segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

SAIR DO PESADELO DO EURO

 

Alberto Montero Soler [*]
 
I - Passam-se os meses, transformam-se em anos e as possibilidades de os países periféricos da Zona Euro superarem a crise por um caminho que não seja uma solução de ruptura afastam-se cada vez mais do horizonte.

Frente àqueles que sustentam que existem caminhos para a reforma capazes de lidar com a situação actual de deterioração económica e social, a realidade empenha-se em demonstrar que a viabilidade dessas propostas requer um pré-requisito inescapável: a modificação radical da estrutura institucional, das regras de funcionamento e da linha ideológica que guia o funcionamento da zona euro.

O problema de fundo é que esse quadro é funcional e essencial para o processo de acumulação do grande capital europeu. Além disso, e é algo que devemos ter sempre em mente, para que a Alemanha consolide tanto o seu papel de liderança na Europa como aquele a que aspira na nova geopolítica multipolar em construção. Neste sentido, podem colocar-se pelo menos dois argumentos básicos que reforçam a tese da necessidade da ruptura do quadro restritivo imposto pelo euro se se pretende abrir o leque de possibilidades para optar por uma saída desta crise que permita uma possibilidade emancipadora mínima para o conjunto dos povos europeus.

O primeiro argumento é que a solução que se está a impor contra esta crise a partir das elites dominantes a nível europeu é, em si, uma solução de ruptura e a seu favor. As políticas de austeridade são a expressão gritante de que essas elites estão numa posição tão forte no que diz respeito ao mundo do trabalho que podem permitir-se romper unilateral e definitivamente com o pacto implícito sobre o qual se tinham criado, cultivado e mantido os Estados providência europeus. Estas elites sabem perfeitamente que uma classe trabalhadora precarizada, desideologizada, desestruturada e que perdeu fortemente a sua consciência de classe é uma classe trabalhadora indefesa e sem capacidade de resistência real para preservar as estruturas de bem-estar que a protegiam contra as inclemências da mercantilização dos que satisfazem as necessidades económicas e sociais básicas. As concessões feitas durante o capitalismo fordista do pós-guerra estão em risco de ser revertidas porque, além do mais, na privatização destas estruturas de bem-estar existe um nicho de negócio que pode facilitar a recuperação da queda da taxa de lucro.

O segundo argumento é que não se pode esquecer, como parece que acontece, a natureza adquirida por um projecto de integração monetária europeu, desde que foi criado e começaram a actuar as dinâmicas económicas que o mesmo promovia o seu interior. O problema essencial é que a zona euro é um híbrido que não avança para o governo federal, com todas as consequências que isso teria sobre a transferência de soberania, e se mantém exclusivamente no terreno do monetário, porque essa dimensão, juntamente com a livre circulação de capitais e de bens e serviços, é suficiente para criar um mercado de grandes dimensões que permite uma maior escala de reprodução de capital, o que elimina os riscos de desvalorizações monetárias competitivas pelos Estados e facilita a dominação de uns Estados por outros na base da aparente neutralidade que é atribuída aos mercados.

Portanto, a Europa – e com ela a sua expressão de "integração" mais avançada que é o euro – tornou-se um projecto puramente económico, ao serviço das oligarquias industriais e financeiras europeias, com a agravante de, no processo, ter cooptado a classe política, nacional e supranacional, sequestrando assim os mecanismos de intervenção política pela dinâmica económica e restringindo as margens para qualquer reforma que não actue em seu beneficio. Consequentemente, este espaço dificilmente pode ser identificado e defendido pelas classes populares europeias como a Europa dos Cidadãos, como a que em alguns momentos aspirou a esquerda.

II - Na verdade, há uma série de factores que explicam porque motivo o euro tem sido, na perspectiva dos povos europeus, um projecto fracassado desde o início: por um lado, tanto as políticas de ajuste permanentes que se articularam durante o processo de convergência antes da introdução do euro, como as políticas mantidas desde a sua entrada em vigor, têm restringido as taxas de crescimento económico, com o consequente impacto sobre a criação de emprego; por outro lado, a ausência de uma estrutura fiscal de redistribuição do rendimento e da riqueza ou de qualquer mecanismo de solidariedade que realmente responda a esse princípio, tem dificultado a redução dos desequilíbrios das condições de bem-estar entre os cidadãos dos Estados membros; e, por fim, também deve salientar-se que as assimetrias estruturais entre as diferentes economias desde o início do projecto, foram piorando ao longo dos anos, fortalecendo a estrutura centro-periferia no interior da zona euro e acentuando a dimensão produtiva da crise actual.

Se a tudo isto se acrescentar que as políticas destinadas a salvar o euro são as políticas para proteger os interesses da elite económica europeia contra o bem-estar das classes populares, o resultado é que se reafirma a ideia de um distanciamento acelerado da possibilidade de identificação da zona euro com um processo de integração, que os povos europeus possam reconhecer como seu e construído para atender às suas aspirações.

Pode-se concluir então, que o euro – e entenda-se este não só como uma moeda em si, mas como todo um sistema institucional e uma dinâmica funcional ao serviço da reprodução ampliada do capital a nível europeu – é a síntese mais crua e acabada do capitalismo neoliberal. Um tipo de capitalismo que é desenvolvido no âmbito de um mercado único dominado pelo imperativo da competitividade e em que, além disso, se produziu um vazio das soberanias nacionais – e não digamos das populares – em beneficio de uma tecnocracia que actua politicamente a favor das elites europeias e em prejuízo das condições de bem-estar das classes populares. E se estamos de acordo em que, para estas últimas, o estabelecimento do euro é um projecto fracassado, a pergunta que imediatamente surge é sobre o que podem fazer, pelo menos as dos países periféricos, sobre as quais está caindo com maior intensidade o peso do ajuste, frente a um futuro de tão pouca esperança e em que as opções de reforma num sentido solidário se vão bloqueando com cadeados cada vez mais férreos.

A resposta a esta pergunta vai depender de qual o conceito que temos da crise actual, das dinâmicas que a mantêm activa e das perspectivas de evolução das relações políticas e económicas no interior da zona euro, que poderiam inverter a situação actual ou, pelo contrário, reforçá-la.

III - A meu ver, a crise apresenta, neste momento, duas dimensões dificilmente conciliáveis e que facilitam a consolidação do status quo.

A primeira dimensão é financeira e centra-se no problema do endividamento generalizado que, no caso da maior parte dos países periféricos, começou como um problema de dívida privada e se tornou um de dívida pública, quando se resgatou - e portanto, se socializou a dívida do sistema financeiro. Os níveis de endividamento atingidos, tanto privado como público, são tão altos que é impossível que a dívida possa ser reembolsada integralmente, e isso é algo que deve estar plenamente consciente pelas suas consequências práticas. Isso, e o facto de que privados da moeda nacional e com as taxas de crescimento da dívida/PIB muito superiores à taxa de crescimento económico, o peso da dívida se torna insustentável e se converte numa bomba de relógio que explodirá a qualquer momento.

A segunda dimensão é real e é baseada em diferenças de competitividade entre as economias centrais e economias periféricas. Essas diferenças encontram-se, entre outros factores, na origem da crise e o problema de fundo é que não só não estão diminuindo, como se estão expandindo. Além disso, a leitura da redução dos desequilíbrios externos em economias periféricas da zona do euro como um sinal de que estamos em vias de superar a crise é manifestamente perversa, porque não considera o tremendo impacto da desaceleração económica sobre as importações.

O elo de ligação entre as duas dimensões da crise é a posição dominante alcançada pelos países centrais sobre os periféricos e, em particular, a posição alcançada pela Alemanha em toda a zona do euro, não só relevante pelo seu peso económico, mas também pelo seu controle político das dinâmicas de reconfiguração da zona euro que se estão desenvolvendo com a desculpa de que são medidas para enfrentar a crise, mas que actuam, de facto, fortalecendo a sua hegemonia.

