quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

UE-MALI: GUERRA PÕE À PROVA EUROPA DA DEFESA




SÜDDEUTSCHE ZEITUNG, MUNIQUE – Presseurop – imagem Tom Janssen

A intervenção da França no Mali é considerada uma guerra solitária por toda a Europa. Os fracos meios oferecidos pelos seus parceiros não indicam apenas uma falta de empenho: assinalam também o fim da Europa da defesa.


Se o problema no Mali implicasse apenas o Mali, os militares franceses não se teriam muito provavelmente envolvido na guerra contra as milícias islâmicas. Uma vez que os interesses da antiga potência colonial no continente africano não chegam para explicar uma intervenção tão arriscada. A intervenção da França deve-se ao facto de o Sahel poder tornar-se um perigo para a Europa. E é o único país europeu envolvido neste conflito porque os restantes preferiram fugir às suas obrigações. O que diz muito sobre o estado da política de segurança e de defesa comum. E não assinala nada de bom.

O facto de a única ajuda concedida a Paris pelos seus parceiros europeus ter sido umas felicitações cordiais e um número reduzido de aviões de transporte mostra claramente que algo não bate certo na União Europeia. É verdadeiramente do interesse da União Europeia impedir os islamitas e os terroristas de controlar o Mali. A UE tem conhecimento desta ameaça há mais de um ano. Se o Mali caísse nas mãos da Al-Qaeda e dos seus simpatizantes, o país transformar-se-ia num outro Afeganistão às portas da Europa, servindo tanto de ponto de partida, de zona de formação como de retaguarda para o terrorismo internacional.

A UE tem plena consciência deste perigo, mas nunca foi capaz de abordá-lo com uma resposta comum. A única coisa na qual concordou foi no envio de uma pequena missão de formação para ajudar o exército do Mali. A vontade comum europeia limitou-se a esta decisão, a UE não foi capaz de elaborar um plano de ação preventivo para reagir a uma urgência militar, ao contrário da França.

Teste decisivo na região do Sahel

O facto de querem agora antecipar o calendário da missão de formação é no mínimo derrisório. Primeiro, porque esta missão não muda em nada o facto de que os outros países europeus continuam de braços cruzados a observar os franceses a empenhar-se para defender os interesses europeus. Depois, porque os soldados do Mali não terão muito provavelmente tempo para dedicar aos formadores europeus, enquanto travam uma guerra contra as milícias no centro e no Norte do país. A situação ultrapassa a União Europeia.

Atualmente, a UE deve sobretudo perguntar-se se pretende realmente ter uma política de segurança comum. Que implicaria ajudar a iniciativa militar francesa no Mali. O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Hubert Védrine, fez uma breve declaração sobre a política de segurança e de defesa comum, na qual a UE tem concentrado todos os seus esforços nos últimos 20 anos.

Se os responsáveis políticos dos Estados-membros da UE não conseguirem muito rapidamente chegar a acordo sobre os fundamentos da sua cooperação, a aspiração europeia de se tornar uma potência mundial nunca se concretizará. Talvez nunca tenha passado pela cabeça de Hubert Védrine que a Europa seria colocada à prova tão rapidamente e que o teste decisivo se desenrolaria na região do Sahel.

Europa vai sair derrotada

Tudo indica que a Europa vai sair derrotada desta história. Uma vez que, em matéria de política estrangeira e de segurança, os interesses dos países-membros da UE continuam muito afastados uns dos outros. O Mali é prova disso: os europeus concordam no facto de existir uma ameaça, mas discordam nos meios de a combater. Nem sequer concordam que, neste tipo de situação, devemos estar preparados para o pior, incluindo a guerra. A política de segurança da UE padece de uma falta de união, de aptidão e de vontade. E estas carências não desaparecerão tão cedo.

No entanto, é preciso que os outros países europeus apoiem militarmente a França. É uma questão de solidariedade, mas também de bom senso a longo prazo: se queremos deixar a porta aberta para uma política de segurança europeia digna desse nome, devemos evitar que Paris seja obrigado a pedir ajuda à NATO em caso de bloqueio da situação militar. De facto, esta seria a derradeira prova de que os europeus não estão à altura.

REAÇÕES EM FRANÇA E NA ALEMANHA

Paris isolada na batalha do Mali

Depois de se lançar na operação militar no Mali, o Presidente francês François Hollande esperaria provavelmente que, à semelhança da Líbia, os seus parceiros europeus lhe dessem uma ajuda. Mas, cinco dias depois do início da guerra, não foi isso que aconteceu. “Daí que, na Europa, a diplomacia francesa e o Estado-Maior se arrisquem a encontrar apenas boas desculpas”, acrescenta Le Figaro. “A Alemanha, a última potência europeia a fazer crescer o seu orçamento militar, não pode mexer num único soldado, nem num único blindado sem o voto do Bundestag, um cenário em que Angela Merkel não confia em período eleitoral”, revelando o seu “apoio” a Hollande.

O berlinense Tagesspiegel critica igualmente a atitude alemã:

Os alemães querem fazer crer aos franceses e a si próprios que estão realmente ao lado do seu aliado europeu mais próximo. Porém, excluem tropa de combate e contentam-se com um apoio logístico. Se Hollande, em vez de ser inconstante, levasse a sério esta afronta, o eixo franco-alemão sofreria uma rude prova. Mas hoje em dia toda a gente faz de conta. Exceto os grupos jiadistas.

Quanto aos parceiros europeus, não há muito a esperar deles, adiantaLe Figaro:

Itália, também ela em plena campanha eleitoral para as legislativas, e Espanha, financeiramente aniquilada pela crise, não mostram qualquer tipo de entusiasmo. A Norte, a Holanda e a Dinamarca, aguerridos elementos da NATO, revelam pouco interesse por África. A Leste, a Polónia relembra que se mantém envolvida no Afeganistão... Nem o debate lançado terça-feira no Parlamento Europeu, nem o encontro dos 27 ministros dos Negócios Estrangeiros da UE, convocado quinta-feira para Bruxelas, poderão alterar a situação na frente do Mali. No máximo, os chefes da diplomacia poderão fazer um balanço dececionante de uma “Iniciativa para o Sahel”, lançada com grande estrondo em março de 2011 para o reforço de países como o Mali. Mesmo que Bruxelas tenha efetivamente feito dotações orçamentais, o plano militar e de segurança nunca se concretizou. Em todo o caso, a ausência de reforços da UE vem complicar os cálculos do Estado-Maior quanto à “segunda fase”, após vários dias de bombardeamentos que conseguiram impedir o avanço das forças jiadistas.

