quinta-feira, 24 de maio de 2012

O BOSQUE EM FLOR



Rui Peralta

O afilhado negro dos Bilderberg

Coincidências

Existem coincidências na vida. De todos. Por exemplo o presidente Obama, na semana em que recebeu o Premio Nobel da Paz, em 2009, ordenou ataques aéreos sobre o Iémen, que resultaram em 63 vitimas mortais, 28 das quais crianças. Coincidentemente, quando Obama anunciou este mês que apoiava o casamento entre pessoas do mesmo sexo, na mesma semana aviões norte-americanos assassinavam 14 civis afegãos. São dois factores secundários (Premio Nobel e declaração de apoio aos casamentos homossexuais) em torno de um factor central (a guerra). Mas o passe de mágica dos mestres ilusionistas dos media foi o de fazerem esquecer o factor central (a guerra) e pôr toda a gente a falar dos factores secundários (o Premio Nobel e os casamentos gay).

As festas

Uma hora antes da sua declaração sobre o casamento gay, Obama efectuou uma operação de captação de fundos para a sua campanha presidencial, enviando mensagens onde declarava a sua posição. Na noite seguinte, já com todos os noticiários dominados pelas suas declarações, Obama compareceu a uma festa de levantamentos de fundos, em Los Angeles, na casa de um conhecido actor de cinema, onde estavam reunidos mais de 150 importantes nomes de Hollywood, que pagaram 40.000 USD para comparecer ao jantar festivo e Obama, contente, arrecadou um recorde de 15milhöes de USD para a sua campanha, posteriormente reforçados por mais outro tanto provindo de apoiantes gay e latinos de New York, que fizeram também uma festa de arromba.

O Partido Único sob a égide de Obama

Democratas e Republicanos são duas faces de um Partido Único, o partido do grande capital. Representam os diversos sectores da alta burguesia norte-americana (os bosses dos bosses) e simultaneamente são os responsáveis pelo empobrecimento da nação norte-americana. Obama é tão reacionário como o foi Bush, ou como o seu outro lado do espelho, o candidato republicano que é só para manter ocupada e dar mais uns cobres as fortes companhias de comunicação social yankees, pois Obama é o candidato de todo o Capital.

É um Premio Nobel da Paz expert em drones Hellfire, em operações cirúrgicas, secreta e de alta precisão e um grande ilusionista. Com a história da retirada parcial das tropas norte-americanas de ocupação do Afeganistão, Obama enviou forças para 120 países com a missão de treinarem grupos especiais. É um liberal que criou fortes medidas restrictivas á liberdade de imprensa (reparem no que se passou e passa-se com a WikiLeaks e Assange, por exemplo). É um pacificador que silenciou o movimento antiguerra, associado ao seu próprio partido (ou melhor á sua facçäo alargada, os democrata, dentro do regime de partido único encapuçado que vigora nos states). É um astuto operador amoral que joga com a cor da pele e que acha natural as manifestações do Tea Party (o núcleo mais fascizante da facçäo republicana do partido único), mas um atentado á população citadina o movimento do Occupy.

Bradley Manning

Entre os bajuladores endinheirados de Obama, os seus gays ricos a quem recorreu para uma ajuda na campanha, não se ouviu nenhuma voz que tivesse chamada a atenção para o que se passou com Bradley Manning, que foi caluniado por Obama e pelo seu vice pelo facto de ser gay e por ter fornecido informação á WikiLeaks. Bradley, um soldado norte-americano, gay, alegadamente proporcionou á WikiLeaks uma grande quantidade de provas sobre actividades criminosas norte; americanas no Iraque e no Afeganistão. Obama e Biden acusaram-no publicamente de traidor e caluniaram a sua “anormal homossexualidade” (para usar as palavras de Obama) como sendo o motivo que o levaram a fornecer as provas á WikiLeaks.

É no mínimo de estranhar, para além de uma enorme hipocrisia, que nenhum dos porta-vozes dos direitos dos homossexuais, apoiantes de Obama, tenha-se manifestado sobre esta contradição, deixando passar em branco, como sendo uma recordação para apagar, as acusações e a campanha de calunias que o presidente da sede imperial, no seu imenso poder, moveu a um cidadão gay, que teve a coragem de assumir a sua cidadania e participar na luta por uma sociedade mais justa e livre, no fundo, a coragem de assumir os ideais que levaram á independências dos USA, nos tempos idos da Revolução Americana, em que a guerra era de libertação e o inimigo o imperialismo.

(Será que o afilhado negro dos Bilderberg leu essa parte da História?)

Fontes
Washington Post; 09/05/2012;
Associated Press 11/05/2012;

GOVERNO DE TRANSIÇÃO TOMA POSSE NA GUINÉ-BISSAU


Empossamento de Governo da Transição - 23 de Maio de 2012 - Foto: UNIOGBIS

(GBissau) Bissau – A cerimónia da tomada de posse do novo governo de transição da Guiné-Bissau teve lugar hoje, quarta-feira em Bissau, um dia depois ter entrado em funções, depois da assinatura do decreto presidencial pelo Presidente de Transição da Guiné-Bissau, Serifo Nhamadjo.

