Maputo -
Marcolino Moco, primeiro-ministro de Angola entre 1992 a 1996 foi o principal
orador de uma conferência Internacional sobre Governação da Economia
Extractiva, realizada em Maputo e organizada por iniciativa do Grupo Ibis
Moçambique sob o lema “Recursos Naturais: Bênção ou Maldição?”.
*Luis Nhachote - NJ
A expectativa de
ver e ouvir Moco, era enorme na capital moçambicana, na medida em ia partilhar
a experiência angolana, numa altura em que o debate a volta de recursos
naturais, desde a sua descoberta em Moçambique esta a levantar vários debates.
A apresentação de
Marcolino Moco, tinha como titulo “Responsabilidade dos políticos para que os
recursos naturais beneficiem a todos: da situação em Angola e notas soltas
sobre Moçambique”. Após a conferência, Marcelino Moco concedeu uma grande
entrevista ao principal canal privado de Televisão em Maputo, a STV, onde
deixou os seus pontos de vista sobre o país que o via nascer: Angola. A mesma
foi integralmente reproduzido no diário O País, um jornal pertencente ao mesmo
grupo da STV, a Sociedade Independente de Comunicação (SOICO).
Os “recados” de
Maputo
Marcolino Moco foi
de 1991 a 1992 secretário-geral do MPLA, de 1992 a 1996 primeiro-ministro de
Angola e primeiro-secretário executivo da CPLP de 1996 a 2000. Como é que um
homem que atingiu tão altos cargos no governo de Angola de repente saiu e torna-se
um crítico do regime? Esta foi a pergunta que deu pontapé de saída a entrevista
que colocou os moçambicanos que conhecem o seu percurso grudados nos aparelhos
de televisão que respondeu nos seguintes termos: “Não houve nada de repente. Eu
aderi ao nacionalismo angolano em 1974, com a ideia de contribuir para o
desenvolvimento do meu país; lutar para harmonização das várias etnias e vários
povos de Angola e de todos os países africanos.
Foi um período de partido único em quase toda a África, mas depois fez-se uma
reflexão, isso com a queda do Muro de Berlim e houve uma mudança que me
apaixonou muito. Criou-se um novo quadro, novo sistema, novo paradigma e, nessa
altura, atingi altas funções, tanto no partido, como mais tarde no governo como
primeiro-ministro (uma espécie de auxiliar do presidente da República, que era
o efectivo chefe do Governo).
Depois de cessar as minhas funções como governante, passei para
secretário-executivo da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP). Como
primeiro-ministro, dei tudo para se consolidar o novo quadro. Regressei às
minhas funções no ano 2000, passando para a Assembleia Nacional e verifiquei
que se tinha dado algum retrocesso na consolidação do caminho democrático,
provavelmente, pelo prolongamento da guerra. A guerra, normalmente, cria um
certo autoritarismo e uma concentração excessiva de poder para a pessoa que
está à frente do Estado.”. Nessa mediática entrevista nos círculos intelectuais
moçambicanos, Moco referiu que não abandonou a política activa, mas que “fui
afastado de forma cínica” no interior do MPLA. Na mesma disse estar muito
preocupado com o presidente José Eduardo dos Santos, pois, na sua percepção ele
“nunca diz claramente o que pensa”.
O ex-primeiro ministro angolano, disse ser “pura ilusão pensar que o regime
angolano é democrático. Ele só o é por proclamação”. Moco diz que a sua forma
independente de pensar, faz que que jovens angolanos usem as redes sociais para
o insultarem, acusarem-no de cobarde.” A uma questão sobre a sucessão do
presidente angolano, Moco disse ser céptico crer que o vice-presidente de
Angola, Manuel Vicente possa suceder dos Santos, pois considera este muito
pragmático. “Manuel Vicente vai fazendo o trabalho, vai recebendo missões do
Estado, vai representando o presidente em reuniões, conferências, mas já
começou-se a falar-se de Eusébio, que é o filho do presidente, de uma forma
estranha nomeado um dos administradores do fundo soberano dos petróleos que
movimenta muito dinheiro. Se isso tivesse sido discutido na Assembleia
Nacional, no próprio Conselho de Ministros não se discutiu. Se olharmos para os
antecedentes, só os distraídos é que não vêem que o futuro presidente de Angola
é o próprio filho do Presidente. Não seria a primeira vez que isso acontece.
Era bom que os angolanos aceitassem isso, mas que fazer, ninguém conhece o
futuro”.
Recursos minerais: Benção ou maldição?
Marcolino Moco considerou em Maputo que os recursos minerais em Angola, não foram
nem bênção nem maldição. “Nem uma coisa, nem outra. Eles estão a ser geridos de
uma forma preocupante, mas não podemos ir aos extremos. São recursos do povo
angolano, de África e do mundo. Eles devem ser geridos com transparência.” Na
óptica do orador, os recursos angolanos, o petróleo está a ser gerido de acordo
com as normas mais sãs do mundo, os contractos de concessão de partilha, estão
sem problemas. Aos moçambicanos Moco disse que para maior gestão dos recursos
de que tanto falam – gás natural, carvão mineral, áreas pesadas e eventualmente
o petróleo – tudo depende do amadurecimento da sociedade civil, e um controlo
rigoroso. Esta fiscalização deve ser feita fundamentalmente pela comunicação
social, por isso o bloqueio da comunicação é um perigo. Acho que Moçambique
esta muito melhor que Angola. Existe uma televisão como esta, que em Angola não
existe, uma entrevista destas lá não é possível. Tenho respondido desta forma
em Angola quando dão me questões, mas depois não se divulga. Sai algumas partes
moderadas. Angola não deve contentar-se com um discurso moderado, é preciso
dizer a verdade da gravidade daquele país. Coisas dessas não saem nem na
sociedade civil, nem do líder da oposição e nem dos líderes religiosos. Há essa
reclamação mas tudo é sufocado.” A terminar a referida e extensa grande
entrevista resumida nesta linhas Moco lançou um desabafo: “Praticamente desde
que estamos em paz, Angola deixou de ratificar documentos de importância de
direitos humanos e todos os documentos abraçados pelos países democráticos”.