Portugal: OS “EXPERTOS”




Eduardo Oliveira Silva – Jornal i, opinião

São eles que geram a espiral recessiva que é a verdadeira peste negra dos dias de hoje

Costuma dizer-se que os números não mentem, o que é porventura a maior das mentiras inventadas desde que a economia deixou de ser contas de somar, subtrair, multiplicar e dividir e passou a integrar um conjunto de factores e elementos tão estranhos como abstractos para o comum dos mortais.

É por isso que muitos “expertos” respondem com desdém quando são confrontados com questões simples e objectivas, que logo classificam como contas de donas de casa.

O facto é que as donas(os) de casa não se enganam porque não podem. Só não acertam quando falha uma entrada de dinheiro que davam por adquirida, enquanto os “expertos” fracassam em toda a linha porque os seus métodos quantitativos, as suas variáveis estatísticas e os seus “benchmarks” (em português copianços) foram transpostos para cenários imaginários.

É isso que está a suceder com o governo e mais concretamente com Vítor Gaspar. Tirando os juros da dívida externa nos mercados secundários, que têm vindo a descer, nada dá certo.

O relatório de Inverno do Banco de Portugal foi o mais recente entalão nas estimativas governamentais. Onde Gaspar consentia uma recessão de 1%, o Banco de Portugal atira com 1,9%, o que é praticamente o dobro.

É preciso, todavia, considerar que esses números são meras projecções e que a recessão em 2012 ultrapassou os 3%, o que pode levar à afirmação de senso comum de que as coisas não irão certamente melhorar e ambas as instituições estão erradas. Apostar noutros 3% é capaz de dar dinheiro.

Agora que são já mais ou menos conhecidos os valores astronómicos dos impostos entrados em vigor com o Orçamento de 2013, é de considerar ainda mais fortemente a possibilidade de nada bater certo.

Talvez nem mesmo as expectativas em relação às exportações, que manifestamente não têm em conta a retracção dos mercados que maioritariamente recebem os nossos produtos.

Todos os dias assistimos de resto a elucubrações simplistas a respeito dos temas mais diversos. A mais recente prende-se com a ideia peregrina de que o regime da ADSE ou certas comparticipações do SNS dentro do sistema geral são excessivas e deveriam ser reduzidas.

Muito bem. Abstraindo do que seria a calamidade de todos irem a correr para os hospitais públicos, dê-se de barato o raciocínio e aplique-se. Mais tarde se verificará que o dinheiro que as pessoas são obrigadas a desviar para tratamentos e consultas que deixam de ser apoiados são logo retirados a pequenas coisas do quotidiano que faz a economia real.

Quais? Muito simples. Tomar café. Petiscar qualquer coisa. Comprar um jornal ou uma revista. Pagar a quota num clube. Oferecer um jantar no S. Valentim, um brinquedo aos filhos ou mesmo dar um contributo para a caridade ou a solidariedade.

É disto que parece não ser nada que se esquecem os “expertos” que tão espertos se consideram. Mas é por eles e pelas suas contas que nos chega esta espiral recessiva, a verdadeira peste negra dos dias de hoje.

ECONOMIA PORTUGUESA VAI CONTRAIR O DOBRO DO PREVISTO POR GASPAR




Bruno Faria Lopes – Jornal i

Para o Banco de Portugal a recessão na zona euro travará as exportações. Banco parece não acreditar na “espiral recessiva”, mas não arrisca

A economia portuguesa poderá contrair 1,9% este ano, cerca do dobro da previsão em que o governo e a troika basearam o Orçamento do Estado para 2013, indicou ontem o Banco de Portugal, no boletim económico de Inverno. A contracção agora prevista, que custará cerca de 88 mil postos de trabalho ao longo do ano, é três décimas maior do que o divulgado há três meses pelo banco central – a revisão é justificada pelas novas previsões sobre o impacto da recessão europeia, para onde Portugal escoa cerca de três quartos das suas exportações (cujo ritmo de crescimento é revisto para 2%, menos de metade dos 5% anteriormente previstos).

O aprofundamento da recessão, divulgado logo no arranque do ano, coloca pressão adicional sobre o governo e a troika, que poderão rever as suas perspectivas já na sexta avaliação regular do programa, em Fevereiro. O banco central salienta que os riscos continuam a estar enviesados no sentido negativo, com 55% de probabilidade do resultado final do PIB no final do ano ser mais negativo do que 1,9%. O impacto da revisão em baixa incide numa rubrica com pouco impacto directo na consolidação orçamental – comparativamente, por exemplo, ao consumo privado –, mas ataca o único ponto que ampara a economia portuguesa em queda, minando mais o emprego e, indirectamente, a execução orçamental.

As más notícias não contam com o impacto de eventuais medidas adicionais de austeridade para corrigir os desvios que apareçam este ano (o plano B de 800 milhões de cortes na despesa previsto pelo governo e pela troika), facto que constitui um risco adicional para o cenário económico, a juntar ao imposto pela conjuntura externa.

Apesar das maiores dificuldades o Banco de Portugal parece não comprar o discurso de “espiral recessiva” ventilado pelo Presidente da República, Cavaco Silva. A instituição liderada por Carlos Costa considera que o impacto negativo do ajustamento é “inevitável” e que se está dentro do “antecipado” pelas autoridades portuguesas, ou seja, mesmo com revisões negativas sucessivas o plano não se desviou radicalmente.

O banco central aponta ainda para uma previsão de crescimento de 1,3% em 2014, salientando que o mais importante é a trajectória de recuperação da economia – a actividade deverá dar sinais de voltar à vida no último trimestre do ano, um pouco mais tarde do que o previsto pelo governo de Passos Coelho.

A previsão para 2014 tem, contudo, um enorme risco associado, salientado pelo próprio Banco de Portugal no boletim: não conta com o efeito das medidas de austeridade que o governo ainda não detalhou, mas que já deu como certas. Portugal terá que cortar cerca de 3,2 mil milhões de euros em despesa no próximo ano para cumprir o compromisso assumido com a troika. As regras do Eurosistema levam o Banco de Portugal a contar apenas com as medidas de política orçamental que conhece – a previsão de retoma em 2014 assume, por isso, que a política orçamental se mantém igual, um pressuposto que será revisto.

“Com as políticas de austeridade que se anunciam de forma geral, que terão um efeito muito significativo, prevemos uma estagnação total da economia”, aponta Paula Carvalho, do Banco BPI. A economista – que reviu o valor de 2013 para -2,2% e não ficou surpreendida com a revisão do Banco de Portugal – salienta a incerteza acumulada por um processo interno de ajustamento violento sem precedentes e pela correcção de vários pontos de crise a nível global.