Se a isto se somarem as peculiaridades da sua estrutura de produção, caracterizada por cronicamente fraca procura interna – e, portanto, a existência recorrente de excesso de poupança interna – e o poder da procura externa – fundamento de seus superávites comerciais contínuos – verificaremos como o que parecia ser um círculo virtuoso de crescimento para toda a zona euro acabou por se tornar um jugo sobre as economias periféricas, o principal destino dos fluxos financeiros, através dos quais a Alemanha rentabilizava os seus excedentes de poupança doméstica e comercial reciclando-os sob a forma de dívida externa que colocava em tais economias.

Assim, a Alemanha reconverteu sua posição credora em uma posição de dominação quase hegemónica que lhe permite impor as políticas necessárias para os seus interesses. Isto significa, na prática, que qualquer solução de natureza cooperativa para resolver a crise é automaticamente rejeitada, enquanto se reforçam, pelo contrário, os aspectos de natureza competitiva entre as economias cuja desigualdades em termos de competitividade já provaram ser insustentáveis num quadro tão diferente e assimétrico, como a zona euro.

E por isso é tão trágica quanto desoladora a aquiescência com que os governos periféricos da zona euro assumem e implementam políticas que estão agravando as diferenças estruturais pré-existentes e, portanto, não só acentuam as diferenças em termos de produção e bem-estar entre o centro e a periferia, sem que possa existir qualquer aparência de solução através das mesmas: os processos de deflação interna, não só minam o poder de compra das classes populares, mas também aumentam o fardo real da dívida Internamente, tanto da dívida privada (por meio de deflação salarial) como da dívida pública (o diferencial entre as taxas de crescimento do PIB e a dívida pública), com a agravante que qualquer apreciação da taxa de câmbio do euro se traduz numa erosão de ganhos de competitividade espúrios conseguidos por meio de deflação salarial. Trata-se, portanto, de um caminho para o abismo do subdesenvolvimento.

É por esta razão que, se as mudanças estruturais radicais não ocorrerem (e passam todas elas por mecanismos de transferências fiscais redistributivas), a Zona Euro será consolidada como um espaço assimétrico de acumulação de capital, em que as economias periféricas serão condenadas a desenvolver-se em qualquer uma das soluções de equilíbrio sem crescimento, para usar um eufemismo economicista, ou, no pior dos casos, vai acabar saltando parcial ou totalmente no ar.

O problema é que essas reformas radicais não só não aparecem na agenda europeia, mas são sistematicamente vetadas pela Alemanha. Na verdade, acho que é facilmente constatável como neste momento, existem tensões entre os interesses das elites económicas e financeiras europeias e os das classes populares de toda a zona euro, mais intensas no caso das dos estados periféricos; entre os interesses da Alemanha e de outros estados centrais e os estados da periferia; e entre as propostas de soluções para a crise impostas por esses estados e elites e Estados e a lógica económica mais elementar, que é expressa nas principais identidades macroeconómicas que reflectem as inter-relações entre os saldos dos sectores privado, público e externo das economias da zona euro. Todas essas tensões, devidamente geridas por aqueles que detêm o poder em diferentes áreas de expressão dos mesmos, são propícias para a consolidação de uma zona euro assimétrica, no sentido já mencionado, e dominada pela Alemanha.

IV - Mas também, essas tensões bloqueiam a possibilidade de uma saída da crise para as classes trabalhadoras que não seja de ruptura, como observado anteriormente neste texto. O problema surge quando aqueles que só estão a considerar a possibilidade de ruptura unilateral, deixando o euro, são partidos nacionalistas de extrema direita, apropriando-se de um sentimento de crescente insatisfação popular contra o euro, em comparação com uma esquerda que continua invocando a opção por reformas que se confrontam directamente com os interesses daqueles que puseram ao seu serviço as potencialidades de dominação imperial pela via económica que facilita o euro. Sob este ponto de vista, seria apropriado deixar de ver o euro apenas como moeda e passar a associá-lo a uma arma de destruição maciça que está a destruir, não só o bem-estar dos povos da Europa, mas também o sentimento europeu baseado na fraternidade entre esses povos, que tanto trabalho tiveram a construir.

O problema de credibilidade é agravado para a esquerda quando, para promover as reformas necessárias, se apela para a activação de um sujeito, "classe trabalhadora europeia", agindo como uma vanguarda na transformação da natureza da zona euro. E a situação da classe trabalhadora na Europa nunca foi tão deteriorada no que se refere a consciência de classe e identidade, sem diminuir nem um pouco o facto incontestável de que o rácio salarial continua a ser a pedra de toque essencial do sistema capitalista. Como escrevia recentemente Ulhrich Beck, vivemos a tragédia de estar em tempos revolucionários sem revolução e sem sujeito revolucionário. Isso não é nada.

Em qualquer caso, o horizonte se clarificaria se a esquerda fosse capaz de dar uma resposta credível para uma questão que se recusa a considerar e que, no entanto, se pode manifestar mais cedo ou mais tarde no palco europeu e, especificamente, na Grécia: o que poderia fazer um governo de esquerda que chegou ao poder em um único país da periferia? Deveria esperar até que houvesse condições objectivas no resto da zona euro para prosseguir com a sua reforma, estando cientes de que isso requer a unanimidade dos 27 estados, ou deveria aproveitar a janela de oportunidade que a história lhe permitiu abrir e promover a saída daquele estado do euro?

Obviamente, a resposta não é fácil, mas não vale enganar-se para ficar isolado. Isso requer começar a reconhecer que, no contexto do euro não há espaço para políticas verdadeiramente transformadoras que actuam nos interesses das classes populares. Além disso, gostaria de afirmar que, neste contexto, não há espaço para a política porque ela foi sequestrada pelo tipo de instituições desenvolvidas para dar um certificado a uma moeda que não tem por trás qualquer tipo de projecto de construção de uma comunidade política inclusiva dos povos da Europa. É, portanto, uma contradição reivindicar processos constitucionais quando a condição de possibilidade prévia para que esse processo possa realizar-se plenamente é romper com o quadro político institucional, económico e jurídico imposto pelo euro. Uma comunidade só pode reconstituir-se através de um processo constitucional, se o fizer sem restrições prévias, impostas de fora e que agem para piorar a situação, em detrimento dos interesses das mesmas classes que reivindicam esse processo constituinte.

Ou, dito de outra forma, a ruptura com o euro não é suficiente, mas condição necessária para qualquer projecto emancipador de transformação social a que possa aspirar à esquerda. Assim, reivindicar a revolução em abstracto e, simultaneamente, tentando preservar o euro e as instituições e políticas que lhe são inerentes nesta Europa do Capital, até estarem reunidas as condições europeias para a reforma, é uma contradição em termos que retira credibilidade perante algumas classes que parecem ter identificado o inimigo de forma mais clara que os líderes da esquerda.

É por isso que até esta contradição não ser assumida e superada e os discursos políticos e económicos serem ambos de ruptura e executados em paralelo; até que a saída do euro seja percebida não apenas como um problema, mas também como parte da solução para a situação dependente das economias periféricas ao abrir o horizonte de possibilidades para se recompor como economias e buscar seu caminho de desenvolvimento na produção e fornecimento de bem-estar de uma forma mais auto-centrada e menos dependente da sua integração na economia mundial; até que deixe de nos perseguir o medo de quebrar as cadeias do euro por falta de certeza absoluta sobre como poderia ser a vida fora dele, da mesma forma que se apoderou daqueles que se recusavam a romper com o padrão-ouro após a Grande Depressão dos anos trinta do século passado; até que tudo isso aconteça só posso prever, com pesar, um longo período de sofrimento social e económico para os povos e os trabalhadores da periferia europeia.
 
 [*] Professor de Economia Aplicada da Universidade de Málaga

O original encontra-se em
www.mientrastanto.org/boletin-120/notas/salir-de-la-pesadilla-del-euro . Tradução de GAC.

Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/ .
 

Portugal: Administradores do BPN escolhiam parceiros com promessa de ganhos indevidos

 


Os ex-administradores do BPN Oliveira Costa, Francisco Sanches e Coelho Marinho, pronunciados hoje juntamente com o antigo ministro Arlindo Carvalho e outros, escolhiam parceiros "com a promessa de ganhos indevidos".
 
O despacho de pronúncia, a que a agência Lusa teve acesso, refere que os três administradores do Banco Português de Negócios (BPN) angariavam "terceiros", entre os quais Arlindo Carvalho e o sócio José Neto, "a quem prometiam e proporcionavam ganhos indevidos".
 
Os arguidos Arlindo Carvalho e José Neto foram idealizados como parceiros ideais para o Grupo [BPN] pelo arguido Coelho Marinho, que conhecia o primeiro arguido por proximidade da terra de naturalidade e porque tinha estado ligado ao Ministério da Saúde, como administrador hospitalar, num período em que Arlindo Carvalho desempenhou funções como ministro da Saúde", lê-se nos autos.
 
Quanto à estratégia utilizada, Arlindo Carvalho e José Neto "e as sociedades por si controladas vieram assim a adquirir a confiança dos arguidos Oliveira Costa, Francisco Sanches e Luís Caprichoso, no sentido de estes últimos virem a montar e fazerem aprovar diversas operações de financiamento a favor dos primeiros, com a finalidade de estes e suas empresas virem a adquirir as posições societárias e os ativos anteriormente detidos" pelo empresário e acionista do BPN Ricardo Oliveira e sua empresa.
 
Segundo o despacho, "sucederam-se assim operações de financiamento, não suportadas em garantias efetivas, mas autorizadas por intervenção de Oliveira Costa, Francisco Sanches e Luís Caprichoso, montadas junto do BPN e do Banco Insular, tendo como beneficiários, primeiro, o arguido Ricardo Oliveira e suas empresas e, depois, Arlindo Carvalho e José Neto".
 
Os arguidos "quiseram alcançar um objetivo negocial com ocultação da intervenção do BPN, mas aceitaram, para conseguir essa ocultação, gerar uma perda para o BPN pela concessão de financiamentos que nunca vieram a ser pagos".
 
Entre os negócios analisados estão a aquisição da sociedade BRICK AND SAND, "uma operação de fachada", e do terreno da Guia, em Cascais.
 
Conclui o magistrado do Tribunal Central de Instrução Criminial que "os arguidos Oliveira Costa, Francisco Sanches e Coelho Marinho conluiaram-se ainda com os arguidos Arlindo Carvalho e José Neto de forma a lhes proporcionarem uma receita financeira que sabiam ser da titularidade de outras entidades, sabendo e querendo que os arguidos Arlindo Carvalho e José Neto iriam desviar essa receita para seu próprio benefício, em prejuízo das entidades legítimas titulares dessas receitas, que se traduziam na produção de juros sobre quantias depositadas junto do BPN".
 
Lusa, com Notícias ao Minuto
 

Portugal - Saúde: Racionamento origina "uma saúde para ricos e outra para pobres"

 


O bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, recusou hoje o racionamento no Serviço Nacional de Saúde (SNS), o qual, na sua opinião, promove "uma saúde para ricos e outra para pobres".
 
"Para mim, o racionamento em saúde é completamente antiético, a não ser que não haja alternativa nenhuma", disse José Manuel Silva, em Coimbra.
 
O bastonário da Ordem dos Médicos intervinha numa conferência subordinada ao tema "Ética da sustentabilidade do sistema de saúde - Ética na prestação de cuidados de saúde, ética no circuito do medicamento".
 
Alegando que "há sempre alternativas", José Manuel Silva afirmou que "o racionamento só afeta os mais desfavorecidos" da sociedade portuguesa.
 
Para o bastonário, o racionamento de medicamentos, materiais diversos usados na saúde e meios complementares de diagnóstico traduz "uma atitude que discrimina" os utentes do SNS.
 
"Estamos a aceitar uma saúde a duas velocidades: uma saúde para ricos e uma saúde para pobres", criticou.
 
O dever dos médicos, acrescentou, é tentarem "esbater as diferenças" das pessoas no acesso à saúde, para "todos terem direito a um nível de dignidade", o que implica evitar qualquer discriminação nos cuidados de saúde.
 
"A saúde a duas velocidades não é ética", incluindo na assistência aos cidadãos em situações de emergência, disse o bastonário, dando como exemplo a recente morte de quatro pessoas, num acidente rodoviário na zona de Évora, tendo faltado uma viatura médica de emergência e reanimação (VMER) disponível para realizar a assistência às vítimas no local.
 
Caso o acidente tivesse ocorrido na zona de Coimbra, os sinistrados "teriam duas" dessas viaturas, sublinhou José Manuel Silva.
 
"Há uma discriminação geográfica que também não é ética", adiantou.
 
O bastonário disse que "há médicos que não se revêm no Código Deontológico", mas todos "têm de o cumprir", uma vez que o diploma "foi aprovado pela maioria" dos membros da classe.
 
Na iniciativa, intervieram ainda Ema Paulino, representante da Ordem dos Farmacêuticos, Paulo Clímaco Lilaia, da Associação Portuguesa de Genéricos, e Filomena Girão, advogada.
 
Moderado por Fernanda Freitas, o debate decorreu no auditório do Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra (ISCAC) e foi organizado pela Livraria Almedina, FAF-Advogados, ISCAC, Diário As Beiras e Diário de Bordo.
 
Lusa, em Notícias ao Minuto
 

Portugal: BOLA DE OURO E CANETA DE ESTERCO

 

Balneário Público
 
Em Portugal e pelo resto do mundo a convicção é que a Bola de Ouro vai para Ronaldo. Aqui para nós, acho que ele a merece mesmo, sem sombra de dúvidas. O seu elevado profissionalismo e as suas exibições futebolisticas são o testemunho indiscutível do merecimento daquele galardão. Como português só posso estar a torcer por Ronaldo mas para além disso carrego a certeza da sua grandiosidade como desportista e como génio do futebol nas suas exibições em campo. Bola de Ouro para Ronaldo, pois então. Noutra área, em Portugal, creio que devia ser instituído o galardão nacional da Caneta de Esterco. Merecidamente, com o máximo de protagonismo vencedor, o galardão, se existisse, devia caber a Cavaco Silva e a Passos Coelho (ex-equo) pelos seus esforços, assinaturas e gatafunhos de criação e aprovação de imposições inconstitucionais ao longo dos anos que dura esta mafiosa austeridade que esbulha os pobres portugueses e os seus parcos haveres, para desse modo possibilitar que pouco mais de umas dezena consigam ficar mais ricos. Porque Portugal está a tornar-se num país de excessos e do tudo ou nada a distância e diferença do melhor e do pior até cai bem, condiz com o panorama e práticas do atual governo e do PR assim como da atual miserabilização do país. Bola de Ouro para um, Caneta de Esterco para outro (outros). Parabéns aos vencedores.
 
Depois de escrito: Foi neste exato momento que tomei conhecimento de que efetivamente Cristiano Ronaldo foi o vencedor da Bola de Ouro da FIFA, para o melhor jogador do mundo em 2013. Já é a segunda vez que vence este galardão. Falta agora saber, quanto à Caneta de Esterco, se haverá quem institua o galardão e depois cumpra o processo de nomear e eleger com transparência os vencedores. É que de certeza absoluta haverá muitos a merecer o destaque e o prémio. Até haverá os que poderão bisar, como Ronaldo – só que aquele é em Bolas de Ouro.
 
