segunda-feira, 12 de março de 2018

Relações de intimidação: Austrália, Timor-Leste e recursos naturais


Binoy Kampmark [*]

"A Comissão optou ao invés pela saída mais fácil, a qual é uma vergonha pois na minha percepção revela a sua própria falta de imparcialidade!" - Xanana Gusmão, negociador chefe de Timor-Leste, 28/Fev/2018

Na lógica das coisas, a Austrália foi delegada como capataz regional das potências imperiais desde o momento em que se tornou um posto avançado do império britânico. Os estados vizinhos têm sido ridicularizados e zombados como se fossem constituídos por sub-humanos e incapazes. A expressão "estado falhado" ainda é utilizada em círculos de poder de Camberra em relação a casos desesperados. Não é de admirar que a China pressinta uma reputação tortuosa.

É nesse estado de espírito que teve lugar a assinatura de um acordo entre a Austrália e Timor-Leste para demarcar fronteiras marítimas. Oficialmente, havia sorrisos, mesmo tapinhas na costa. O comunicado de imprensa de 7 de Março da ministra dos Negócios Estrangeiros, Julie Bishop, transmite este momento de falsa elevação:

"O tratado é um acordo histórico que abre um novo capítulo no nosso relacionamento bilateral. Ele estabelece fronteiras marítimas permanentes entre nossos países e proporciona desenvolvimento e gestão conjunta dos campos de gás Great Sunrise".

A narrativa por trás desta fricção premente era mais problemática. Ambos os países haviam, afinal de contas, atingido este ponto depois de alegações de espionagem terem ameaçado afundar as conversações. Aquelas alegações referiam-se a esforços por parte do Australian Secret Intelligence Service de espionar delegados timorenses durante as negociações de 2006 do CMATS (Certain Maritime Arrangements in the Timor Sea). No que se refere à divisão das receitas – nesse caso, o campo de gás Greater Sunrise no Mar de Timor – os espectros continuarão.

Os pontos centrais do contencioso histórico entre os estados são os tradicionais: recursos naturais e como melhor aproveitá-los. Nenhum dos dois podia concordar sobre quem teria acesso às reservas de petróleo e gás no Mar de Timor. O imbroglio político teve sua origem no Tratado Timor Gap assinado em 1989 entre a Austrália e a Indonésia quando a cleptocracia do presidente Suharto, para não mencionar a brutal repressão de Timor Leste, foram considerados assuntos aceitáveis de realpolitik.

A subsequente libertação de Timor-Leste deixou o estado nascente numa situação perigosa, próxima da morte. A Indonésia e a Austrália continuavam a partilhar os recursos do Timor Gap numa alegre festa glutona até a assinatura do Tratado do Mar de Timor. O documento tinha uma deriva gritante: a falta de uma fronteira marítima determinada e permanente. O CMATS, o qual Timor-Leste rasgou devidamente, permitir uma divisão igual das receitas, mas adiava da mesma forma a discussão de uma fronteira marítima.

Foi central para a estratégia de Timor-Leste uma determinação de fazer isto de acordo com o direito internacional. Timor-Leste argumentou em favor de uma fronteira marítima que ficasse a meio caminho entre o seu país e a Austrália, que seguisse sua plataforma continental. O Tribunal Permanente de Arbitragem e os Comissários da Conciliação estiveram devidamente empenhados em aplicar a Convenção da ONU sobre a Lei do Mar. A Austrália subsequentemente celebrou o resultado como "a primeira conciliação de sempre sob o UNCLOS".

Apesar de estudantes de direito internacional louvarem o resultado, a dimensão política demonstrou-se mais feia. O negociador chefe de Timor-Leste e Xanana Gusmão, a versátil figura da resistência, fustigou a Austrália e os Comissários numa carta à Comissão de Conciliação.

A Comissão, argumentou ele, era ignorante em assuntos timorenses. O "perito técnico escolhido não tinha a experiência apropriada ou o entendimento do trabalho em Timor-Leste ou no contexto de um país em desenvolvimento semelhante". Suas avaliações sobre "benefícios potenciais para a população de Timor-Leste" foram "chocantemente superficiais", um ponto que só beneficiou a Austrália.

Gusmão também tinha outra queixa: os negociadores australianos aparentemente haviam sido escolhidos pelos peso-pesados da indústria extractiva, a Woodside Petroleum e a Conoco Philips. "A sociedade civil poderia potencialmente perceber isto como uma 'forma' de conivência entre o Governo da Austrália e a Darwin LNG Partners e/ou a Sunrise J".

Que os responsáveis de Timor-Leste devessem arvorar suspeitas obstinadas é não só entendível como sagaz. Negociar com repressivos e sanguinários militares indonésios foi bastante penoso. Mas chegou então ao conhecimento internacional o regime brutal que operava no Timor-Leste, o conhecimento que vinha de certa forma associado à cumplicidade activa. Conversações fraternais tendem a ser falsificadas no mercado da geopolítica.

O relatório de 2500 páginas da Comissão para a acolhida, verdade e reconciliação em Timor-Leste , entregue pelo então presidente Gusmão ao parlamento nacional em Novembro de 2005 mencionava centenas de documentos reveladores anteriormente classificados pelos EUA e Grã-Bretanha. Eles mostravam a aprovação tácita tanto dos EUA como da Grã-Bretanha à invasão de Timor-Leste em 1975 e ao status quo até 1999, período durante qual morreram cerca de 100 mil timorenses.

Houve mesmo exemplos de responsáveis indonésios a mostrarem interesse, como declara um memorando do Conselho de Segurança Nacional ao secretário de Estado Henry Kissinger, "em saber a atitude americana em relação ao Timor português (e, por implicação, nossa reacção a uma possível tomada de controle indonésio)". Eles não foram desapontados.

Ainda em 2014, o governo australiano fez consideráveis esforços para impedir a divulgação de ficheiros referentes ao conhecimento de Canberra de deslocações de tropa indonésia durante a ocupação. De sensibilidade particular foram as operações conduzidas no fim de 1981 e princípio de 1982, as quais acabaram num massacre previsível. Numa decisão do Tribunal Administrativo de Recursos a concordar com o governo, o presidente Duncan Kerr afirmou com absurdo kafkiano que ele tinha de "exprimir conclusões as quais sou incapaz de explicar".

O que a justiça revelou foi um petisco tentador acerca da intimidação regional a que Timor-Leste foi sujeita às mãos de assassinos e ocasionalmente potências cúmplices. Evidência submetida ao Department of Foreign Affairs and Trade [da Austrália] revelou uma certa insistência por parte das autoridades dos EUA em 2013 pretendendo que "o governo australiano continue a restringir acesso... a quatro documentos" com "sensibilidades em curso".

Timor-Leste permanece um estado precário. Está empobrecido. Apesar de tudo, a preferência australiana continua determinada e exploradora. A questão sobre onde o petróleo e o gás serão processados continua como um incómodo assunto melindroso. Canberra prefere que a tubagem tenha lugar através de Darwin, com o incentivo de uma receita de 80 por cento para Timor-Leste.

Isso dificilmente é aceitável para Dili, a qual considera valiosa ter a instalação de processamento em Timor-Leste, onde um "centro petrolífero" está a ser desenvolvido. Com esse objectivo, está mesmo disposta a aceitar um corte de receita em favor da Austrália. As maquinações do poder e o lobby australiano do petróleo ainda podem desfazer estes acordos. A intimidação regional continua a renascer. 