Para o Banco de Portugal o ritmo em 2014 dependerá da conjugação destes dois efeitos – a austeridade adicional é uma certeza (e o efeito de cortes de despesa na economia foi revisto em alta recentemente pelo FMI), sendo que um comportamento melhor da conjuntura externa, que poderia compensar o impacto negativo na frente doméstica, permanece no domínio da incerteza. A instituição atribui uma probabilidade de 60% à concretização de um cenário pior para o PIB e, consequentemente, para o emprego.

Ao todo, entre 2009 e 2013 a economia portuguesa encolherá mais de 7%, com os gastos das famílias a recuarem 17% – recordes negativos que fazem o país recuar ao início da década passada. O reverso da medalha está no ajustamento recorde das contas externas: tal como previsto a meio do ano passado, em 2012 a economia portuguesa registou o primeiro excedente comercial em cerca de seis décadas (devido ao recuo das importações e ao esforço nas exportações, que já valem 42% do PIB), um resultado que deverá manter este ano e no próximo, segundo o Banco de Portugal. O défice externo, que há três anos estava perto dos dois dígitos, deverá praticamente desaparecer no final do programa da troika – subsistem dúvidas entre vários economistas sobre a sustentabilidade deste resultado.

Brasil: FINANCIAL TIMES PRECISARÁ PEDIR DESCULPAS A LULA





O Financial Times teve acesso às informações não confirmadas sobre o ex-presidente Lula, que vazaram na rede na semana passada, e não se deu ao trabalho de checar se a fonte era confiável

O diário conservador inglês Financial Times (FT) precisará se retratar, publicamente, em relação à matéria publicada nesta sexta-feira, sob o título Lula’s ‘loot’: not much to look at (‘O butim de Lula: não há muito o que se observar‘, em tradução livre), em que atribui ao ex-presidente brasileiro imóveis que nunca lhe pertenceram. A resposta chegou nesta terça-feira, pela equipe de comunicação do Instituto Lula.

A notícia, assinada pelo editor-chefe da Editoria de Brasil do FT, Joseph Leahy, que já publicou outras matérias negativas em relação ao país, associa o nome do antecessor da presidenta Dilma Rousseff ao escândalo do ‘mensalão’. “Lula sempre negou qualquer conhecimento sobre o esquema. Agora os pedidos de investigação estão aumentando, sob alegações de que o ex-presidente recebeu dinheiro do ‘mensalão’ para uso pessoal”, alega o redator.

O FT teve acesso às informações não confirmadas sobre o ex-presidente, que vazaram na rede na semana passada, e não se deu ao trabalho de checar se a fonte era confiável. “Endereços de propriedades, números de telefones, empresas registradas em seu nome e documentos foram divulgados no Twitter”, escreveu o jornalista que cometeu o erro. A matéria atribui, ainda, quatro imóveis, que seriam de Lula, e reproduz imagens do Google Maps das fachadas dos bens.

A propriedade “mais respeitável”, segundo a publicação, fica situada em um condomínio em São Bernardo do Campo (SP). Trata-se, na realidade, do único imóvel que realmente pertence ao ex-presidente, segundo a assessoria de imprensa do Instituto Lula. Além deste, o texto cita uma casa em um “bairro não muito salubre” de São Bernardo, outra “humilde” em Sertãozinho, interior de São Paulo, que precisa de “uma mão de tinta” e a terceira em Natal, em uma região que “você não gostaria de passear à noite, especialmente quando uma busca no YouTube mostra vídeos de homicídios e outros problemas sociais”.

O FT acrescentou que a fonte à qual consultaram, sem qualquer preocupação quanto à veracidade das informações divulgadas, a despeito de incriminar o ex-presidente – que tem sido taxado de “ladrão” pela direita brasileira – confirma que, mesmo se tivesse aquele patrimônio alegado, não seria nada de mais para quem tem mais de 30 anos de vida pública.

A matéria também não avançou sobre os imóveis subvalorizados que pertenceriam ao senador Aécio Neves (PSDB) no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte. Embora o líder tucano tenha um apartamento no Leblon e outro em Ipanema (entre outros imóveis em BH e Nova Lima, além da Rádio Arco-Íris), Aécio declarou um patrimônio de pouco mais de R$ 600 mil em sua última prestação de contas à Justiça Eleitoral.


Brasil: A PERVERSA MODERNIDADE LÍQUIDA




Rodolpho Motta Lima* - Direto da Redação

O governo brasileiro, dando seguimento a ações que buscam o enquadramento dos planos de saúde , resolveu suspender por três meses as atividades de venda de 255 deles, vinculados a 28 operadoras, em razão do descumprimento de prazos máximos fixados para consultas, cirurgias e exames diversos.

Esse é um cenário que, como outros do gênero, nos convida a refletir sobre a importância do debate – hoje central e crucial em muitos pontos do planeta - que coloca em oposição o público e o privado, com as respectivas responsabilidades.

Em livro que motiva o título deste artigo (“A Modernidade Líquida”), escrito há alguns anos mas que mantém integral atualidade, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman trata, em diversos níveis, das mudanças experimentadas pela Humanidade nos tempos mais recentes, cuidando de múltiplos aspectos que exemplificam o advento do que ele denomina “modernidade líquida”, como contraposição a uma anterior modernidade posta de lado, tida como “sólida”, “pesada”. Entre os aspectos envolvidos nessa transformação (que muitos consideram evolutiva) estariam presentes temas como emancipação, individualidade, tempo/espaço, trabalho e comunidade, cada um deles merecendo expressivas análises do autor e todos eles, seguramente, constituindo um bom assunto para debate aqui no DR, não para produzir pretensiosos documentos da ciência social, mas para colocar em questão a importância que merecem tais assuntos, por marcarem o mundo de hoje.

Entre as características de um mundo “pesado”, do mundo das coisas sólidas, de complicada dissolução, que a realidade moderna pretendeu ver superadas por elementos mais “flexíveis”,”leves”, esteve sempre em destaque a chamada “esfera pública” com o domínio considerado opressivo de um Estado onipotente, inibidor das potencialidades do indivíduo. Em nome da “leveza” – como componentes da modernidade líquida - surgiram as teses neoliberais que propugnavam pelo Estado mínimo, defendendo para a esfera particular a missão de “colonizar o espaço público”, e conferindo à iniciativa privada, em escala crescente, funções que eram prerrogativas estatais.

