segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Diálogo: Guebuza e Dhlakama poderão assinar nesta terça-feira cessar-fogo em Moçambique



Verdade (mz)

O Presidente da República, Armando Guebuza, e o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, poderão homologar os três documentos sobre os quais as delegações do Governo e da Renamo alcançaram consensos em sede do diálogo político e, por conseguinte, fazer uma declaração conjunta de cessão imediata das hostilidades em Moçambique, nesta terça-feira (12), na capital moçambicana.

José Pacheco, chefe da delegação do Executivo no diálogo, disse que “Armando Guebuza está disponível, amanhã, 12 de Agosto”, para com o líder da Renamo homologarem e declararem o cessar do conflito político-militar.

Entretanto, o discurso de Pacheco é destoante quando ele diz o seguinte: “O Governo está disponível para criar as condições logísticas, se for o caso, para que o presidente da Renamo possa estar presente neste acto e, também, aliviá-lo da situação de estar em permanente esconderijo e poder conviver em liberdade com os moçambicano e com a comunidade internacional em liberdade plena”. É que as palavras dele não reflectem que os seus pronunciamentos partam do entendimento com a Renamo sobre a referida vinda de Dhlakama a Maputo.

Aliás, Saimone Macuiane, chefe da delegação da Renamo não disse nada que confirme que o aludido encontro entre Guebuza e Dhlakama esteja marcado para a data avançada por José Pacheco. Mas assegurou que o líder da “Perdiz” pretende que “havendo entendimento com o Governo podemos declarar o cessar-fogo e ele (Dhlakama) irá se encontrar com o Presidente Guebuza”.

De referir que a proposta de amnistia dos elementos que estiveram envolvidos no conflito político-militar no país foi submetida ao Parlamento pela Presidência da República. Neste contexto, Verónica Macamo, pediu aos deputados para que viabilizassem em definitivo esta matéria na generalidade e especialidade ainda nesta terça-feira, com vista a garantir que os entendimentos alcançados em sede do diálogo político tenham andamento definitivo.

Relativamente à 70ª ronda do diálogo político que decorreu nesta segunda-feira (11), as duas delegações assinaram e trocaram pastas cujo conteúdo eram três documentos essenciais, nomeadamente um memorando de entendimento sobre o diálogo, mecanismos de garantia da amnistia e os termos de referência tendo em vista a vinda dos observadores internacionais que vão monitorar, observar e garantir a implementação da cessação das hostilidades no país.

Os documentos assinados dizem respeito a integração dos homens da Renamo nas Forças de Defesa e Segurança (FDS), sua reinserção em actividades económicas e sociais, cessação das hostilidades, entre outras matérias.

Segundo Macuiane, “apesar de ter havido demora termos partido com pontos discordantes, chegamos a um bom termo e queremos sublinhar que mais do que nunca é fundamental empenharmo-nos na implementação na íntegra deste entendimento. Torna-se fundamental, junto do Governo, com todos os moçambicanos, com o apoio não só dos mediadores nacionais, que possamos trabalhar para o bem do nosso povo”.

CIP contesta "tratamento especial" para multinacionais petrolíferas em Moçambique




A organização moçambicana Centro de Integridade Pública pede um debate público sobre os "detalhes" dos projetos de liquefação de gás natural no norte do país.

Numa análise publicada este mês, a organização não-governamental moçambicana, que luta por mais transparência no país, nota que o Governo já concluiu as negociações com o grupo norte-americano ANADARKO e a petrolífera italiana ENI para atribuir um regime especial aos projetos de liquefação do gás natural das áreas 1 e 4 da bacia do Rovuma (norte).

Entretanto, o Governo terá mesmo pedido autorização ao Parlamento para legislar por decreto sobre esta matéria. Isso aumentaria a rapidez do processo. Porém, o debate público passaria para segundo plano, algo que o CIP contesta.

"Não compreendemos por que se está a negociar algo em paralelo", diz Fátima Mimbire, a autora do artigo. "Tudo decorre num quadro não transparente, apesar de reconhecermos que o decreto-lei é um instrumento legal. Mas o decreto-lei é usado de forma abusiva pelo Governo."

Segundo a análise do CIP, "os detalhes do referido regime especial não são do domínio público e há sérias dúvidas de que possam ser debatidos, publicamente, antes da sua aprovação." O conteúdo do decreto e os termos oferecidos às empresas só seriam conhecidos depois da sua publicação.

Faltam respostas

Fátima Mimbire denuncia o secretismo dos detalhes do regime especial proposto. E pede respostas ao Governo, particularmente à ministra dos Recursos Minerais, Esperança Bias.

"O Governo nunca nos explicou oficialmente por que está a optar por um tratamento especial", comenta a especialista do CIP. "Mesmo em sede da Assembleia da República, a única coisa que a ministra disse foi 'este é um projeto especial e merece um tratamento especial'. Isso é suficiente?"

A ausência de respostas levanta suspeitas, refere Mimbire. "As empresas foram ter com o Governo e disseram 'nós queremos tratamento especial'. Qual é a contrapartida?"

Posição de inferioridade

O CIP reconhece que, para este tipo de negociações, Moçambique parte numa posição de inferioridade em relação às grandes multinacionais.

"Nós ainda não temos pessoas especializadas para discutir contratos com as empresas. E sabemos que elas contam com a assistência das melhores empresas de advocacia a nível internacional. E nós não temos sequer pessoas formadas em Direito Mineiro ou Direito dos Contratos, por exemplo", afirma Fátima Mimbire.

Mas isso não deve fazer com que o país baixe os braços. Antes de avançar para novas concessões, porventura desvantajosas para o Estado e os cidadãos moçambicanos, o Governo deveria preparar melhor o país para tirar melhor proveito dos seus recursos, refere a perita do CIP. "Por que não nos preparamos?"

Deutsche Welle - Autoria António Cascais - Edição Guilherme Correia da Silva / António Rocha

NOVAS MEDIDAS DE INTIMIDAÇÃO POLÍTICA EM ANGOLA




O padre Casimiro Congo, uma figura emblemática de Cabinda e opositor ao regime de Luanda, diz que forças de segurança cercaram a sua casa. UNITA está preocupada com crescimento de atos de intolerância política no Huambo.

Em Cabinda, o padre Casimiro Congo, afastado em 2011 do exercício clerical da Igreja Católica, queixa-se de estar a ser perseguido pelos serviços secretos e pelo comando provincial da Polícia Nacional.