[*] Foi académico da Commonwealth no Selwyn College, em Cambridge. Dá aulas na RMIT University, em Melbourne. Email: bkampmark@gmail.com 

O original encontra-se em countercurrents.org/... 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

PORTUGAL | Como vai Rui Rio descalçar a bota do trapaceiro secretário-geral do PSD?


Num artigo da Sábado, publicado ontem no PG, concluiu-se que o secretário-geral do PSD, Barreiras Duarte, mentiu acerca das suas habilitações académicas, pode ler a partir das considerações e da opinião em Bocas do Inferno, com o respetivo artigo da sábado adendado. Mas hoje há mais.

Hoje, a Sábado volta a publicar online o mesmo caso com mais atualizações (pode ler em baixo). A conclusão, ao ler o descrito na Sábado, é que o secretário-geral do PSD é um aldrabão, um trapaceiro no que diz respeito às referidas habilitações. académicas. Curiosamente, ou talvez não, “Barreiras Duarte foi chefe de gabinete de Pedro Passos Coelho e ex-secretário de secretário de Estado adjunto de Miguel Relvas. Agora, é secretário-geral do PSD de Rui Rio”. Informa a Sábado, como poderá ler.

Por este andar e considerando o adágio “diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és” não nos admiremos se viermos a concluir que este Barreiras Duarte é tão doutor quanto Relvas era. A não ser que trapaceiro (para sermos brandos) já corresponda a um grau académico que legitima os doutores.

Em abono da verdade, segundo a Sábado descreve, Barreiras Duarte é mais um trapaceiro. Vamos ver como Rui Rio vai “descalçar esta bota”. Se não a descalçar só provará que não o incomoda. Significará que o PSD tem nas suas fileiras alguns peritos da trapaça devidamente reconhecidos e estimados pelo líder, pelo menos este Barreiras. E são eles que querem voltar a ser governo? E são os portugueses que vão votar em gente tão desonesta?

Leia a seguir o que diz a Sábado. Fiquemos à espera, para ver como vai Rui Rio descalçar a bota do trapaceiro secretário geral do PSD. (MM | PG)

Barreiras Duarte também mentiu sobre Berkeley na tese de mestrado

Na sua tese de mestrado, o secretário-geral do PSD referiu várias vezes o estatuto de visiting scholar na Universidade norte-americana.

No relatório profissional referente à sua tese de mestrado em Direito, Feliciano Barreiras Duarte referiu várias vezes o seu estatuto de visiting scholar (professor convidado) na Universidade de Berkeley, nos EUA, que não possui. O documento foi entregue à Universidade Autónoma de Lisboa pelo secretário-geral do PSD e data de Setembro de 2014.

Ao jornal Sol, a Universidade norte-americana desmentiu que Duarte figure nos registos de professores convidados. Deolinda Adão, que assina a carta apresentada por Duarte como prova do seu estatuto de visiting scholar, garantiu que o documento é forjado e diz estar "pronta a declarar em tribunal que esse documento é uma falsificação". 

Na descrição do percurso profissional, Barreiras Duarte diz-se visiting scholar da Universidade Pública de Berkeley, EUA, "desde Junho de 2009". Duarte indicou que "está a concluir o doutoramento com uma tese sobre ‘Políticas Públicas e Direito da Imigração’ em parceria com a Universidade Pública de Berkeley, Califórnia, EUA, com o estatuto de visiting scholar.  

O documento de Setembro de 2014 é composto por duas partes: uma que descreve o currículo profissional de Feliciano Barreiras Duarte, e um estudo sobre o sistema político nacional e sistemas políticos comparados. Feliciano Barreiras Duarte tornou-se mestre em Direito, na especialidade de Ciências Jurídico-Políticas. A proposta de júri da prova de mestrado conta com Constança Urbano de Sousa, antiga ministra da Administração Interna, como membro.

Segundo o jornal Sol, que revelou o polémico estatuto de Duarte, para se obter o estatuto de visiting scholar tem de se permanecer na Universidade de Berkeley, para prosseguir a investigação, durante mais de um mês. Além disso deve-se apresentar um certificado de candidatura. O secretário-geral do PSD já indicou que não cumpriu a estadia em Berkeley, mas reforçou que a relação enquanto visiting scholar tinha sido consumada. Como prova, apresentou a carta cuja suposta autora, Deolinda Adão, diz ter sido forjada.

"A princípio, ainda quis dar o benefício da dúvida porque recebo muitos alunos há vários anos e poderia não ter memória deste. Mas assim não. Esse documento é forjado. Feliciano Barreiras Duarte nunca cá esteve", indicou Deolinda Adão.

Barreiras Duarte vai retirar as referências ao estatuto de visiting scholar do seu currículo. Ao jornal Expresso, depois de ter estalado a polémica, referiu que nunca forjou nada. "Não se trata de arrepender-me porque nada fiz com má-fé, nem tirei qualquer benefício desse estatuto como bolsas de estudo", afirmou.

Barreiras Duarte foi chefe de gabinete de Pedro Passos Coelho e ex-secretário de secretário de Estado adjunto de Miguel Relvas. Agora, é secretário-geral do PSD de Rui Rio. A SÁBADO tentou contactar Barreiras Duarte, sem sucesso. 

Leonor Riso | Sábado

Na imagem: Feliciano Barreiras Duarte junto a Rui Rio e outros do PSD quando da visita de Rio à Presidência da República, foto de José Sena Goulão/Lusa

Portugal | SACRISTAS EM CONGRESSO


Bom dia e boa semana que todos temos pela frente. Esta é a cafeína matinal que de vez em quando trazemos por aqui. Hoje é assim: o CDS teve congresso. Ena, tanta falácia, tanta demagogia, tanto populismo. Tanto sacrista! Obra de Cristas ao vento a sonhar com o cargo de primeira-ministra. Que sacrista.

Por isso a dona Angélica foi parar ao hospital com um ataque de histerismo que por nada lhe passava, até pareceu ao médico que a assistiu, no São José, que a senhora tinha tomado várias caixas de pílulas 'Goronsan' (que é para ficar muito bem disposto). A Cristas foi anunciada, no congresso, como futura PM e vai daí a Angélia caiu a rebolar-se e a rir às gargalhadas. Só parou depois de várias drogas para “desligar” e adormecer. Calmantes e soporíferos em barda foi a cura. Está a dormir desde ontem pelo meio da tarde. Mesmo assim decerto que sonha com a tal futura PM, porque sorri a todo o minuto que passa e faz uns gargarejos - que devem ser gargalhadas lá no sonho. Raio de sonho, com aquela sacrista!

Bem, a Cristas em PM é que não seria um sonho para os portugueses, mas sim um pesadelo. A direita perfila-se ridiculamente e atira para a mesa jogo viciado que os ‘croupiers’ e restantes jogadores não vão aceitar. Com razão. E lá se rodeou a Cristas de sacristas. Rodeou-se dos mais radicais saudosistas das políticas de salazaristas adaptadas à modernidade. “Tadinha da Assunção Cristas das Feiras”, alvitrou a Engrácia Viúva. “Uma rapariguinha que sonha tanto que quando acordar e cair na realidade vai partir-se toda. Vai ser cá uma queda”, lamentou pesarosa. “Oxalá que quando cair o chão esteja pejado de ouriços”, rezingou o Adelino da Tasca. Que maldoso.