Álvaro Tomeu
 
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Portugal: JOSÉ LUÍS ARNAUT, UM FACILITADOR

 

Daniel Oliveira – Expresso, opinião
 
José Luís Arnaut foi ministro de Durão Barroso e de Santana Lopes. Anda nos corredores do poder há muitos anos e teve direito, claro está, a uma comenda. Nos tempos em que parecia que Arnaut se dedicava à política, era uma espécie de Relvas que sabia ler e escrever. Mais polido do que o aprendiz de Tomar, dedicou-se a uma das mais antigas profissões das democracias: fazer uma ponte entre o mundo dos negócios e o Estado, quase sempre com vantagem clara para o primeiro. Era e continua a ser, usando alguma liberdade de linguagem, um facilitador.
 
A Rui Pena & Arnaut, sociedade de advogados de que é um dos sócios, esteve ligada à privatizações da REN e da ANA e envolvida na fracassada privatização da TAP. Nunca sendo muito claro de que lado joga, como foi o caso da REN, onde o escritório tinha como cliente da Rede Elétrica Nacional e, em simultâneo, participava na elaboração das propostas de lei de base e diplomas regulamentares do novo enquadramento legislativo nos sectores da energia. Essa é, aliás, uma das funções destes escritórios: autênticos órgãos não eleitos de produção legislativa para o Estado, sem qualquer verdadeira fiscalização de conflitos de interesses. A RPA também participou nas negociações dos swaps com o Estado e representou os interesses da Goldman e da JP Morgan.
 
Resumindo: o escritório de José Luís Arnaut é, com mais um ou outro, uma placa giratória onde os interesses de alguns políticos mais ambiciosos e empresários que dependem de decisões do Estado se cruzam, num emaranhado de cumplicidades em que se perde o rasto de quem representa quem e mais não se pode fazer do que escrever, com cuidado, em textos como este, o que toda a gente sabe: que por ali se faz o que a democracia não deveria tolerar.
 
A ida de José Luís Arnaut para a Goldman Sachs não me choca rigorosamente nada. Não se pode dizer, desta vez, que alguém mudou de campo. É apenas a conclusão lógica de toda uma carreira. Fazer lá fora o que já se faz cá dentro é o que se lhe pedirá, como administrador não executivo daquele gigante bancário, com participação tão ativa na crise financeira que o mundo vive hoje. Servir de apoio para os principais clientes em todo o mundo, é o que fazem estes administradores. Traduzindo para a realidade: sacar das agendas de contactos e pô-las a render. E a agenda de Arnaut será pequena quando comparada com a de alguns senhores que lhe farão companhia.
 
É isso mesmo que lá fará Otmar Issing. O alemão foi, como membro da Administração do Bundesbank e do Banco Central Europeu, um dos principais arquitetos dum Euro mal parido e da catastrófica política monetária europeia. Ou Robert Zoellick, que, depois de trabalhar no Departamento do Tesouro dos EUA, foi para a Goldman Sachs, da Goldman Sachs para a presidência do Banco Mundial e do Banco Mundial regressou para a Goldman Sachs. No meio, trabalhou para a Enron e teve, como representante dos EUA, um papel central nas negociações para a entrada da China na Organização Mundial de Comércio. Ou Lord Griffiths, antigo conselheiro de Margaret Thatcher, grande amigo, na política, dos interesses da banca e autor da ideia de que devemos "tolerar a desigualdade [promovida pelos brutais bónus dados aos banqueiros] como uma forma de atingir a maior prosperidade para todos". Ou o antigo ministro das finanças sueco, o social-democrata Erik Asbrink, um dos autores dum código de ética empresarial.
 
Mas os caminhos paralelos dos organismos públicos, da burocracia europeia e internacional e da Goldman Sachs são tantos que um texto não chegaria. Basta lembrar Peter Sutherland, ex-procurador-geral irlandês, comissário europeu para a concorrência e com um papel central no vergonhoso resgate à banca irlandesa. Homem que foi diretor não executivo do Royal Bank of Scotland, até este colapsar e ser, claro, nacionalizado. Chegou a diretor não executivo da Goldman Sachs. Ou Mario Draghi, atual presidente do Banco Central Europeu. Antes de regressar ao Banco de Itália foi, entre 2002 e 2005, vice-presidente da Goldman Sachs. Ou o falecido António Borges, que foi responsável do FMI para a Europa e conselheiro do governo português para as privatizações (algumas das que Arnaut também participou). Foi vice-presidente da Goldman Sachs. Ou Mario Monti, primeiro-ministro italiano nunca eleito (e que, depois, nas urnas, não conseguiu mais do que 10%). Foi conselheiro sénior da Goldman Sachs. Ou Petros Christodoulou, que, à frente Banco Nacional da Grécia (privado), e com a ajuda da Goldman Sachs, participou num esquema para esconder o défice do Estado antes da crise rebentar. Começou a sua carreira na Goldman Sachs e a última vez que ouvi falar dele estava à frente da agência governamental da dívida pública grega.
 
Resumindo: em todos os momentos fundamentais da desregulação económica e financeira do mundo e da Europa e da transformação do projeto europeu no monstro que hoje conhecemos encontramos gente da Golman Sachs. Generais, como Otmar Issing, Zoellick, Griffiths, Draghi ou Monti. Ou soldados, como Arnaut. Porque um dos ramos fundamentais da atividade deste colosso é a compra da democracia, pondo os Estados a decidir contra os seus próprios interesses, roubando o sentido do nosso voto e entregando o poder que deveria ser do povo a quem tem dinheiro para o pagar. São um verdadeiro partido invisível, um poder acima das nações que regula as nossas vidas independentemente das nossas vontades. Privatiza o que é nosso, vende lixo aos Estados, armadilha leis, governa em favor de poucos e premeia quem lhe preste vassalagem.
 
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Portugal: CDS DE PORTAS, UM LIMÃO ESPREMIDO

 

Ana Sá Lopes – jornal i, opinião
 
O segmento dos pensionistas e idosos já votará novamente no “Paulinho das feiras”
 
O CDS esteve quase morto, no início dos anos 90, e foi Paulo Portas que o ressuscitou. Sob a liderança de Adriano Moreira, o partido ficou reduzido àquilo que ficou popularizado pelo “partido do táxi” – eram só quatro deputados eleitos, o próprio Adriano Moreira, Nogueira de Brito, um deputado em regime rotativo eleito por Aveiro e Narana Coissoró, líder parlamentar. Na realidade, só existia na frente política Narana Coissoró – estava habitualmente sozinho a enfrentar o governo cavaquista e a esquerda. Os restantes tinham funções diminutas no combate político. Com a demissão de Adriano Moreira na sequência da derrota clamorosa, Freitas do Amaral é reeleito presidente do partido. Mas aqui a famosa frase de Cesare Pavese – “Nada é mais inabitável do que o lugar onde se foi feliz” – revelou-se adequadamente trágica. Surgem, entretanto, Manuel Monteiro e “O Independente” de Paulo Portas, com uma agenda poderosa, populista, popular, eurocéptica e que se revelou decisiva para ressuscitar o partidofundador do regime democrático do estado de coma eleitoral em que o tinham deixado os fundadores.
 
Portas ajudou a criar Manuel Monteiro, embora Monteiro tivesse “vida própria” e não se reduzisse a um mero fantoche do director de “O Independente”. Mas não dispunha da sua argúcia e capacidade de sobrevivência quase imbatível entre os políticos portugueses no activo. Portas sobreviveu a vários escândalos, a vários desaires políticos – mas como sobreviverá à traição de todo o seu programa eleitoral sobre o qual fundou a sua liderança? O segmento dos pensionistas, idosos, pessoal das feiras, etc. já não pode voltar a pôr o voto no “Paulinho das feiras” transmutado no Portas das Laranjeiras. A explicação sobre o que aconteceu em Julho não existiu – talvez nem pudesse existir – mas a sua formulação em congresso, com o recurso à expressão “o que tem que ser tem muita força” não poderia ter sido mais infeliz. Se hoje existe governo, é porque Pedro Passos Coelho recusou a demissão de Paulo Portas, coisa em que, de facto, na altura ninguém acreditava. E este gesto de Passos Coelho teve mais apoio dentro do CDS do que a demissão “irrevogável” de Portas. O cargo de vice-primeiro-ministro e o de interlocutor com a troika cola Paulo Portas a Passos Coelho para o resto da legislatura, com evidentes prejuízos para o primeiro. É natural que o próprio Portas já admita que a sua sucessão está na rua. As feiras e a lavoura vão ter outros visitantes do CDS. E, ao que parece, são muitos os disponíveis.
 