À DW África, Casimiro Congo denunciou que, este domingo (10.08), por volta das quatro horas da manhã, a sua casa esteve cercada por cerca de 45 militares fortemente armados, sob a direção do comandante da polícia local, Cristo Liberal, e do responsável local dos serviços secretos. As forças de segurança terão intimidado as pessoas que entravam e saíam da sua residência.

Um grupo de oração tem-se reunido todas as manhãs em casa do padre Congo, depois das autoridades terem fechado no mês passado uma Igreja ligada a si, denominada "Igreja Católica das Américas".

"Aqui em Cabinda, o que não está sob a cobertura do Governo, habitualmente, não consegue subsistir. Há pessoas que, cá em Cabinda, constituem um problema para o Governo. Eu sou uma delas", afirma o padre Casimiro Congo. "Não sei por que razão o regime angolano não compreende que não é hostilizando as pessoas que se resolve o problema de Cabinda."

"Não sou delinquente"

Para proteger a sua integridade física e a da sua família, nas primeiras horas desta segunda-feira, o padre Congo deslocou-se à Procuradoria-Geral da República em Cabinda para dar conhecimento da ocorrência.

Casimiro Congo anunciou que vai intentar uma ação judicial contra os responsáveis da polícia e dos serviços de inteligência: "Eles não me podem tratar como um delinquente, porque eu não sou delinquente", diz.

Todos os esforços efetuados para ouvir o comando provincial de Cabinda da Polícia Nacional não foram bem sucedidos.

UNITA também denuncia intimidação política

Este caso surge depois de deputados da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) visitarem a província central do Huambo para averiguar o "crescimento dos atos de intimidação e intolerância política" naquela região.

Na ocasião, Raúl Danda, chefe da bancada parlamentar do maior partido da oposição, falou também da situação em Cabinda. Danda denunciou a existência de perseguição política e a violação dos direitos humanos na província, afirmando mesmo que há, neste momento, uma forte presença militar nas áreas do Lika, Luango e noutras zonas centrais do enclave, que já terá levado à detenção ilegal de vários cabindas.

"Porque terá havido algumas ações – não se sabe se foram da autoria da Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC) ou se foram simuladas. Mas estão a prender pessoas lá. Há pessoas que morrem em Cabinda. É preciso acabar com isto", afirmou Raúl Danda.

Deutsche Welle - Autoria Nelson Sul D'Angola (Benguela) - Edição Guilherme Correia da Silva / António Rocha

Angola: ECONOMIA ESTÁVEL TEM NOTA POSITIVA




A agência de rating Moody’s melhorou nota à economia de Angola, de Ba3 para Ba2, com perspectiva considerada estável, uma posição muito próxima do nível de Investimento no qual está posicionado o Brasil e a África do Sul.

A actualização do rating posiciona Angola ao mesmo nível que Portugal, Roménia, Jordânia, e acima do nível da Nigéria, Paraguai e Montenegro. 

Para o Foreing Country Ceiling of Bank Deposits, que reflecte a opinião da agência sobre o risco de capital e os controlos cambiais impostos pelas autoridades soberanas, que podem prevenir ou impedir o sector privado de converter a moeda local em divisas e a transferência da mesma para credores não residentes, a subida foi ainda mais significativa por o país ter passado de Ba3 para Ba1. Foram também registadas melhorias significativas nas notações relacionadas com o Local - Currency Ceilings, reflexo da opinião da agência sobre o conjunto de riscos a que um emissor em qualquer jurisdição está exposto, incluindo riscos económicos, legais e políticos, de Baa3.

A classificação do risco soberano é a nota dada por instituições ou agências especializadas em análise de crédito de risco aos países que pretendem emitir dívida no mercado internacional. As agências avaliam a capacidade e a disposição de um país honrar, pontual e integralmente os pagamentos da sua dívida, tendo em conta as perspectivas de um forte crescimento económicas a médio prazo, assentes no aumento da produção de petróleo, e no aumento e melhoria do crédito público, além da capacidade demonstrada pelo Executivo na aplicação de reformas estruturais.

O rating é um instrumento relevante para os investidores, uma vez que fornece uma opinião independente a respeito do risco de crédito da dívida do país analisado.

Recentemente, representantes da agência Moody’s visitaram o país e tiveram contactos com altos funcionários dos Ministérios das Finanças, Economia, Planeamento, Construção, Habitação, Indústria, Comércio, Petróleos, Banco Nacional de Angola, e altos responsáveis da Sonangol, Fundo Soberano de Angola, Instituto para o Sector Empresarial Público, da Agência Nacional de Investimento Privado e Petrolífera Total.

Jornal de Angola

TRAFICANTES DE PESSOAS USAM VASTO LEQUE DE RECRUTAMENTO




Luanda - Os traficantes de seres humanos utilizam as tecnologias de informação e comunicação, na selecção e recrutamento das suas vítimas, afirmou a oficial de programas da Organização Internacional de Migrações, Lerena Pinto.

“Na sua generalidade, usam um vasto leque de estratégias de recrutamento, como as redes de contactos pessoais, meios de comunicação, com maior predominância para os jornais, internet e rádio”, explicou a propósito do tema o “tráfico de seres humanos e suas consequências”.

De acordo com a especialista em questões de tráfico de pessoas, o consentimento das vitimas é obtido através da coerção, indução em erros e acções abusivas pelos traficantes.

Lerena Pinto apontou a pobreza extrema, falta de oportunidades, elevados indicies de desemprego, conflitos sociais e políticos como as causas do tráfico de pessoas, associadas as práticas sociais e culturais, marginalização/subordinação de mulheres e jovens raparigas.

O tráfico de pessoas, na óptica de Lerena Pinto, tem como consequências o abuso, coerção, situação ilegal no país de destino das vitimas.

Na sua generalidade, as vítimas são tratadas como criminais e correm perigo de morte, assim como são sujeitos a contraírem doenças graves.

Os mesmos enfrentam dificuldades de reintegração e estigmatização, após o retorno as comunidades de origem.

Na foto: LERENA PINTO - OFICIAL DE PROGRAMAS DA OIM / LINO GUIMARÃES

Angop

PRESIDENTE DO CHILE EM VISITA OFICIAL A ANGOLA




Presidente do Chile já está em Luanda

Luanda - A Presidente do Chile, Michelle Bachallet, chegou na noite desta segunda-feira a Luanda (por volta das 19:30), para uma visita de 24 horas a Angola, destinada ao reforço das relações de amizade e cooperação entre os dois países.

No Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, a estadista chilena, proveniente de Moçambique, foi recebida pelo ministro angolano das Relações Exteriores, Georges Chikoti.    

Em declarações à imprensa, o embaixador chileno em Angola, residente na África do Sul, Gabriel Zepeda, disse que a visita da presidente Michelle Bachallet trará benefício recíproco.