Saiba que esta é a entrada do PG que habitualmente antecede o Expresso Curto, do Expresso Bilderberg Balseminas. Isso porque o Balsemão mina tudo. Velhote, manchado, mas é sempre a aviar. Ah, e este Curto tem a lavra de Rui Gustavo, jornalista que por lá é editor, provavelmente até doutor… ou dótor. Não sabemos exatamente.

Não deixa de ser curioso que o Curto que vai ler a seguir (contamos com isso) arranca com desporto. Primeiro o boxe e a seguir futebol em campo e na justiça. Só depois de muita ladainha desportiva é que o servidor da cafeína de hoje se refere ao congresso do CDS. E fala de entronização, ali, no congresso. Ora, o que está à vista há tempos é essa mesma entronização na comunicação social manipuladora, sacrista. Aquela dos três efes de antigamente: fado, futebol e Fátima. Agora até há mais efes para alienar exaustivamente os já alienados: o Facebook, por exemplo. E mais. Adiante.

Hoje há uma artigo no Público que será bom que leiam. É este: Os pobres continuam pobres, mesmo depois de arranjarem emprego. Avança o jornal com “Investigadores acompanham desde 2011 um grupo de pessoas em situação de pobreza, em Lisboa. "O combate à pobreza necessita forçosamente de uma mudança de paradigma", defendem.” É de ler e meditar. Trabalham e recebem uma miséria. Pois. Empresários sacristas e esclavagistas é o que não falta. Vida de pobre, uma trampa de vida. Com a Cristas ainda será mais trampa. Com Rio idem, até porque está na linha da Cristas. A direita, com mais ou menos pó. Mas direita. 

Já com o PS no poder é o que é e tem sido o que tem sido. Questionemo-nos: quem é que nos anda a roubar? A roubar e à descarada, legalmente. Porque será? O que têm que ver aqueles que elegemos com esta situação de enorme pobreza, de miséria? Quanto mais à direita… pior. È bom de ver, sempre assim foi e assim continuará a ser.

Mas há os ditos de esquerda que disso nada têm. O PS é o que é, um partido político do ‘sim’ e do ‘nim’. A não ser que mude, que Costa dê um murro na mesa e passe mesmo a ser de esquerda (não basta dizer, tem de agir e ser), acabando com as desigualdades, com a pobreza permanente de mais de metade da população, enquanto uns quantos, de número reduzido, detêm as fortunas conseguidas por via de tanto explorarem os que para eles trabalham ou através da especulação, ou roubando ‘legalmente’, impunes. Uma corja insaciável de lucros através de processos desumanos, imorais… Ops, chega. Basta de conversa. Até porque já entenderam onde é que isto iria parar. Nem é preciso pôr mais na escrita. Pois.

Vão para o Expresso Curto. Sigam a prosa. ‘Inté’. (MM | PG)

Bom dia, este é o seu Expresso Curto

As cordas queimam

Rui Gustavo | Expresso

Bom dia.

No boxe não há como não sofrer. Para se poder esquivar de todos os ataques do adversário, um pugilista tem de usar as cordas do ringue, que provocam feridas e queimaduras nas costas, as rope burns, como dizem os aficionados. Quando contra-ataca, um boxeur expõe-se sempre. E muitas vezes o vencedor é aquele que melhor sabe receber um murro sem se desnortear.

O Benfica, que depois de uma semana horrível recebeu boas notícias de onde menos se esperava (o imbatível FC Porto, que ainda tem de jogar na Luz, foi derrotado em Paços de Ferreira e já só está a dois pontos de distância) anunciou para hoje um contra-ataque em força. O presidente Luís Filipe Vieira – que só foi atingido pela justiça no caso Lex, em que é suspeito de ter pedido favores judiciais ao desembargador benfiquista Rui Rangel - disse no final da vitória contra o Desportivo das Aves que o clube vai montar um gabinete de crise “para responder a todos”.

"Todos" são os “jornalistas e administradores” que têm publicado as suspeitas que envolvem o clube em jogos fora das quatro linhas. E, talvez ainda mais, "todos" são os elementos da Polícia Judiciária e do Ministério Público que têm cercado o Benfica com investigações judiciais: vouchers e e-mails, em que é investigada uma alegada rede de influências para manipular nomeações de árbitros para jogos com o Benfica; a Operação Lex e, agora, a operação e-toupeira, em que é investigada a relação entre Paulo Gonçalves, um agente de jogadores (representa Heriberto Tavares, do Benfica B) e três funcionários judiciais que, de acordo com os indícios recolhidos pelos investigadores, passaram a Paulo Gonçalves informação em segredo de justiça de vários processos. As investigações começaram depois de denúncias do Sporting e do FC Porto (só o caso da toupeira foi espoletado por um telefonema anónimo) o que terá levado Vieira a indignar-se com a “clubite” da Justiça.

O caso é tão grave que levou à prisão preventiva de José Augusto Silva, funcionário judicial especialista em informática que usou a password adormecida de uma procuradora para aceder aos processos que envolviam o Benfica e os seus rivais. Fez consultas diárias, imprimiu documentos e terá informado Paulo Gonçalves de todos os passos do processo dos emails desde o primeiro dia. Tudo por umas camisolas, convites para os jogos e amor ao clube.

O Benfica nega tudo. Nega ter tido acesso a qualquer informação em segredo de justiça ou ter sabido de que iria ser alvo de buscas, como o Expresso noticiou esta semana. De acordo com esta versão, fica-se sem se perceber porque é que José Augusto Silva recolhia informação sigilosa que o levou à prisão. Luís Filipe Vieira pediu celeridade à justiça. E tem razão. Tudo isto tem de esclarecido depressa.

Para já, o único nome do universo benfiquista atingido com dois diretos é Paulo Gonçalves, assessor jurídico da direção, braço direito de Luís Filipe Vieira, e arguido no caso dos emails e da toupeira. Muito provavelmente será um dos escolhidos para o gabinete de crise de onde sairão os contra ataques benfiquistas: queixas-crime, exposições às autoridades sobre os crimes de violação de justiça de que se diz vítima e a convocação da nação benfiquista para “a luta”, como ficou patente na emocional (para dizer o menos) intervenção do presidente do Benfica. Apesar das ameaças veladas a jornalistas e administradores, não chegou aos exageros de Bruno Carvalho (apelou aos sportinguistas para deixarem de ler jornais e seguirem a atualidade pela Sporting TV), mas o tom crispado das críticas à investigação “incompetente” que “manchou a honra” benfiquista e está infetada pela “clubite” não é sinal de uma atitude colaborante com a justiça. Veremos o que sai do gabinete de crise.

As cordas deixam marcas.

OUTRAS NOTÍCIAS

A tempestade Felix passou, os alertas vermelhos são agora laranja e está prevista chuva, o que é bom por causa da seca. Há sol e o vento amainou.

A reboque da bonança, as autoridades marítimas vão tentar hoje desencalhar o navio espanhol Betanzos, que avariou no Tejo com 130 toneladas de combustível nos tanques que podem provocar um derrame de consequências desastrosas. Já houve quatro tentativas falhadas para rebocar o navio e a tripulação já foi resgatada na última quinta-feira. Hoje vai ser usado um rebocador maior e as operações começam de manhã.