O novo executivo liderado por Rui Duarte de Barros, conta com 14 ministérios e 13 secretarias de Estado e é composto por algumas individualidades conhecidas na política guineense. A nova estrutura governamental contempla menos dois ministérios do que em relação ao governo de Carlos Gomes Júnior, deposto no golpe de Estado de dia 12 de Abril.

Deste novo governo fazem parte, por exemplo, o antigo primeiro-ministro guineense Faustino Imbali que é o novo ministro dos Negócios Estrangeiros do governo de transição. Além dos Negócios Estrangeiros, Faustino Imbali também vai coordenar as pastas da Cooperação Internacional e das Comunidades Guineenses na Diáspora.

E ao Comando Militar foram atribuidas três pastas – dois ministros e uma secretaria de Estado. O piloto-aviador Celestino de Carvalho, até aqui director do Instituto Nacional de Defesa, vai chefiar a pasta da Defesa e dos Combatentes da Liberdade da Pátria. O ministério do Interior vai ser liderado por António Suka Ntchama, enquanto Mussa Djata vai liderar a pasta da Secretário de Estado dos Combatentes da Liberdade da Pátria.

O porta-voz do Fórum da Oposição Democrática — partidos que lideraram as contestações ao Governo deposto no golpe de Estado — Fernando Vaz, é agora o novo ministro da Presidência do conselho de ministros, da comunicação social e dos assuntos parlamentares.

Quanto ao primeiro-ministro, Rui Duarte de Barros foi o antigo comissário Bissau-guineense na UEMOA e ex-ministro das finanças e terá agora a função de liderar o país durante este período após o golpe de 12 de Abril.

E o seu novo elenco vai dirigir os destinos da nação guineense durante os próximos 12 meses de transição. Este governo assim como a presidência do país, são frutos do Pacto de Transição entre o Parlamento e os partidos políticos da oposição sob os auspicios da organizacao regional, a CEDEAO.

Alguns membros do governo não tomaram posse por estarem ausentes do país.


Guiné-Bissau: MINISTROS DE TRANSIÇÃO COMEÇAM A ASSUMIR PASTAS



FP - Lusa

Bissau, 24 mai (Lusa) - Os novos ministros da Guiné-Bissau, que integram o governo de transição saído do golpe de Estado de 12 de abril, começaram hoje a assumir funções, depois de terem tomado posse na quarta-feira.

No início da tarde de hoje, como constatou a Lusa, o ministro da Justiça do governo deposto pelo golpe de Estado, Adelino Mano Queta, fez a passagem de dossiês para Mamadú Saído Baldé, nomeado novo titular da pasta do governo de transição.

Depois de o edifício que serve de sede ao Ministério da Justiça ter estado encerrado desde 12 de abril, data do golpe militar que depôs o governo de Carlos Gomes Júnior, hoje todas as salas voltaram a abrir e todas foram limpas.

O Palácio do Governo, edifício onde funcionavam a maior parte dos ministérios e o gabinete do primeiro-ministro, e que também esteve encerrado durante muitos dias, está de novo de portas abertas e os novos ministros estão a ocupar os respetivos gabinetes.

Muitos dos ministros do governo derrubado pelo golpe de Estado de 12 de abril não estão no entanto a fazer a passagem de pastas, uns porque nem sequer estão no país e outros porque estão ou refugiados ou em parte incerta.

Fonte do governo de transição disse à Lusa que nesses casos a passagem está a ser feita com a presença da Polícia Judiciária.

Cabo Verde: Escutas telefónicas são "prioridade" para combater crime organizado - PJ



JSD - Lusa

Espargos, Cabo Verde, 24 mai (Lusa) - A Polícia Judiciária (PJ) de Cabo Verde considera uma "prioridade" a elaboração de legislação sobre as escutas telefónicas para combater a criminalidade organizada e outros ilícitos criminais, disse o diretor da instituição, citado hoje pela Inforpress.

Segundo Carlos Reis, que falava quarta-feira à margem do encerramento da Conferência Internacional sobre Terrorismo, que se realizou durante três dias na ilha do Sal, a PJ está a trabalhar "afincadamente" com o Governo na busca de parcerias e com as operadoras de comunicações para que as condições fiquem criadas.

Considerando tratar-se de um processo "moroso", devido aos "custos bastante elevados", Carlos Reis frisou que as interceções telefónicas são uma "prioridade".

"Em Cabo Verde, a nossa realidade exige que façamos a racionalização de esforços para a questão da utilização de meios. A PJ defende, embora seja uma questão da proteção da segurança nacional, a criação o mais rapidamente possível de condições para que as interceções telefónicas sejam uma realidade", sublinhou.

Cabo Verde tem estado no centro das atenções internacionais devido à utilização das suas águas territoriais pelos narcotraficantes e outros tipos de tráfico, bem como nos processos de lavagem de capitais.

A vulnerabilidade na fiscalização das águas territoriais, como acentuou na quarta-feira na sessão de encerramento o Presidente cabo-verdiano, Jorge Carlos Fonseca, tem estado a ser colmatada aos poucos com o apoio internacional, a par de legislação "cirúrgica" aprovada pelo Governo, como a lei de lavagem de Capitais.