"Durão está a criar clima para que portugueses aceitem sacrifícios" - Maria de Belém

 


A presidente do PS, Maria de Belém Roseira, comentou esta tarde na sede do partido, aos jornalistas, as recentes declarações do presidente da Comissão Europeia, considerando que Durão Barroso, ao defender um programa cautelar, pretende criar um clima psicológico para que as pessoas estejam disponíveis para aceitar mais sacrifícios”.
 
O presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, considerou hoje que, apesar de ainda ser “um bocado cedo” para decidir a melhor forma de Portugal sair do programa de ajustamento, o recurso a um programa cautelar será, à partida, “a melhor opção”.
 
Em reação a esta declaração, a presidente do PS, Maria de Belém Roseira, afirmou aos jornalistas, que esta tarde marcaram presença na sede do partido no Largo do Rato, em Lisboa, que “se ainda é cedo para falar”, então as palavras de Durão “tem um objetivo: criar o clima psicológico adaptado para que as pessoas estejam disponíveis para aceitar os sacrifícios que este Governo e os seus aliados, o presidente da Comissão inclusive, pretendem fazer” com “aquele permanente jogo de mensagens subliminares, como o caso da Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES)”.
 
Questionada no final de uma conferência de imprensa sobre o alargamento da CES, a dirigente socialista comentou também a afirmação do primeiro-ministro, lembrando que, e ao contrário do que Passos declarou ontem aos jornalistas, o chefe do Governo “referiu na Assembleia da República que não precisaria do PS para assinar um programa cautelar”.
 
O primeiro-ministro, salientou Maria de Belém Roseira, “diz uma coisa e o seu contrário sistematicamente. O que o PS diz é que não podemos negociar com pessoas que não sabemos o que estão a dizer, se é ou não verdade”.
 
Nesta conferência de imprensa sobre o alargamento da CES no Largo do Rato, em Lisboa, a presidente do PS, reiterou que o partido está contra a medida, assim como em relação ao aumento dos descontos para a ADSE, sublinhando que ambas estão a retirar dinheiro às famílias e acusando o Governo de estar a nacionalizar o direito às pensões.
 
Notícias ao Minuto
 
É "inconstitucional" alargamento da base de incidência da CES
 
A presidente do PS considerou hoje "inconstitucional" a medida do Governo que alarga a base de incidência da contribuição solidária de extraordinária (CES) e admitiu que os socialistas poderão solicitar a fiscalização sucessiva junto do Tribunal Constitucional.
 
A posição de Maria de Belém foi transmitida em conferência de imprensa na sede nacional do PS, depois de sustentar que o alargamento da CES proposto pelo executivo PSD/CDS é "inconstitucional, intolerável, injusto e revoltante".
 
"No quadro da legalidade democrática, o PS avançará com todas as medidas ao seu alcance para se opor", advertiu a presidente do PS, referindo que já anteriormente o Tribunal Constitucional tinha deixado um aviso ao Governo em matéria de aplicação da CES aos pensionistas.
 
"O Tribunal Constitucional disse que só aceitaria a CES [no Orçamento para 2013] se fosse por um período transitório e progressivo. Neste momento assiste-se a uma tentativa de transformar em definitivo algo que era provisório e transitório, agravando ainda mais as condições já de si muitos difíceis da maioria dos pensionistas", sustentou a ex-ministra dos governos de António Guterres.
 
Para Maria de Belém, perante o alargamento da CES a cidadãos com pensões mensais acima dos mil euros ilíquidos, "o PS avançará com todas as medidas que o quadro da democracia e da legalidade democrática permitirem contra o que considera algo absolutamente intolerável, inaceitável e diria mesmo revoltante".
 
"Entre as medidas poderá estar incluído um pedido de fiscalização sucessiva [junto do Tribunal Constitucional], especificou logo a seguir a presidente do PS.
 
Na conferência de impressa, Maria de Belém apontou razões sociais, económicas, fiscais, políticas e de cidadania para os socialistas se oporem às medidas do Governo que pretendem contornar o chumbo pelo Tribunal Constitucional da convergência das pensões da Caixa Geral de Aposentações (CGA) com as da Segurança Social.
 
Maria de Belém disse mesmo que os pensionistas poderão estar confrontados, agora, na sequência do alargamento da CES, com "um esbulho", com "uma monstruosidade" e com uma "nacionalização de um direito privado [o das pensões] por parte de um Governo de direita".
 
A presidente do PS defendeu que, no plano social, o alargamento da base de incidência da CES coloca em causa "um direito de propriedade - assim o define o Tribunal Constitucional alemão".
 
"O Governo não é o titular nem o dono desses descontos, sendo antes o seu mero gestor, um gestor fiduciário, sendo gestor porque merece a confiança de quem descontou. O Governo está portanto obrigado a respeitar essa confiança", advogou a ex-ministra socialista.
 
Por outro lado, o Governo, ao pretender introduzir um agravamento dos impostos sobre os pensionistas, Maria de Belém disse que, dessa forma, o Estado está "a isentar-se do cumprimento de regras que ele próprio impõe - e bem - ao setor segurador privado, porque os descontos sociais obrigatórios são um seguro social gerido pelo Estado".
 
"A conjugação da CES com o aumento dos descontos para a ADSE (para além da questão da autossustentabilidade deste subsistema de saúde) significa que os pensionistas são considerados pelo Governo como um peso para o Estado, e que os pensionistas do setor da administração pública ainda são mais pesados. Com uma medida dessa natureza, o Governo abala a confiança no sistema público de segurança social, o que é gravíssimo", frisou.
 
Maria de Belém insurgiu-se ainda contra estes cortes nas pensões "quando o Governo procedeu a um perdão fiscal", o que, na sua perspetiva, coloca "uma questão de cidadania".
 
"Essa mensagem é errada e grave, porque dá a entender que mais vale não se pagar aquilo que devemos porque seremos perdoados. Mas aqueles que pagam são castigados", acrescentou a presidente do PS.
 
Lusa, em Notícias ao Minuto
 

Portugal: O REGRESSO AO PASSADO

 

Tomás Vasques – jornal i, opinião
 
Na sua moção a Juventude Centrista declara "querer a Constituição sem o perfumedo 25 de Abril", revelando que, em matéria de cheiros, lhe agrada mais a de 1933
 
Muitas vezes, quando algum desalento cala fundo, nestes doces invernos, refugio-me em memórias literárias para recuperar esperanças que se esvaem e afastar o pesadelo de pensar que os meus netos (ou bisnetos) visitarão um dia a Igreja de Santa Engrácia, feita Panteão Nacional, para aí prestar homenagem à que teria sido a nossa melhor selecção de futebol de todos os tempos. Preferia que fossem, com tal propósito, ao cemitério dos Prazeres, como milhares de pessoas visitam o cemitério Père Lachaise, em Paris, para homenagear quem lá repousa: Balzac, August Comte, Paul Éluard, Oscar Wild, Proust, Maria Callas, Edit Piaf, Jim Morrison e Laurent Fignon, um admirado ciclista francês, entre muitos outros desportistas, filósofos, escritores, poetas, compositores e músicos. Mas rendo-me às evidências: cada país tem a dimensão que tem, porque os deputados eleitos, unanimemente, assim querem, e só por mérito dos republicanos de Afonso Costa, Portugal consagra a um poeta - Luís Vaz de Camões - o seu dia nacional.
 