Uma dessas atividades em que se foi expulsando o publico em detrimento do privado diz respeito à saúde e suas diversas nuances. Alguns países – mesmo com o peso de ícones do capitalismo, como a Inglaterra e a França – conseguiram, nesse âmbito, manter o poder público como protagonista das ações. Mas essa não foi a realidade, em termos planetários. Estamos hoje, aliás, percebendo como o tema é explosivo nos Estados Unidos, sendo uma das diferenças entre as óticas da administração Obama e dos republicanos.

A transformação em elementos “líquidos” das coisas tidas como “sólidas” - às quais era preciso dar fluidez - passou também por outra sutil metamorfose que colocou no lugar da cidadania – com a consciência do social que ligava as pessoas - a individualidade, ou seja, seres “emancipados” em relação a qualquer obrigação comunitária. Cidadãos tornaram-se indivíduos apreciadores do próprio umbigo, consumidores contumazes e vorazes, paradoxalmente insensíveis quanto à defesa, com a força do coletivo, de seus próprios interesses.

Os valores e ações da cidadania cedendo lugar aos que tipificam o individualismo – dentro dos princípios de “substituição do sólido pelo líquido” – constituíram e constituem ainda um dos motes que propiciou essa diminuição da interferência do Estado em assuntos como a saúde, cuja natureza – diretamente vinculada ao interesse público – deveria merecer a preocupação do cidadão. Mas esse também estava sendo diminuído pelos novos tempos.

No Brasil, esse processo não foi diferente e os governos que precederam o de Lula – principalmente os conduzidos pelo tucanato - tentaram consolidar os ideais da modernidade líquida ,em processo que buscava o Estado mínimo e a participação máxima da iniciativa particular. A tão decantada administração da saúde naqueles governos só fez propiciar a proliferação dos planos de saúde, relegando a um descuidado estágio inferior as atividades públicas.

Os planos de saúde, com a perversa lógica do mercado voltada para o lucro, são instrumentos que exemplificam claramente os malefícios da iniciativa privada, se deixada livre para agir apenas segundo suas conveniências. Seguramente, um Estado que contasse com todos os recursos (muitas vezes abusivos) carreados para os Planos , e que assumisse como missão prioritária o bem comum traria muito mais benefícios e segurança aos seus governados.

Na impossibilidade de, a curto prazo, reverter essa perversa situação, o governo Dilma – como já o fez recentemente com as empresas de telecomunicações – tenta, com providências de fiscalização e punição, salvar os destroços e, mal ou bem, recuperar a importância do Estado na gestão de assuntos viscerais para o nosso povo.

Fica bem fácil entender determinadas reações do pessoal da ”modernidade líquida” diante de posturas de governos como o nosso, todas as vezes em que se assume a defesa dos interesses populares. É facílimo entender a raivosa oposição que se faz, por exemplo, ao governo de Hugo Chavez, na Venezuela, marcado fortemente pela presença do Estado, com ações que redundaram na expressiva diminuição da pobreza, na erradicação do analfabetismo e na democratização do acesso à comunicação.

E fica mais fácil ainda perceber a importância de buscar-se a recuperação do público em relação ao privado, com o retorno do primado do cidadão diante do indivíduo, através de participações coletivas que denunciem, inibam e ao final destruam os agentes contrários aos interesses da população.

* Advogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.

CHEFE DE ESTADO DA ÁFRICA DO SUL TERMINA VISITA A ANGOLA




Angola Press        

Luanda - O Presidente sul-africano, Jacob Zuma, deixou já Luanda no termo da visita de trabalho de algumas horas ao país, no âmbito do reforço da cooperação entre os dois países.

Durante a sua permanência em Luanda, Jacob Zuma reuniu-se com o seu homologo angolano, José Eduardo dos Santos, com quem abordou as relações entre os dois países e a situação prevalecente em alguns países africano.

Depois das conversações entre os dois estadistas, José Eduardo dos Santos ofereceu ao seu homologo um almoço oficial.

No Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, Jacob Zuma e a delegação que o acompanhou recebeu cumprimentos de despedida do ministro da Administração do Território, Bornito de Sousa, e de representantes da missão  diplomática do seu país acreditada em Angola.

Angola: OGE DIFÍCIL DE FISCALIZAR PELO CIDADÃO COMUM




Venâncio Rodrigues – Voz da América

Fernando Pacheco disse que o Governo não informa a sociedade sobre como as dotações orçamentais são aplicadas.

LUANDA — O coordenador do Observatório Político e Social de Angola (OPSA), engenheiro Fernando Pacheco disse ser muito difícil fiscalizar o Orçamento Geral do Estado (OGE) por parte de organizações independentes porque o Governo não informa à sociedade a forma como as dotações orçamentais são aplicadas.

“O mais grave é que o Governo publica o Orçamento no “Diário da República” mas depois nunca sai o cumprimento”, disse.

O responsável cívico diz que o Governo devia também definir as prioridades e os critérios a utilizar na aplicação de fundos públicos.

Para mais pormenores escute a reportagem clicando na ligação OGE Sociedade Civil

Guiné-Bissau primeiro país a receber "Alfabeto do Desenvolvimento" depois de Portugal




FP – JMR - Lusa

Bissau, 15 jan (Lusa) - A Guiné-Bissau tornou-se hoje o primeiro país, depois de Portugal, a receber a exposição "Alfabeto do Desenvolvimento", uma iniciativa de várias organizações portuguesas destinada a sensibilizar para questões como o desenvolvimento e a cidadania.

Apresentada em Lisboa em outubro do ano passado e percorrendo depois várias regiões do país, a exposição, que é também um livro e um catálogo, juntou o trabalho de jornalistas, fotojornalistas e académicos à volta de 26 palavras, cada uma delas correspondendo a uma letra do alfabeto e relacionada com o desenvolvimento.

Hoje, em Bissau, no mês em que se assinala o 40.º aniversário da morte de Amílcar Cabral, inaugurou-se o primeiro de 10 dias da exposição, que em breve deverá rumar a S. Tomé e Príncipe, como disse à Lusa a diretora da Associação para a Cooperação entre os Povos (ACEP), Fátima Proença.

"Neste momento em que a Guiné-Bissau vive novamente um período complicado da sua história, o trazer aqui esta exposição, que nos desafia a todos a pensar, a refletir e a procurar caminhos, é uma manifestação do reconhecimento que temos pela grande coragem cívica e grande empenhamento de muita gente neste país", aliada ao facto de se assinalarem 40 anos da morte de Amílcar Cabral, explicou a responsável da associação portuguesa.