Sobre as conclusões da conferência, Carlos Reis salientou o "refrescar de conhecimentos" para as polícias de Cabo Verde e lembrou a importância "inevitável" do país no contexto da região, em que há a necessidade de servir de elo de ligação para as instituições policiais que trabalham a questão do terrorismo e os atos criminais com impacto internacional.

"A partir de agora o que vai mudar é a nossa capacidade de pontos de contacto a nível internacional", disse o diretor da PJ cabo-verdiana, lembrando o crescimento, ao longo dos últimos 19 anos, da polícia científica, com ações concretas no combate à criminalidade organizada internacional.

São Tomé e príncipe: PR inicia visita de quatro dias à África do Sul



MYB - Lusa

São Tomé, 24 mai (Lusa) - O presidente de São Tomé e Príncipe, Manuel Pinto da Costa, iniciou hoje uma visita de trabalho de quatro dias à África do Sul, durante a qual pretende "abrir mais as portas para uma cooperação frutuosa" entre os dois países.

"O que vou fazer é abrir mais as portas para permitir ao governo são-tomense encontrar mais espaço para fortalecer essa cooperação", disse Pinto da Costa aos jornalistas, antes de viajar para a África do sul a convite do homólogo, Jacob Zuma.

O chefe de Estado são-tomense referiu-se igualmente à necessidade de um "maior incremento" na cooperação empresarial bilateral.

"Há já a presença de empresários sul-africanos aqui (São Tomé) e seria bom que isso se incrementasse", acrescentou Pinto da Costa, numa referência ao projeto do grupo sul-africano HBD Vida Boa, que está a investir 70 milhões de euros em projectos turísticos, agrícolas e formação na ilha do Príncipe.

Fonte diplomática disse a agência Lusa que o apoio de São Tomé e Príncipe à candidatura da atual ministra dos Negócios Estrangeiros sul-africana, Nkosazana Dlamini-Zuma, para a presidência da Comissão da União Africana vai ser debatido nos encontros de Pinto da Costa.

O presidente são-tomense vai participar, à margem da visita a África do Sul, na cimeira da diáspora africana, cujos trabalhos terminam na sexta-feira. O regresso está marcado para domingo.

É tal o nível da democracia que as eleições de 2012 em Angola não carecem de observadores




Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*

Nas eleições anteriores a afluência em alguns círculos ultrapassou os 100%. Em Agosto o MPLA vai com certeza querer bater o seu próprio recorde.

Portugal em particular e a Europa em geral já estão a fazer um relatório sobre as eleições de 31 de Agosto em Angola. Tudo porque o mesmo terá de ser aprovado pelo MPLA, obviamente antes da data que o consagrará como vencedor total e inequívoco.

No âmbito do meu “jornalismo interpretativo” creio que da parte portuguesa o responsável será o ministro Miguel Relvas, tanto mais que – a fazer fé nas palavras sábias de Carlos Magno, presidente da ERC – nem de gravata precisa de mudar.

Acresce que se Portugal não estiver do lado da verdade do regime, o que só por si constitui um crime contra a segurança do Estado, a torneira dos dólares pide fechar-se. E isso seria uma chatice.

Como contributo para esse relatório, recordo que, por exemplo, que o então presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), Caetano de Sousa, considerou que as observações feitas pela União Europeia em relação às eleições legislativas de 2008 eram extemporâneas.

E eram extemporâneas apenas porque, segundo ele, não foram divulgadas logo após o pleito de 5 de Setembro.

Não esteve mal e poderá ser um precedente útil, ou um aviso, para quem este ano ousar meter-se com um regime que está no poder desde 1975 e tem um presidente, não eleito, há 32 anos no poder.

Em declarações à Voz da América, Caetano de Sousa considerou na altura que as posições expressas no relatório final da Missão de Observação da União Europeia não deviam sequer ser feitas nesta altura.

Eu digo mais. Nem nesta altura nem nunca. Aliás, a União Europeia nem sequer deveria ter mandado uma missão de observadores ao mais democrático e transparente Estado de Direito do mundo, Angola.

É que para fazerem figuras de urso ou de palhaço, os observadores europeus bem poderiam continuar a actuar em exclusivo no circo europeu. Que, ao menos, tenha servido de lição para 2012.

O relatório então apresentado em Luanda pela chefe da Missão de Observação da União Europeia, Luísa Morgantini, denunciou falhas, irregularidades, fraudes e quejandos no desempenho da CNE no que toca à imparcialidade na tomada de decisões, assim como na garantia de transparência durante o acto eleitoral.

“Para nós não nos oferece comentários se não os que já foram feitos anteriormente. O relatório já está fora de prazo, isto devia ser apresentado logo a seguir à finalização e apresentação do escrutínio. Os comentários posteriores a isto já não os comentamos, porquanto achamos ultrapassados”, explicou Caetano de Sousa, certamente num improviso decorado a partir da ordem do soba maior.

Mas para a Missão de Observação da União Europeia foi muito bem feito. Ousaram, embora timidamente, “cuspir” no prato em que o MPLA lhes deu comida e por isso foram tratados como não se tratam os vira latas. Só por isso valeu a pena Caetano de Sousa reproduzir as ordens do dono do reino.