Talvez por isso, me ocorra toda a trama de "O Processo", de Kafka, quando leio um relatório interno, da Procuradoria-Geral da República, propor escutas telefónicas a jornalistas, a proibição de publicação de notícias ou a realização de buscas a casa de jornalistas e às redacções dos jornais tendo em vista "reduzir" a violação do "segredo de justiça". Os autores do relatório não se importam de molhar o mensageiro ao sacudir a água do capote. São muitos os casos de juízes que decidem, no segredo do seu gabinete, uma detenção ou uma busca na casa de uma "figura pública" e quando lá chegam têm, pelo menos, um canal de televisão a acompanhá-los. Que me ocorra, o caso mais escandaloso foi o do juiz Rui Teixeira que assinou um mandado de detenção de um deputado tendo, ele próprio, subido num elevador do Palácio de São Bento com uma câmara de televisão ao seu lado. Não tendo havido castigo para o autor deste facto (e para tantos outros), também não há crime, presume-se, apesar de tudo o que Dostoiewsky escreveu, detalhadamente, em "Crime e Castigo".
 
E, quando, nesta ofensiva ideológica, meticulosa e ressabiadamente preparada, em que a direita se empenha, vejo que João César das Neves escreve o que o nosso primeiro-ministro pensa (e disse umas vezes), ou seja, que o actual surto de saída de portugueses, já superior àquele dos malfadados anos sessenta do século passado, "alivia a taxa de desemprego e promove a situação dos que partem e beneficia os países de destino com excelentes colaboradores", não sei se lembre John dos Passos, se Alberto, o estudante de Direito, desempregado, personagem de "A Selva", de Ferreira de Castro, que por orgulho e dignidade foi atirado para o seringal. Esta gente esconde que a mobilidade voluntária é um direito, enquanto a emigração forçada é uma exclusão: da família, dos amigos, da pátria.
 
Finalmente, ao ler a moção da "juventude popular" ao congresso do CDS- -PP só me ocorreu o título de uma obra de Mário Cesariny, com todo o respeito pelo autor: "Titânia - História hermética em três religiões e um só deus verdadeiro com vistas a mais luz como Goethe queria". O texto dos jovens centristas é surreal, mas vai ser aprovado neste congresso de um partido que nos governa. No seu conjunto, está eivado de "um só deus verdadeiro com vistas a mais luz", como se a queda do último governo correspondesse à queda do muro de Berlim: "A opção pelo socialismo matou aos poucos a nossa liberdade e conduziu-nos à miséria" ou "Queremos a nossa constituição sem o perfume do 25 de Abril", como se o CDS-PP não tivesse integrado 3 governos na última década. Mas, a cereja em cima do bolo desta moção é a proposta de que "o ensino obrigatório devia recuar para o 9.o ano de escolaridade", em vez do actual 12.o ano. E isto ligado à proposta do "cheque-ensino" dá todo um programa destes "jovens" liberais - assim se assumem - a fazer lembrar as páginas de "Dinossauro Excelentíssimo", de José Cardoso Pires. Como escreveu, em tempos, Maria Filomena Mónica, para o salazarismo, o analfabetismo era uma virtude, como ficou claro nos debates da Assembleia Nacional, em 1938.
 
Jurista, escreve à segunda-feira
 

Portugal - José Lello: "Enquanto nos arruinavam o futuro, iam arrumando o deles"

 

Notícias ao Minuto
 
As nomeações dos ex-ministros Vítor Gaspar e Álvaro Santos Pereira, e do também antigo governante José Luís Arnaut para cargos no Fundo Monetário Internacional (FMI), OCDE e Goldman Sachs, respetivamente, geraram críticas por parte da oposição. O jornal i conta hoje que, por exemplo, o socialista José Lello escreveu na sua página numa rede social que “enquanto nos arruinavam o futuro, iam arrumando o futurozinho deles”.
 
“Álvaro [Santos Pereira] para a OCDE, [José Luís] Arnaut para a G&S, Vítor [Gaspar] para o FMI” é caso para dizer, escreveu o ex-governante do PS, José Lello, na sua página, na rede social Facebook, que, “enquanto nos arruinavam o futuro, iam arrumando o futurozinho deles”, conta hoje o jornal i.
 
Em causa está o facto de, conforme avançou este fim-de-semana o semanário Expresso, Vítor Gaspar ser candidato ao departamento de política fiscal do Fundo Monetário Internacional (FMI), para o qual se candidatou no passado mês de dezembro, e do ex-ministro adjunto de Durão Barroso, José Luís Arnaut, para o conselho consultivo internacional da Goldman Sachs.
 
A juntar a estes dois antigos governantes está o caso de Álvaro Santos Pereira que, soube-se na passada semana, vai assumir a liderança do departamento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que faz a ponte com os ministérios das Finanças e Economia dos países membros.
 
Pela voz de António Galamba, secretário nacional do PS, escutou-se ainda que tudo isto, em particular o caso de Arnaut, prova “a confusão entre a política e os negócios”, referindo-se ao facto de o escritório do social-democrata ter estado envolvido num conjunto de privatizações, nomeadamente da “ANA, REN e CTT, onde o banco norte-americano detém [agora] a maior participação”.
 
Em declarações na SIC Notícias, José Luís Arnaut desvalorizou as acusações, esclarecendo que “quem vê isso como uma confusão [o envolvimento do seu escritório nas privatizações], é porque é muito pequeno, não tem dimensão e não percebeu a dimensão do mercado e o papel das pessoas no mundo internacional”.
 
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Rafael Marques notificado de que vai ser julgado por nove queixas-crime em Angola

 


O ativista angolano Rafael Marques foi hoje notificado que vai ser julgado em nove queixas-crime intentadas contra si por generais angolanos e uma empresa, disse o próprio à Lusa.
 
O julgamento, que não tem ainda data marcada, será no Tribunal Provincial de Luanda, acrescentou Rafael Marques.
 
Em causa está a publicação, em Portugal, do livro "Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola".
 
O ativista disse à Lusa que a notificação que recebeu hoje é a resposta ao pedido de arquivamento das queixas por calúnia e difamação, enviado em dezembro passado, por ter sido ultrapassado o prazo legal para ser constituído arguido.
 
"Os prazos prescreveram e ao invés de responderem à petição (de arquivamento), ignoraram-na e remeteram (os processos) para o tribunal, para julgamento", salientou.
 
Rafael Marques classificou esta decisão como "mais um exemplo da forma absurda de se fazer justiça em Angola".
 
No livro, o ativista acusou de "crimes contra a humanidade" os generais Hélder Vieira Dias, mais conhecido como "Kopelipa", ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente angolano; Carlos Vaal da Silva, inspetor-geral do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas (FAA); Armando Neto, ex-Chefe do Estado-Maior General das FAA; Adriano Makevela, chefe da Direção Principal de Preparação de Tropas e Ensino das FAA.
 
João de Matos, ex-Chefe do Estado-Maior General das FAA; Luís Faceira, ex-chefe do Estado-Maior do Exército das FAA e António Faceira, ex-chefe da Divisão de Comandos, são outros nomes apontados pelo ativista angolano.
 
Publicado em Portugal em setembro de 2011, o livro resultou de uma investigação iniciada em 2004 e documenta casos de homicídio e tortura contra os habitantes na região diamantífera das Lundas.
 
A empresa que figura entre os queixosos é a sociedade mineira ITM Minning Limited.
 
Rafael Marques disse ainda que o seu advogado, Luís Nascimento, não teve ainda acesso ao processo.
 
Ouvido pela primeira vez em abril de 2013, Rafael Marques queixa-se de até agora nem ele nem o seu advogado terem tido acesso ao processo, desconhecendo os termos e as razões por que os queixosos se sentem caluniados e difamados.
 
Relacionado com este processo, que ativista classifica como "político", 16 organizações de defesa dos direitos humanos, angolanas e estrangeiras, enviaram a 06 de junho de 2013 uma petição ao Procurador-Geral da República de Angola em que classificam como "politicamente motivados" os ataques e acusações feitos ao ativista.
 
