sábado, 28 de março de 2015

Portugal. “TEMOS COFRES CHEIOS”



Ricardo Cabral – Público, opinião

Ministra das Finanças de um país com dívida de 128,7% do PIB congratula-se ao anunciar, num evento partidário, que “temos cofres cheios”.

De facto, a almofada financeira do Estado – que Viriato Soromenho Marques, eloquentemente, designa por “almofada de pedra” – para a qual, note-se, não existe enquadramento legal, somava, no final de Janeiro de 2015, perto de 24 mil milhões de euros. Desse montante, 15,3 mil milhões de euros estavam depositados junto do Banco de Portugal. O restante, de acordo com a imprensa, encontra-se depositado junto da banca comercial.

A Ministra das Finanças é adepta da disciplina orçamental e do “cumprir as regras” europeias. Mas estará consciente de que, ao permitir a constituição de uma almofada financeira de 24 mil milhões de euros, não está a cumprir as regras – a lei e, em particular, o artigo 161º a Constituição Portuguesa – que atribui tais competências, não ao Ministro das Finanças nem ao Governo, mas à Assembleia da República?

E quanto à disciplina orçamental, não saberá a Ministra que uma almofada financeira sem regras pode propiciar (e já propiciou) o despesismo público?

Mesmo às baixas taxas de juro actuais, a despesa com juros dessa almofada financeira que, em média em 2014, foi de 21 mil milhões de euros, deverá ser de 500 milhões de euros em 2015, no melhor dos casos.

Sem o “investimento” público no Novo Banco, a almofada financeira seria, em Janeiro do corrente ano, de 28 mil milhões de euros, quando o Presidente da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) afirmava, a 2 de Abril de 2014, no Parlamento, que o valor previsto para a almofada financeira era de 7 mil milhões de euros mas que poderia “fazer sentido”  que atingisse os 10 mil milhões de euros em 2014. A almofada financeira esteve, porém, sempre substancialmente acima desses montantes tendo sido, em média, de 21 mil milhões de euros em 2014[1]. Meros desvios de mais de 100% em relação aos planos?

Quem decide alterações de tal magnitude face aos planos anunciados perante a Assembleia da República? Só  o Ministro das Finanças e o IGCP? É que esse dinheiro tem custos – despesas com juros e menos valias de operações de troca de dívida –.

O desvio na dimensão da almofada financeira em relação ao afirmado no Parlamento por Moreira Rato (à data Presidente do IGCP), deverá custar aos cofres do Estado em 2015, na melhor das hipóteses, cerca de 250 milhões de euros, a que acrescem os prejuízos das operações de troca realizadas[2]. A dimensão das perdas registadas pelo erário público, em 2014 e já em 2015, nestes dois tipos de operações financeiras é muito significativa!

Não está em causa a diligência, boa-fé e sentido de missão dos funcionários e responsáveis do IGCP. Mas a competência para tomar tais decisões – nomeadamente porque, como já acima referido, envolvem despesa pública[3] – cabe à Assembleia da República, nos termos do artigo 161º da Constituição e devem ser enquadradas pela Lei Quadro da Dívida Pública e pela Lei do Orçamento de Estado.

Se as “opções financeiras” do IGCP estiverem erradas – e, à luz da evolução das taxas de juro nos últimos quase 30 meses, todas as operações de troca de dívida realizadas desde 3 de Outubro de 2012, bem como todas as emissões de dívida subjacentes ao desvio na dimensão da almofada financeira parecem estar – sobre quem vai recair a responsabilidade?

A almofada financeira pode ser relevante em contexto de crise nos mercados, mas a definição da sua dimensão não cabe nem ao IGCP nem ao Ministro das Finanças.

A Ministra das Finanças deveria impor regras e controlo a este (actualmente muito significativo) item da despesa pública – a despesa com juros da almofada financeira e as menos valias das operações de gestão de dívida correspondentes –, submetendo proposta(s) de lei(s) à aprovação da Assembleia da República.

Nessa situação, a responsabilidade por despesa com juros da almofada financeira e pelas eventuais menos valias deixaria de ser dos responsáveis do IGCP e/ou do Ministro das Finanças e passaria a ser da Lei e da Assembleia da República… como decorre da Constituição!

[1] Média mensal. Inclui cerca de 2 mil milhões de euros que a Administração Central deposita directamente junto da banca comercial e que por conseguinte não estarão sob a gestão do IGCP.
[2] Uma dessas operações de troca no valor de 1,03 mil milhões de euros, realizada em Fevereiro de 2014, resultou, logo de início, num acréscimo de despesa pública de 40 milhões de euros por ano até Outubro de 2015. Essas menos valias agravaram-se com a descida das taxas de juro que ocorreu desde essa data.
Outro exemplo, a operação de pagamento antecipado de 6,5 mil milhões de euros de dívida ao FMI, realizada em Março de 2015, também poderá vir a resultar em prejuízos para o erário público muito significativos, se o euro se vier a valorizar até à data da maturidade original dos empréstimos. Concretamente, se o euro se valorizar para a taxa de câmbio registada há um ano atrás (24.3.2014), as menos valias seriam de cerca de 870 milhões de euros.
[3] Com juros da almofada financeira e com menos valias.

Em Tudo Menos Economia, com Bagão Félix, Francisco Louçã e Ricardo Cabral

Portugal. CGTP LAMENTA “AS BARRIGAS VAZIAS” DOS TRABALHADORES




Centenas de jovens saíram, este sábado à tarde, da Praça da Figueira em direção ao Largo Camões, em Lisboa, num protesto pela defesa dos seus direitos laborais.

"Uma coisa são os bolsos cheios, outra coisa são as barrigas vazias", disse Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, em declarações à Lusa na Praça da Figueira, em Lisboa, de onde partiu a marcha nacional "Juventude em Marcha: Trabalho com Direitos, contra a Precariedade e a Exploração", organizada pela Interjovem/CGTP-in.

O dirigente sindical explicou que se juntou aos jovens que estão a marchar pelos seus direitos laborais para dizer ao Governo que "chega de precariedade" e para lutar contra "a degradação da qualidade do emprego".

O dirigente sindical afirmou que "a ministra das Finanças pode estar muito satisfeita por ter dinheiro para pagar aos credores com juros usurários", mas defendeu que "a esmagadora maioria do povo não está melhor".

Para o secretário-geral da CGTP, basta olhar para os que "não têm emprego ou estão em subocupação", para os que estão em "situações de insegurança e de instabilidade permanente" e para "os trabalhadores licenciados cujas ofertas do Instituto do Emprego e Formação Profissional apontam para salários de 560 euros ilíquidos".

Arménio Carlos disse que, ao longo desta semana em que a Interjovem esteve em todos os distritos do país a realizar ações informativas, verificou-se que "há um grande consenso" no sentido de "combater esta chaga do século XXI, que é a precariedade", considerando que se trata de um problema que afeta toda a sociedade.