O FC Porto perdeu pela primeira vez no campeonatorelançando a luta pelo título. Os portistas falharam um penalti e lidaram mal com a estratégia do Paços de Ferreira que recorreu a algum anti jogo. De acordo com o próprio treinador pacense, João Henriques, só houve 40 minutos de tempo de jogo útil. Sérgio Conceição confessou que se estivesse a ver o jogo em casa pediria o dinheiro de volta à Sport TV. A disparidade de armas entre os grandes e pequenos é a principal causa desta mentalidade enraizada na cultura desportiva em Portugal.

O Sporting joga hoje em Chaves e pode reentrar na corrida. Só tem de ganhar.

Uma boa notícia: João Sousa conseguiu no torneio de Indian Wells uma das melhores vitórias da carreira e do ténis português derrotando o alemão Alexander Zverev, número 5 do mundo e uma das grandes promessas da modalidade. A carreira de Sousa (o único português a conquistar dois torneios ATP) estava mergulhada numa depressão com várias derrotas consecutivas mas nenhuma tempestade dura para sempre.

O congresso do CDS e a entronização de Assunção Cristas como líder incontestada do partido marcou o fim de semana político. Cristas, que já tinha reclamado no Expresso ser “melhor do que Rui Rio”, disse no pavilhão de Lamego que os centristas são a única alternativa ao Partido Socialista e apontou a uma vitória nas eleições legislativas. O Expresso acompanhou durante todo o fim de semana o congresso e explica-lhe aqui o que Cristas quis dizer e aqui os seis melhores momentos do fim de semana em Lamego.No Observador, nota para uma das poucas vozes dissonantes.

Na China, a Assembleia Nacional Popular, aprovou uma emenda à Constituição que acaba com os limites aos mandatos presidenciais e vai prolongar no poder o atual presidente Xi Jinping, que acabava o segundo mandato em 2023. Só dois dos mais de três mil deputados votaram contra. O princípio dos dois mandatos estava em vigor há 30 anos e distinguia a China das restantes ditaduras “populares”. O parlamento chinês aprovou um total de 21 alterações constitucionais que vão fortalecer o papel do Estado na Economia e na vida dos chineses.

Cinco pessoas morreram quando um helicóptero turístico caiu no rio Hudson, em Nova Iorque. Há um sobrevivente, que se atirou à água antes do aparelho se despenhar.

Marcelo Rebelo de Sousa inicia hoje uma visita de três dias à Grécia, a braços com uma crise migratória sem precedentes. O presidente, que ontem espalhou beijinhos e selfies e fez uns sprints vigorosos em Oliveira do Hospital, vai encontrar-se com portugueses que trabalham nos campos de refugiados.

Na Síria a luta pela cidade de Ghouta continua e o desastre humanitário também. Como é difícil imaginar o que é viver debaixo de fogo cruzado, resta seguir Amin Hasem, que gravou estes vídeos antes de deixar de dar sinais de vida.

Manchetes

Assunção Cristas e uma espetacular blusa cor-de-rosa estão nas primeiras páginas de quase todos os jornais. O DN diz que “sonha com São Bento e PSD fala em mania das grandezas”. O Público nota que o “CDS vota na demografia, nova economia e território”. No JN, destaca-se a vontade de o CDS ser “a opção dos que rejeitam o socialismo” e o Iressalva que Cristas quer um partido “de todas as direitas para todos os portugueses”. Sound-bytes para todos os gostos.

O Correio da Manhã, o único a ignorar Cristas, lembra que “Diplomatas ganham mais do que Marcelo”.

O Negócios noticia: “Estado obrigado a devolver IVA de prédios desocupados”. A decisão é do tribunal de justiça europeu.

O JN revela que há “Escolas cheias de sucata informática e net lenta”. O número de computadores nas escolas caiu para metade em seis anos e não há um investimento sério há dez anos. Estamos a falar de informática.

O Público diz que “Testes de VIH e de hepatite B e C passam a ser feitos nas farmácias”. Eventuais resultados positivos terão de ser confirmados.

No DN há um balanço de lares fechados pela segurança social em 2017: 133.

Frases

“Parece-me um exagero que corre o risco de ser ridículo”
Marques Mendes, sobre a ambição de Assunção Cristas em ganhar as eleições

“Eu serei melhor candidato do que Assunção Cristas e António Costa”
Rui Rio, sobre a comparação que Cristas tinha feito ao Expresso

“Se estivesse a ver o jogo em casa pedia a devolução do dinheiro à Sport TV”
Sérgio Conceição, treinador do FC Porto depois da derrota com o Paços de Ferreira.

“Habituem-se”
João Henriques, treinador do Paços de Ferreira, o primeiro a vencer o FC Porto.

"O prazo pressupõe alguma elasticidade"
Presidente Marcelo, sobre o prazo para limpar as matas que termina próxima quinta-feira.

O que eu ando a ler

“Rope Burns”
FX Toole

Livro de contos sobre boxe e os seus segundos planos, os homens que ficam no canto dos pugilistas: treinadores e cutmen, que curam as feridas durante os combates. FX Toole, que na verdade se chamava Jerry Boyde, começou a jogar boxe aos 46 anos e tornou-se um treinador que atingiu um nível bastante razoável. Um dos contos deste livro, que dá o nome à edição portuguesa, chama-se “Million Dollar Baby”, e deu origem ao excelente filme de Clint Eastwood que ganhou os principais oscars de 2004. FX Toole morreu em 2002, sem ver a sua obra no grande ecrã. Além da história da pugilista Maggie, o livro está pejado de personagens e situações que seriam aproveitadas no filme. E aprendemos como se curam as queimaduras das cordas.

O que ando a ver

“Foge”
Jordan Peele

Surpreendente Óscar para melhor argumento original, vencendo o meu favorito “Três cartazes à beira da Estrada”, é na aparência um filme de terror acima da média, mas na verdade é um excelente protesto contra o racismo. Não me lembro de outro filme que foque este tema e não seja sobre escravatura ou a luta pelos direitos civis dos negros. O ator principal é uma revelação e o próprio Peele (realizador e argumentista) só tinha escrito comédias e filmes de animação até chegar a Foge. Não digo mais nada porque detesto spoilers.
É tudo.

*Foto de Rui Duarte Silva, em VISÃO

PORTUGAL | "O PS vai pôr-se do lado da parte mais débil ou vai juntar os trapinhos com o PSD e CDS?"


Jerónimo Sousa, líder do PCP, questionou o Governo na Maia, distrito do Porto, no comício comemorativo do 97.º aniversário do partido

O secretário-geral do PCP afirmou este domingo que a votação de legislação laboral na quarta-feira, no parlamento, servirá para o PS mostrar se "está com os trabalhadores ou contra eles", em convergência com o PSD e o CDS.

"Ou estão com os trabalhadores ou estão contra eles. O PS vai pôr-se do lado da parte mais débil ou vai juntar os trapinhos com o PSD e o CDS, para vetar estas iniciativas legislativas?", questionou Jerónimo de Sousa, na Maia, distrito do Porto, no comício comemorativo do 97.º aniversário do PCP, subordinado ao lema "Com os trabalhadores e o Povo - Democracia e Socialismo".

Referindo-se à votação de quatro iniciativas legislativas do PCP pelo "trabalho com direitos", agendada para quarta-feira, o secretário-geral indicou estar "na hora de o PS dar um passo adiante e atacar estes problemas de frente, pondo fim à convergência com PSD e CDS, em matéria de direitos dos trabalhadores, como o tem feito nestes últimos anos, vindo ao encontro das propostas do PCP de valorização do trabalho e dos trabalhadores".