Mencionou a Energia, Agricultura, Petróleo e mineração como potenciais áreas que vão conformar a nova abordagem entre Angola e o Chile, e considerou existir um entendimento muito eficiente e rico entre os governos.

A agenda da visita de Michelle Bachallet a Angola inscreve um encontro com o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, uma sessão solene na Assembleia Nacional, em sua honra, e deslocações ao Memorial Dr. Agostinho Neto, ao Museu de História Militar e a Centralidade do Kilamba, todos sedeados na capital do país.

Na foto: CHEGADA DA PRESIDENTE DO CHILE - MICHELLE BACHELET A ANGOLA / ANTONIO ESCRIVAO

Angop – Título PG

DESBRAVANDO A LÓGICA COM SENTIDO DE VIDA! – II




Martinho Júnior, Luanda  (ler DESBRAVANDO A LÓGICA COM SENTIDO DE VIDA! – I)

5 – Logo que na sequência da independência de Angola foram estabelecidas conjunturas regionais favoráveis em relação ao Zaíre, o Presidente António Agostinho Neto procurou imediatamente caminhos de paz com Mobutu, pois era necessário diminuir a pressão sobre as fronteiras norte e leste, a fim de melhor se concentrarem as atenções no sul:

- Encontrou consensos com Mobutu (19 e 20 de Agosto de 1978), consensos que muitos julgavam impossíveis, que contribuíram para o estabelecimento de relações diplomáticas, uma muito maior estabilidade nas fronteiras norte e leste de Angola, bem como relacionamentos a condizer entre os dois povos;

- Suspendeu em 1978 a actividade de penetração militar do “Front de Libération Nationale du Congo” (os “Leais” para as autoridades coloniais portuguesas, “gendarmes katangais” antes fieis a Tschombé), que na altura tinha como líder Nathanael M’Bumba;

- Encontrou formas de integrar nas FAPLA os militares do ELNA através da plataforma do COMIRA (“Comité Militar de Resistência de Angola”), garantindo às famílias desses angolanos a realização plena dos direitos conferidos em Constituição, acto que culminaria em 11 de Outubro de 1984, a seguir à sua morte, já com José Eduardo dos Santos como Presidente.

Os 1.500 combatentes do ELNA, que formaram o COMIRA, assim como cerca de 20.000 populares afectos, após 10 meses de contactos na região de Cuilo-Cuango, com patriotismo foram recebidos em Angola, no seguimento das políticas de clemência encetadas pelo Presidente Agostinho Neto em 1978.

Com isso o líder do MPLA indicava e preparava o futuro post-“apartheid”, que ao obrigar à busca duma ampla plataforma de paz, dava oportunidade ao início da longa luta contra o subdesenvolvimento, num exemplo corajoso, inteligente e optimista, que desde logo criava condições para se levar a cabo o Programa Maior!

A morte veio antes de ele conseguir que o “apartheid” fosse banido na África Austral, mas o caminho em aberto teve seguimento garantido com a sabedoria do então jovem José Eduardo dos Santos, que interpretou digna e fielmente os seus ensinamentos e a sua inquebrantável ânsia de futuro, desde logo possibilitando a paz com o COMIRA.

6 – Os instrumentos do poder do jovem estado angolano, empenharam-se nos contactos com dirigentes da FNLA, entre eles Johny Pinock Eduardo e os militares do COMIRA, tendo à cabeça Afonso Tonta de Castro, o oficial que havia comandado o ELNA e seus aliados em Quifangondo.

Foi um processo que demorou 10 longos meses, mas o patriotismo de uns e de outros acabou por vencer: o que a Guerra Fria havia dividido, o amor à causa do movimento de libertação em África e a cultura que ele havia gerado, teve a sua primeira grande experiência no post independência e a sua primeira grande vitória, em prol duma Angola digna, soberana, justa e ávida de futuro!

7 – Mobutu na altura nada mais pôde fazer, por que a corrupção e as divisões minavam já o seu poder e só os suportes exteriores o mantinham no poder.

A prova disso dava as suas próprias forças armadas, testadas com as incursões do FNLC, com tão maus resultados…

Ao invés de aprender com a lição humilde dos angolanos, Mobutu mais tarde associar-se-ia a Savimbi, garantia-lhe a retaguarda que ele necessitava quando deixou de ter o directo suporte dos racistas sul-africanos, por força do acordo de Nova York, na mais nefasta das condições: o rico vale do Cuango, de onde haviam saído os militares do COMIRA, deveria ser a cobiçada presa comum, pois com os diamantes garantir-se-ia a riqueza deles próprios (Mobutu e Savimbi), do seu séquito, de chefes de estado africanos afins e poder-se-ia desencadear uma vez mais a guerra em Angola e na região!

Quer um quer outro, ao não aprenderem a lição, traíam mais uma vez o movimento de libertação em África, perderam a oportunidade de aprender com os ensinamentos de António Agostinho Neto e colocaram-se à mercê das ingerências e manipulações externas: embarcaram nas conjunturas da Guerra Fria, que impediam os povos de avançar na via do progresso e no resgate em busca do que antes sempre lhes havia sido negado!

(Continua)

Foto: Estátua de Agostinho Neto que integra o complexo do seu mausoléu, em Luanda.

Brasil: UMA POLÊMICA FORA DE HORA E DE PROPÓSITO



Afropress - editorial

A polêmica em torno da posição editorial da Folha contrária às cotas raciais, anunciada por uma modelo negra, surge tão fora de hora quanto de propósito. Fora de hora, porque essa é uma questão vencida desde que a Lei 12.711/2010, aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidente da República, instituiu as cotas sóciorraciais em todas as escolas federais de ensino médio e superior.

Passa de 160 o número de instituições que já adotam cotas para negros, política que tem se demonstrado eficaz (não a única) como modelo de inclusão dos que, historicamente, sempre ficaram de fora. Aliás, as instituições brasileiras, mesmo sob a República, não foram pensadas para incluir negros e pobres. Ao contrário, como todos sabemos.

Para que não houvesse dúvidas quanto a constitucionalidade desse tipo de política, o Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão histórica nos dias 25 e 26 de abril de 2012 bateu de vez o martelo e, pela unanimidade dos seus ministros (só José Dias Toffoli deixou de votar porque já havia se manifestado favoravelmente como Advogado Geral da União), declarou constitucional o Programa de Cotas adotado pela Universidade de Brasília (UnB), questionado pelo Partido Democratas (DEM) por intermédio de uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental - a ADPF 186.