No texto da petição, a que a Lusa teve acesso, os representantes de 16 organizações não-governamentais (ONG) manifestam-se "preocupados" com as recentes ações judiciais intentadas contra Rafael Marques, na sequência da publicação do seu livro.
 
No documento, os signatários instam o PGR angolano, general João Maria de Sousa, a garantir que Angola respeite os "compromissos internacionais assumidos sobre os direitos humanos e o combate à corrupção, arquivando as acusações e pondo termo ao processo" contra o também jornalista.
 
A fundamentação alegada pelos generais angolanos e a empresa mineira foi a mesma da queixa-crime apresentada em Portugal, contra Rafael Marques e a editora Tinta-da-China, que a Procuradoria Geral da República portuguesa arquivou em fevereiro de 2013.
 
Um mês depois, os generais angolanos intentaram uma acusação particular junto do Tribunal de Lisboa, exigindo uma indemnização de 300 mil euros ao autor e à editora.
 
Esta ação aguarda decisão do juiz.
 
Lusa, em RTP
 

Rafael Marques - ATIVISTA DIZ QUE ANGOLA NÃO VAI COMBATER A CORRUPÇÃO

 


Rafael Marques reage a declaração do PGR prometendo combate à corrupção este ano
 
Voz da América
 
O jornalista e activista anti corrupção Rafael Marques disse não acreditar que a procuradoria vá iniciar este ano um combate á corrupção, como anunciado.

O Procurador-Geral da Republica João Maria de Sousa disse que vai este ano dar especial atenção ao combate à corrupção.
Em declarações ao Jornal de Angola o procurador disse que estão a ser preparados novos instrumentos legais para o combate ao branqueamento de capitais.

Mas Marques disse que as declarações de João maria de Susa são “um pronunciamento meramente político”.

“O procurador não vai fazer nada disso,” disse.

“A procuradoria geral da república e os tribunais não vão dar combate nenhum á corrupção e ao branqueamento de capitais porque são actos praticados sobretudo por altas figuras de estado,” acrescentou

O activista recordou que no passado apresentou várias queixas detalhando alegada corrupção de dirigentes do estado angolano mas que a procuradoria “justifica sempre os actos ilícitos dos próprios dirigentes contrariamente ao que a lei diz”.
 

Riqueza de Angola aumenta exponencialmente mas não chega à população

 


Relatório diz que os angolanos registaram o maior aumento na sua riqueza individual, mas ficam em nono lugar quando analisados apenas os números sobre os rendimentos de 2013.
 
Coque Mukuta – Voz da América
 
Um relatório publicado recentemente pela New World Wealth (NWW), uma consultora sediada em Londres, afirma que a riqueza por pessoa em Angola subiu 527% entre 2000 e 2013, ou seja de 620 dólares para quase 3.900 dólares, o crescimento mais rápido em África.

No terreno, no entanto, esse crescimento vertiginoso não se traduz na melhoria da vida dos cidadãos.

O economista e professor universitário António Pedro Gomes, em entrevista à voz da América, começa por explicar que estas contas são feitas em função do produto interno bruto do país e não do rendimento per capita dos cidadãos.

Esses números, portanto, quando comparados com a realidade de cada angolano ou até da grande maioria dos cidadãos, revela a má distribuição dos recursos do país em virtude da disparidade gritante entre os angolanos.

Pedro Gomes diz ainda que os cidadãos angolanos não sabem onde está todo esse dinheiro produzido nem com quem, em virtude de os números anunciados pelo relatório não se traduzirem em melhores condições de vida dos cidadãos.

Enquanto organizações nacionais e internacionais continuam a relatar casos de corrupção em Angola, com grandes fugas de dinheiro para o exterior, questiona-se de que forma a produção de petróleo e de toda a económica angolana pode reverter para a melhoria do poder de compra e de qualidade de vida dos angolanos.

Nelson Pestana Bonavena, politólogo, entende que deve haver maior oportunidades para todos os cidadãos.

De realçar que no relatório os angolanos registaram o maior aumento na sua riqueza individual per capita, mas ficam em nono lugar quando analisados apenas os números sobre os rendimentos de 2013: enquanto os habitantes de Angola obtiveram, em média, 3.890 dólares no ano passado, os sul-africanos registaram quase o triplo, com 11.310 dólares, ao passo que nos países mais ricos, como a Suíça ou a Austrália, os valores rondam os 250 mil, de acordo com o relatório da consultora britânica New World Wealth.
 

Guiné-Bissau: Duas primeiras candidaturas a PR hoje formalmente entregues

 


Iaia Djaló e Domingos Quadé foram hoje os primeiros a entregar no Supremo Tribunal de Justiça da Guiné-Bissau as candidaturas ao cargo de presidente do país nas eleições gerais de 16 de março.
 
Iaia Djaló foi ministro dos Negócios Estrangeiros e é líder do Partido da Nova Democracia (PND) e Domingos Quadé é o bastonário da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau.
 
O primeiro a depositar a candidatura, Iaia Djaló, disse aos jornalistas que a lei do país prevê que a entrega dos documentos deve acontecer 60 dias antes das eleições.
 
"Nós do PND, estamos a cumprir com os prazos legais que mandam que as candidaturas sejam entregues até 60 dias antes das eleições", disse Djaló, que se manifestou confiante na vitória.
 
O líder do PND disse que vai ganhar pelo facto de os seus adversários diretos nas eleições passadas não serem candidatos.
 
"É a terceira vez que me candidato e uma vez que os meus anteriores adversários (Malam Bacai Sanhá e Henrique Rosa) já não se encontram entre nós, estou convencido que posso ganhar", disse, justificando ainda o seu otimismo com a desistência de Kumba Ialá de se candidatar ao cargo.
 
Nas eleições presidenciais de 2009, Iaia Djaló ficou em quarto lugar, depois de Malam Bacai Sanhá, Kumba Ialá e Henrique Rosa.
 
Bacai Sanha e Henrique Rosa já faleceram e Kumba Ialá anunciou que não se vai candidatar mais a cargos públicos.
 
O outro candidato que entregou hoje os documentos no Supremo Tribunal de Justiça foi Domingos Quadé, através do seu mandatário nacional, Cletch Na Isna.
 
Domingos Quadé é candidato independente e o seu mandatário adiantou que se ganhar as eleições vai promover a reafirmação da autoridade do Estado, a justiça e a reconciliação nacional.
 
O atual bastonário da Ordem dos Advogados da Guiné-Bissau deve apresentar publicamente o seu projeto político na vila de Cassaca, no sul do país, numa data ainda a marcar.
 
Fonte do Supremo Tribunal de Justiça disse à agência Lusa que não existe uma data limite para a entrega das candidaturas devido ao facto de haver alterações propostas pelos partidos para alteração do prazo do recenseamento.
 
Lusa, em Notícias ao Minuto
 

UE avalia possibilidade de enviar observadores para as eleições gerais na Guiné-Bissau

 


Uma missão exploratória da União Europeia (UE) está na Guiné-Bissau para avaliar a possibilidade de destacar observadores para as eleições gerais de 16 de março, anunciou hoje a delegação guineense da UE em comunicado.
 
A missão exploratória é composta "pelos serviços técnicos da UE e por peritos eleitorais independentes".
 
Os membros têm reuniões agendadas com autoridades de transição, autoridades eleitorais, partidos políticos, sociedade civil, meios de comunicação social e representantes de organizações internacionais.
 
"As conclusões e recomendações desta missão servirão de base para a decisão final a ser tomada em breve pela Alta Representante da União Europeia para a Politica Externa e de Segurança, Catherine Ashton", refere o comunicado.
 
A UE enviou missões de observação eleitoral as eleições de 2005, 2008 e 2009 e uma missão de peritos eleitorais as eleições presidenciais antecipadas de 2012, interrompidas por um golpe de Estado, acrescenta o documento.
 