De acordo com o comunista, com o congresso do PSD, esta "convergência" abriu-se "a novos e preocupantes domínios", uma vez que aquele partido "ousa já propor a revisão da própria Constituição da República a reboque de uma pretensa reforma da Justiça".

Jerónimo de Sousa notou ainda que esta convergência foi "bem visível com o projeto de Lei do PCP, que visava a reposição do pagamento do trabalho extraordinário e do trabalho em dia feriado, recusado pela votação conjunta" dos três partidos, evidenciando "o compromisso de uns e outros com o grande patronato".

"Está na hora de o PS e de o seu governo fazerem a opção pelo trabalho com direitos, por garantir horários de trabalho com respeito pelos tempos de descanso e a sua articulação com a vida familiar, pessoal e profissional", afirmou, referindo-se à votação de quarta-feira na Assembleia da República. "Está na hora de dar um passo em frente", frisou.

Para Jerónimo de Sousa, "impõe-se" que o PS aprove a legislação, "para que não fiquem apenas palavras preocupadas com a situação dos trabalhadores, mas a dura realidade da exploração do trabalho permaneça a mesma".

Em causa estão, segundo Jerónimo de Sousa, as propostas de "revogação dos mecanismos de adaptabilidade do banco de horas individual, do banco de horas grupal, banco de horas na Função Pública", bem como "a proibição da caducidade dos contratos coletivos de trabalho e de reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador".

De acordo com o secretário-geral, esta legislação preparada pelo PCP visa "garantir uma legislação de trabalho que retome a sua natureza de proteção da parte mais débil -- a única que é compatível com uma perspetiva progressista e com o projeto que a própria Constituição da República comporta".

"Numa correlação de forças que permitiria dar resposta aos problemas do País, isso só não se concretiza porque o PS e o seu governo, em convergência com o PSD e o CDS-PP, confirmam o seu compromisso com os interesses do grande capital e a sua submissão às imposições do Euro e da União Europeia", observou.

Para o comunista, o governo socialista "continua a manter orientações nucleares da política de direita, superando campanhas orquestradas pelo grande capital e seus agentes, denunciando as sistemáticas pressões da União Europeia e os seus artificiosos relatórios, como o desta semana, condicionadores da recuperação de direitos do povo".

Lusa | em TSF | Foto: Luís Forra/Lusa

UE: a desafetação das pessoas


Manuel Carvalho da Silva | Jornal de Notícias | opinião

Eduardo Lourenço, grande ensaísta, professor e filósofo tem dito que a Europa que hoje referenciamos como União Europeia (UE) nasceu e viveu, até à queda do Muro de Berlim ou até 1991, como "um projeto político entre parêntesis" com os Estados Unidos da América de um lado e a União Soviética do outro. Quando esta desapareceu, o projeto ficou ainda mais encostado ao outro parêntesis, mas à deriva no seu todo e com os seus grandes atores políticos desorientados. Essa desorientação agravou-se face a alterações de poderes à escala global e ao reforço do neoliberalismo.

A social-democracia europeia não conseguiu ou não quis interpretar objetivamente a nova situação, acentuou contradições genéticas e, desde aí, caminha de recuo em recuo subjugada a medos decorrentes do irrealismo do compromisso que tem com forças conservadoras: entrega da finança e da economia aos mercados, e atribuição aos estados - que na década anterior chegaram a ser governados na esmagadora maioria por partidos sociais-democratas - da missão de assegurar as políticas sociais, em parte com o Estado a financiar e os privados a executarem. A essa estratégia acrescentou o erro de implementar uma das ideias mais desastrosas da Europa do pós-guerra: a de que a integração económica europeia, no seu avanço, embora suscitasse problemas haveria de inevitavelmente conduzir à união política, ou seja, esta tornar-se-ia um facto sem necessidade de uma decisão explícita de constituição de um Estado federal.

Enquanto a integração esteve confinada a um núcleo relativamente homogéneo de países e não se traduziu em muito mais do que uma união aduaneira, o projeto europeu avançou com solavancos suportáveis. Mas quando, em sucessivos alargamentos, se expandiu para incluir países muito diversos nos seus níveis de desenvolvimento económico e nas suas instituições, e ao mesmo tempo se aprofundou na forma de uma União Monetária, a impossibilidade daquele modelo de integração revelou-se na expressão de uma crise existencial, que já tem quase dez anos e está longe de acabar.

Todo o processo de "construção europeia" das últimas décadas dispensa a participação dos cidadãos, não promove o diálogo, secundariza a cooperação entre povos e países. É também por isso que a UE não é capaz de lidar com o complexo problema das migrações. O "mais Europa" significa cada vez mais controlo, desde a política orçamental à supervisão bancária, passando pelas políticas laborais e sociais, as privatizações e os regimes de Segurança Social. O estado de exceção da crise foi (e continua a ser) usado para alargar as prerrogativas da UE e impor políticas de Direita, se necessário com suspensão da democracia e da soberania dos países.

As mensagens que chegam do topo da UE, nomeadamente pelas vozes sociais-democratas mais relevantes, prosseguem reclamando "mais Europa" numa espécie de obsessão pelo abismo. Continuam teimosamente na fuga para a frente, indiferentes ao que vem de baixo, expresso nos protestos contínuos dos cidadãos e nas suas opções de voto, como agora em Itália. Como convém a esta retórica europeísta, todos os que estão contra ou desconfiam do rumo em curso são catalogados de "antieuropeus". Se aqueles que o são efetivamente, no essencial forças fascistas e aventureiros políticos, saem reforçados das eleições nos países, isso pouco importa. A estratégia parece ser a de que as estruturas europeias e os poderes que lhes estão por detrás tudo suportarão: governos ultraconservadores ou fascistas (que os mecanismos da UE pretensamente adaptarão), ou a gestão da desafetação popular face à União Europeia, negando a democracia.

O caminho da "mais Europa" sem consentimento popular acabará por aumentar as tensões. A estrutura pode quebrar, quer a nível europeu, quer dos países. O bom senso aconselharia ao alívio das tensões favorecendo verdadeiras reformas: um arranjo monetário flexível no lugar da moeda única, uma devolução de políticas ao nível nacional que dê aos governos instrumentos para realizar os programas sufragados, espaço para a afirmação da democracia em cada país, e para a cooperação no plano europeu em torno das questões de interesse comum.

*Investigador e professor universitário

A CDU de Merkel é de esquerda?


Ascensão da AfD deu munição aos críticos internos que acusam chanceler federal de ter deslocado CDU para a esquerda. Para eles, é hora de uma guinada à direita. Merkel e seus aliados, porém, rejeitam essa interpretação.

Uma acusação recorrente à chanceler federal Angela Merkel, feita por correligionários, é que ela conduziu o seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), para a esquerda do espectro político alemão.

Os críticos internos apontam para decisões polêmicas da chanceler, como o casamento homossexual, o programado fim da energia nuclear e a abertura das fronteiras para os refugiados, para embasar sua tese.

Outros argumentam que o surgimento de um partido à direita da CDU, no caso a Alternativa para a Alemanha (AfD), só pôde acontecer porque a CDU se moveu para a esquerda, deixando espaço vago e eleitores insatisfeitos à direita.

Também as duas coalizões de governo com o Partido Social-Democrata teriam ajudado a diluir o perfil conservador da CDU. E há ainda aqueles que veem na própria Merkel uma social-democrata disfarçada.