Recorde-se que o relatório referia-se a um leque de anomalias registadas durante a votação, desde a notória falta de acesso dos representantes dos partidos políticos ao centro de apuramento central, à não acreditação de um número significativo de observadores domésticos do maior grupo de observadores na capital.

Interessante foi ver que, mesmo obrigados a comer e a calar, os observadores europeus não deixarem de verificar que, por exemplo, uma província “apresentou uma participação eleitoral de 108%” e que “não foram utilizados os cadernos eleitorais para a verificação dos eleitores no dia das eleições e como tal, não houve mais salvaguarda contra os votos múltiplos além da tinta indelével, e nenhum meio para confirmar as inesperadamente elevadas taxas de participação eleitoral”.

Mas como só o disseram dias depois… são umas verdades que não contam porque passou o prazo de validade.

A Missão de Observação da União Europeia dizia ainda que “houve falta de transparência no apuramento dos resultados eleitorais”, “que não foi autorizada a presença de representantes dos partidos políticos nem de observadores para testemunhar a introdução dos resultados no sistema informático nacional e não foi realizado um apuramento manual em separado”, para além de “não terem sido publicados os resultados desagregados por mesa de voto e como tal não foi possível a verificação dos resultados”.

Também Ana Gomes, eurodeputada socialista portuguesa que integrou a missão da União Europeia, disse que eram “legítimas as dúvidas que foram levantadas por partidos políticos e organizações da sociedade civil sobre a votação em Luanda”, ou que “posso apenas dizer que a desorganização foi bem organizada”.

Mas Ana Gomes foi mais longe: “À última da hora, foram credenciados 500 observadores por organizações que se sabe serem muito próximas do MPLA e parece que alguém não quis que as eleições fossem observadas por pessoas independentes”.

Ou, “as eleições em Luanda decorreram sem a presença de cadernos eleitorais nas assembleias de voto e isso não pode ser apenas desorganização...”

Enfim. Como são verdades que não contam porque passou o prazo de validade, o melhor é fazer já um relatório sobre as eleições de 2012 e mandá-lo, a tempo e horas, para ser aprovado pelo MPLA.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor, compilado em Página Global: SE QUISER, VENCERÁ COM MAIS DE… 100%

Angola: Presidente formaliza dia 31 de agosto para data de eleições gerais



NME - Lusa

Luanda, 24 mai (Lusa) - O Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, formalizou hoje a convocação de eleições gerais para o dia 31 de Agosto.

Um comunicado de imprensa da Casa Civil da Presidência da República, divulgado hoje, informa que, nos termos da lei Orgânica sobre as eleições gerais, vão ser remetidas certidões do referido decreto presidencial ao Tribunal Constitucional e à Comissão Nacional Eleitoral.

A data de 31 de agosto tinha já sido avançada na quarta-feira, no final da reunião do Conselho da República, orientado por José Eduardo dos Santos.

O documento informa ainda que o Chefe de Estado angolano exarou um decreto em que autoriza o ministro das Finanças de Angola a proceder à inscrição, no Orçamento Geral de Estado de 2012, as despesas para os partidos políticos e coligação de partidos, legalmente constituídos, no valor de 9,6 milhões de Kwanzas (cerca de 96 mil dólares), atribuídos de modo igual a cada um.

Quem está por trás do grupo sem rosto que ataca jovens oposicionistas em Angola?



Deutsche Welle

Um suposto “Grupo de Cidadãos Angolanos pela Paz, Segurança e Democracia” reivindicou vários ataques contra jovens que ousam manifestar-se contra o regime em Angola. Quem está por trás deste grupo sem rosto?

Foi a Televisão Pública de Angola (TPA) que, em março do corrente ano, deu amplo espaço a um suposto “Grupo de Cidadãos Angolanos pela Paz, Segurança e Democracia na República de Angola”. Este grupo, com membros não identificados, terá sido o responsável por vários ataques a representantes da sociedade civil de oposição ao regime de José Eduardo dos Santos.

Invasões a residências e ataques em pleno espaço público

A primeira invasão aconteceu a 9 de Março passado, tendo os agressores atacado, com barras de ferro, a residência do rapper Carbono Casimiro, onde se encontravam os ativistas Liberdade Sampaio, Catumbila Faz-Tudo “Caveira”, Nelito Ramalhete e António Roque dos Santos. Estes jovens organizavam um protesto contra o presidente José Eduardo dos Santos, uma manifestação que deveria ter lugar no dia seguinte.

A 10 de Março, supostamente, os mesmos atacantes dispersaram violentamente uma concentração de cerca de 30 manifestantes, no Tanque do Cazenga, em Luanda, tendo causado sérios ferimentos, entre outros, ao rapper Luaty Beirão “Ikonoklasta”, assim como ao secretário-geral do Bloco Democrático, Filomeno Vieira Lopes.

Ativistas angolanos dizem que é o governo quem está por trás dos ataques

Rafael Marques, em entrevista à DW África, afirma que os atacantes pertencem às forças de segurança do governo e não atuam como um grupo individual: "São elementos da polícia nacional e da segurança do Estado. Não há um grupo. São agentes de segurança e de polícia."

