segunda-feira, 21 de agosto de 2023

ÁFRICA PARA OS AFRICANOS -- Patrick Lawrence

As animosidades contra os franceses no exterior entre os nigerianos foram amplamente divulgadas. Mas a história é apenas parte da história, e não a maior parte. Aqueles que lideraram o golpe no Níger estão olhando para frente, não para trás.

Patrick Lawrence* | Original para ScheerPost | Consortium News | #Traduzido em português do Brasil

C omo devemos entender o golpe de 26 de julho no  Níger, no qual oficiais militares derrubaram Mohamed Bazoum, o presidente da nação de inclinação ocidental? É o sexto golpe deste tipo no Sahel ou próximo dele nos últimos quatro anos. Devemos descartar esta banda na África subsaariana como um país golpista e não nos preocupar mais com isso? O pensamento está implícito em grande parte da cobertura da mídia, mas com que frequência nossa mídia se dedica a aprimorar nossa compreensão dos eventos globais e com que frequência cultiva nossa ignorância sobre eles?

Não tome este último desenvolvimento na África como um evento isolado, se me permite uma sugestão. Seu significado reside no contexto mais amplo em que ocorreu – seu entorno global, por assim dizer. O Ocidente está sitiado pela coerência e influência acumuladas do não-Ocidente e sua versão do século XXI  . Sua mídia não suporta escrever ou transmitir sobre isso. O Níger, na minha leitura, acaba de se declarar parte desse fenômeno histórico. E a grande mídia também não suporta mencionar isso.   

Aqueles que depuseram Bazoum são liderados por Abdourahamane Tchiani, ex-chefe da Guarda Presidencial, e nutrem um profundo ressentimento pela presença pós-colonial dos franceses. Também há relatos - na mídia, aqueles que saem dos think tanks - de que Bazoum estava prestes a demitir Tchiani, e os eventos do final de julho foram motivados, principalmente ou principalmente, por rivalidades pessoais, ressentimentos ou ambos. 

Todos relataram, de uma forma ou de outra e mais ou menos bem, sobre as animosidades contra os franceses no exterior entre os nigerianos. Tais sentimentos são evidentes em muitas partes da África francófona. O passado é outro país, nigerianos, malianos e outros parecem dizer: este é o século XXI ,  não o XIX . 

Mas a história é apenas parte da história, e eu diria que não é a maior parte. Não devemos dar muita importância à história ou à memória neste caso: os que lideraram o golpe estão olhando para frente, não para trás. E sugerir que o golpe de deposição de Bazoum foi uma questão de política palaciana, seja ela qual for, equivale a servir a salada como prato principal. Não, temos que pensar mais se quisermos compreender a nova realidade que está se formando no Níger e em outros lugares em sua vizinhança. 

Tchiani e os seus apoiantes, que parecem ser muitos nas forças armadas e nas ruas de Niamey, a capital, têm o Ocidente tal como está agora em primeiro lugar nas suas mentes, na minha opinião. Se eles estão fartos dos franceses, neste ponto eles são descaradamente claros de que também não querem mais do que os EUA têm a oferecer nas últimas duas décadas e alguns: uma presença militar desajeitada e ineficaz e ortodoxias econômicas neoliberais. Como no Mali e em outros lugares da região, o Níger agora parece se inclinar em uma direção distintamente não ocidental.

O golpe do mês passado, em outras palavras, soa para mim como um anúncio de que o Níger está pronto para se alistar na causa da “nova ordem mundial” sobre a qual os chineses têm falado cada vez mais publicamente nos últimos dois anos – desde, de fato, o regime de Biden alienou Pequim meses depois de assumir o cargo em 2021. Isso coloca o golpe que derrubou Bazoum em um contexto mais amplo, onde acho que deveria estar. 

Isso significa que os EUA agora se encontrarão em uma competição crescente com a China e a Rússia pela influência em todo o continente africano. A menos que altere o curso de forma muito importante - e as panelinhas políticas em Washington não têm o dom de alterar o curso, se você não percebeu - a América quase certamente será a perdedora nessa rivalidade, se é assim que devemos chamá-la. Os EUA, e neste caso os franceses, estão simplesmente mal equipados. É uma questão de tecnologias apropriadas: os americanos chegam à África com armas, assistência militar e interesses geopolíticos; os chineses e os russos chegam com interesses próprios, sim, mas também com ajuda econômica, fluxos comerciais e projetos de desenvolvimento industrial. 