A consequência lógica dessa análise é: a CDU deve dar uma guinada à direita para reforçar seu perfil conservador, voltar a ser o que era e assim recuperar os eleitores perdidos para a AfD.

Essa posição é defendida pela ala direita do partido e – com ainda mais ênfase – pelo partido conservador da Baviera, a União Social Cristã (CSU), que forma uma bancada parlamentar única com a CDU.

Mas Merkel e seus aliados internos rejeitam categoricamente essa interpretação. Eles colocam as dificuldades eleitorais enfrentadas pelo partido na conta dos desafios externos surgidos nos últimos anos, como a crise dos refugiados e a crise econômica e financeira no sul da Europa. Merkel sempre defendeu que o lugar da CDU é no centro do espectro político alemão.

O vice-presidente Armin Laschet foi ainda mais longe e rejeitou reduzir o partido a um perfil conservador. "O objetivo da CDU não pode ser reunir tudo aquilo que se encontra à direita da esquerda política", declarou Laschet ao jornal Frankfurter Allgemeine Sonntagszeitung.

Para não deixar dúvidas sobre o que pretendia dizer, Laschet foi ainda mais claro: "A essência da União Democrata Cristã não é o conservadorismo, mas colocar a concepção cristã de ser humano acima de tudo".

O vice-presidente recorreu aos primórdios do partido para reforçar seu argumento, afirmando que a concepção cristã de ser humano sempre esteve em primeiro plano, e que o próprio Konrad Adenauer, primeiro chanceler federal da Alemanha e da CDU, "sempre rejeitou a ideia de que o partido fosse uma aliança de movimentos conservadores." Laschet descartou categoricamente "deslocar o eixo" do partido para a direita.

Uma posição também defendida pela nova secretária-geral, Annegret Kramp-Karrenbauer, uma aliada de Merkel com um perfil semelhante ao da chanceler, mas com elementos conservadores suficientes para agradar também à ala direita do partido.

Kramp-Karrenbauer afirmou que a CDU é um partido que reúne diferentes confissões e concepções de mundo. "Se guinada à direita significa cortar essas raízes e passarmos a nos definir apenas como um partido conservador, então sou totalmente contra", disse. Para ela, o partido, na sua forma atual, continua fiel às suas raízes conservadoras.

A coluna Zeitgeist oferece informações de fundo com o objetivo de contextualizar temas da atualidade, permitindo ao leitor uma compreensão mais aprofundada das notícias que recebe no dia a dia.

Alexandre Schossler ! Deutsche Welle

PORTO-PORTO | Investigue-se!


Rui Sá* | Jornal de Notícias | opinião

Há 15 dias, aqui, abordei o facto de, no Porto, tal como acontecia no início do século, se voltar a falar de projetos urbanísticos polémicos, quer pela sua dimensão, quer pela sua localização, quer pelo uso que dão a determinados edifícios e/ou equipamentos.

Em particular, as redes sociais, mas também a Comunicação Social, têm abordado o caso do edifício em construção ao lado da Ponte da Arrábida, na marginal, ligeiramente a jusante da mesma. A discussão anda em torno da sua altura (falam em 16 pisos - o que a eleva praticamente até à cota da Via Panorâmica Edgar Cardoso, sendo que, nesta via, praticamente no seguimento deste empreendimento, está a ser construído outro com mais seis pisos, que o elevam a uma cota superior à do tabuleiro da ponte!), do facto de "esconder" a escarpa e de, pela sua proximidade à Ponte da Arrábida prejudicar a (belíssima) imagem desta obra de arte. Tudo questões relevantes e preocupações que partilho.

Mas, como referi nesse meu artigo, este processo foi à Câmara em 2001 - mais precisamente na última reunião antes das eleições autárquicas que se realizaram a 16 de dezembro desse ano. Pois nessa reunião votou-se uma proposta de permuta de terrenos com aquele que, nesse momento, era o promotor desse empreendimento (a Imoloc que, curiosamente, integrava também o consórcio proprietário dos terrenos do Parque da Cidade que tanta polémica causaram). No artigo que escrevi há 15 dias, apelava à memória. Hoje, consultada a ata dessa reunião, constato que errei (pedindo desde já desculpa aos leitores por isso): de facto, e ao contrário do que referia, a proposta foi aprovada...

Mas o mais interessante eram os considerandos da proposta: "Durante algum tempo gerou-se um conflito de interesses entre a Câmara Municipal do Porto (CMP) e a Imoloc relativamente à titularidade de uma parcela [exatamente aquela onde está a ser feita a construção], (...) sustentando cada uma das referidas entidades ser a proprietária exclusiva daquela área de terreno". "O certo porém é que os dados existentes relativamente à propriedade dessa mesma parcela são em larga medida mais favoráveis à posição da Imoloc do que a da CMP, desde logo pela presunção de propriedade resultante do registo daquela parcela a favor da citada Imoloc, presunção essa que a Câmara não parece poder iludir com os elementos probatórios em seu poder por serem de extrema fragilidade"...

Ou seja, e mais uma vez (à semelhança do que aconteceu com os terrenos da Selminho) estamos perante o caso de terrenos que pouca gente acreditará não terem sido expropriados por força da construção da Ponte da Arrábida e dos seus acessos. A Câmara e o Estado não procederam ao registo destes terrenos e/ou pelo menos, à sua ocupação plena. Será que alguém os registou (recorrendo à figura de usucapião?), ganhando milhões com isso? Creio ser útil que Rui Moreira esclareça este caso, mostrando os documentos existentes na Câmara. E que, de uma vez por todas, a Câmara e o Governo se juntem e investiguem todas as expropriações feitas aquando da construção da Ponte da Arrábida (e, já agora, olhem para as outras pontes...). Para que estas situações se clarifiquem.

* Engenheiro

PORTUGAL | Futebol: F. C. Porto sofre primeira derrota no campeonato


O F. C. Porto perdeu (1-0), este domingo, frente ao P. Ferreira na Capital do Móvel. Miguel Vieira foi o autor do único golo do encontro.

Com André André no onze - Herrera foi baixa devido a castigo - o F. C. Porto deu o primeiro aviso logo aos 10 minutos, por Sérgio Oliveira, na marcação de um livre, mas o médio luso atirou por cima. Seria mesmo a equipa da casa a chegar ao golo, aos 34 minutos.

Felipe Ferreira tentou o remate primeiro, voltou a ganhar o lance e cruzou para Miguel Vieira que não perdoou e deu a vantagem aos castores.

O F. C. Porto começou a crescer no jogo e, aos 66 minutos, teve uma oportunidade de ouro para igualar o resultado. O árbitro assinalou grande penalidade por uma falta de Rui Correia sobre Felipe mas, na conversão do castigo máximo Mário Felgueiras defendeu o remate de Brahimi.

Aos 83 minutos, Gonçalo Paciência, de cabeça, esteve perto de igualar o resultado mas valeu a atenção do guardião do Paços de Ferreira.

Com este resultado, o F. C. Porto lidera o campeonato com dois pontos de vantagem em relação ao Benfica, que este sábado venceu o Aves no Estádio da Luz. Na próxima jornada, o F. C. Porto recebe o Boavista e o Paços de Ferreira defronta, fora de casa, o Estoril.