A UnB que, aliás, esse ano, por iniciativa do Conselho de Pesquisa, Ensino e Extensão (CEPE) não apenas manteve a política de cotas, como a ampliou, garantindo aos negros, cotas de acesso, independente se oriundos de escolas públicas e ou particulares e do nível de renda per cápita.

Mais do que o resultado, os votos dos ministros – inclusive os de posição mais conservadora – foram definitivos: cotas e ações afirmativas são constitucionais porque todos os que tem origem negra (e ou indígena) no Brasil carregam uma desvantagem histórica por por conta dos quase quatrocentos anos de escravidão.

Fundamentalismo tosco

A polêmica é também fora de propósito, porque o fato de um grande jornal se posicionar contra as cotas, nada significa a não ser o direito que tem aquele veículo de ter posição a respeito de qualquer tema de interesse da sociedade brasileira. A Folha é contra as cotas raciais, como é a favor do casamento gay, entre outros temas polêmicos.

Daí a considerar que a Folha - como qualquer outro grande veículo de comunicação - não tenha o direito de expressar seus pontos de vista, ou ainda – e pior – declarar que ser contra as cotas é ser racista – é uma bobagem monumental que depõe contra quem assume esse tipo de posição.

Ou parte da ignorância pura e simples – o que já é grave; ou da tendência que tem uma certa militância de responder aos desafios da luta pela igualdade com a repetição de clichês ou palavras de ordem desprovidas de sentido e significado - o que é mais grave ainda, porque revela despreparo.

Dizer que alguém por ser contra as cotas é racista, é pura expressão da mesma intolerância de que historicamente somos vítimas. Mais: beira a fundamentalismo evangélico de algumas seitas neopentescostais para quem todo aquele que não comunga com suas crenças e ritos está condenado ao fogo do inferno. Lógica de torcida organizada: se não é do meu time é meu inimigo.

À propósito: a patologia social que divide as pessoas em hierarquias de acordo com sua cor, tipo de cabelo, cultura ou origem, a que se dá o nome de racismo, é coisa séria, crime inafiançável e imprescritível de acordo com a nossa Constituição. Não convém banalizar.

Aos porta-vozes da polêmica – fora de hora e de propósito – nunca é demais lembrar que o passo seguinte à banalização é a naturalização - do racismo e de outras aberrações e crimes em prejuízo da vítima. Nesse caso, de todos nós que lutamos por um Brasil sem racismo, sem a obscena exploração de classe, fraterno e solidário.

Qualquer veículo, em qualquer país que se pretenda democrático, tem o direito de ter posição sobre esse como qualquer outro tema, sem que isso implique o carimbo de “racista”. 

Nós, da Afropress, também temos posição e, neste caso, é direta, tanto quanto a da Folha,ainda que em sentido oposto ao assumido por aquele veículo: a luta contra o racismo é bem mais séria, bem mais necessária e bem mais urgente e não se faz com a ressurreição de polêmicas vencidas, nem com clichês vazios, nem muito menos com o viés autoritário e intelectualmente indigente dos que vêem racismo em tudo e gastam tempo e energia buscando racistas debaixo das próprias camas.


Brasil: POR QUE ME TORNEI A FAVOR DAS COTAS PARA NEGROS




Cotas para negros: por que mudei de opinião. Juiz federal, mestre em Direito e ferrenho opositor das cotas explica as razões que o fizeram mudar de ideia

Pragmatismo Político

William Douglas, juiz federal (RJ), mestre em Direito (UGF), especialista em Políticas Públicas e Governo (EPPG/UFRJ), professor e escritor, caucasiano e de olhos azuis

Roberto Lyra, Promotor de Justiça, um dos autores do Código Penal de 1940, ao lado de Alcântara Machado e Nelson Hungria, recomendava aos colegas de Ministério Público que “antes de se pedir a prisão de alguém deveria se passar um dia na cadeia”. Gênio, visionário e à frente de seu tempo, Lyra informava que apenas a experiência viva permite compreender bem uma situação.

Quem procurar meus artigos, verá que no início era contra as cotas para negros, defendendo – com boas razões, eu creio – que seria mais razoável e menos complicado reservá-las apenas para os oriundos de escolas públicas. Escrevo hoje para dizer que não penso mais assim. As cotas para negros também devem existir. E digo mais: a urgência de sua consolidação e aperfeiçoamento é extraordinária.

Embora juiz federal, não me valerei de argumentos jurídicos. A Constituição da República é pródiga em planos de igualdade, de correção de injustiças, de construção de uma sociedade mais justa. Quem quiser, nela encontrará todos os fundamentos que precisa. A Constituição de 1988 pode ser usada como se queira, mas me parece evidente que a sua intenção é, de fato, tornar esse país melhor e mais decente. Desde sempre as leis reservaram privilégios para os abastados, não sendo de se exasperarem as classes dominantes se, umas poucas vezes ao menos, sesmarias, capitanias hereditárias, cartórios e financiamentos se dirigirem aos mais necessitados.

Não me valerei de argumentos técnicos nem jurídicos dado que ambos os lados os têm em boa monta, e o valor pessoal e a competência dos contendores desse assunto comprovam que há gente de bem, capaz, bem intencionada, honesta e com bons fundamentos dos dois lados da cerca: os que querem as cotas para negros, e os que a rejeitam, todos com bons argumentos.

Por isso, em texto simples, quero deixar clara minha posição como homem, cristão, cidadão, juiz, professor, “guru dos concursos” e qualquer outro adjetivo a que me proponha: as cotas para negros devem ser mantidas e aperfeiçoadas. E meu melhor argumento para isso é o aquele que me convenceu a trocar de lado: “passar um dia na cadeia”. Professor de técnicas de estudo, há nove anos venho fazendo palestras gratuitas sobre como passar no vestibular para a EDUCAFRO, pré-vestibular para negros e carentes.

Mesmo sendo, por ideologia, contra um pré-vestibular “para negros”, aceitei convite para aulas como voluntário naquela ONG por entender que isso seria uma contribuição que poderia ajudar, ou seja, aulas, doação de livros, incentivo. Sempre foi complicado chegar lá e dizer minha antiga opinião contra cotas para negros, mas fazia minha parte com as aulas e livros. E nessa convivência fui descobrindo que se ser pobre é um problema, ser pobre e negro é um problema maior ainda.