O percurso lógico da exposição, que em Portugal esteve patente em 10 universidades, será depois S. Tomé e Príncipe, onde a ACEP está a desenvolver a segunda fase de um projeto que tem como tema as políticas públicas para o desenvolvimento, passando depois para Cabo Verde.

Além da ACEP, a exposição é uma iniciativa do Centro de Estudos sobre África e do Desenvolvimento (CESA) e da Associação In Loco, Desenvolvimento e Cidadania.

"É um trabalho de contribuições de forma criativa e inovadora sobre o desenvolvimento e a cidadania em Portugal e no Mundo. É tentar, seguindo as letras do alfabeto (começando em A, com Água e terminando em Z, com Zapping) identificar temas que nos traduzam uma visão de desenvolvimento", resumiu Fátima Proença.

E o objetivo, acrescentou, é o de "conseguir criar pontes entre maneiras diferentes de olhar o mundo e de ter a noção de que o mundo não é só Portugal".

MAU TEMPO EM MOÇAMBIQUE DESTRÓI E MATA QUE SE FARTA




Chuvas provocam 12 mortos e atingem cerca de 14 mil pessoas em Moçambique -- novo balanço

16 de Janeiro de 2013, 14:06

Maputo, 16 jan (Lusa) - As fortes chuvas que assolam Moçambique causaram 12 mortos, afetaram 14.374 pessoas e, na capital moçambicana, Maputo, destruíram 380 casas, refere o novo balanço do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC) hoje divulgado.

A porta-voz do INGC, Rita Almeida, disse aos jornalistas que quatro crianças morreram na terça-feira em bairros da periferia de Maputo arrastadas pelas águas da vala de drenagem quando regressavam da escola.

Um dos corpos foi recuperado no vale do Infulene, arredores da capital moçambicana, onde a chuva provocou estragos enormes, porque todas as casas destruídas eram de alvenaria.

Nas restantes províncias, as habitações destruídas pelas chuvas eram de construção precária.

Um caso similar, envolvendo também quatro crianças, ocorreu nas imediações da Rua Cândido Mondlane, no bairro das Mahotas.

Desde sexta-feira vigora o alerta laranja para a região norte do país, decretado pelo governo moçambicano na sequência das chuvas que atingem Moçambique.

De acordo com os dados governamentais, a província do centro do país Manica é uma das mais fustigadas, com 11.580 famílias atingidas, seguida da Zambézia, com 1914 agregados, e Inhambane, no sul, com 775 famílias.

Perto de mil famílias estão albergadas nos centros de acomodação espalhados pelo país, disse Rita Almeida, admitindo que, com o evoluir dos acontecimentos, o número de mortes poderá subir.

MMT // MLL.

Chuvas mataram quatro crianças em Maputo

16 de Janeiro de 2013, 08:39

Maputo, 16 jan (Lusa) - Quatro crianças morreram na terça-feira em bairros da periferia de Maputo, em resultado das fortes chuvas que caíram na capital moçambicana, relata hoje a imprensa local.

Segundo o Notícias, de Maputo, no bairro da Maxaquene morreram duas crianças que resvalaram e foram arrastadas pelas águas da vala de drenagem quando regressavam da escola.

Um dos corpos foi recuperado no vale do Infulene.

Fortes chuvas provocam encerramento da Escola Portuguesa de Maputo

16 de Janeiro de 2013, 06:37

Maputo, 16 jan (Lusa) - A Escola Portuguesa de Maputo (EPM) suspendeu hoje o seu funcionamento, em consequência das fortes chuvas que, nos últimos dias, afetaram a capital de Moçambique.

Segundo um comunicado da EPM, a suspensão das atividades destina-se a "repor o normal funcionamento de algumas instalações e equipamentos" afetados pela chuva que, quase sem cessar, cai em Maputo desde a passada sexta-feira.

Hoje, será emitido novo comunicado sobre a situação e com o provável anúncio da data de retoma das aulas, refere o mesmo documento.

LAS // HB

UE ESPERA INICIAR ESTE ANO CONVERSAÇÕES COM A CHINA




AC – HB - Lusa

Pequim, 16 jan (Lusa) - A União Europeia espera iniciar este ano conversações com a China para um acordo sobre investimentos que consagre o acesso aos respetivos mercados e a igualdade entre empresas, disse hoje o embaixador da UE em Pequim, Marcus Ederer.

"Estamos prontos a iniciar as conversações", afirmou o diplomata na primeira conferência de imprensa do ano na capital chinesa e que serviu para apresentar a nova presidência rotativa da União Europeia até ao final de junho de 2013, a cargo da Irlanda.

A ideia de um acordo geral sobre investimentos entre a China e a UE foi lançada há cerca de um ano, mas aparentemente, falta ainda definir o seu âmbito.

Para os "27", os "princípios mais importantes" a consagrar dizem respeito à proteção dos investimentos, acesso aos mercados e igualdade de tratamento entre as empresas, realçou Marcus Ederer.

Evocando a compra de 21,35% do capital da EDP por uma empresa estatal chinesa, concretizada o ano passado, o embaixador da UE em Pequim perguntou: "Seria possível uma companhia europeia fazer o mesmo na China?".

"É por isso que insistimos que o acesso aos mercados e a igualdade de tratamento entre empresas façam parte das negociações do acordo", acrescentou o diplomata, respondendo implicitamente "não" àquela pergunta.

Marcus Ederer indicou ainda que o aparente atraso no lançamento das referidas conversações estará também relacionado com "o processo de transição" política em curso na China, iniciado em novembro passado com o 18.º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC) e que culminará com a formação de um novo Governo, em março.

O primeiro-ministro, Wen Jiabao, que na última década representou a China nas cimeiras anuais com a UE, deverá então ser substituído pelo atual "número 2" da hierarquia do PCC, o vice-primeiro-ministro executivo, Li Keqiang.

Na conferência de imprensa, Marcus Ederer salientou que China e UE "têm a maior relação comercial do mundo" e são "profundamente interdependentes", e que as divergências políticas "não bloquearam o diálogo" entre Pequim e os "27".

"Os líderes europeus estão empenhados no diálogo com a nova liderança chinesa. As duas partes necessitam de crescimento e de um crescimento sustentado", disse o embaixador da UE.

Marcus Ederer agradeceu as "repetidas manifestações de confiança" do Governo chinês no futuro da UE e disse que a zona euro "está a caminho de ser da crise".

"Não abandonem a esperança. Tenham confiança", acrescentou.

A presidência irlandesa da União Europeia assentará na promoção de três valores , "Estabilidade, Emprego, Crescimento", anunciou o embaixador irlandês na China, Dellan Kelleher.

