Jaciara
Itaim, São Paulo – Correio do Brasil, opinião
As
dificuldades enfrentadas pela Presidenta em aumentar os índices de popularidade
de seu governo, bem como de sua própria candidatura à reeleição no primeiro
turno, podem provocar um aprofundamento de sua relação com os representantes do
grande capital em nosso
País. Em sua estratégia de minorar os estragos acumulados até
o momento, Dilma busca uma aproximação com o empresariado, em uma
clara tentativa de alavancar suas chances em outubro.
As
pressões que os mais diversos setores da sociedade exercem sobre o governo e
sobre as lideranças políticas são cíclicas. Em ano eleitoral, porém, as
movimentações ganham uma coloração diferenciada. Afinal, trata-se de um período
onde serão definidos os ocupantes dos principais cargos do Executivo e do
Legislativo, a partir de janeiro de 2015. Apesar da inegável importância dos 26
governos estaduais e do Distrito Federal em disputa, além de suas casas
legislativas, o fato é que o principal foco de atenções se concentra nas
eleições para o Palácio do Planalto.
Os
candidatos da oposição conservadora não conseguem encontrar um discurso
eficiente para suas respectivas campanhas. As pesquisas de intenção de voto
evidenciam a incapacidade de Aécio e Campos em decolarem junto ao eleitorado.
Porém, ainda assim permanece um sério risco de que as eleições sejam decididas
apenas no segundo turno, a ser realizado em 26 de outubro. Esse é o tabuleiro
em que se movem as peças do xadrez sucessório no atual momento.
Esse
quadro termina por fragilizar a própria candidata, que passa a buscar uma
ampliação de seu círculo de apoiadores, inclusive no meio empresarial. Ocorre
que esse tipo de envolvimento mais explícito dos endinheirados não se dá de
forma natural ou espontânea. Todos sabemos que a cobrança virá com a aceitação
de projetos e propostas a serem incorporados na campanha ou mesmo ao longo dos
últimos meses do atual mandato.
O
encontro com Katia Abreu e o agronegócio
Algumas
das articulações mais recentes da Presidenta parecem caminhar nessa direção. Em
23 de maio, por exemplo, ela recebeu para um jantar no Palácio da Alvorada a
fina flor dos representantes do agronegócio tupiniquim. A principal
articuladora do encontro foi a Senadora Katia “Motosserra” Abreu, que também
ocupa o cargo de Presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA).
Trata-se
de um personagem carregado de forte simbolismo na vida política brasileira.
Militante aguerrida e defensora dos agropecuaristas no Estado do Tocantins,
logo foi eleita deputada federal e depois chegou à Câmara Alta. Transitou pelo
PFL e DEM. Saiu com Kassab para o PSD e agora, há pouco tempo, voltou para a
base governista pois ingressou no PMDB. O mesmo partido do Vice-Presidente
Michel Temer, do todo-poderoso José Sarney, do carinhoso deputado Eduardo
Cunha, do Presidente do Senado Renan Calheiros e do Presidente da Câmara dos
Deputados Henrique Eduardo Alves.
Pois
bem, essa representante de quase tudo que existe de mais atrasado e retrógrado
na sociedade brasileira, sempre vociferou contra o PT, contra a esquerda,
contra a reforma agrária e a favor da liberdade para degradação do meio
ambiente. Atua na defesa de todos aqueles que utilizam o trabalho escravo para
acumulação de riqueza em pleno século XXI, mas exige que o governo ofereça
todas as melhores condições para a produção agrícola baseada nos transgênicos,
nos pesticidas e nos fertilizantes. Porém, como desde 2003 a opção dos governos
tem sido pela manutenção do modelo econômico bastante dependente da capacidade
exportadora do agronegócio, eles terminam por ficar refém desse tipo de
pressão. Pode-se imaginar qual não será a longa pauta de reivindicações do
setor para que passem a pipocar declarações explícitas de apoio aDilma no
pleito que se aproxima. Chega a dar arrepios!
A
contribuição da previdência: desoneração para sempre!
Outro
campo de intervenção propositiva da Presidenta junto ao empresariado refere-se
às generosas políticas de desoneração fiscal e tributária. A decisão voluntária
de abrir mão de receitas estratégicas do Estado em prol de empresas, grupos ou
setores tampouco não é exclusividade desse governo. No entanto, a partir da
ampliação da crise financeira internacional, o Brasil passou a adotar medidas
para estimular a produção e o consumo, procurando evitar uma maior contaminação
recessiva em nossas terras. Era o caso da redução de alíquotas do Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI) e de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF),
entre outros. Diga-se de passagem, aliás, que tais facilidades não vieram
acompanhadas de nenhum tipo de exigência de contrapartida a ser cumprida pelas
empresas, tais como a geração de emprego, o compromisso com preços ou a redução
de índice de componentes importados.
