa da Terra) em sua luta contra a construção de um aeroporto em Texcoco. Dois jovens foram mortos e mais de 207 presos. Quarenta e sete mulheres foram violentadas sexualmente, de acordo com a CNDH (Comissão Nacional de Direitos Humanos). Nenhum dos culpados foi punido.

O PRI reagiu ao ataque a Peña Nieto e acusou a universidade de ter sido manipulada por um grupo de provocadores e inimigos políticos infiltrados. Os principais meios de comunicação fizeram coro. Em resposta, 131 estudantes gravaram um vídeo em que mostram a carteira de estudante, desmentindo as acusações. Em questão de horas o “Yo Soy 132” eclodiu na web e manifestações contra Peña Nieto e os meios de comunicação hegemônicos foram agendadas.

“Sou bonita, mas não idiota!” dizia a faixa de Karina, vestida com roupas de marca. Com um sorriso no rosto, a estudante da UIA explica porque foi à marcha de quarta-feira (23/05), em repúdio à imprensa: “Essa é a primeira vez que participo de um movimento como esse. Sou de uma geração que cresceu nas redes sociais e em um país oprimido por informações manipuladas. Quando percebemos como Peña Nieto e suas emissoras quiseram esconder nossa indignação, a resposta surgiu automaticamente”, contou ao Opera Mundi.

A jovem ressaltou que a onda de protestos é ainda incipiente, mas lembrou que pode crescer ainda mais. “É evidente que as reivindicações são muitas, mas finalmente saímos às ruas para expressá-las juntos. Penso que existem ainda mais pessoas que querem mudanças neste país, muito mais do que os que estão aqui [na marcha]. O futuro é nosso e já se foram os tempos de autoritarismo.”

Já são milhares de estudantes e jovens nas ruas do país sob o grito de “Estudantes informados, jamais manipulados”. Organizada nas redes sociais com a ajuda do Twitter, Facebook e Youtube por alunos de universidades públicas e privadas, a mobilização estudantil das últimas semanas representa o evento mais interessante da campanha presidencial. As mobilizações se repetem em vários estados: #Yosoy132 #Córdoba #Guadalajara #Jalapa #León #Pachuca #Puebla #Querétaro #Saltillo #Tijuana são as hashtags mais usadas no Twitter.

Peña Nieto recebeu críticas dos estudantes da Ibero e não soube contestá-las. Defendeu sua decisão repressora em Atenco afirmando que, “nesse caso, tomou a decisão de usar a força pública para recuperar a ordem e a paz”. No final do evento, sob as vaias dos jovens, chegou a se esconder em um banheiro da universidade antes de escapar pelas portas dos fundos.

A resposta dos principais meios de comunicação foi imediata. Encabeçados pela Televisa, a principal emissora do México, acusaram os estudantes de terem sido pagos pelo candidato da esquerda, Andrés Manuel López Obrador, e de terem agido como provocadores antidemocráticos. Além disso, alguns expoentes do PRI chegaram a ameaçá-los. Esse foi o caso do líder nacional do partido, Pedro Joaquín Coldwell, que disse que “esses jovens provocadores pagos para importunar deveriam ser investigados”.

Raúl, estudante do ITAM, diz desejar destacar o caráter amplo da luta estudantil. “Todos somos estudantes e não massa de manobra. Queremos estimular a consciência crítica por meio da cidadania e de uma informação livre e respeitosa com a realidade. Assim, cada um poderá eleger livremente o que quer. Mas deve haver informação livre. Este movimento está aqui para denunciar todo tipo de prática jornalística de ‘desinformacão’”.

Em meio a uma campanha eleitoral que era tida como decidida de antemão, dado o orçamento do PRI, os fundos de seu candidato, e o apoio da Televisa, os estudantes surgiram na opinião pública em resposta a um fato que parecia marginal.

União

Na marcha estão todos presentes: estudantes da Ibero com os da UNAM, do Instituto Politécnico Nacional, da Universidade Autônoma Metropolitana, da Universidade Autônoma da Cidade do México, do Claustro de Sor Juana, da TEC de Monterrey, do ITAM e da ANÁHUAC. Todos unidos em uma crítica à manipulação da informação, à desonestidade dos meios de comunicação e ao apoio dado por eles a Peña Nieto. Camponeses de Atenco, atacados em 2006 por Peña Nieto, também participaram.

Alberto Navarrete, estudante da Ibero, explica, erguendo seu cartaz: “O monopólio televisivo idiotiza! E Peña Nieto, além de ser ignorante e repressor, não está à altura de governar este país. Não sou de esquerda, nunca votei na esquerda. Só estou farto dessas mentiras, dessa arrogância e ignorância. Não somos minoria. Se levarmos em conta os jovens com idade entre 18 e 30 anos, somos a maioria no México e vão ter que nos escutar”.

História

De fato, quase toda a totalidade da população nasceu em um México priísta quando, de 1929 a 2000, o presidente designava seu sucessor, e as eleições era um mero trâmite. Contudo, nas duas últimas eleições, outro partido conseguiu chegar ao poder, o PAN (Partido da Ação Nacional). A "transição à democracia", como foi chamado o momento no México, não trouxe ganhos sociais e colocou o país em um espiral de violência.

Com essa conjuntura, o PRI pretendia captar o voto jovem. Um em cada quatro eleitores tem menos de 29 anos e mais de 13 milhões votarão pela primeira vez. No entanto, a reação dos estudantes a Peña Nieto mostra que não se esqueceram da história e que são, de fato, um nicho de voto poderoso.

De acordo com o professor Lorenzo Meyer, docente do Colégio do México, presente à marcha de quarta-feira, “um incidente trivial” na Ibero trouxe tudo à superfície, quase como o que aconteceu na Tunísia, quando Mohammed Bouazizi, farto da repressão se imolou e desencadeou uma revolução. “No mínimo, estamos diante de uma primavera mexicana”, sentenciou Meyer.

Na opinião do jornalista da publicação semanal Proceso Jenaro Villamil tudo é muito claro: “A primavera mexicana, ainda que muitos digam o contrário, é um movimento antiautoritário, como a primavera de Praga, como o maio francês, como a primavera árabe. Estão conduzindo uma mobilização contra o autoritarismo, algo que não mudou neste país com a estrutura monopólista da informação”.

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