Durante muito tempo, os nigerianos tiveram pouca escolha a não ser aceitar formas de neocolonialismo como herança, legado da história. A marca do nosso tempo é que essas nações agora têm escolhas viáveis ​​e, finalmente, são capazes de fazê-las em seu próprio interesse. Enquanto escrevia este comentário, Chas Freeman, o distinto diplomata,  gravou um webcast  no qual argumentava que a Ásia Ocidental - como devemos aprender a chamar o Oriente Médio - está destinada a definir seu próprio futuro, agora que a hegemonia dos EUA é coisa de o passado. Há muito disso por aí, digamos: os nigerianos acabaram de anunciar que daqui em diante é a África para os africanos.

Angola | Amplo e Invencível Movimento em Perda – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Pela primeira vez desde 10 de Dezembro de 1956 as forças libertadoras perdem espaço e influência em Angola. Uma vaga de extremismo de direita abateu-se sobre o país à boleia da crise financeira exportada pelo estado terrorista mais perigoso do mundo, em 24 de Julho de 2007.Grandes bancos mundiais foram à falência. Apesar da tragédia, o MPLA esmagava nas eleições de 2008 com 81,64 por cento dos votos enquanto o partido que lidera a Oposição (UNITA) registou pouco mais de dez por cento.

O Presidente José Eduardo dos Santos na mensagem sobre o Estado da Nação de 2008 lembrou que “o MPLA é um partido de esquerda. Somos socialistas”. E de vez em quando repetia a mensagem. Só após as eleições de 2017 percebi o alerta. Nada de grave porque sou apenas um repórter a cair da tripeça. Gravíssimo foi a direcção do partido ter permitido que os cucos pusessem seus ovos no ninho feito pelos combatentes da liberdade. Hoje o mundo é varrido por uma onde irrefragável de extremismos da direita. Até a Suécia, pátria da social-democracia e onde o poder era suportado pela força dos sindicatos, hoje tem um governo de extrema-direita.

Após as eleições de 2022 (apenas há um ano) o rumo do partido que ganhou as eleições com maioria absoluta vai no sentido do culto da personalidade. As políticas sociais desapareceram e foram substituídas pela caridadezinha. A propaganda mostra uma pobre camponesa agradecendo ao Presidente João Lourenço 30.000 Kwanzas do Kwenda. O neoliberalismo está implantado de pedra e cal com uma ministra das Finanças que parece uma montra ambulante de trançados.

 O pensamento único ganha força, os órgãos de soberania submeteram-se à Presidência da República e é o chefe que decide quem pode ser rico. Quem pode ficar com os seus “activos” e quem fica sem nada. No auge do “combate à corrupção” o Chefe de Estado disse que “vão todos para a cadeia!” como se estivesse numa roda de amigos. Os jornalistas já se esqueceram que o Jornalismo é um exercício permanente de grande rigor e só é possível numa lógica de contra poder.

Ninguém se sobressaltou. Neste momento os libertadores da Pátria são simplesmente ignorados e os Generais que ganharam a guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial são abandalhados. O Estado Sou Eu! Neste quadro os sicários da UNITA fazem muito jeito. São o inimigo que é preciso combater enquanto o absolutismo, às cavalitas do neoliberalismo, se instala a todos os níveis e desfila nos Media.

Angola | Coroa do Rei e a Metro Europa – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Na minha juventude corria uma tirada filosófica que muito me ajudou a sobreviver à discriminação e exclusão. Era assim: Viver Não Custa. O que Custa É Saber Viver. Tentei aprender todos os truques, todos os golpes, todas as manhas para saber viver. Confesso que falhei redondamente. Nem cheguei aos calcanhares dos ricaços. Ainda se conseguisse chegar às unhas dos pés dos seus serventes… Nem isso!

Um dia perdi-me de amores por uma menina filha de um ricaço que arrotava postas de lagosta e tinha bafo de uísque da minha idade. Naquele tempo as festas mais finas corriam no salão do Aeroclube de Angola. Estávamos no Carnaval e minha amada queria muito que eu fosse, para dançarmos agarradinhos e segredarmos juras de amor. 

Problema. A organização exigia aos convivas “traje de fantasia”. Viver não custa. A minha amiga Raquel era uma barra em trabalhos manuais e fez-me uma coroa de cartolina que pintou com aguarela dourada. Eu fui à farra, disfarçado de Rei Artur. Coroa na cabeça, camisa fardex, calças de bombazina largonas (as medidas dos fardos não eram para mim) e quedes (sapatilha macambira). Fui barrado à entrada por um armário que falava axim, tinha bigodaça e muitos pelos nos braços. Perdido por cem, perdido por mil.