CONTRAÇÃO DA ECONOMIA ALEMÃ É NOVO GOLPE PARA A EUROZONA




A contração econômica da Alemanha no último trimestre de 2012 e a redução oficial das projeções de crescimento para este ano são um novo golpe para a zona do euro. Segundo o Escritório Federal de Estatísticas da Alemanha a contração foi de 0,5%. Segundo o Banco Central alemão, a economia crescerá 0,4% este ano, muito menos do que o 1,6% previstos. A crise dos países do sul da zona do euro está alcançando a Alemanha e apagando a ilusão de um desacoplamento graças à mítica eficiência produtiva germânica. O artigo é de Marcelo Justo, direto de Londres.

Marcelo Justo – Carta Maior

Londres - A contração econômica da Alemanha no último trimestre de 2012 e a redução oficial das projeções de crescimento para este ano são um novo golpe para a zona do euro. Segundo o Escritório Federal de Estatísticas da Alemanha a contração foi de 0,5%. Segundo o Banco Central alemão, a economia crescerá 0,4% este ano, muito menos do que o 1,6% previsto em cálculos anteriores. Na primeira metade do ano passado o crescimento alemão evitou uma recessão do conjunto da eurozona. É óbvio que as coisas estão mudando.

A crise dos países do sul da zona do euro está alcançando a Alemanha e apagando a ilusão de um desacoplamento graças à mítica eficiência produtiva germânica. Em 2009, a Alemanha sofreu uma contração de 5% como consequência da crise mundial, mas em 2010 e 2011 teve uma rápida recuperação com um crescimento de 4,2% e 3% respectivamente. A queda foi abrupta na segunda metade do ano passado e deixou o Produto Interno Bruto (PIB) alemão com um anêmico aumento de 0,7%. Em declarações ao Financial Times nesta quarta-feira o presidente do governo da Espanha, mariano Rajoy, que aceitou o plano de ajuste em seu país, pediu às nações credoras da eurozona que ponham em marcha políticas de estímulo ao crescimento. “Este é o momento de colocar em marcha essas políticas. Está claro que não se pode pedir a Espanha que adote políticas de expansão, mas sim aos países da zona do euro que estão em condições de fazê-lo”, afirmou.

Um dado deveria favorecer esta mudança. Segundo o mesmo Escritório de Estatísticas, a Alemanha obteve um superávit fiscal de 0,1%, o primeiro desde 2007. Mas o ministro de Finanças alemão, Wolfgang Schauble reafirmou, terça-feira à noite, a posição de austeridade de seu governo.

As duas eurozonas

Desde o estouro da crise da dívida na Grécia em 2010, a zona do euro vem apresentando uma história de realidades paralelas. Enquanto os PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha) afundavam na recessão, a Alemanha, segundo exportador mundial depois da China, crescia graças suas vendas ao exterior. Segundo Marie Dirone, economista sênior da consultora internacional Ernest and Young, os novos dados provam que a Alemanha não pode se desvencilhar do destino de seus vizinhos. “Durante um certo tempo causou assombro a capacidade alemã para resistir à debilidade do sul da Europa com a diversificação de suas exportações para a China e outros mercados emergentes. Está claro que isso tem limites. A Alemanha está sentindo a queda da demanda nos outros países da zona do euro”, assinalou à Carta Maior.

Não chega a surpreender. A metade das exportações alemãs tem como destino os países da zona do euro. O dado se reflete nas estatísticas oficiais. O setor exportador, que representa mais da terça parte do PIB alemão, sofreu uma queda abrupta no último trimestre do ano passado. Esta queda arrastou a zona do euro que terminou 2012 em recessão (dois trimestres consecutivos de contração).

Os novos dados oficiais mostram também que o euro segue sofrendo do desequilíbrio estrutural entre economias muito distintas, o que vem colocando em perigo o projeto da moeda única europeia. Entre Alemanha ou França e Grécia ou Portugal sempre houve um abismo de produtividade e competitividade. Estas diferenças não eram incorrigíveis. No coração do projeto pan-europeu estava a ideia de homogeneizar economias diversas por meio do investimento público nas zonas mais atrasadas.

Mas o euro nasceu em meio à grande festa financeira. Graças à moeda única, os países da periferia, os PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha), tiveram uma taxa de juro muito baixa que financiou bônus de investimento e consumo pagos com um crescente endividamento. O resultado foi que os países do norte europeu exportaram e os do sul consumiram com base em um déficit de conta corrente. O ajuste decidido pelo governo alemão socialdemocrata de Gerhard Schroeder em 2003 aprofundou o desequilíbrio: os salários alemães tiveram uma estagnação relativa aos do Sul que encareceu os produtos que vinham dos PIGS.

O ajuste unidimensional

Segundo uma escola de pensamento, sendo a zona do euro uma unidade, o desequilíbrio não deveria importar tanto: a queda de uma região seria compensada pelo crescimento de outra. Mas o especialista alemão da London School of Economic, Henning Meyer, opina que a unidade da zona do euro é uma ficção sem mecanismos concretos que compensem os desequilíbrios. “A zona do euro não tem transferências fiscais que compensem a queda de uma região. E a política que está sendo impulsionada no conjunto da região é exatamente a contrária a um mecanismo desta natureza. Há um ajuste assimétrico pelo qual os países que têm déficit estão adotando políticas recessivas enquanto que os países que apresentam superávit não estão adotando políticas expansivas”, disse Meyer à Carta Maior.

A chanceler alemã Angela Merkel é a grande papisa da austeridade na zona do euro em meio a uma contração que começa a afetar os interesses do poderoso setor exportador alemão. Estes programas de ajuste, que o jornal espanhol El País batizou como “austericídio”, são uma corda no pescoço que o governo alemão segue apertando. É preciso reconhecer que o fundamentalismo alemão é coerente. Há duas semanas, o ministro de Finanças, Wolfgang Schauble assinalou que a própria Alemanha necessita de um ajuste fiscal.

Isso dependerá muito do que ocorrer com sua economia. O fantasma que começa a rondar entre os analistas é a possibilidade de uma recessão alemã. A este fantasma econômica se somam as eleições de setembro, nas quais a chanceler Merkel tem que renovar seu mandato. “A Alemanha tem vivido em um mundo paralelo no qual a crise da zona do euro era uma coisa que se via pela televisão. Se a economia alemã se deteriorar, isso pode ter um forte impacto no resultado das eleições, na política adotada e no conjunto da eurozona”, disse Meyer à Carta Maior.