Idêntica opinião tem Timóteo João, um dos ativistas que tem estado na frente das manifestações contra José Eduardo dos Santos e que também tem sido alvo de perseguições e ameaças do "Grupo de Cidadãos Angolanos pela Paz, Segurança e Democracia": "Os atacantes estavam encapuzados. Em Angola não se vende capuzes nas lojas, foi a polícia de intervenção rápida que fez aquilo. As armas que eles usam são as armas que a polícia usa."

O último ataque ocorreu na noite de terça-feira (22.05.2012): três pessoas ficaram gravemente feridas depois de um grupo de 15 homens armados e encapuzados terem atacado 10 jovens ligados aos protestos contra o governo angolano, novamente em casa do rapper Carbono Casimiro, em Luanda,

Américo Vaz, uma das vítimas, afirma ter fotos e vídeos que servem de prova, garante que os atacantes são os responsáveis pela violência nas manifestações e salienta que os grupos "fazem-se deslocar em carros das forças de segurança."

Autoridades angolanas mantêm silêncio

Quem é o grupo de indivíduos armados que atacam os manifestantes anti-governo em Angola? Jovens manifestantes e ativistas afirmam que é a própria polícia que está por trás das agressões. A DW África tentou - em vão - obter uma reação da Polícia Nacional de Angola.

Autores: Nuno Noronha / António Cascais - Edição: António Rocha

Angola, Guiné-Bissau e Moçambique desrespeitam direitos humanos



Deutsche Welle

Uso de força excessiva por parte da polícia, ameaças à liberdade de expressão e impunidade são alguns dos abusos observados em 2011 pela Amnistia Internacional (AI) nestes três países africanos de expressão portuguesa.

O mais recente relatório da AI sobre o estado dos direitos humanos, referente a 2011 e que este ano se concentra no impacto dos protestos ocorridos em todo o mundo e as mudanças que trouxeram, descreve a situação em 155 países, inclusive em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique.
No ano passado, centenas de milhares de pessoas saíram às ruas para protestar, não apenas no Norte de África e no Médio Oriente, mas também a sul do Saara, onde muitas pessoas reivindicaram o direito à livre opinião e protestaram contra regimes autoritários. No entanto, segundo a Amnistia, estes protestos não tiveram os mesmos resultados e as manifestações foram reprimidas, muitas vezes com violência excessiva, como foi o caso de Angola.

Uso excessivo de força em Angola

Mais preocupante para a organização de defesa dos direitos humanos, em 2011, foi o desrespeito das autoridades angolanas pelo direito à liberdade de reunião e pelo direito de manifestação que se traduziu em prisões e detenções arbitrárias, acusações criminais e uso excessivo da força por parte da polícia, que resultou mesmo em mortes.

Segundo Muluka-Anne Mit, investigadora da AI para os países africanos de expressão portuguesa, em alguns casos, a polícia usou armas e cães contra manifestantes anti-governo. Mas, a maior preocupação da AI eram “grupos que se infiltraram nas manifestações e usaram muita violência contra as pessoas que se estavam a manifestar pacificamente e a polícia não reagiu”, disse à DW África. A organização critica também as detenções arbitrárias de que foram alvo alguns desses manifestantes e lembra que, até ao momento, estes ainda não foram compensados.

Também os jornalistas angolanos tiveram de enfrentar mais violência e mais restrições. Armando Chicoca, da rádio Voz da América, e William Tonet, do jornal “Folha 8”, foram julgados e condenados por difamação por escreverem artigos críticos, como é referido no relatório de 2012 da Amnisitia.

Imigrantes congoleses entre as vítimas

Os direitos humanos de imigrantes congoleses continuaram igualmente a ser violados. Segundo a investigadora da AI, que cita a organização não governamental Comité Internacional pelo Desenvolvimento dos Povos, pelo menos 55 mil pessoas da República Democrática do Congo (RDC) foram expulsas de Angola. E entre estas 55 mil, pelo menos seis mil pessoas foram abusadas sexualmente pelas autoridades em Angola.

Os desalojamentos forçados e a demolição de casas em Angola também preocupam há muitos anos a AI, que critica o governo de Luanda por ainda não ter honrado a promessa, feita no ano passado, de realojar 450 famílias que tinham sido anteriormente despejadas.

Instabilidade na Guiné-Bissau

A Guiné-Bissau também continua na lista de preocupações da organização de defesa dos direitos humanos, sobretudo a tensão entre os militares que já em 2011 era vista como fonte de instabilidade. O relatório faz referência a “relatos da tentativa de golpe de Estado no final de dezembro” passado.

As críticas da AI estendem-se à falta de progressos na investigação sobre os assassinatos de figuras políticas e militares em 2009, que levaram milhares de pessoas às ruas para exigir o fim da impunidade. “Também nos preocupamos com a impunidade em relação à morte do presidente Nino Vieira e à morte do general Tagme Na Waie”, diz Muluka-Anne Mit, lembrando que não houve ainda uma investigação, nem um julgamento por causa destas mortes. “E agora estamos a ver que esta tensão entre militares e governo continua”, acrescenta.