"Não há nenhuma família em Portugal que não tenha alguém que esteja desempregado ou que esteja numa situação de precariedade. Este é um problema que deixou de ser apenas dos jovens, é de toda a sociedade portuguesa e, por isso mesmo, implica uma solidariedade intergeracional ativa", defendeu o secretário-geral da CGTP-IN.

Arménio Carlos, que marchou ao lado dos jovens da Intersindical desde a Praça da Figueira até ao Largo Camões, fez uma intervenção nesta praça lisboeta já no encerramento do protesto, em que apelou à participação de todos na manifestação do 1 de Maio, o Dia do Trabalhador.

Também presente na manifestação esteve a deputada do PCP Rita Rato, que disse à Lusa que o seu partido vai apresentar na Assembleia da República "um pacote de medidas" de combate à precariedade laboral "na próxima semana".

Rita Rato afirmou que, entre outras medidas, o PCP vai propor "reduzir a capacidade de contratação a termo quando se trata de necessidades permanentes" por parte do empregador, bem como "a proibição do recurso a um estágio cada vez que [está em causa] uma necessidade permanente para ser suprida".

Algumas centenas de pessoas, sobretudo jovens, saíram da Praça da Figueira em direção ao Largo Camões, em Lisboa, num protesto pela defesa dos seus direitos laborais que encerra uma semana de ações da Interjovem organizada em várias cidades do país.

Jornal de Notícias - Foto: Mário Cruz / Lusa

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LEI FRANCESA SOBRE INFORMAÇÃO PREOCUPA LIGA DE DIREITOS HUMANOS




Na França, uma nova lei de segurança nacional, com o pretexto de proteger o país do terrorismo, pode também hipotecar liberdades individuais.

Leneide Duarte-Plon, de Paris – Carta Maior

Ao revelar, em junho de 2013, a mega-espionagem feita sistematicamente pela National Security Agency (NSA) sobre cidadãos americanos e chefes de Estado (inclusive de países aliados dos Estados Unidos), o ex-agente da NSA Edward Snowden criou um enorme problema para o governo Obama. A presidente Dilma Rousseff cancelou sua viagem oficial a Washington, Angela Merkel e os alemães pediram explicações. O mundo descobria a extensão dos tentaculares serviços de informação americanos.  

Desde o 11 de setembro as leis liberticidas do governo Bush fabricaram um « big brother » que lê mensagens privadas e escuta conversações telefônicas de todo mundo, a pretexto de garantir a segurança do país. A espionagem dos cidadãos é realizada em nome da famosa « segurança nacional » que está gravada no próprio nome da agência americana. Foi a mesma segurança nacional que serviu de doutrina a ditaduras sul-americanas que instalaram o terror de Estado nas décadas 1960 e 1970, prendendo, torturando e matando seus próprios cidadãos, em guerras civis que não se assumiam como tal. Nos Estados Unidos pós-11 de setembro, o famigerado « Patriot Act » foi a lei que melhor encarnou essa supervalorização dos serviços de informação em detrimento das liberdades do cidadão americano.

Depois da revelação de milhares de documentos através de jornalistas como o americano Glenn Greenwald, Edward Snowden tornou-se imediatamente o « inimigo número 1 » do governo de Obama, que fez tudo para levá-los aos tribunais como traidor. Acontece que no mundo inteiro, Snowden é considerado por muitos militantes dos direitos humanos como um herói e sua causa encontrou apoio em grupos que o ajudaram a se asilar na Rússia, onde vive hoje. Sua saga resultou no excelente filme « Citizenfour », da ativista Laura Poitras, Oscar de melhor filme documentário este ano. A história de Snowden supera em audácia e suspense qualquer romance policial imaginado pelo mais criativo autor.

Agora, os franceses querem dotar seus seis serviços de informação de uma nova lei, cujo projeto foi aprovado no Conselho de ministros no dia 19 de março. Acontece que a pretexto de proteger o país do terrorismo, a nova lei pode também hipotecar liberdades individuais. Essa discussão ocupou um grande espaço da mídia francesa na semana passada e vai continuar nos debates para a votação da lei no Parlamento. Há quem pense, como o presidente da Liga dos Direitos Humanos, Pierre Tartakowsky, que a lei sobre a informação « é muito vasta, vaga e intrusiva ».

Para o primeiro-ministro Manuel Valls, trata-se de « dar aos serviços de informação franceses meios à altura dos novos desafios  que a França enfrenta ». Ele chegou a garantir que não será feito nenhum controle massivo dos cidadãos. Mas a preocupação de muitos é justamente evitar um « Patriot Act à la française ».

Os críticos da lei francesa que vai ser votada dizem que, contrariamente ao que se passa atualmente, simples autorizações administrativas serão suficientes para promover escutas e espionagem eletrônica. O respeitado advogado William Bourdon, presidente do Sherpa, entidade que combate a criminalidade financeira e econômica, reconhece a necessidade de adaptar a legislação em face da ameaça do terrorismo contemporâneo. Mas em grande artigo no « Le Monde » ele se disse preocupado com um texto que “apresenta graves erosões de nossas liberdades públicas ».  Ele escreveu : « Quando uma democracia cede aos serviços de informação, estes não devolvem o que ela lhes deu ».

Ele informa que entre juízes isentos e insuspeitos há o temor que os poderes excessivos cedidos aos serviços de informação em diversos campos seja um grande risco, já que tudo sairá do rígido contrle dos juízes, como é atualmente. Segundo Bourdon, mesmo nos Estados Unidos o texto do projeto de lei francês foi considerado não muito longe das disposições estabelecidas pelo « Patriot Act » de outubro de 2001. Na prática, essa lei americana autoriza os serviços de segurança a terem acesso a dados informáticos detidos por particulares e por empresas sem autorização prévia e sem informar os utilizadores.

A Comissão Nacional da Informática e das Liberdades (Comission Nationale de l’Informatique et des libertés-CNIL) mostrou-se bastante crítica quanto ao texto que vai ser discutido. Segundo ela, os serviços de segurança poderão inclusive requerer dados de telefonemas e SMS diretamente das operadoras. Nesse sentido, a Comissão expressou sua preocupação quanto a algumas categorias profissionais como médicos, advogados e jornalistas que não são suficientemente protegidos pelo texto quando ele se refere aos dados informáticos.

Por outro lado, o texto do projeto de lei visa também, segundo comentaristas, a enquadrar de certa forma os serviços de informação que já realizavam ilegalmente algumas das ações que que se tornarão legais. Mas isso não é um argumento que convence pois se trata apenas de legalizar a intromissão dos agentes secretos do Estado na vida dos cidadãos, restringindo cada vez mais o espaço privado

«Os cidadãos devem por todos os meios tentar pesar para restaurar um equilíbrio que deveria ser o da tradição francesa », recomenda William Bourdon.  