Meu pai foi lavrador até seus 19 anos, minha mãe operária de “chão de fábrica”, fui pobre quando menino, remediado quando adolescente. Nada foi fácil, e não cheguei a juiz federal, a 350.000 livros vendidos e a fazer palestras para mais de 750.000 pessoas por um caminho curto, nem fácil. Sei o que é não ter dinheiro, nem portas, nem espaço. Mas tive heróis que me abriram a picada nesse matagal onde passei. E conheço outros heróis, negros, que chegaram longe, como Benedito Gonçalves, Ministro do STJ, Angelina Siqueira, juíza federal. Conheço vários heróis, negros, do Supremo à portaria de meu prédio.

Apenas não acho que temos que exigir heroísmo de cada menino pobre e negro desse país. Minha filha, loura e de olhos claros, estuda há três anos num colégio onde não há um aluno negro sequer, onde há brinquedos, professores bem remunerados, aulas de tudo; sua similar negra, filha de minha empregada, e com a mesma idade, entrou na escola esse ano, escola sem professores, sem carteiras, com banheiro quebrado. Minha filha tem psicóloga para ajudar a lidar com a separação dos pais, foi à Disney, tem aulas de Ballet. A outra, nada, tem um quintal de barro, viagens mais curtas. A filha da empregada, que ajudo quanto posso, visitou minha casa e saiu com o sonho de ter seu próprio quarto, coisa que lhe passou na cabeça quando viu o quarto de minha filha, lindo, decorado, com armário inundado de roupas de princesa. Toda menina é uma princesa, mas há poucas das princesas negras com vestidos compatíveis, e armários, e escolas compatíveis, nesse país imenso. A princesa negra disse para sua mãe que iria orar para Deus pedindo um quarto só para ela, e eu me incomodei por lembrar que Deus ainda insiste em que usemos nossas mãos humanas para fazer Sua Justiça. Sei que Deus espera que eu, seu filho, ajude nesse assunto. E se não cresse em Deus como creio, saberia que com ou sem um ser divino nessa história, esse assunto não está bem resolvido. O assunto demanda de todos nós uma posição consistente, uma que não se prenda apenas à teorias e comece a resolver logo os fatos do cotidiano: faltam quartos e escolas boas para as princesas negras, e também para os príncipes dessa cor de pele.

Não que tenha nada contra o bem estar da minha menina: os avós e os pais dela deram (e dão) muito duro para ela ter isso. Apenas não acho justo nem honesto que lá na frente, daqui a uma década de desigualdade, ambas sejam exigidas da mesma forma. Eu direi para minha filha que a sua similar mais pobre deve ter alguma contrapartida para entrar na faculdade. Não seria igualdade nem honesto tratar as duas da mesma forma só ao completarem quinze anos, mas sim uma desmesurada e cruel maldade, para não escolher palavras mais adequadas.

Não se diga que possamos deixar isso para ser resolvido só no ensino fundamental e médio. É quase como não fazer nada e dizer que tudo se resolverá um dia, aos poucos. Já estamos com duzentos anos de espera por dias mais igualitários. Os pobres sempre foram tratados à margem. O caso é urgente: vamos enfrentar o problema no ensino fundamental, médio, cotas, universidade, distribuição de renda, tributação mais justa e assim por diante. Não podemos adiar nada, nem aguardar nem um pouco.

Foi vendo meninos e meninas negros, e negros e pobres, tentando uma chance, sofrendo, brilhando nos olhos uma esperança incômoda diante de tantas agruras, que fui mudando minha opinião. Não foram argumentos jurídicos, embora eu os conheça, foi passar não um, mas vários “dias na cadeia”. Na cadeia deles, os pobres, lugar de onde vieram meus pais, de um lugar que experimentei um pouco só quando mais moço. De onde eles vêm, as cotas fazem todo sentido.

Se alguém discorda das cotas, me perdoe, mas não devem faze-lo olhando os livros e teses, ou seus temores. Livros, teses, doutrinas e leis servem a qualquer coisa, até ao nazismo. Temores apenas toldam a visão serena. Para quem é contra, com respeito, recomendo um dia “na cadeia”. Um dia de palestra para quatro mil pobres, brancos e negros, onde se vê a esperança tomar forma e precisar de ajuda. Convido todos que são contra as cotas a passar conosco, brancos e negros, uma tarde num cursinho pré-vestibular para quem não tem pão, passagem, escola, psicólogo, cursinho de inglês, ballet, nem coisa parecida, inclusive professores de todas as matérias no ensino médio.

Se você é contra as cotas para negros, eu o respeito. Aliás, também fui contra por muito tempo. Mas peço uma reflexão nessa semana: na escola, no bairro, no restaurante, nos lugares que freqüenta, repare quantos negros existem ao seu lado, em condições de igualdade (não vale porteiro, motorista, servente ou coisa parecida). Se há poucos negros ao seu redor, me perdoe, mas você precisa “passar um dia na cadeia” antes de firmar uma posição coerente não com as teorias (elas servem pra tudo), mas com a realidade desse país. Com nossa realidade urgente. Nada me convenceu, amigos, senão a realidade, senão os meninos e meninas querendo estudar ao invés de qualquer outra coisa, querendo vencer, querendo uma chance.

Ah, sim, “os negros vão atrapalhar a universidade, baixar seu nível”, conheço esse argumento e ele sempre me preocupou, confesso. Mas os cotistas já mostraram que sua média de notas é maior, e menor a média de faltas do que as de quem nunca precisou das cotas. Curiosamente, negros ricos e não cotistas faltam mais às aulas do que negros pobres que precisaram das cotas. A explicação é simples: apesar de tudo a menos por tanto tempo, e talvez por isso, eles se agarram com tanta fé e garra ao pouco que lhe dão, que suas notas são melhores do que a média de quem não teve tanta dificuldade para pavimentar seu chão. Somos todos humanos, e todos frágeis e toscos: apenas precisamos dar chance para todos.

Precisamos confirmar as cotas para negros e para os oriundos da escola pública. Temos que podemos considerar não apenas os deficientes físicos (o que todo mundo aceita), mas também os econômicos, e dar a eles uma oportunidade de igualdade, uma contrapartida para caminharem com seus co-irmãos de raça (humana) e seus concidadãos, de um país que se quer solidário, igualitário, plural e democrático. Não podemos ter tanta paciência para resolver a discriminação racial que existe na prática: vamos dar saltos ao invés de rastejar em direção a políticas afirmativas de uma nova realidade.

Se você não concorda, respeito, mas só se você passar um dia conosco “na cadeia”. Vendo e sentindo o que você verá e sentirá naquele meio, ou você sairá concordando conosco, ou ao menos sem tanta convicção contra o que estamos querendo: igualdade de oportunidades, ou ao menos uma chance. Não para minha filha, ou a sua, elas não precisarão ser heroínas e nós já conseguimos para elas uma estrada. Queremos um caminho para passar quem não está tendo chance alguma, ao menos chance honesta. Daqui a alguns poucos anos, se vierem as cotas, a realidade será outra. Uma melhor. E queremos você conosco nessa história.