A liberdade de expressão na Guiné-Bissau também foi ameaçada quando o jornal “Última Hora” foi obrigado a fechar, depois de ter implicado um oficial militar na morte do ex-presidente do país.

Impunidade em Moçambique

Moçambique é o terceiro País Africano de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) mencionado no relatório. Foram registados vários casos do uso ilegal da força pela polícia, alguns dos quais resultaram em morte e a impunidade continua a ser um problema. “Ainda há muitos casos de abusos e de mortes pela polícia que ainda não foram julgados”, sublinha a investigadora da Amnistia.

Outra das preocupações da AI é em relação a imigrantes, refugiados e requerentes de asilo. “Recebemos informação sobre maus-tratos a imigrantes, principalmente imigrantes da Somália e da Etiópia por agentes da fronteira e da polícia em Moçambique”, conta Muluka-Anne Mit. Tortura e outros maus-tratos nas prisões também continuaram a ser relatados.

Autora: Madalena Sampaio - Edição: Helena Ferro de Gouveia

Anistia Internacional denuncia violação de direitos humanos pela polícia brasileira


Deutsche Welle

Em seu relatório anual, a organização humanitária denuncia a precariedade do sistema prisional e a ação de milícias. Documento lembra a morte de indígenas e quilombolas na disputa por terras e elogia Comissão da Verdade.

O excessivo uso da violência por parte das autoridades policiais – seja dentro do sistema penitenciário, seja por esquadrões da morte e milícias responsáveis por execuções e torturas e comandadas por grupos que agem à revelia da lei – está entre as principais violações dos direitos humanos no Brasil, segundo relatório da Anistia Internacional (AI) divulgado nesta quarta-feira (24/05) em Londres.

Segundo o documento, referente ao ano de 2011, ampliou-se a prática de tortura no momento da prisão e durante interrogatórios em presídios e delegacias do Brasil. O sistema penitenciário conta com cerca de 500 mil condenados, sendo pouco mais da metade em regime fechado, sob custódia do Estado, diz a Anistia. Esses presos vivem sob péssimas condições, em celas superlotadas e vulneráveis a todo tipo de violência.

A organização humanitária afirma que a situação também é preocupante nos centros de detenção de menores. Os autores do estudo relembram o caso da menina de 14 anos detida em Belém em setembro de 2011 e que foi dopada e violentada durante quatro dias. Durante as investigações da denúncia, 30 funcionários do centro, entre eles o diretor, foram suspensos. Após receber ameaças, a menina teve que entrar para o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte.

Polícia violenta

A AI afirma que os procedimentos adotados pela polícia brasileira são marcados pela discriminação, violação dos direitos humanos, corrupção e pelo estilo militar. "As prometidas reformas na segurança pública foram prejudicadas por corte drásticos no orçamento e por falta de vontade política", afirma o relatório.

Apesar de concordar que as 18 Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) que existem no Rio de Janeiro representam um "avanço importante", por intensificarem a presença policial nas áreas mais problemáticas, a organização critica a falta de investimentos de maior alcance em políticas sociais para as comunidades que vivem em situação de pobreza.

A AI também cobra do governo brasileiro uma melhor formação dos policiais e maior controle sobre as instituições de segurança, diante das denúncias de uso excessivo da violência e de envolvimento com corrupção.

Outro destaque do relatório é a participação de policiais na formação de milícias e esquadrões de morte envolvidos em extorsões, tráfico de armas e drogas e assassinatos, classificados como "limpezas sociais". Entre os casos de quadrilhas desbaratadas divulgados pela mídia está a Operação Guilhotina, realizada pela Polícia Federal em fevereiro do ano passado, que chegou a 47 policiais e ex-policiais do Rio de Janeiro acusados de envolvimento com tráfico, fraudes e extorsão.

Conflitos agrários

O relatório destaca ainda os conflitos nos campos pela posse de terras, que têm levado à morte de índios e quilombolas. De acordo com o Conselho Indigenista Missionário, 1.200 famílias vivem em situação extremamente precária, às margens de rodovias, enquanto aguardam a restituição de suas terras. A AI traz vários relatos de ameaças, violência e mortes em conflitos agrários, envolvendo indígenas e ativistas.

Em outubro do ano passado, a decisão do governo Dilma Rousseff de facilitar a concessão de licenças ambientais a grandes projetos que estimulam o desenvolvimento econômico foi muito criticada, segundo a AI, por atingir áreas de comunidades indígenas e quilombolas. Um dos projetos mais criticados é o da construção da usina de Belo Monte, no Pará, alvo de inúmeros protestos país afora.

Um ano de gestão Dilma

O relatório lembra ainda que, em apenas um ano de governo Dilma, sete ministros tiveram que deixar o cargo por conta de denúncias de corrupção e de mau uso de dinheiro público.

Para a AI, o limitação do sigilo de documentos públicos em 50 anos e a criação da Comissão da Verdade, que começou seus trabalhos na semana passada, representaram "um importante avanço na luta contra a impunidade no país".