Créditos da foto: Steve Jurvetson / Flickr

ALGUMAS LIÇÕES GREGAS PARA BOM ENTENDEDOR, SEM MEIAS PALAVRAS




Ou o governo grego continua a apresentar listas de novas medidas, que serão sempre criticadas por Berlim, ou prepara um referendo para medidas excepcionais

Francisco Louça – Carta Maior

Circula na internet esta notável comparação entre duas fotos dos primeiros-ministros da Alemanha e da Grécia na capa de jornais de referência, o Financial Times e o Frankfurter Allgemeine Zeitung: há fracções de segundo entre uma e outra e vejam a diferença que isso faz, Merkel está como é mas Tsipras aparece desconfiado numa e descontraído noutra. O olhar, que será o espelho da alma, muda tudo. A escolha editorial é aliás reveladora da abordagem de cada um dos jornais: o diário alemão apresentou a reunião como um alívio da tensão entre o dois governos, o diário britânico continua a insistir em que não há solução europeia se a economia grega continuar a ser destruída.

Os dias das listas

Os dois olhares serão também reveladores de uma tensão crescente. Na carta que Tsipras enviou a Merkel uns dias antes do mini-congresso em Bruxelas e do encontro de Berlim, a razão é explicada em detalhe: a Grécia já não tem dinheiro e aproxima-se do risco de incumprimento, não tendo até agora conseguido uma solução negociada com a União Europeia. O encontro de Berlim deixou tudo na mesma.

Em artigo anterior, analisei as condições do acordo de 20 de fevereiro. Como agora é ainda mais evidente, desde então o tempo correu contra os gregos. Esse acordo permitiu algum recuo da tensão imediata (no dia 1 de março não foi aumentado o IVA nem reduzidas as pensões, como o governo da direita e do partido socialista tinham previsto), mas prometeu vantagens que não podia cumprir (suspender a austeridade e permitir o início da recuperação econômica) ou que foram imediatamente congeladas (melhorar a liquidez do sistema bancário e permitir-lhe comprar dívida pública de curto prazo). O que se iniciou foi uma guerra de manobras e de pressões em que a Grécia tem ficado sempre a perder.

Essa guerra tem sido implacável. O BCE proibiu os bancos gregos de comprarem dívida pública e, de fato, não permite que o Estado grego se refinancie. O protectorado continua e está mais aguerrido pela derrota dos seus embaixadores. A União Europeia protestou contra a única lei aprovada, e por quase unanimidade no parlamento grego, que estabeleceu medidas de alívio de emergência para os mais pobres. Não houve nem um centavo dos empréstimos prometidos e são exigidas mais listas de medidas, incluindo a retomada das privatizações, o adiamento da recuperação do salário mínimo e o recuo nas promessas de alívio fiscal. Mesmo os dinheiros que são dos gregos (a sua parte nas operações do BCE) não lhes são entregues se as suas medidas não forem aprovadas num exame em abril.

De
nada lhes serve poderem hoje ter provas de que as contas do défice de 2009 foram falsificadas para exagerar a sua dimensão, abrindo caminho ao encarecimento da dívida e posteriormente ao resgate. De nada serve que anteriores ministros sejam condenados por terem favorecido a família e escondido as suas responsabilidades em fraudes fiscais. Agora é a hora dos acertos de contas. E, portanto, já não há mais tempo.

A política de Merkel e da União é muito evidente e ela não tenta camuflá-la: levar a Grécia à beira da bancarrota a curtíssimo prazo para a obrigar a prosseguir a política que o eleitorado rejeitou, humilhando assim o país, exibindo a sua derrota como vacina europeia, mostrando ainda que Merkel só permite outro Hollande, nunca um opositor.

Esta corrida para o abismo é implacável e está por poucas semanas. Não é para fim de junho, pode ser em abril. A 9 de abril, a Grécia poderá ainda conseguir os 450 milhões de euros para pagar a conta ao FMI, mas já é duvidoso que tenha o suficiente para pagar os salários no fim do mês se não houver uma nova entrada de recursos que reforce a tesouraria. Por isso, o governo está a recorrer a todas as medidas possíveis: usa alguns fundos de pensões, adia pagamentos, mobiliza subsídios que eram para agricultores (300 milhões), está a tentar contrair empréstimos de curto prazo em mercados monetários (600 milhões). Se a sua operação de antecipação de impostos resultar, então ficará com uma pequena folga, mas cada semana terá que fazer contas. Se não for assim, em abril fica sem dinheiro e pode entrar em incumprimento.

A
hipótese da saída da Grécia do euro torna-se por isso mais forte. Ao admiti-la, Draghi aceitou desencadear a especulação sobre essa possibilidade e, assim, aproximar-se da sua concretização. Resta saber se ela já está a ser negociada em segredo ou, se acontecer por acidente ou por desígnio, se estão prontos os necessários planos de contingência. O impacto desta escolha, para a Europa e para a esquerda em todos os países vitimados pela crise dos últimos anos, pode ser essencial para o mapa político do nosso tempo.

A força da razão grega

Num relatório recente, o Bank of America Merril Lynch apresenta três cenários para a Grécia. O cenário “bom” é Tsipras assumir o papel que Lula desempenhou, escrevem os analistas: alguém que chega ao governo com pergaminhos de esquerda para depois aplicar uma política que proteja os mercados. Mas esse cenário é ingênuo, porque os mercados financeiros saem de uma grave crise mundial, recompuseram a sua rentabilidade garantindo rendas, nomeadamente sobre as dívidas públicas, impuseram mudanças de contratos sociais, generalizaram a austeridade e a transformação do trabalho em mercadoria precarizada – numa palavra, não recuam, não permitem alívio, antes exigem destruição. Mais ainda, os agentes políticos dessa adaptação estão radicalizados: o SPD alemão, social-democrata (e parceiro internacional do PT de Lula) faz parte do governo de Merkel e é fiel à sua política.

O cenário “mau” para o Bank of America é continuar tudo na mesma. Tem razão, a Grécia já cumpriu o ajustamento de austeridade como nenhum outro país e o resultado foi o agigantar da dívida para 177% e portanto o agravamento da austeridade. A OCDE classifica a Grécia como campeã das “reformas estruturais”, ou seja, da austeridade, ao longo de todo o tempo da crise internacional (2007 a 2014). O resultado é que a economia não consegue evitar uma longa depressão.

Finalmente, o cenário “feio” é a saída do euro, o controlo de capitais e perdas dos credores. Ou seja, a incerteza e o risco.

O meu argumento é que a Grécia já não tem outra alternativa senão o risco e é melhor preparar-se bem. Por duas razões, uma estrutural e outra conjuntural, e vai ser a última que vai decidir. A razão estrutural é verificável na comparação entre a dinâmica da produção industrial na Europa antes do euro (a Grécia cresce mais do que a Alemanha) e depois do euro (a Alemanha beneficia e todos os outros perdem). O euro foi o problema para as economias mais frágeis. Portanto, para recuperar a capacidade industrial e para criar emprego, é preciso sair do colete de forças. Já não há compromisso bondoso que seja possível no quadro do euro.