Sofia Esteves Pereira | Jornal de Notícias | Foto: José Coelho/Lusa

A filantropia dos capitalistas “muy amigos”


“Ajuda” de bilionários e corporações à África inclui contrabando maldito: desrespeito aos direitos sociais, apoio a ditadores e, em especial, destruição das chances de desenvolvimento autônomo

T. Rivers | Outras Palavras | Tradução: Camila Teicher

Filantropos como Howard Buffett são os queridinhos dos jornalistas e do universo das ONG – mas será que estão mesmo ajudando a África?

Em 2015, em uma viagem a trabalho com a Fundação Mídia Internacional das Mulheres (IWMF, em inglês) na República Democrática do Congo, um jornalista local me disse: “é difícil ir a qualquer lugar no leste deste país sem dar de cara com um projeto de Howard Buffett”.

De fato, tendo investido numa gama de iniciativas, entre elas usinas de energia hidrelétrica, desenvolvimento de rodovias e ecoturismo, Howard Buffett está consideravelmente envolvido com o leste do Congo. O fotógrafo, agricultor, xerife, ex-diretor da Coca-Cola Company e filho do terceiro homem mais rico do mundo já despejou milhões na região.

O projeto hidrelétrico foi a primeira fase de um programa de investimentos elaborado em conjunto pela autoridade congolesa responsável por parques nacionais (ICCN) e a Fundação Virunga, uma instituição de caridade britânica. Em 2015, Buffett teria prometido mais US$39 milhões para mais duas usinas de energia e a Fundação Virunga planeja financiar mais usinas, hotéis e projetos de infraestrutura no entorno do parque ao longo dos próximos anos. Numa entrevista à Reuters, o diretor do parque, Emmanuel de Merode, afirmou que essas iniciativas, especialmente as usinas de energia, criarão oportunidades de emprego para as comunidades vizinhas.

E os investimentos de Buffett não param por aí: em 2015, sua fundação alegou estar fazendo uma injeção em toda a fronteira de Ruanda de US$500 milhões ao longo de dez anos para “transformar” a agricultura do país “em um setor mais produtivo, de alto valor, orientado ao mercado”. Até agora, a fundação se concentrou em projetos de segurança alimentar, com 67,5% das contribuições de 2015 dirigidos ao financiamento desse setor.

Esses investimentos parecem louváveis. Quem poderia se opor a melhorar a segurança alimentar da zona rural de Ruanda ou à construção de usinas hidrelétricas na região Kivu do Congo, onde a infraestrutura básica é limitada e somente cerca de 3% da população têm eletricidade? Que outra forma de apoiar a região seria melhor do que financiar usinas de energia e evitar que as pessoas derrubem árvores para produzir carvão vegetal?

Para responder essas perguntas, primeiro devemos perguntar: quem é exatamente Howard Buffett?

A filantropia capitalista e seus pontos de insatisfação

Howard Buffett, assim como Bill Gates, pertence a um clube exclusivo de “filantropos capitalistas”, que investem suas riquezas na solução dos principais problemas do mundo em setores como saúde e agricultura. A declaração de missão da Fundação Howard Buffett explica que seus investimentos “catalisam mudanças transformadoras, particularmente para as populações mais empobrecidas e marginalizadas do mundo”.

Embora os filantropos digam que estão ajudando os impotentes, Jens Martens [diretor-gerente do Global Policy Forum] e Karoline Seitz documentaram como as doações à caridade beneficiam também os ricos. Executivos abastados criaram as primeiras fundações americanas no início do século XX para se proteger dos impostos, construir seu prestígio e ganhar espaço nos assuntos globais. Desde então, passaram a ocupar uma posição cada vez mais dominante no desenvolvimento econômico, influenciando governos e organizações internacionais.

Os filantropos capitalistas operam no nexo entre caridade, capitalismo e desenvolvimento. Como escreve Behrooz Morvaridi, são “comprometidos política e ideologicamente com uma perspectiva de mercado”. Ao investir vastas quantias na solução de problemas históricos complexos, expandindo o setor privado, e em correções técnicas, reforçam a ideia de que o capitalismo não é a causa e sim a solução para os dramas do mundo. Tomando as palavras do historiador Mikkel Thorup, a filantropia capitalista obscurece o conflito entre ricos e pobres, afirmando que, na verdade, “os ricos são os melhores e, possivelmente, os únicos amigos dos pobres”.

Entretanto, os problemas que os filantropos capitalistas alegam estar resolvendo têm raízes no mesmo sistema econômico que permite a geração de tanta riqueza.  Martens e Seitz mostram que as doações à caridade representam “o outro lado da moeda da crescente desigualdade entre ricos e pobres”: desvelam uma correlação direta entre “aumento da acumulação de riquezas, medidas fiscais regressivas e financiamento para atividades filantrópicas”.

No livro Não basta dizer não, Naomi Klein escreve que, ao longo dos últimos 20 anos, os liberais da elite têm “recorrido aos bilionários para resolver os problemas” anteriormente abordados “com ações coletivas e um setor público forte”. De fato, as soluções propostas pelos filantropos capitalistas em áreas como saúde, educação e agricultura corroem os gastos do setor público e desviam o olhar para longe das causas estruturais da pobreza. Na agricultura, uma das barreiras estruturais são os acordos de livre comércio, que eliminam as tarifas de importação e permitem que os países ricos comprem produtos com baixo custo, assim como a corrida global por terras agrícolas, que, em 2016, traduziu-se em quase quinhentos acordos, afetando trinta milhões de hectares de terra.

Buffett criticou a imposição do modelo norte-americano de agricultura industrial na África com o respaldo de outros filantropos, como Bill Gates. No entanto, seus investimentos no leste do Congo e em Ruanda foram pensados para dar suporte a sistemas orientados ao mercado. Ele colaborou com o Partners for Seed in Africa (PASA) e com o Program for Africa’s Seed Systems (PASS), que apoiam as empresas privadas que vendem sementes híbridas e fertilizantes a agricultores, um processo que já foi criticado por enfraquecer as práticas tradicionais dos agricultores de guardar, compartilhar e trocar sementes, promovendo assim a biodiversidade. Ambos os programas são parte da controversa Aliança pela Revolução Verde na África, criticada por pequenos produtores e criadores de gado de diferentes países do continente por promover o grande negócio e “usar a propriedade intelectual para estabelecer o controle corporativo das sementes”.

Junto com Gates, Buffett investiu US$ 47 milhões em um projeto em parceria com a Monsanto para desenvolver variedades de milho mais eficientes em água para pequenos agricultores. Os críticos argumentam que a agrogigante está tentando passar a posse da “criação de milho, produção de sementes e comercialização… para o setor privado”, manipulando assim “os pequenos produtores para que adotem variedades de milho híbrido e seus fertilizantes sintéticos e pesticidas correspondentes”, beneficiando as empresas agroquímicas e de sementes.

Sem levar em conta a ironia de ter uma pessoa que atuou no conselho administrativo da Coca-Cola (que financiou pesquisas para mascarar seus perigosos efeitos para a saúde) decidindo como os agricultores africanos devem produzir alimentos, vale lembrar que Buffett também atuou no conselho administrativo da gigante alimentícia Conagra Foods, que já enfrentou acusações de violação de códigos trabalhistas e ambientais.

A preservação é a outra principal prioridade de Buffett. Alguns descreveram o Parque Nacional de Virunga – queridinho da mídia que mantém uma parceria com a Fundação Buffett – como um “estado dentro de um estado”: embora proteja a biodiversidade da região da caça furtiva e da exploração de petróleo, despojou os habitantes originais da área de suas terras e seus guardas paramilitares treinados teriam maltratado as comunidades indígenas nos arredores do parque.