Um
dos aspectos que os representantes do capital lograram incluir na lista de
benesses foi uma reivindicação histórica do setor: a desoneração patronal da folha
de pagamentos para a previdência social. Em 2011, o governo terminou por se
curvar a tal proposição e iniciou uma espécie de experiência localizada em
alguns poucos setores. A idéia era promover uma troca na forma de arrecadação
patronal.
Os
trabalhadores continuariam a recolher os 11% sobre o salário. As empresas
deixariam de recolher os 20% sobre a folha de pagamentos e passariam a
contribuir com uma alíquota indefinida (entre 1% e 2%) a ser aplicada sobre o
faturamento das mesmas.
A
medida foi se estendendo aos poucos e a lista de setores incluídos foi sendo
ampliada a cada renovação periódica da medida. Atualmente são mais de 50 ramos
beneficiados e a lei prevê um prazo para a excepcionalidade terminar em
dezembro próximo. Como era de se esperar, o “lobby” do capital vai no sentido
de forçar o governo a generalizar a nova sistemática para todos os setores e
introduzir uma cláusula que torne essa nova sistemática permanente. A
experiência vem demonstrando que o volume arrecadado com a alíquota incidente
sobre o faturamento não tem sido suficiente para cobrir as receitas necessárias
à manutenção do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) equilibrado. Assim, o
Tesouro Nacional tem sido chamado a cobrir esse buraco, o que não se traduz em
boa medida para as receitas de um regime de pensões e aposentadorias que é
intergeracional. Eventuais problemas de arrecadação no momento atual só serão
efetivamente sentidos daqui a 30 anos.
Para
felicidade de poucos e surpresa/indignação da maioria, Dilma cedeu ao capital e atendeu ao pleito: desoneração
para sempre! Ao invés de incorporar tais demandas patronais e efetivá-las como
política pública permanente, o mais adequado seria o governo do Partido dos
Trabalhadores atender às reivindicações das entidades sindicais e de
representação dos aposentados, os maiores interessados em um sistema
previdenciário que se revele como equilibrado e sustentável no tempo. Assim, o
primeiro passo seria promover o retorno à situação anterior, onde a
contribuição patronal voltaria a ser definida por uma alíquota de 20% incidente
sobre a folha de salários.
Construção
civil: os grandes doadores para o PT
Outro
grande setor do capital que tem merecido toda atenção e carinho por parte do
governo é o da construção civil. Trata-se de um ramo da economia que depende
essencialmente das demandas e das orientações do próprio Estado brasileiro. Sua
principal área de atuação são as obras públicas, em especial aquelas vinculadas
aos programas de infraestrutura. É o caso dos grandes programas e projetos de
energia, saneamento, estradas, portos, ferrovias, aeroportos, complexos
esportivos, entre outros. Além disso, faz parte desse extenso rol de atividades
do setor de construção os programas habitacionais, a exemplo do “Minha Casa,
Minha Vida”.
O
ramo da construção tem como característica básica essa relação quase umbilical
com os espaços de decisão na Administração Pública. Não por acaso, são os
maiores contribuidores para os caixas dos partidos políticos, particularmente
daqueles que estão no exercício do poder. Assim, as grandes construtoras são as
principais doadoras para as campanhas eleitorais, em especial para o PT. E tal
fenômeno se manifesta inclusive em anos sem eleições. Em 2013, por exemplo, as
empresas do setor destinaram R$ 60 milhões à agremiação, valor equivalente a
75% do total de R$ 80 mi
que o partido recebeu a título de doações empresariais.
Como
se pode perceber, os interesses econômicos do grande capital batem à porta da candidatura
de Dilma. Melhor dizendo, eles continuam a se apresentar com seus pleitos e
reivindicações, exatamente da maneira como fazem o tempo todo, inclusive nos
períodos fora do calendário eleitoral. A grande dúvida que permanece é saber
qual será o limite das bondades e das concessões que ela ofertará em troca do
apoio solicitado. Isso porque a fatura de tais benesses oferecidas ao
empresariado com recursos públicos cairá nas contas a serem pagas pelo povo
brasileiro. A velha prática de fazer bondade com chapéu alheio.
*Jaciara
Itaim, é economista e militante por um mundo mais justo em termos sociais
e econômicos.