Mas tudo vai ser decidido brevemente e por outra razão. É que um governo que esteja submetido à provação de lutar dia a dia pelo pagamento dos salários fica sem capacidade para resolver os problemas fundamentais do desemprego. Para se salvar, a Grécia não pode aceitar esse condicionamento que é a austeridade, ou seja, não pode submeter-se a continuar a ter a certeza de falhar e ficar pior.

Marquem nos vossos calendários, caros leitores e leitoras, é no mês de abril que se vão dar passos fundamentais para escolher entre um programa de austeridade ou uma saída, negociada ou não.

Para os que acompanham com esperança a Grécia e a promessa do seu governo, a lição é forte e deve ser enunciada com todas as palavras: tem ficado evidente que o euro não permite uma política de esquerda para corrigir ou combater os efeitos da crise financeira e social. Se a esquerda quer fingir que a Grécia ensina algo de regenerador sobre a União Europeia, é melhor começar a fazer uma procissão a Berlim, porque será o seu destino.

A força externa da Grécia: a questão da dívida da Alemanha

Mas poderia a Grécia evitar este conflito, ganhar tempo e conseguir fazer ceder os seus parceiros europeus, apesar desta intransigência e da firmeza que Merkel tem demonstrado? Tudo depende da relação de forças.

Para melhorar a sua capacidade de iniciativa, o governo de Tsipras relançou a questão da dívida nazi à Grécia. Na recente conferência de imprensa ao lado de Merkel, Tsipras reafirmou que pretende uma negociação sobre a dívida da Alemanha à Grécia em resultado da ocupação nazi, de 1941 a 1944. Fez bem e foi importante que mostrasse que não há duas linguagens, uma em Atenas e outra em Berlim.

O
acordo de 1953 entre a Alemanha e os seus credores, permitindo uma gigantesca reestruturação da dívida alemã e garantindo as condições para a recuperação do país, não incluiu as reparações de guerra, que ficaram adiadas para um futuro tratado. Esse tratado só foi estabelecido em 1990, quando da reunificação das duas Alemanhas, e foi assinado com as potências aliadas de 45 anos antes, os EUA, a Inglaterra, a França e a União Soviética. Juridicamente, as autoridades alemães clamam que este acordo encerra a questão, mas essa não é a opinião dos Estados que nem participaram nessa negociação nem assinaram esse tratado. Reconhecendo esse problema, a Alemanha negociou em separado com a Polônia uma reparação, que foi paga.

Em 1960, tinha havido um entendimento com vários países europeus, para o pagamento de indenizações a vítimas da guerra. A Alemanha desembolsou então 71 mil milhões de euros (em termos da moeda de hoje), dos quais 57,5 milhões de euros às vítimas gregas, ou, como alguém disse então, 2,5 euros por cada dia em Auschwitz. No entanto, esse acordo não indenizou o empréstimo forçado, ou seja a pilhagem do banco central grego, pelas autoridades nazis: 476 milhões de marcos da época, ou 11 bilhões de euros hoje, pelos quais assinaram um título de dívida, que ainda vale.

Na década de 1960, o chanceler Ludwig Erhard garantiu mesmo que pagaria esse empréstimo quando da reunificação da Alemanha, porventura esperando que a promessa nunca tivesse que ser chamada à pedra. Mas houve a reunificação e o tratado de 1990, mas a dívida ficou por pagar.

A Grécia tem portanto razão do ponto de vista do direito internacional. É certo que o pagamento desta dívida não resolveria as suas contas públicas (outra coisa seria se fossem liquidadas as reparações de guerra). Mas significaria que a negociação seria diferente no tempo (os próximos meses estariam assegurados) e na relação de forças (a Alemanha ficou a dever durante 70 anos). E, o que não seria menor, a história seria corrigida segundo o princípio da responsabilidade.

Pode então a Grécia conseguir esta reparação? A resposta pragmática é que não tem a relação de forças que lhe permita impô-la, sobretudo porque na Alemanha não mobiliza o apoio suficiente para desequilibrar o governo de Merkel e dos social-democratas do SPD.

A força interna de Tsipras: o apoio popular

Não é portanto entre os governos da Europa que a Grécia encontra aliados. A força do governo está antes na sua popularidade interna: uma pesquisa de 21 de março dava ao Syriza 47,8% de intenções de voto, um resultado esmagador.

Numa Europa sem alternativas, como argumenta o Prémio Nobel da Economia Edmund Phelps, esta resistência da sociedade grega é um sinal forte. Como vai ser utilizada, no entanto, é ainda uma questão em aberto. Berlim pretende usar o desgaste, para assim ganhar tudo: vergar a Grécia, vacinar a Europa, impedir o sucesso de um governo de esquerda, destruir a sua estrutura política. A Grécia parece estar a usar táticas dilatórias mas, em vez de ganhar tempo, tem perdido tempo e tem sacrificado o momento do impacto inicial da novidade e da surpresa: a rotina está a instalar-se nas negociações e nas chantagens europeias.
 
Abril poderá ser por isso o mês em que o jogo se joga. Ou o governo continua a apresentar listas de novas medidas, que serão sempre criticadas por Berlim e Bruxelas por serem austeridade a menos, e haverá sempre a exigência de mais medidas, ou prepara um referendo ou outra mobilização democrática para medidas excepcionais. Tem várias ao seu dispor: o incumprimento da dívida e o controle de capitais, mesmo sem sair imediatamente do euro, porque não há meio legal nos Tratados europeus para o obrigar a tal. Mas, para essa resposta, precisa de controlar o sistema bancário que, aliás, será imediatamente estrangulado pelo Banco Central Europeu. E essa guerra só pode conduzir à emissão do dracma, ou seja, à soberania monetária. A dificuldade evidente é que o que é mais necessário é cada vez mais difícil, com o tempo a correr contra os gregos.

Créditos da foto: Martin Schulz / Flickr

OS DONOS ANGOLANOS DE PORTUGAL - o filme




“Os Donos Angolanos de Portugal” é um projeto de documentário sobre o poder e influência do capital angolano em Portugal. Um filme produzido pelo público, a divulgar na internet, com distribuição livre. Realizado por Jorge Costa e editado por Edgar Feldman, a mesma equipa do anterior “Donos de Portugal” (2012).

Ao esclarecer o papel do capital angolano na economia portuguesa, o filme faz o inventário dos grandes articuladores desta relação pelo lado angolano: Isabel dos Santos, Manuel Vicente, António Mosquito, José Leitão, o general Kopelipa.

O filme divulgará a lista dos ex-governantes portugueses com lugares nas administrações de empresas que realizaram investimentos ou parcerias em setores estratégicos das duas economias.

Entre outros, o filme incluirá depoimentos de Marcolino Moco, jurista e primeiro-ministro angolano entre 1994 e 1996; Filomeno Vieira Lopes, economista e dirigente do Bloco Democrático angolano; Nicolau Santos, jornalista e diretor-adjunto do semanário Expresso; Mariana Mortágua, deputada da comissão parlamentar de inquérito ao caso BES.

Este projeto tem como base o livro do mesmo nome, da autoria de Jorge Costa, João Teixeira Lopes e Francisco Louçã, que a Bertrand Editora publicou em janeiro de 2014.