Tradução: Katarina Peixoto

UE: SEM UMA FRENTE COMUM CONTRA O DESEMPREGO





Os últimos números são implacáveis: o desemprego atinge números recorde na zona euro, com 11,8% da população ativa sem emprego. Mas até agora, os países europeus continuam incapazes de harmonizar as suas políticas sociais para tentarem sair da crise.


Quatro anos depois do início da crise, a Europa continua a confrontar-se com um mercado de trabalho deprimido. Ainda faltam 2,7 milhões de empregos na zona euro para que se voltem a alcançar os níveis de 2008 e 2,8 milhões a nível da União Europeia. No conjunto da União, o número de desempregados aumentou em oito milhões em quatro anos e a taxa de desemprego passou de 7,1% para 11,8%.

Nem todos os países foram atingidos da mesma maneira. A queda do emprego foi vertiginosa nos países fortemente afetados pela crise financeira e presos num endividamento público excessivo: desde 2008, a Irlanda e a Espanha perderam um posto de trabalho em cada seis, a Grécia perdeu um em cada sete e Portugal um em dez. Fora da zona euro, os países bálticos e a Bulgária também pagaram um pesado tributo. Em contrapartida, a Polónia, a Bélgica, a Alemanha, a Áustria e a Suécia saíram-se bem melhor e ultrapassaram um pouco os níveis de 2008. Entre estes dois grupos, a França está ligeiramente abaixo do nível que tinha antes da crise, segundo os dados do Eurostat.

Como explicar tais divergências? É a política de emprego praticada que faz a diferença e não apenas a intensidade da recessão de 2009. Longe de harmonizar as suas respostas face à crise, os Estados europeus, de facto, escolheram estratégias diferentes. Com mais ou menos sucesso.

Variável de ajustamento

Em alguns países, o ajustamento do emprego ao choque de atividade foi total. Perante a diminuição das encomendas, as empresas cortaram rapidamente o número de funcionários para preservarem as suas margens. Foi o que aconteceu no Reino Unido, onde o mercado de trabalho é muito flexível. Em Espanha e na Dinamarca, o emprego caiu mais do que as encomendas às empresas, o que se traduziu em importantes ganhos de produtividade e num grande aumento do desemprego. São sobretudo os trabalhadores temporários (com contratos a prazo) que servem de variável de ajustamento: os seus contratos não são renovados. Por isso, os países que flexibilizaram mais o mercado de trabalho viram as suas taxas de desemprego subir mais rapidamente.

Nos outros países, pelo contrário, o ajustamento no emprego foi apenas parcial. Perante a diminuição da procura, as empresas preferiram diminuir o número de horas de trabalho ou a remuneração dos seus funcionários, em vez de os despedirem. Esta estratégia foi sobretudo utilizada na Alemanha, na Bélgica e em Itália, graças a um recurso intensivo ao desemprego parcial. Foi também este o caso, numa escala menor, em França. Perante uma diminuição de atividade, os esforços são, assim, partilhados entre todos os funcionários de uma mesma empresa, em vez de serem essencialmente suportados por aqueles que são despedidos.

Também foram postos em prática outros tipos de políticas. Na Áustria, por exemplo, optou-se por subsidiar até ao início de 2011 os postos de trabalho pouco ou nada qualificados. De facto, são geralmente os trabalhadores com fracas qualificações os primeiros a serem sacrificados. A Hungria, a Eslováquia, o Reino Unido, a Finlândia, a Suécia, a França e a Espanha também apoiaram a procura de trabalho, para incentivar a contratação de jovens, seniores e trabalhadores pouco qualificados, mas de modo mais tímido e com resultados mitigados.

Quebra-cabeças à escala europeia

Pelo contrário, o recurso aos empregos subsidiados, financiados em grande parte com dinheiros públicos, tem sido limitado. Na União Europeia, o número destes postos de trabalho diminuiu 15% entre 2007 e 2009. Finalmente, a formação profissional foi o instrumento mais largamente utilizado. Mas, para além deste relativo consenso em torno da formação, a crise não serviu como uma ocasião para criar políticas sociais na Europa. Alguns Estados continuam adeptos do laisser-faire [deixa andar], enquanto outros são muito interventivos. Em 2010, as despesas com políticas de emprego variaram entre 0,7% do produto interno bruto (PIB) no Reino Unido, a 3,9% em Espanha, passando por 2,3% na Alemanha, 2,,5% em França, 3,4% na Dinamarca e ainda 3,8% na Bélgica.

Num tal contexto, a ideia defendida pela França e estudada pela Comissão de instituir um sistema de seguro de desemprego à escala europeia é um quebra-cabeças. Porque em matéria de subsídio de desemprego, o panorama também é uma cacofonia. As regras são diferentes de país para país e os sistemas mais ou menos generosos.

Mesmo que um regime europeu de seguro de desemprego não substituísse os sistemas nacionais, mas funcionasse sobretudo como uma prestação base complementada depois por cada um dos países, a harmonização necessária no plano da cobertura e condições de acesso seria muito difícil. Para mais, confrontados com grandes limitações orçamentais, recentemente, a maior parte dos Estados reformou os seus sistemas de subsídio de desemprego num sentido pouco vantajoso para os desempregados.

Um caminho menos social

Assim, em 2010, a Dinamarca diminuiu a duração do subsídio de desemprego de quatro para três anos. A França fez o mesmo em 2002, reduzindo a duração desse subsídio de três para dois anos. Em Espanha, houve uma redução de 10% do valor do subsídio a partir do sétimo mês. Em Portugal, diminuiu o valor máximo do subsídio, o montante é agora degressivo e a própria duração do subsídio também foi encurtada. Só a Bélgica, em contracorrente, aumentou o montante da prestação e facilitou o acesso dos jovens ao subsídio de desemprego.

Os países europeus estão a dirigir-se para um caminho menos social. No entanto, os sistemas de subsídio de desemprego têm um interesse económico e não apenas social. Sem esse amortecedor, a crise teria feito muito mais estragos. Mesmo a OCDE acabou por o reconhecer. Desfazer essa rede de segurança enquanto a Europa ainda não saiu das dificuldades é correr o risco de nos afundarmos ainda mais no marasmo económico.

Traduzido por Maria João Vieira

COMPRAR UMA ARMA DE FOGO NOS EUA É FÁCIL E RÁPIDO




Deutsche Welle

A regra se confirma: em vez de intimidar, massacre de Newtown incentiva norte-americanos a comprar ainda mais armas. Repórter da DW vai às lojas e confere a simplicidade do procedimento.