Dei uma de diplomata e disse ao matulão que tinha um encontro marcado com a minha amada e se falhasse seria infeliz para sempre. Ele não se comoveu e eu parti para a porrada. Outros que foram barrados solidarizaram-se com bornos e bicos. O guardião ficou estendido no chão. Entrámos calmamente, mas por pouco tempo, a polícia entrou em acção. O próprio pai da minha amada era da direcção do Aeroclube de Angola e quando meu viu, desencasacado e com coroa na cabeça, apontou-me aos polícias. Passei a noite na cela da esquadra do chefe Aires (também era aviador) na Vila Clotilde. Ninguém respeitou o Rei Artur e a minha amada, de castigo, foi estudar para Londres.

Viver não custa nada, mas custa saber viver. Falhei sempre. Mas não estou só. Um pasquim infecto controlado pela Irmandade Africâner publicou um texto asqueroso onde revela que o “Presidente da Republica retira filha Jéssica dos negócios familiares”. A peça é ilustrada com uma foto de João Lourenço com a menina Jéssica ao lado. No alto da graciosa cabeça ela tem uma coroa dourada. Também não lhe serviu de nada, isto se é verdade o que foi publicado.

Angola | A CANÇÃO DO BANDIDO – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A Fatinha era mesmo muito bonita. Vivia numa zona belíssima, colina iluminada donde se via o verde exuberante da Kapopa. O sonho dela era ir para Luanda e viver no mar. Cresceu com o sonho e o sonho cresceu com ela. Um dia, estava eu no colégio do Uíje, partiu à boleia de um camionista que vendia peixe seco da candonga, sem selo do grémio. Nessas férias grandes também fui à capital com meu Pai. Ficámos no hotel Paris, nos Coqueiros. Como tinha combina, fui à procura dos sinais que ela me deixou. Encontrei-a no Bairro Operário, com uma barriga empinada de tanta gravidez. O que foi isto Fatinha? Um aí me cantou a canção do bandido e me engravidei…

A UNITA também está a entoar a canção do bandido. Entre distraídos e indecisos alguém vai engravidar. Depois só lhes resta a vida desprevenida como aconteceu com a bela Fatinha. A vida continua e no percurso pode acontecer que Adalberto da Costa Júnior seja acusado de tráfico de droga, Chivukuvuku de abuso sexual de menores e Filomeno Vieira Lopes internado por demência senil. Vai fazer companhia ao Justino Pinto de Andrade.

O Kid Kindumba tinha a mania que era o rei das forças. Um dia houve um concurso no Ginásio de São Paulo. Depois de vários exercícios que consistiam em levantar pesos cada vez mais pesados, os concorrentes foram chamados a dobrar uma barra de ferro. O Ninito conseguiu uma ligeira dobragem. O Adriano foi um pouco mais longe. O forçudo da Vila Alice, Avelino ou Tractor, dobrou ainda mais. Quase um arco. O Taúta começou e dois minutos depois atirou com a barra ao chão, intacta. Até que subiu ao estrado o Kid Kindumba. Pegou na barra pelas extremidades, levou-a à coxa e fez toda a força. Soltou um guincho de dor e berrou: Já está! Está o quê, ó vigarista? Uma perna partida…

A UNITA é ainda mais vigarista do que o Kid Kindumba. Isso do processo de destituição do Presidente da República é uma barra de ferro pesadíssima. Os dirigentes do partido ao tentarem dobrá-la, partem as pernas, os braços e até partiam a cabeça, se tivessem mais do que tronco e membros. Uma canção do bandido que não passa de propaganda. Para disfarçarem a fraqueza, Adalberto, Chivukuvuku e o maoista convertido às fogueiras da Jamba (Filomeno Vieira Lopes) dizem que o processo é desencadeado pelos deputados da Nação.

Chivukuvuku só conta porque é “coordenador” de um projecto político que não passa disso. É vice-presidente da Frente Patriótica Unida que só existe na cabeça destes vigaristas irremediáveis. Em 2027 fica tudo resolvido. Porque os sicários da UNITA não vão admitir veleidades e não há “frente” oficial. O assassino a soldo de Savimbi ou regressa às fileiras da UNITA ou vai gozar os rendimentos de marimbondo.

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