Para ser possível a realização deste filme, precisamos da sua contribuição.



Activistas angolanos continuam vulneráveis, dizem organizações dos direitos humanos



Voz da América

O ministro angolano da justiça e dos direitos humanos, Rui Mangueira afirmou, esta semana em Genebra que a aprovação do relatório de Angola sobre direitos humanos, garante a credibilidade do pais e reforça a sua posição a nível internacional.

Entretanto, as organizações da sociedade civil falam da vulnerabilidade a que estão expostos os ativistas.

Para nos falar sobre o assunto, ouvimos a activista Maria Lúcia da Silveira, presidente da Associação Justiça Paz e Democracia e João Castro Freedom, presidente da Liga Internacional dos Direitos Humanos.


Angola. OS GENERAIS ESTÃO EM GUERRA




“Irei a tribunal, no dia 24 de Março próximo, como arguido em nove acusações distintas de denúncia caluniosa imputadas à minha pessoa por sete poderosos generais e seus comparsas de negócios. Escrevi um livro no qual relatei violações sistemáticas dos direitos humanos na indústria diamantífera.

Os queixosos neste processo são grandes accionistas de empresas diamantíferas, e as empresas de segurança privada sob sua alçada levaram a cabo muitas das violações que denuncio.

É uma honra e um orgulho enfrentar um tal imenso poder e criar a oportunidade para que muitas das vítimas se expressem através dos relatórios que tenho vindo a elaborar ao longo dos últimos dez anos. Sairei mais resiliente deste julgamento e fortalecido pela experiência.”

Estas palavras proferidas pelo jornalista angolano Rafael Marques no passado dia 18, ao receber em Londres o Prémio Liberdade de Expressão da ONG Index On Censorship, só pecam pela modéstia: chegado a Luanda, para além dos nove crimes de denúncia caluniosa de que já estava acusado, confrontou-se com a acusação da prática de mais cerca de 15 crimes de difamação. Sendo certo que os grandes acionistas das empresas diamantíferas e de segurança privada são, na sua maior parte, generais que fazem parte do círculo do poder angolano.

A coragem do jornalista Rafael Marques na sua luta, quase quixotesca face aos enormes poderes com que se defronta, em defesa dos seus ideais de liberdade de expressão, de respeito pelos direitos humanos e da solidariedade é notável. Em 2004, Rafael Marques começou a fazer um trabalho sistemático de investigação e compilação de dados sobre violações de direitos humanos na região diamantífera das Lundas, em especial nos municípios do Cuango e Xá-Muteba. Sobre o assunto, com dados concretos de torturas e homicídios impunes, publicou em 2005 o relatório Lundas: As Pedras da Morte, em 2006 o relatório Operação Kissonde: os Diamantes da Miséria e da Humilhação e em 2008 o relatório Angola: A Colheita da Fome nas Áreas Diamantíferas.

Por último, publicou em 2001 o livro Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola que foi disponibilizado gratuitamente online pela editora Tinta da China e onde relata atos de tortura e homicídios praticados contra os garimpeiros e as populações dos referidos municípios. Rafael Marques não tem dúvidas: dos testemunhos que ouviu, do material que recolheu e observou há inequívocas responsabilidades diretas nesses factos dos empregados e agentes de duas sociedades — Sociedade Mineira do Cuango e Teleservice — de que são sócios importantes figuras do poder político angolano, nomeadamente diversos generais.

Os generais queixaram-se criminalmente em Portugal do conteúdo do livro, mas o processo foi arquivado já que o Ministério Público considerou, e bem, que Rafael Marques estava no legítimo exercício da sua liberdade de expressão e de informação.

Mas Rafael Marques não se bastou com a, já de si corajosa, recolha de testemunhos e publicação de relatórios e do livro. Foi mais longe no seu combate na defesa dos direitos humanos em Angola: em Setembro de 2011, apresentou uma queixa crime contra diversos gestores, sócios e acionistas das sociedades envolvidas na práticas reiteradas de violações de direitos humanos que constatara no terreno, convicto como estava da existência de indícios de que davam cobertura, “por ação ou omissão”, aos abusos que constatara. Como prova juntou o seu livro e indicou diversas testemunhas. E solicitou ao procurador-geral da República angolano “a abertura de inquérito para investigação e apuramento da prática pelos denunciados dos factos criminosos“ descritos no livro. O inquérito foi curto e concluiu pelo arquivamento.

Os generais e outros sócios queixaram-se, então, da prática por Rafael Marques do crime de denúncia caluniosa e de difamação e é por estes crimes que Rafael Marques está a ser julgado.

Mas, como é evidente, estamos perante um julgamento em que se procura silenciar e intimidar, utilizando o aparelho judicial, não só Rafael Marques, mas todos os angolanos que pensem sequer em denunciar abusos, prepotências e eventuais crimes dos poderosos. Não se atreverão a denunciá-los ao próprio Ministério Público, já que correm o risco de a queixa ser arquivada e terem de se sentar no banco dos réus. Para serem esmigalhados.

Este processo é, assim, fatalmente, político e o tribunal terá de decidir se aceita ser um instrumento de terror cívico e de negação da cidadania, ou se se assume como um defensor da legalidade e dos direitos, nomeadamente da liberdade de expressão e do direito de participação cívica dos angolanos na construção da sua Pátria. Uma opção que não devia ser difícil de adivinhar, mas que só poderemos saber quando terminar o julgamento, que, iniciado na passada terça-feira, recomeça no próximo dia 23 de Abril.

Na foto: Rafael Marques. Sentados, na fila da frente, os generais queixosos Armando da Cruz Neto (primeiro à esquerda), Adriano Mackenzie, Hendrick Vaal da Silva e outros.

Francisco Teixeira da Mota – Público, em Angola 24 Horas

Parlamento português chumba apelo pela libertação de Rafael Marques

Lisboa - PSD, CDS, PS, PCP e "Os Verdes" rejeitaram hoje, no parlamento, um voto do Bloco de Esquerda a solicitar às autoridades judiciais angolanas a libertação e anulação do julgamento do jornalista Rafael Marques.

No Grupo Parlamentar do PS, porém, cinco deputados demarcaram-se da orientação oficial da bancada e colocaram-se ao lado do voto do Bloco de Esquerda "em defesa da liberdade de expressão em Angola": Isabel Santos, Eduardo Cabrita, Bravo Nico, Carlos Enes e António Cardoso.

O coordenador da bancada socialista para as questões de trabalho, Nuno Sá, optou pela abstenção.

O voto do Bloco de Esquerda pretendia que a Assembleia da República manifestasse "solidariedade com o jornalista Rafael Marques pela coragem demonstrada na defesa da liberdade de expressão em Angola".

Com esta iniciativa, o Bloco de Esquerda visava também que o parlamento procedesse à "condenação da perseguição de que Rafael Marques continua a ser vítima em Angola", apelando às autoridades e instâncias judiciais angolanas "para que velem no sentido de ser anulado o julgamento".