"Ah, leve uma Glock 9mm", aconselha, simpático, o rapaz louro do meu lado, "ela atravessa paredes, portas, praticamente qualquer coisa". E acrescenta, prestativo: "Depende um pouco do tamanho da sua mão" – ambos olhamos para minha mão esticada – "mas com uma Glock, não tem erro".

Assim como eu, o jovem, que calculo ter em torno de 20 anos, encontra-se na fila de compradores de uma loja de armamentos na Virgínia. Ele me conta que está procurando uma pistola bem específica, por isso já esteve aqui na semana passada. "Mas eles estavam com o estoque praticamente esgotado."

A loja, ao sul da capital norte-americana Washington DC, abriu há uns 20 minutos, mas os três vendedores mal dão conta da grande afluência de fregueses. Segundo as estatísticas, nove entre dez norte-americanos possuem uma arma de fogo, e continuam comprando mais. Quantas armas trocam de proprietário, de fato, ninguém sabe, pois em muitos casos não é necessária qualquer formalidade.

Como se fosse uma bicicleta

Porém, quão fácil é, realmente, comprar uma pistola nos Estados Unidos? A alternativa mais simples é uma feira de armas de fogo, as populares gun shows. Aqui não há qualquer tipo de verificação de antecedentes nem se fazem perguntas. Tanto negociantes quanto particulares podem colocar à venda suas pistolas e espingardas.

Uma outra possibilidade é a internet. Mas, para mim, como compradora de primeira viagem, acho muito arriscado. Quem é que vai querer dar suas informações pessoais a um site anônimo? Para me informar o mínimo sobre o tema, encontro-me com um conhecido, "John" – que prefere não ter seu nome verdadeiro publicado.

Ele cresceu num lugarejo do estado da Virgínia, onde, como relata, as armas de fogo faziam parte do cotidiano. "Eu tinha uns 9 anos quando atirei pela primeira vez." Aos 18 anos, comprou sua primeira espingarda, uma Winchester. Atualmente, ele possui diversas armas. John insiste nas formalidades, ao vender ou comprá-las, embora isso não seja obrigatório em seu estado.

Quem lá reside pode vender uma arma a outros cidadãos da Virgínia como se fosse uma bicicleta, sem checagem de antecedentes, sem documentos. John não concorda com isso. "Se eu não possuo mais a arma, isso deve estar documentado, para que eu não seja mais responsável por ela", diz, pois quem sabe o que o comprador terá feito, em dez anos.

Sem tempo para jornalistas

Quando se compra uma arma numa loja da Virgínia, a checagem de antecedentes transcorre rapidamente, conta John. Caso nada conste, dentro de duas ou três horas o comprador já pode levar o objeto consigo, pelo menos no caso de uma pistola ou de um fuzil semiautomático.

Decido ir diretamente a uma loja, alguns dias mais tarde, porém no estado de Maryland, onde estou registrada. Já no primeiro estabelecimento que visito pela manhã, o movimento é grande. Ele se situa numa rua comercial típica, entre um restaurante taiwanês e uma loja de animais.

Chega a minha vez. Eu me identifico como jornalista que gostaria de saber se e como se pode comprar uma arma. "Hum, deixe ver se eu posso falar com a senhora", diz o vendedor, e desaparece num aposento adjacente. Pouco mais tarde, o gerente me comunica que devo me dirigir ao assessor de imprensa. Este se encontra numa outra loja e infelizmente não tem tempo para falar comigo.

Caminho aberto a calouros

Vou a outra loja de armamentos em Maryland, mais para o leste da cidade. Também aqui o movimento é intenso, pouco após a abertura. Desta vez, sou simplesmente uma cliente.

"Como posso ajudá-la?", me interpela, gentil, a vendedora. "Antes de mais nada, tenho uma série de perguntas", replico. "Primeira vez?", pergunta, e quando faço que sim, ela prossegue: "Sem problema, meu colega pode ajudá-la, temos muita gente que compra uma arma pela primeira vez, homens e mulheres."

Seu colega, que acaba de atender uma senhora de meia idade, aponta para um cartaz. "Então primeiro a senhora tem que ir a este site e fazer o curso. No fim, recebe um certificado, que traz aqui, e eu posso lhe vender uma arma."

Eu quero saber: "Eu moro em Maryland, mas não sou norte-americana. Posso comprar uma pistola, mesmo assim?" "Tem o green card?", ele pergunta. Eu digo sim, que possuo o visto oficial de trabalho e permanência. "Então não tem problema", é a resposta.

"Curso" de meia hora

Ninguém vê qualquer problema em me vender uma arma, embora esteja claro que eu não tenha a menor noção de como lidar com uma. Ainda pergunto quanto dinheiro vou precisar investir. "De 300 a 600 dólares", é a resposta.

Vou para casa e me sento diante do computador. No site da polícia de Maryland, fico sabendo que o "curso de segurança para armas de fogo" dura cerca de 30 minutos.

Digito meu nome, data de nascimento e número de carteira de motorista e vou clicando adiante. Aprendo algo sobre os diferentes tipos de revólver, sou instada a guardar separadas a arma e a munição e, se possível, a manter a arma num cofre.

Pergunto-me: então como é que vou estar a postos, à noite, quando vier o gângster de máscara de esqui, contra o qual os sites das lojas de armamentos tanto me alertam?

Dentro de 30 minutos, de fato, terminei o curso online, e como prova posso imprimir o certificado. Parte dele devo enviar de volta para a polícia. E aí não há mais nada que me impeça de comprar a minha primeira pistola.

Agora, só falta comprar

Falta ainda o comerciante realizar uma checagem de antecedentes, ou seja, enviar meus dados pessoais para a polícia. "Normalmente demora sete dias", ele me avisara, "mas eles estão tão atrasados que a senhora precisa contar com duas ou três semanas".

No fim do dia, ainda vou até aquela loja na Virgínia, onde espero quase três quartos de hora até ser atendida. Quero saber se também posso comprar uma pistola aqui, onde tudo é mais simples e rápido?

O vendedor esclarece: "A senhora pode comprar aqui, mas teríamos que enviar a arma para um comerciante em Maryland, para a senhora a receber lá e completar as formalidades. Só que estamos com tanto trabalho que no momento não fazemos isso, lamento".

Eu agradeço e saio da loja. Agora, eu poderia ir até o negociante em Maryland, escolher uma pistola e, em duas a três semanas, simplesmente levá-la para casa comigo. Uma perspectiva que não me deixa especialmente à vontade.

Autoria: Christina Bergmann (av) - Revisão: Alexandre Schossler

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