Não creio que esse mundo seja seguro para minha filha, que tem tudo, se ele não for ao menos um pouco mais justo para com os filhos dos outros, que talvez não tenham tido minha sorte. Talvez seus filhos tenham tudo, mas tudo não basta se os filhos dos outros não tiverem alguma coisa. Seja como for, por ideal, egoísmo (de proteger o mundo onde vão morar nossos filhos), ou por passar alguns dias por ano “na cadeia” com meninos pobres, negros, amarelos, pardos, brancos, é que aposto meus olhos azuis dizendo que precisamos das cotas, agora.

E, claro, financiar os meninos pobres, negros, pardos, amarelos e brancos, para que estudem e pelo conhecimento mudem sua história, e a do nosso país comum pois, afinal de contas, moraremos todos naquilo que estamos construindo.

Então, como diria Roberto Lyra, em uma de suas falas, “O sol nascerá para todos. Todos dirão – nós – e não – eu. E amarão ao próximo por amor próprio. Cada um repetirá: possuo o que dei. Curvemo-nos ante a aurora da verdade dita pela beleza, da justiça expressa pelo amor.”

Justiça expressa pelo amor e pela experiência, não pelas teses. As cotas são justas, honestas, solidárias, necessárias. E, mais que tudo, urgentes. Ou fique a favor, ou pelo menos visite a cadeia.

Na foto: O escritor e Juiz Federal William Douglas (divulgação)


Brasil – RESPOSTA À FOLHA DE S. PAULO: COTAS, SIM!




A adoção de cotas raciais pelas universidades brasileiras responde a uma demanda histórica da população negra por políticas de equidade racial, ampliando a democratização do acesso ao ensino superior

Letícia Peçanha, Blogueiras Negrasem Pragmatismo Político

É de uma desonestidade intelectual tremenda querer discutir cientificamente sobre as cotas e a existência das raças, como se uma porcentagem de genes definisse quem é negro. Uma pessoa que tem mais da metade de genes de origem caucasiana-européia, mas, ainda sim, manifesta fenótipos negros, terá sobre si o peso do racismo. Ninguém precisa fazer um exame de DNA em mim pra saber que eu sou negra. Esse papo de herança genética, de não existência de raças, é, pra mim, enfurecedor. Tamanha falácia.

Acho engraçado também quando eu escuto a imensa preocupação com possíveis fraudes na autodeclaração. Para negar direitos ao povo negro, a autodeclaração é tornada um óbice… Mas ser declarado negro por essa sociedade, ser marginalizado, preso, exterminado, não é problema nenhum. As cotas nas penitenciárias andam a pleno vapor e ninguém se importa com a fraude que é esse sistema perverso e racista. Quanta hipocrisia.

Ah, mas e as cotas sociais e os brancos pobres? Nós estamos aqui falando de séculos de exclusão e marginalização da população NEGRA. Chega de falar de branco! Estamos falando de mais da metade da população desse país sendo excluída da universidade e ainda ousam questionar a injustiça que é alguns dos brancos não terem acesso à universidade? Nós somos maioria na população e minoria na universidade e ainda temos que ficar pedindo licença pra entrar? Chega! Já deu!

Estamos falando de uma meritocracia fajuta, que exclui mais sistematicamente pessoas negras da universidade. Não há que se falar em mérito quando as oportunidades são desiguais. Você, branco, com seu pré-vestibular maravilhoso, com curso de inglês, francês, intercâmbio, competindo com um cara que mal tinha uma carteira pra sentar, que dirá um professor.

Eu estou falando de reconhecimento. EU estou falando de andar nos corredores da faculdade de Direito da UERJ e olhar os quadros com as fotos dos formandos antes das cotas e ver, no máximo, um negro pingado nas fotos. EU estou falando de nunca ter tido uma professora negra. Estou falando de andar no fórum onde trabalho e só encontrar meus iguais com o uniforme de terceirizado, trabalhando na limpeza, no elevador ou de segurança. Aliás, por isso, sou a favor de cotas não só na universidade, como no serviço público.

Já perdi a conta das vezes que debati essa questão. E já vi que vou passar muitos anos da minha vida ainda tendo que debater. Paciência!

“Acima de tudo, não iremos nos calar diante de qualquer ataque aos nossos direitos.”
Folha, eu discordo de você e não te sigo! Cotas sim!

Assista aqui ao vídeo da Folha contra as cotas.


Brasil: JBS É CONDENADA POR SERVIR CARNE COM LARVAS PARA EMPREGADOS…




… E DESRESPEITAR AS JORNADAS DE TRABALHO


A JBS, considerada a maior empresa de processamento de carne do mundo, foi condenada em segunda instância pelo Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região, no Mato Grosso, em dois processos diferentes abertos pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), com base em infrações sistemáticas de leis trabalhistas. As sentenças determinam o pagamento de dois milhões e 300 mil reais em danos morais coletivos por violações que vão desde o desrespeito a jornadas de trabalho, superiores a 20 horas, e práticas que configuram assédio, até situações que podem afetar a saúde dos trabalhadores.

Entre os problemas apontados nos processos estão o fato de a empresa servir alimentos contaminados aos empregados, incluindo carne com larvas de moscas varejeiras, e o vazamento de gás amônia na unidade industrial de Juruena, no Mato Grosso.

Para o procurador Sandro Sardá, responsável pelo Projeto de Atuação em Frigoríficos do Ministério, as condenações refletem o descaso da empresa em relação aos trabalhadores. De acordo com o procurador, a JBS adota uma conduta deliberada em não proteger a saúde dos seus empregados, o que é incompatível com a Constituição. A empresa somente adequa as condições de trabalho mediante condenações judiciais.

Com acionistas como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Caixa Econômica Federal, a JBS teve receita bruta de 78 bilhões de reais em 2012. A empresa é uma das mais influentes do país e investe pesado em campanhas eleitorais.

pulsar/repórter brasil - foto: Leandro Marcidelli

Portugal: TRAGÉDIA DE ENTRE-OS-BES



Fernanda Câncio – Diário de Notícias, opinião

Maria Luís Albuquerque, a 27 de junho, no Parlamento: "Posso dar a garantia de que não vamos ter dinheiro dos contribuintes no BES. Estamos a acompanhar a situação há já largos meses. O Governo tudo tem feito." M.L.A., a 7 de agosto, no Parlamento: "Os contribuintes receberão de volta o seu montante." M.L.A., a 27 de junho, idem: "Quem toma as decisões é o Governo e ninguém mais." M.L.A., a 7 de agosto, ibidem: "A decisão é tomada pelo regulador. Aconselho os senhores deputados a lerem a legislação."