"Rafael Marques tem sido frequentemente perseguido por responsáveis do Governo de Angola, como denunciam várias organizações internacionais como a Amnistia Internacional. O julgamento que presentemente enfrenta é apenas resultado do legítimo exercício do direito de liberdade de expressão, reconhecido pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e, inclusive, pela Constituição de Angola", refere o documento do Bloco de Esquerda.

Lusa, em Angola 24 Horas

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Moçambique. A LUTA DE PODER NA FRELIMO “ESTÁ A PIORAR”




Alex Vines, da Chatham House, garante que o braço-de-ferro está a prejudicar as negociações com a Renamo.

O director do departamento africano no instituto de estudos internacionais Chatham House considera que a luta de poder entre o actual e o antigo Presidente de Moçambique está a piorar.

“A luta de poder entre o antigo Presidente Guebuza e o Presidente Nyusi está a piorar, tendo influência nas decisões do Governo, nos esforços de mediação com a oposição e afectando o clima empresarial”, disse Alex Vines em entrevista à Bloomberg numa altura em que o Comité Central da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo)está reunido até domingo.

A reunião está a ser ensombrada pela rivalidade entre os dois líderes, embora oficialmente o discurso garante que não há tensões, nem estão previstas alterações na direcção do partido.

“Apesar de o secretário-geral da Frelimo, Eliseu Machava, insistir que a questão da sucessão do presidente da Frelimo não está na agenda da reunião, ela está”, disse Alex Vines, admitindo que “dificilmente a questão será resolvida este fim de semana”, mas avisando que “este tema precisa de ser resolvido pelo Comité Central, até porque o próximo congresso da Frelimo ainda nem está marcado”.

Nyusi venceu as eleições de Outubro do ano passado, herdando a Presidência de Armando Guebuza, que se manteve como líder do partido. Entre as principais tarefas do novo Presidente está a relação com as empresas que vão explorar o gás natural, encarado como o principal motor do crescimento económico e fonte de riquezas do país, para além de todo o gigantesco trabalho de desenvolvimento do país.

A economia, que valia USD 15,6 mil milhões em 2013, deverá crescer dez vezes até 2035, à medida que os recursos naturais começam a ser explorados, segundo os analistas do Standard Bank.

A substituição de Guebuza na liderança do partido “não é preocupação dentro da Frelimo, estamos bem, continuamos unidos e coesos”, afirmou o porta-voz do partido, em conferência de imprensa na sede nacional, na quarta-feira, embora tenha reconhecido que o CC é um órgão soberano e novos pontos podem ser adicionados à ordem dos trabalhos.

A matéria tem sido alvo de ampla discussão nos meios políticos e entre os analistas em Moçambique, que avisam para o risco da convivência de dois centros de poder, diminuindo a acção do chefe de Estado, nomeadamente nas negociações com a Renamo na crise instalada no país após as eleições gerais de 15 de Outubro.

Rede Angola, com Agência Lusa

Moçambique. FRELIMO QUER DEBATER IDEIAS MAS COM DISCIPLINA




Jorge Rebelo falou que Guebuza anda a meter medo aos militantes, porta-voz diz que as críticas se fazem à porta-fechada.

A Frelimo, partido no poder em Moçambique, negou ontem que esteja a limitar a liberdade de expressão dos seus membros, mas enfatizou que o debate de ideias pelos militantes do partido deve ser feito respeitando a disciplina interna.

Falando à Lusa, à margem da abertura da IV sessão do Comité Central da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), o militante histórico do partido Jorge Rebelo considerou na quinta-feira que o discurso do presidente da organização, Armando Guebuza, na abertura do encontro, cria medo e silencia o debate.

“Ele está a travar a discussão, quando lança esses recados de que há membros que estão a lançar publicamente ideias que enfraquecem o partido. Isso é que é mau, porque mete medo às pessoas e, pronto, aí estamos silenciados”, afirmou o antigo dirigente da Frelimo e ex-ministro da Informação de Samora Machel.

Em conferência de imprensa sobre os trabalhos da IV Sessão do Comité Central que se realiza desde quinta-feira na cidade da Matola, arredores de Maputo, o porta-voz da Frelimo, Damião José, rejeitou a acusação de que Armando Guebuza esteja a tentar silenciar os membros do partido.

“A disciplina faz parte de qualquer organização, o nosso partido, como partido com responsabilidades acrescidas no nosso país, rege-se pela observância da disciplina, não se pode concluir que quando se apela à disciplina há limitação da liberdade de expressão”, afirmou Damião José.

O porta-voz da Frelimo afirmou que os debates no Comité Central, que se realizam à porta fechada, têm decorrido num ambiente de liberdade e que os membros do órgão têm apresentado as suas opiniões à vontade.

“O que preocupa a todos nós, membros do partido Frelimo, é o facto de nalgum momento haver camaradas nossos que têm ideias sobre algum aspecto de funcionamento do nosso partido e não colocam os assuntos no fórum próprio, usam a comunicação social”, afirmou.

Damião José afirmou que nos dois primeiros dias da reunião, o Comité Central aprovou a agenda do encontro e iniciou a análise, em grupos, dos documentos dos órgãos do partido, nomeadamente da Comissão Política, Comité de Verificação e Gabinete Central de Preparação das Eleições Gerais de 15 de Outubro.

Até ao fim da reunião, o Comité Central vai analisar o Plano Quinquenal do Governo, o Plano Económico e Social (PES), o Orçamento Geral do Estado, a actuação da bancada parlamentar da Frelimo e a situação política no país, afirmou Damião José.

No discurso de abertura da IV Sessão do Comité Central da Frelimo, Armando Guebuza criticou os camaradas que publicamente procuram dividir e semear a confusão na força política.

“Preocupa-nos a postura e comportamento de alguns camaradas que publicamente engendram ações que concorrem para perturbar o normal funcionamento dos órgãos e das instituições e para gerar divisões e confusão no nosso seio”, declarou o ex-Presidente moçambicano, que se mantém líder da Frelimo, perante 195 membros do Comité Central e dezenas de convidados.

A agenda da IV Sessão do Comité Central da Frelimo não inclui a questão de uma eventual substituição de Armando Guebuza pelo actual Presidente da República, Filipe Nyusi, também da Frelimo, defendida por alguns quadros do partido como necessária para o fim dos propalados dois centros de poder na condução dos assuntos do Estado moçambicano.

Lusa, em Rede Angola (ao)

Moçambique - Autonomias. “Se não aprovarem, eu tomo conta disto, eles vão embora e acabou”




Dhlakama ameaça e diz que Frelimo vai aprovar regiões autónomas

Líder da Renamo afirma que, se quisesse, podia organizar manifestações e tomar o poder.

Voz da América

O presidente da Renamo Afonso Dhlakama reiterou que a Frelimo vai aprovar a proposta para a criação de regiões autónomas caso contrário o Presidente da República não vai poder governar. O líder da oposição rejeitou a ideia de que vai recorrer às armas e disse que se quisesse podia fazer um apelo popular e  milhares de pessoas sairiam à rua, provocando a queda do governador de Manica, onde se encontra.