Durante os próximos dois anos, a comissão vai investigar crimes contra os direitos humanos ocorridos entre 1946 a 1985, com foco no período do regime militar. A expectativa de organizações formadas por familiares de pessoas desaparecidas na ditadura é de que, ao final dos trabalhos, haja uma pressão para que agentes públicos envolvidos em torturas e assassinatos sejam punidos, apesar da proteção oferecida pela Lei da Anistia.

Exportadores de armas estão no Conselho de Segurança

Na introdução do relatório anual da entidade, o secretário-geral internacional da AI, Salil Shetty, ressaltou que 2011 foi um ano marcado por protestos corajosos e profundas mudanças políticas em todo o planeta, especialmente nos países onde ocorreu a chamada Primavera Árabe, como Egito, Líbia e Tunísia.

Apesar de Estados Unidos e Europa terem apoiado verbalmente os movimentos democráticos nesses países, cientes de que a "crítica à repressão estatal e às péssimas condições econômicas" era justificada, norte-americanos e europeus não queriam abrir mão de suas "relações especiais" com os regimes repressores, que garantiam a estabilidade em áreas estratégicas por conta das reservas de gás e petróleo, afirma o relatório da AI.

Além disso, aponta o organismo, os países ocidentais têm grandes interesses no lucrativo comércio de armas. "Quem mais fatura com o comércio internacional de armas são os países com assentos permanentes no Conselho de Segurança da ONU", afirma Wolfgang Grenz, diretor-geral da AI na Alemanha.

Em 2010, 70% das exportações saíram dos países com poder de veto no Conselho Segurança das Nações Unidas, estando os EUA em primeiro lugar (30%), seguidos de Rússia (23%), França (8%), Reino Unido (4%) e China (3%). "Assim fica fácil entender por que a Rússia não aprovou sanções mais duras contra a Síria no Conselho", constata Grenz.

A Alemanha, que não é membro permanente do Conselho de Segurança, é o sétimo maior exportador mundial de armas, segundo a Anistia.

Autoras: Mariana Santos/Mirjam Gehrke - Revisão: Alexandre Schossler

Brasil: ANISTIADO DEFENDE JULGAMENTO JUSTO DE SEUS TORTURADORES



Najla Passos – Carta Maior

Em um julgamento emocionante, a Comissão de Anistia reconheceu, por unanimidade, a condição de anistiado político do jornalista Anivaldo Pereira Padilha, 71 anos, pai do ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Em entrevista à imprensa, ele defendeu o julgamento justo dos seus torturadores. E criticou a interpretação da Lei da Anistia, de 1979, reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2010.

Brasília - Em um julgamento emocionante, a Comissão de Anistia reconheceu, por unanimidade, a condição de anistiado político do jornalista Anivaldo Pereira Padilha, 71 anos, pai do ministro da Saúde, Alexandre Padilha. O julgamento ocorreu na terça (22), momento antes do que negou o mesmo status ao Cabo Anselmo, agente infiltrado da ditadura militar.

Editor de um jornal da Igreja Metodista de São Paulo, na década de 1960, ele militava na organização clandestina de esquerda Ação Popular (AP). Em consequência disso, foi preso e barbaramente torturado pelos agentes do regime. E, posteriormente, obrigado a viver no exílio, impedido do convívio com a família.

Anivaldo terá direito a receber uma pensão mensal de R$ 2.484, além do pagamento retroativo de R$ 229,3 mil, referente ao período em que o processo tramitou. Mas o que mais o deixou mais contente foi receber o pedido de perdão do estado brasileiro pelos crimes cometidos contra ele. “Eu sinto que minha dignidade como cidadão e brasileiro, hoje, foi restaurada”, afirmou.

Em entrevista à imprensa logo após o julgamento, ele falou sobre a necessidade de se estabelecer a verdade histórica no país. Defendeu o julgamento justo dos seus torturadores. Criticou a forma como a lei estabelece a reparação financeira aos anistiados. E, também, a interpretação da Lei da Anistia, de 1979, reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2010.

O senhor está de alma lavada?

Bastante. Me sinto bastante leve, agora. Hoje realmente se encerra um ciclo importante da minha vida. As decisões da Comissão da Anistia, ao estabelecer seu voto, especialmente, pedir perdão em nome do estado brasileiro, ao pedir perdão pelos crimes que a ditadura cometeu contra nós, é uma forma de restaurar nossa dignidade. Eu sinto que minha dignidade como cidadão e brasileiro, hoje, foi restaurada.

No seu depoimento, o senhor citou o nome dos seus torturadores e pediu que a denúncia fosse encaminhada à Comissão da Verdade e ao Ministério Público. O senhor acha que eles devem ser julgados?