Contradições insanáveis categoricamente proferidas, como é apanágio da responsável (?) das Finanças. E como as explica, enfadada? "Houve uma quantidade de factos novos que vieram a público nos últimos dias." Portanto, andou a garantir que o banco era sólido até meio de julho sem fazer a mínima, mas qual é o problema? Ninguém espere que senhora tão séria admita ter andado a enganar os portugueses e, o que para ela será muito mais grave, os mercados.

Admitir o quê se ontem também foi ao Parlamento o governador do Banco de Portugal assegurar que toda a responsabilidade é sua? "Se houver alguma coisa a criticar, é ao BdP, se houver alguma coisa a elogiar, é ao BdP. O proprietário da solução é o BdP." Solução que, informou os deputados, Carlos Costa só decidiu na sexta - apesar de, no domingo à noite, ter informado o País de que a fraude no BES, constando da descapitalização do banco a favor de empresas do grupo, fora detetada em setembro de 2013. Para além desta revelação espantosa (o regulador sabia de uma fraude e durante um ano permitiu que continuasse, deixando os que a cometeram - é ele que disso os acusa agora apesar de até há pouco lhes ter certificado a idoneidade - em funções até falirem o banco), estamos ante um milagre: é que o Governo aprovou na quinta de manhã, portanto quatro dias antes do anúncio de Costa e um dia e meio antes daquele em que este situa a decisão, o diploma (de imediato aprovado pelo PR) que permitia a tal solução.

Lindo, não? O problema é que isto não configura mera "inverdade". Como apontou na quarta à noite na SicNot o socialista Pedro Silva Pereira, a data da aprovação da lei significa que muita gente sabia, nesse dia e até antes (na preparação do diploma), o destino do BES. Evidência disso é o facto de Marques Mendes o ter revelado o sábado na SIC. Quantas mais pessoas tiveram acesso a uma informação que tanto dinheiro valia? Quantas a traficaram? Não se sabe e talvez nunca se saiba. O que sabemos é que Governo e BdP permitiram que as ações do BES se mantivessem em mercado, perdendo, entre quinta e sexta, 62% do seu valor.

Não foi uma ponte que caiu, mas um banco. E até ver não morreu ninguém. Mas a cadeia da responsabilidade é, ao contrário da de Entre-os-Rios, cristalina. Demissões é que nada.

Na foto: Maria Luís Albuquerque, a pútrida ministra que se juntou ao coro do pútrido Bando de Mentirosos maestrados por Passos e protegidos por Cavaco. PG

Portugal - BES: Advogados publicaram ata do Banco de Portugal para informar clientes




O advogado Miguel Reis, em declarações à TSF, diz que é prática do escritório divulgar toda a informação que considera essencial, exercendo um direito que está garantido na Constituição.

«Entendemos publicar este documento pela simples razão de que, tanto quanto sei, não era conhecido e é de uma grande importância para a comunidade jurídica, para os clientes do Banco Espírito Santo (BES), para muitos dos nossos clientes e para os portugueses em geral. Essencialmente, exercemos o direito de informar, que está garantido na Constituição da República», explicou à TSF Miguel Reis, da sociedade de advogados Miguel Reis & Associados.

De acordo com ata divulgada ontem à noite, o Banco Central Europeu (BCE) obrigou o BES a «reembolsar integralmente» o crédito contraído junto do banco central no mesmo dia em que suspendeu o acesso às suas linhas de financiamento.

A informação consta da ata da reunião extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal, realizada pelas 20:00 no passado domingo, 3 de agosto, no exato dia em que foi anunciado o fim do BES, tal como era conhecido.

O advogado Miguel Reis disse ainda à TSF que está a desaconselhar os clientes, acionistas e obrigacionistas do antigo BES a avançarem com processos a título pessoal para recuperarem o dinheiro, devido aos custos elevados.

O BCE não comenta as notícias sobre a alegada responsabilidade da instituição liderada por Mario Draghi na falência do BES. Em resposta a um contacto feito esta manhã pela TSF, o BCE fez saber que não pretende comentar a informação de que terá exigido ao BES, no dia 1 de agosto, o pagamento de 10 mil milhões de euros em apenas três dias.


Portugal: CRÓNICA DE AGOSTO


O quarteto da "choldra torpe", mas há mais...
Tomás Vasques – jornal i, opinião

Nestas férias não precisam de ler Marx. Regressem a Eça de Queirós. Descobrem lá quase tudo: este país é uma "choldra torpe"

Agosto, o último mês do ano no meu calendário, evoca o murmurejar das ondas a desfazerem-se em espuma no extenso areal da ilha de Tavira, a mais bela praia de todas as infâncias e adolescências, por onde passei e que me remete para tempos esquecidos, coisas insignificantes, intimidades. Rememorei agora esse tempo distante que aos poucos se desfizera no interior da memória, tal como os barcos se desfaziam no fio do horizonte quando, ainda criança, me sentava na areia a observar o movimento das ondas e a inquietar-me com o seu murmurejar.

Aconselhado pelo escritor José Marmelo e Silva, meu professor, autor de "O Adolescente Agrilhoado", livro que me emprestou para ler, aos 11, 12 anos, li tudo o que havia para ler de Eça de Queirós, em livros requisitados na biblioteca da Gulbenkian, situada na Rua da Galeria, em Tavira. Aí comecei a aprender, com João da Ega, que o país que me calhara em destino era uma "choldra torpe", observação que ainda hoje não destoa, passado mais de um século sobre o que escreveu o autor de "Os Maias" e meio século sobre essas minhas primeiras leituras.

Só mesmo numa choldra torpe o senhor Presidente da República, o senhor primeiro-ministro, a senhora ministra das Finanças e o senhor governador do Banco de Portugal - ou seja, todo o poder que nos pastoreia - podiam jurar, como juraram, a pés juntos, com a mão no peito e ar solene, durante quase um mês, por estas ou outras palavras, que "os portugueses podem confiar no BES, dado que as folgas de capital são mais que suficientes para cobrir a exposição que o banco tem na parte não financeira, mesmo na situação mais adversa" E, depois, quando se percebeu que afinal o que disseram era falso, um engodo para enganar papalvos, a fina flor de um poder à deriva, sem credibilidade nem mérito, partiu para o mar, ali para a Manta Rota ou para a praia da Coelha, ouvir o murmurejar das ondas a desfazerem-se em espuma no areal, como se nada disto lhes dissesse respeito. Sem uma palavra. Sem uma justificação nem um acto de contrição.