Em declarações a uma rádio local em Chimoio, Dhlakama disse ter ido a Santunjira reunir-se com as pessoas e não preparar nenhum ataque militar porque não vai recorrer às armas, mas destaca o apoio popular que desfruta.

"Viu as pessoas que vieram o mato aqui e encheram este lugar num minuto ? Se quiser organizo marchas e avançaremos pelas ruas e o governador de Manica, terá de correr", disse Dhlakama.

Para o líder da Renamo, o Presidente da República necessita da sua ajuda porque Filipe Nyusi deve querer govenar, apesar, segundo Dhlakama, ele não ter ganho a eleição presidencial, mas sim a fraude.

O presidente da Renamo lembra o que aconteceu no Egipto, onde o antigo Presidente Hosni Mubarack caiu apenas com manifestações, apesar de contar com exército e polícia mais poderosos que os de Moçambique.

Apesar de vários sectores da Frelimo terem manifestado a sua oposição ao projecto de criação de regiões autónomas apresentado pela Renamo, Afonso Dhlakama diz estar confiante que a legislação, em debate a partir do próximo dia 31, será aprovado.

«Eles vão aprovar sim porque o Nyusi quer governar. Se eles não aprovarem, eu tomo conta disto, eles vão se embora e acabou », concluiu Dhlakama.

Proposta da Renamo não reúne consenso

Projecto é analisado pela Assembleia da República a partir do dia 31

Ramos Miguel – Voz da América

Em Moçambique, desde a morte do professor Giles Cistac, no passado dia 3, nenhum outro académico apareceu a defender publicamente o projecto das autarquias provinciais, o que pode constituir um constrangimento aos  esforços da Renamo para que o Parlamento aprove o documento a ser discutido a partir do dia 31.

Analistas dizem que Cistac, tendo em conta o interesse que tinha na proposta, poderia ajudar muito quando fosse necessário esclarecer eventuais dúvidas ao longo dos debates.

Cistac defendia que a exigência da Renamo sobre as regiões autónomas tinha cobertura constitucional, e Afonso Dhlakama prometeu vingar-se da morte do académico.

“Seria importante se aparecessem outros académicos apoiantes desta proposta, que, na minha opinião, precisa apenas de ser melhorada, uma vez que pode contribuir para a descentralização e aprofundamento da democracia em Moçambique”, disse o politólogo José Manhiça.

Contudo, o deputado da Renamo na Assembleia da República, José Manteigas, diz que o projecto tem pernas para andar, porque como afirma Afonso Dhlakama sem isso não haverá paz em Moçambique.

Segundo José Manteigas, este projecto "poderá resolver, em parte, as grandes desinteligências em que o país se encontra".

O jurista José Caldeiras diz que para a implementação do projecto da Renamo é preciso fazer uma alteração ao quadro legal mas também ao quadro institucional do país.

"Nós não temos neste momento nenhuma situação em que há autarquias que estão na zona territorial de outras autarquias, que é o que este projecto vem trazer", disse.

Também para o jurista Tomas Vieira Mário, a proposta da Renamo levanta muitas questões, incluindo as relacionadas com as assembleias provinciais, onde, em algumas delas, a Renamo é maioria.

Mário esclareceu que os poderes das assembleias provinciais estão previstos na Constituição da República, e se é para serem alterados, isso implica uma emenda constitucional.

O projecto de lei visa a criação de seis províncias autárquicas no norte e centro do país.

Associação dos Portos de Língua Portuguesa defende fim de barreiras alfandegárias na CPLP




Maputo, 27 mar (Lusa) - O presidente da Associação dos Portos de Língua Portuguesa (Aplop) considerou hoje em Maputo as barreiras alfandegárias um entrave às relações comerciais entre os países lusófonos, defendendo que devem ser removidas para o desenvolvimento dos negócios na CPLP.

"Nós queremos uma facilitação de serviços alfandegários entre os países de língua oficial portuguesa. É preciso remover as barreiras alfandegárias que existem, para que se aumente os níveis do comércio entre os países lusófonos", disse à Lusa Anapaz de Jesus Neto, à margem do VIII Congresso dos Portos de Língua Portuguesa, que terminou hoje na capital moçambicana.

De acordo com o presidente da Aplop, as relações portuárias entre os países da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) estão numa boa fase, mas é preciso diminuir os encargos aduaneiros, como forma de dinamizar a cooperação entre eles.

"Uma mercadoria que sai de Moçambique para Angola, por exemplo, não pode pagar os direitos alfandegários como se fosse uma mercadoria que vem da Suécia", afirmou Anapaz de Jesus Neto.

Além dos entraves aduaneiros nas trocas comerciais, O VIII Congresso dos Portos de Língua Portuguesa discutiu a ideia de reforçar as viagens de cabotagem, como forma de explorar a riqueza das costas marítimas existentes na lusofonia.

"As relações entre os países lusófonos estão excelentes, mas queremos melhorar. Por isso, debatemos também o incrementar das viagens de cabotagem entre os países de língua portuguesa, que neste momento ainda não são feitas", adiantou o presidente da Aplop.

Subordinado ao tema "Estreitando Relações e Cooperação no Espaço da Lusofonia, o VIII Congresso da Aplop reuniu, durante dois dias em Maputo, académicos e empresários dos países de língua portuguesa, que discutiram os projetos portuários e logísticos, acessibilidade marítima e o mercado da CPLP.

EYAC // VM

INDÚSTRIA DO PETRÓLEO E GÁS TIMORENSE... É PARA AVANÇAR




Setor petrolífero já emprega cerca de 500 timorenses, mas tutela quer mais

Díli, 27 mar (Lusa) - O setor petrolífero emprega cerca de 500 timorenses, a maioria com contratos temporários e em empresas subcontratadas, mas este é um número que pode e deve ser ampliado, disse o presidente da Timor Gap, a petrolífera estatal timorense.

"Não é suficiente. Estamos a tentar não nos centrar apenas nos aspetos extrativos do setor, na exploração e produção, mas sim dos efeitos que o projeto pode ter no aumento da industrialização", disse Francisco Monteiro.

Numa apresentação sobre o projeto de Beaçu, que se centra numa unidade de processamento de Gás Natural Liquefeito (GNL) no sul de Timor-Leste, Monteiro destacou o impacto que o projeto pode ter na economia timorense.

Uma das maiores apostas do projeto é no fortalecimento de mão-de-obra timorense, procurando aumentar tanto o número de timorenses que trabalham no setor e a sua formação, quer a capacidade de industrialização a jusante do projeto.

Monteiro estima que, atualmente, trabalhem no setor de petróleo e gás cerca de 500 timorenses, metade na petrolífera e regulador e outras entidades do Governo e metade no setor, quer em contratos permanentes (cerca de 50) quer em temporários e pontuais (200).

Além de aumentar este número - o Governo continua a apostar na formação - a aposta é utilizar Beaçu como alavanca para que os recursos, neste caso o gás natural, ajudem à industrialização do país.