As eleições gerais (legislativas e presidenciais) de 16 de março de 2014 já estiveram marcadas para 24 de novembro, mas a Guiné-Bissau não as conseguiu preparar a tempo e serão as primeiras após o golpe de Estado de abril de 2012.
 
Lusa, em RTP
 

Moçambique: OS CUSTOS DA TESE DE SUICÍDIO PARA A LAM

 

Lázaro Mabunda – O País (mz)
 
A companhia de bandeira pode afundar
 
A LAM terá de desembolsar cerca de 5 milhões de dólares pelas indemnizações às 33 vítimas do acidente aéreo, mas esse valor será superior caso prevaleça a tese de suicídio.
 
A queda do avião das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), a 29 de Novembro, em Namíbia, pode levar a companhia a pagar facturas elevadas de indemnizações, que irá desembolsar para as famílias das vítimas da queda do avião Embraer 190 – voo TM 470. É que, ao abrigo da Convenção de Montreal de 1999 – Moçambique é signatário – independentemente de ser culpada ou não, a LAM terá de desembolsar o equivalente a 140 mil dólares americanos de indemnização por cada um dos 33 passageiros por “responsabilidade objectiva.
 
Esta convenção estabelece o “regime de responsabilidade ilimitada” das culpas das companhias aéreas, abandonando, desta forma, o “regime de responsabilidade limitada” fixado pela convenção de Varsóvia em 1929. Na base desta convenção, a transportadora aérea “não poderá excluir ou limitar a sua responsabilidade pelos danos que não excedam 100.000 DSE (equivalente a 140 mil dólares)”, mas não será responsável pelos “danos que excedam 100.000 DSE (equivalente a 140 mil dólares) por passageiro”, se provar que a) “tais danos não foram causados por negligência ou outro acto doloso ou omissão sua ou dos seus trabalhadores ou agentes” e b) “tais danos foram causados exclusivamente por negligência ou outro acto doloso ou omissão de terceiro”.
 
Quer dizer, caso se confirme a tese de suicídio do piloto, o pacote de indemnizações por cada passageiro será superior a 140 mil dólares, na medida em que a LAM será responsável pelos danos causados pelo “acto do seu trabalhador”. A convenção estipula que nesta “responsabilidade subjectiva” baseia-se no princípio da “culpa presumida da transportadora”, o que faz com que não haja “limite de indemnização”, ou seja, a “indemnização é iliminada”, não havendo tecto máximo. Porém, caso a tese de suicídio não vinque e caso se chegue a conclusão de que a queda não resulta de negligência ou de erro de piloto ou do seu trabalhador, os prejuízos da LAM serão minimizados, na medida em que apenas irá indemnizar as vítimas, em colaboração com as seguradoras, em valores equivalentes a 4.620 mil dólares (quatro milhões e seiscentos e vinte mil dólares).
 
A convenção de Montreal faz a questão de esclarecer que a transportadora só é responsável pelo dano causado em caso de morte ou lesão corporal de um passageiro se o acidente que causou a morte ou a lesão “tiver ocorrido a bordo da aeronave ou durante uma operação de embarque ou desembarque.”
 
José Duarte André, jurista português especializado em direito aéreo e espacial, conclui, no seu trabalho intitulado “A responsabilidade civil das transportadoras áreas no transporte de passageiros, bagagens e mercadorias, publicado no livro “Textos do Direito Aéreo”, que as inovações da convenção de Montreal permitem indemnizações “mais elevadas e mais rápidas e, possivelmente, mais justas, o que é óptimo para os utilizadores do transporte aéreo”.
 
Moçambique ratificou por decreto
 
A Convenção de Montreal para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Internacional foi ratificada por Resolução 43/2008, de 13 de Novembro, do Conselho de Ministros. Ora, os juristas são de opinião que a ratificação “deveria ter sido feita pela Assembleia da República”, ao abrigo do disposto na alínea t) do artigo 179 da Constituição da República.
 
“O mais preocupante é que há indicações que apontam que Moçambique não tinha procedido até há pouco ao depósito do instrumento de ratificação junto da ICAO (Organização da Aviação Civil Internacional), como é requerido pelo nº 5 do artigo 53 da Convenção. Isto significa que Moçambique só pode ser considerado parte da Convenção (com os respectivos direitos e deveres) após depositar o referido instrumento”, lamenta um dos juristas moçambicano.
 
De qualquer forma, acrescenta, o país é parte da convenção de Varsóvia de 1929, pelo que, logo, os passageiros das aeronaves têm protecção com base nesse instrumento.
 
Três versões, uma tese
 
Quando a LAM confirmou a queda do seu avião a 29 de Novembro passado, na Namíbia, matando 33 pessoas, duas hipóteses foram imediatamente avançadas. A primeira era de que a queda teria sido provocada por mau tempo que se fazia sentir no local do acidente. A segunda foi de que o avião teria caído por problemas mecânicos. A primeira hipótese viria a ser desmentida, no dia seguinte, pelas autoridades aeronáuticas da Namíbia, que informaram que na altura da queda do avião não fazia mau tempo no Bwabwata, parque onde se despenhou.
 
De facto, o “Despacho Operacional”, a que “O País” teve acesso, emitido pela equipa da preparação de voo da LAM, duas horas antes da partida, não deu nenhuma indicação de mau tempo na rota que o avião iria seguir. Estavam criadas as condições para que o piloto iniciasse a viagem.
 
No segundo dia, 1 de Novembro, uma outra hipótese, a terceira, é lançada no ar: o piloto pode ter-se suicidado. As duas hipóteses (a 2ª e a 3ª) viriam a prevalecer até às vésperas do relatório preliminar. É que no dia 15 de Dezembro, seis dias antes da divulgação do relatório preliminar, o comandante João de Abreu veio afastar, em entrevista à agência Lusa, a hipótese de “problemas mecânicos”. Segundo ele, os elementos retirados das caixas negras e do local onde se deu o acidente, na Namíbia, demonstravam que o aparelho não tinha quaisquer falhas técnicas e assegurou que “As investigações continuam e deverão ficar concluídas ainda antes dos 30 dias de prazo recomendado pela Organização Internacional de Aviação Civil”.
 
As declarações de João Abreu, no dia 14, davam indicações de que ele ainda não tinha recebido o relatório do inquérito. Porém, no dia 21, sábado, o comandante João Abreu, depois de ter afastado a 2ª hipótese (problemas mecânicos), confirmou a terceira (suicídio do piloto), a única que prevalecia, como tendo sido a causa do acidente que vitimou 33 pessoas.
 
A reacção a este resultado preliminar não demorou. No dia seguinte, domingo, a LAM emitiu um comunicado no qual manifestava a sua “profunda preocupação e choque” quanto ao “conteúdo da declaração divulgada pelas Autoridades de Investigação em relação ao inquérito em curso alusivo à perda do voo TM470”. No mesmo comunicado, a LAM garantiu que irá solicitar o “relatório detalhado que evidencia e prova os factos conducentes às conclusões preliminares da referida declaração”.
 
De facto, o texto oficial do relatório preliminar enviado pelo Governo da Namíbia ao ministro dos Transportes e Comunicações, Gabriel Muthisse, deixa transparecer que o piloto, Hermínio Santos Fernandes, poderá ter-se suicidado, conduzindo, propositadamente, o avião à queda final ao “denotar clara intenção”.
 
O presidente do Instituto de Aviação Civil, o comandante João Abreu, está a ser alvo de críticas no seio da sua classe, por ter aparecido a divulgar os resultados preliminares do inquérito que indicam que o piloto Hermínio Santos Fernandes denotou clara intenção de provocar o acidente. Este voluntarismo do IACM também “irritou” as autoridades namibianas, o que fez com que viessem publicamente condenar o facto de Moçambique ter divulgado os resultados preliminares de um inquérito que eles ainda não concluíram.
 
 

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