Só mesmo numa choldra torpe um governo aprova à socapa, na quinta- -feira 31 de Julho, um diploma que testemunha que a expropriação do BES já estava decidida, pelo menos nesse dia mas certamente antes, omitindo-o no comunicado do Conselho de Ministros, como se o governo estivesse na clandestinidade e este assunto fosse dos "deuses" e não dos portugueses.

Só mesmo numa choldra torpe a decisão do governo, com a conivência do senhor Presidente da República, é conhecida antecipadamente apenas por "gente de bem", próxima do governo, o que provavelmente permitiu atempadamente a venda de acções do BES pela Goldman Sachs e outros "amigos", o que levou à monumental queda em bolsa a 31 de Julho e 1 de Agosto, ou à retirada do dinheiro das contas da PT por esses dias.

Só mesmo numa choldra torpe se permite a promiscuidade de comentadores habitual de canais de televisão, ex-presidentes do principal partido do governo, um deles conhecido como a "bruxa de Carnaxide", que anunciam a solução para o "caso BES" antes de o governador do Banco de Portugal a ter apresentado, supostamente em "primeira mão".

Só mesmo numa choldra torpe um governo, por razões ideológicas, trata com eufemismo a inevitável nacionalização de um banco, para evitar males maiores, através de uma "engenharia" pirotécnica, em que os contribuintes entram com 90% do capital e a propriedade é entregue às "instituições financeiras a operar em Portugal", sendo todos os riscos, como bem sabem, de quem paga impostos.

Volto ao começo: nestas férias não precisam de ler Marx. Regressem a Eça de Queirós. Descobrem lá quase tudo. E descubram também o escritor José Marmelo e Silva.

Jurista - Escreve à segunda-feira

Portugal: BPN custou 2203 milhões aos cofres do Estado até ao final do ano passado



LUÍS VILLALOBOS - Público

Relatório do Tribunal de Contas revela o impacto da nacionalização do BPN nas contas públicas até Dezembro de 2013, mas valores finais serão sempre superiores

O impacto negativo da nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN) nas contas públicas estava contabilizado em 2202,5 milhões de euros no final de Dezembro do ano passado. Os cálculos são do Tribunal de Contas, presidido por Guilherme d’Oliveira Martins, e constam do relatório de acompanhamento da execução orçamental da administração central, referente a 2013.

De acordo com este documento, agora divulgado, o despesa do Estado com o BPN, no ano passado, ascendeu a 472,9 milhões de euros, valor a que acrescem 1729,6 milhões de euros de perdas entre 2011 e 2012 (-746,9 milhões e -982,7 milhões, respectivamente). Ao todo, a despesa contabilizada com o BPN, nacionalizado há quase seis anos, ascende a 2543 milhões de euros, mas a este valor há que subtrair algumas receitas obtidas, como a venda de activos, que chegaram aos 340,4 milhões de euros (199,4 milhões em 2012 e outros 141 milhões no ano passado).

A análise do Tribunal de Contas dá conta do que, em termos de contabilidade pública, custou a nacionalização do BPN aos contribuintes até ao final de 2013, mas o número final será inevitavelmente maior. No entanto, só haverá valores definitivos quando já não houver nada para vender ou recuperar, e sejam assumidas todas as perdas, tal como ficou expresso no relatório da comissão parlamentar de 2012, formada para analisar a nacionalização da instituição financeira gerida por Oliveira Costa.

No documento da comissão parlamentar, presidida pelo PSD, estimava-se que o BPN representava até ao final de 2012 um encargo líquido de 3405,2 milhões para os contribuintes portugueses, um valor que inclui responsabilidades que ainda não foram abatidas em termos de contabilidade pública. O relatório dizia que, "no limite", as perdas poderiam "atingir 6509 milhões de euros, mais juros e contingências”. Isto seria, no entanto, se não houvesse qualquer encaixe de receita, o que não acontece, podendo assim o cálculo final rondar os cinco mil milhões.

Para já, o relatório do Tribunal de Contas recorda que, em 2013, “a Parups e a Parvalorem [duas sociedades veículo detidas pelo Tesouro para onde foram activos “tóxicos” e outros potencialmente recuperáveis] haviam orçamentado, em passivos financeiros, para reembolso à CGD, 3685,3 milhões, tendo a execução sido de 397,1 milhões de euros”.  “Da mesma forma”, acrescenta o relatório, “para as duas sociedades foi orçamentado 3739,8 milhões de empréstimos do Estado e concedidos 510,5 milhões”.

Por outro lado, a instituição destaca ainda que a Parparticipadas, outra sociedade veículo criada para lidar com o BPN, “apresentava no final de 2012 capitais próprios negativos de 203,6 milhões, podendo vir a constituir, também, encargos significativos para o Estado”. Isto porque, diz o Tribunal de Contas, poderá ser necessária a sua recapitalização, ou poderá haver perdas indirectas, se, por exemplo, “a empresa não venha a pagar o empréstimo que contraiu junto da CGD, cujo montante em dívida ascendia a 90 milhões de euros no final de 2012”. No final do ano passado, a Parparticipadas tinha diminuído o capital próprio negativo para 176 milhões.

A herança do BPN (comprado pelo BIC) ainda tem vários dossiers por resolver, como a recuperação de créditos e outros encaixes de receita, onde se incluí a polémica venda dos quadros de Miró e a alienação de participações sociais.

A 4 de Julho, as Finanças anunciaram a venda da BPN Crédito à Firmus Investimentos, por 36 milhões de euros. Este activo estava na esfera da Parparticipadas que, no dia anterior, tinha recebido uma injecção de 37,5 milhões de euros por parte do Tesouro.

O caso do BPN voltou à ribalta na sequência da intervenção no BES, com o Governo a garantir que, na actual operação, a história não se irá repetir. Logo após o anúncio da estratégia para o colapso do BES, dividido em “banco bom” (o Novo Banco) e “banco mau”, no actual quadro da união bancária europeia, o Ministério das Finanças enviou logo um comunicado onde sublinhava que “os contribuintes não terão de suportar os custos relacionados com a decisão”.  

No imediato, vão ser emprestados 3900 milhões de euros ao Fundo de Resolução, para ajuda a capitalizar a nova instituição, cabendo aos bancos outros 1000 milhões. Depois, o Estado irá receber no momento da venda do banco. Se o dinheiro não chegar para pagar o valor do empréstimo, o remanescente deverá ser pago em prestações.

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