"Com este projeto abrimos as possibilidades de industrialização e, com isso, adicionamos valor ao próprio recurso", disse.

"Com estas medidas não só fortalecemos a base industrial mas também a capacidade de criação de empregos e de outras oportunidades", salientou.

"Não nos podemos esquecer que neste setor quem sai mais beneficiado são as empresas que não estão aqui para nos ajudar mas sim para ganhar dinheiro para os acionistas. Por isso temos que nos ajudar a nós próprios", afirmou.

ASP // PJA

Petrolífera Timor Gap destaca importância estratégica de projeto de gás natural em Beaçu

Díli, 27 mar (Lusa) - O projeto de Beaçu, que se centra numa unidade de processamento de Gás Natural Liquefeito (GNL) no sul de Timor-Leste pode ser um dos projetos mais importantes para o desenvolvimento do país, defendem responsáveis do setor.

A unidade de GNL é o 'coração' de todo o projeto, que engloba ainda um gasoduto e infraestruturas marítimas. É nessa unidade que o gás transportado pelo gasoduto é arrefecido a -162 graus celsius, o reduzindo o seu volume 600 vezes e tornando-o mais fácil de armazenar e transportar.

E será nas suas proximidades que vão nascer novas aldeias e - insistem os responsáveis governamentais timorenses - novas infraestruturas que desenvolverão uma região do país em que hoje os seus habitantes se dedicam exclusivamente à pesca artesanal e à agricultura de subsistência.

Francisco Monteiro, presidente da Timor Gap, a petrolífera estatal timorense e vários elementos da sua equipa, incluindo Domingos Maria, diretor Unidade de Negócios Gás, detalharam elementos centrais do projeto, numa das mais amplas apresentações feitas até hoje à imprensa.

Domingos Maria, diretor Unidade de Negócios Gás da Timor Gap, explicou que o projeto Beaçu, num espaço de entre 250 e 300 hectares, está a ser estudado desde 2008 com todos os componentes a serem alvo de uma análise de viabilidade, dois níveis de desenho de engenharia (conhecidos como Pre-FEED e FEED nas suas siglas em inglês) e outros estudos.

No caso do gasoduto as autoridades timorenses concluíram em 2013 todos os estudos, depois de análises a aspetos como a rota, a profundidade da água - há uma zona de 5 quilómetros onde ultrapassa dos 3.000 metros - e a situação do terreno.

Já identificaram as empresas que poderiam realizar a obra e até uma sondagem marítima detalhada como um veículo subaquático, concluindo uma análise geotérmica pontual com informação sobre riscos, desníveis e limitações físicas no percurso, entre outras.

A solução é um gasoduto de 231 quilómetros com uma profundidade máxima de 3.022 metros, uma dimensão de 24 polegadas e uma espessura de 37,4 milímetros, permitindo um fluxo de 900 milhões de metros cúbicos por dia.

O custo aproximado é de 826 milhões de dólares, valor muito mais barato do que a opção de fazer o gasoduto de 457 quilómetros até à cidade australiana de Darwin, onde o custo estimado ascender a 1,83 mil milhões.

"Além de que, com essa opção, haveria muito poucos benefícios sócio-económicos para Timor-Leste, tendo em conta emprego, conteúdo local e negócios de apoio", explicou Domingos Maria.

Sem poder quantificar o impacto exato que o gasoduto de um outro campo, o Bayu Undan, tem tido nos últimos anos em Darwin - "basta ver a forma como a cidade cresceu" - Francisco Monteiro recorda que o projeto chegou a empregar, no seu pico, 10 mil pessoas com "cada dólar investido no projeto a ter um impacto de 5 dólares na economia".

Por isso, afirma, "deve ser no mínimo desconhecimento" a opinião dos que criticam a apostar de Timor-Leste num projeto idêntico que trará "grandes benefícios" ao país.

No que toca às infraestruturas marítimas, que incluem um porto para apoio à unidade de GLN, o custo estimado pelas autoridades timorenses é de 1,4 mil milhões de dólares.

Por concluir estão os estudos relacionados com a unidade de GLN, estando a decorrer a fase final da análise pre-FEED. Só depois disso se saberá o custo aproximado final para a unidade onde se processa o gás do Sunrise.

Ainda assim, os estudos preliminares (conceptuais e de viabilidade) apontam um custo estimado é de 4,36 mil milhões de dólares, com uma margem de erro que pode alcançar + ou - 50 %.

ASP // PJA

Basta um ano para Timor-Leste poder arrancar com projeto gás natural - petrolífera

Díli, 27 mar (Lusa) - Timor-Leste já avançou significativamente nos estudos para a construção, no sul do país, de uma unidade de processamento de Gás Natural Liquefeito (GNL) do campo de Greater Sunrise e está a apenas um ano de trabalho de poder avançar com concursos.

"Se a decisão fosse tomada hoje para avançar com o projeto, dentro de um ano poderíamos realizar os concursos", explicou Francisco Monteiro, presidente da Timor Gap, a petrolífera estatal timorense.

Findo esse prazo de estudos e licitação, demoraria cerca de cinco anos para concluir todas as fases do projeto: gasoduto, infraestruturas marítimas e a unidade de GNL.

Monteiro e vários elementos da equipa da Timor Gap fizeram aos jornalistas um ponto da situação sobre o projeto do gasoduto e do processamento de GLN de Beaçu, que por seu lado se inserem no Projeto Tasi Mane, de desenvolvimento do sul da ilha.

Nos últimos anos e a um custo total de cerca de 20 milhões de dólares, Timor-Leste realizou já grande parte dos estudos necessários para os vários componentes do projeto que deve, insiste Monteiro, ser pensado "a longo prazo, a 10, 15 ou 20 anos".

Domingos Maria, diretor Unidade de Negócios Gás da Timor Gap, explicou que o projeto Beaçu, num espaço de entre 250 e 300 hectares, está a ser estudado desde 2008 com todos os componentes a serem alvo de uma análise de viabilidade.

As contas timorenses apontam para receitas totais do projeto que ascendem a 110 mil milhões de dólares com a taxa interna de retorno (TIR) - a taxa que o investidor obtém do projeto - a ser de 20,61%, ou seja, aproximadamente 20 dólares por cada 100 dólares investido.

Nos cenários que foram estudados, Timor-Leste começaria a ganhar dinheiro a partir do sétimo ano de atividade, num período de retorno de cerca de 30 anos.

Esta semana, o ministro do Petróleo e Recursos Naturais timorense, Alfredo Pires, disse em entrevista à agência Lusa que o custo total do processamento do GNL em Timor-Leste custaria 13.000 milhões de dólares (12.000 milhões de euros), constituindo a opção mais barata.

Este custo divide-se, aproximadamente em 6,6 mil milhões 'downstream' - a fase de no transporte, distribuição e comercialização dos derivados do petróleo - e 6,4 mil milhões na fase 'upstream', essencialmente de extração e produção.

ASP // PJA

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