A tão falada usina hidrelétrica do parque também tem gerado controvérsias significativas; alguns se queixam de que o preço da eletricidade vinda da usina aumentou absurdamente de US$5 a US$50 para uso doméstico básico. Tais alegações foram negadas pelo Save Virunga, grupo que defende o parque.

Buffett também financiou negociações de paz entre o grupo militar rebelde M23 e o governo congolês em Uganda – um nível de intromissão que revela quanta influência os filantropos exercem nas resoluções políticas. Quando um relatório do Grupo de Especialistas da ONU revelou que o governo de Ruanda estava apoiando o M23, Buffett argumentou contra a suspensão de sua ajuda ao país. Apesar de se descrever como uma “entidade apolítica”, sua fundação publicou um relatório que colocava em dúvida as conclusões do Grupo de Especialistas e questionava sua credibilidade.

David Rieff ressalta como o projeto filantrocapitalista é “irredutivelmente não democrático”, se não “antidemocrático”. Em sua análise sobre Bill e Melinda Gates, ele nota que não há controle sobre o que podem fazer, a não ser “seus próprios recursos e desejos”. Joanne Barkan destaca os problemas das fundações filantrópicas privadas: “elas intervêm na vida pública mas não se responsabilizam pelo público; são governadas de forma privada, porém subsidiadas publicamente pela isenção fiscal” e “reforçam o problema da plutocracia – o exercício do poder derivado da riqueza”.

O fato de que Howard Buffett possa investir tão livremente no Congo é produto do passado colonial devastador do país, assim como de sua atual subjugação ao sistema neoliberal. A economia do Congo foi assolada por 32 anos de cleptocracia de Mobutu (apoiada pelo ocidente), políticas de ajustes estruturais impostas pelo Banco Mundial, extrativismo praticado por empresas mineradoras transnacionais e pela elite política congolesa e uma guerra que tirou a vida de milhões de pessoas.

Buffett argumenta que seus investimentos são necessários “porque ninguém mais está interessado em fazê-lo”. Entretanto, há inúmeros cidadãos congoleses que prefeririam ver o setor público fortalecido ao invés de investimentos privados em serviços. Muitos se uniram ao movimento social Lucha (“Lutte pour le changement”), que vem exigindo do governo o fornecimento de serviços básicos no leste do Congo, como água encanada e infraestrutura adequada. Em sua luta por ver as necessidades materiais do congoleses atendidas e garantir que possam participar nas decisões políticas, muitos de seus membros já sofreram repressão ou foram presos.

O poder da narrativa

A Fundação Howard G. Buffett apresenta seu trabalho cuidadosamente. Artigos da região publicados em agências de notícias respeitáveis, como Guardian e Al Jazeera, receberam o apoio da Fundação Mídia Internacional das Mulheres (IWMF, em inglês), que, em troca, recebeu fundos de Buffett. Sua fundação contribui diretamente com a Iniciativa de Reportagem dos Grandes Lagos Africanos da organização, que apoia as jornalistas que trabalham no Congo, Sudão do Sul, Ruanda, Tanzânia, Uganda e República Centro-Africana em assuntos relacionados a “empoderamento, democracia, segurança alimentar e preservação”.

Este parece ser um projeto muito necessário: em um momento em que os meios de comunicação enfrentam déficits orçamentários cada vez maiores, a IWMF concede bolsas generosas a jornalistas sem dinheiro. Eu mesma sou grata pelo apoio que recebi do programa Grandes Lagos Africanos para cobrir o leste do Congo, porém me senti desconfortável ao tomar conhecimento de quem financia a organização.

A IWMF ressalta que não influencia as reportagens de suas bolsistas; em uma entrevista, disseram que acham “inaceitável que um financiador influencie o conteúdo editorial das reportagens que facilitam”. Entretanto, suas áreas de foco preferenciais, particularmente segurança alimentar e preservação, são escolhidas em parceira com a Fundação Howard G. Buffett.

Ironicamente, o investimento de Buffett na IWMF existe paralelamente a seu apoio à ditadura que dizimou a imprensa local. Conforme documentado por Anjan Sundaram em Bad News, o presidente de Ruanda, Paul Kagame, matou, torturou, exilou e prendeu jornalistas em todo o país. O Comitê para a Proteção dos Jornalistas registra que 17 profissionais foram mortos em Ruanda desde 1992. Ainda assim, Buffett afirmou que o país é “o mais progressista do continente” e, como muitos doadores ocidentais, mantém uma relação próxima com seu líder.

Até o momento, nenhum dos artigos da IWMF publicados diretamente de Ruanda oferecem uma perspectiva crítica acerca do regime Kagame. Jennifer Hyman, a diretora de comunicações da organização, afirmou que seu apoio a jornalistas estrangeiros trabalhando em Ruanda não foi contraditório, considerando o mandato da organização de promover a liberdade de imprensa, e que a organização conduz treinamento para os jornalistas locais nos países onde trabalham. Ainda assim, embora a organização tenha condenado abertamente o tratamento dado a jornalistas na Colômbia, Bahrein e Azerbaijão, Hyman não foi capaz de afirmar a posição da IWMF em relação ao tratamento de Ruanda a seus próprios jornalistas.

Um olhar mais atento aos financiadores da IWMF oferece mais explicações. Em seu website, entre os doadores de 2013 estão incluídas empresas multinacionais como a gigante farmacêutica Pfizer, que enfrenta processos trabalhistas, de direitos humanos e de crime ambiental, incluindo o uso de crianças nigerianas para testar um medicamento para meningite que causou a mortes de sete; Walmart – conhecido por suas práticas trabalhistas de exploração – também fez uma contribuição, assim como a Dole Food Commpany, acusada de impor condições desumanas de trabalho e expor trabalhadores rurais nicaraguenses a um pesticida proibido; as gigantes do petróleo Occidental Petroleum e Chevron, além da filha de Donald Trump, Ivanka, também aparecem na lista.

A IWMF esclareceu que nessa lista não estão os principais doadores da organização, exceto por Chevron, Bank of America e a Fundação Buffett. Em resposta a perguntas sobre a aparente contradição em aceitar o apoio dessas entidades enquanto enfatiza questões relativas a empoderamento e democracia na região dos Grandes Lagos, Hyman disse que a missão da organização é “liberar o potencial das jornalistas como defensoras da liberdade de imprensa… aceitamos o apoio de corporações, fundações e indivíduos que acreditam nessa missão”.

Nas palavras de Morvaridi, as organizações, incluindo a mídia, promovem as prioridades dos “filantropos capitalistas de elite” e, portanto, “contribuem para a construção da agenda política apoiada por eles”. A IWMF conseguiu remodelar as narrativas da mídia convencional na região dos Grandes Lagos, diversificando a gama de histórias que emergem dessa área e influenciando a opinião internacional. Apesar disso, em parceria com a Fundação Howard G. Buffett, também legitimou as atividades de Buffett e seu apoio ao governo de Ruanda.

Revelações recentes dos Paradise Papers demonstram até que ponto vastas quantias de riqueza estão sendo desviadas de países como o Congo. Cabe aos jornalistas questionar o dinheiro que entra no país vindo da classe bilionária filantrocapitalista, de homens como Howard Buffett, cuja visão de desenvolvimento regional – privatização como caminho para o crescimento – enfraquece a luta contínua dos congoleses comuns para moldar seu próprio futuro.

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