Eu acho que sim. E não é uma questão de vingança, revanche. Vingança seria se eu quisesse pegar esses torturadores e colocá-los no “pau-de-arara”, na “cadeira do dragão”. Ou que quisesse julgá-los de forma sumária, como todos nós fomos. Eu estou propondo que [ a denúncia] seja encaminhada ao Ministério Público para que faça as investigações. Se for o caso, que faça as denúncias e que eles sejam julgados com amplo direito à defesa. E porque eu e muitos de nós propõem isso? Porque, no Brasil, vivemos uma tradição de impunidade. Talvez o período mais sombrio da história do Brasil, além da ditadura, tenha sido a escravidão. E Rui Barbosa mandou queimar e destruir os documentos da escravidão. Nós temos uma tradição de acordo entre as elites do Brasil para que sempre seja mantida a impunidade. Eu creio que se os crimes cometidos pelo Estado Novo tivessem sido investigados - e os torturadores, assassinos e mandantes, punidos - talvez o golpe de 1964 não tivesse ocorrido e, especialmente, o estado de terror estabelecido a partir de 1964, não teria ocorrido. Não é questão de punir pensando no passado, mas punir pensando no futuro. Os torturadores continuam aí nas prisões e delegacias de todo o pais, porque sabem que podem ficar impunes.

O senhor pode repetir os nomes dos seus torturadores?

São vários. Tem o capitão Albernaz, o capitão Coutinho, o capitão Guimarães, o capitão Homero, o delegado Baêta e outros. Alguns já morreram. O Albernaz, por exemplo, eu soube que morreu, mas alguns estão na reserva. Alguns civis continuam aí. Há delegados ainda atuando.

E seria capaz de reconhecê-los?

Sim sem dúvidas, mesmo passados 40 anos, eu tenho certeza que os reconheceria.

O Senhor ficou satisfeito com os valores da indenização?

Eu não me preocupei muito com os valores. É claro que eu necessito. É importante, porque vai possibilitar que eu me aposente. Mas eu tenho uma vida simples e nunca fui atrás de riqueza e nem de dinheiro. A Lei que regula o trabalho da Comissão da Anistia estabelece uma reparação baseada em termos trabalhistas. E aí você perpetua a injustiça que há na sociedade. Porque que um profissional liberal ou intelectual tem que receber mais que um camponês ou um operário?

O senhor achou ruim testemunhar e reviver esta história densa e pesada?

Não achei ruim, não. Na verdade, sempre pensei que, no momento em que houvesse o julgamento, eu gostaria de estar presente. Por dois motivos. Primeiro, porque eu nunca me neguei a falar sobre aquele per[iodo. O que é também um processo terapêutico. Quanto mais colocamos para fora aquilo que passamos, mas fácil é superar. Segundo, é importante contar esta historia, porque muitas pessoas da nova geração não tem conhecimento, em geral. E pessoas que viveram na época, sob terror, evitavam obter informação. Não é penoso. É emocionante. Eu me emociono toda vez que falo sobre o período, porque eu me lembro dos companheiros que morreram, me lembro do sofrimento da minha família, da impossibilidade de conviver com meus filhos.

Como o senhor encara o fato do Cabo Anselmo pedir anistia tal como o senhor, que sofreu a perseguição da ditadura para a qual ele trabalhou?

Ao fazer o requerimento de anistia e pedir reparação, o Cabo Anselmo está cumprindo o papel que ele sempre cumpriu, que é o de agitador externo, um agitador infiltrado. Um sujeito que foi agente infiltrado, que teve um papel fundamental na preparação do golpe, com a Revolta dos Marinheiros, que foi o principal pretexto usado pelos militares para dar o golpe de estado. A violação da hierarquia militar foi liderada pelo Cabo Anselmo quando ele já era um agente golpista. Depois continuou como agente infiltrado. Ele mesmo confessou que foi responsável pela morte demais ou menos 200 companheiros. Ou seja, ele continuou como agente da ditadura. Se, por acaso, ele foi demitido ou sofreu qualquer coisa, foi para manter a fachada de aparência de alguém que não era infiltrado. O que ele quer é simplesmente turvar as águas.

O senhor acha que a Lei da Anistia precisa sofrer uma revisão para que torturadores sejam punidos?

Eu não diria uma revisão, mas uma reinterpretação correta. Essa Lei da Anistia foi imposta pelos militares. É uma auto-anistia. Claro que nos serve também, mas é uma auto-anistia. E é uma reinterpretação o que precisa, porque quando eles dizem que a Lei perdoa crimes conexos, isso não se aplica aos torturadores. Por exemplo, eu cometi um crime conexo, de acordo com a Lei de Segurança Nacional. Eu era militante de uma organização clandestina de esquerda que lutou contra a ditadura. Para me proteger, principalmente na clandestinidade, eu tinha um documento falso. Isso é um crime conexo. Um crime que cometi paralelamente. Os militares, não. A anistia não se aplica a eles porque se tratam de crimes cometidos por agentes do estado. Quer dizer, pessoas que estavam presas sob custodia do estado brasileiro. E foram torturadas, mortas, assassinadas. E ainda desapareceram com seus corpos. A Lei da Anistia não se aplica. O que há é o resultado de mais um acordo entre a elite para manter a impunidade.

Anistia Internacional critica governos que não respondem às demandas sociais




Marcelo Justo, Londres – Carta Maior

Informe anual da Anistia Internacional criticou duramente os governos por sua falta de resposta às demandas sociais. “De Nova York e Moscou a Londres e Atenas, de Dakar e Kampala a La Paz e Cuernavaca, de Phom Penh a Toquio, as pessoas saíram às ruas. Foi patente o contraste entre a valentia dos que exigem direitos e a incapacidade dos líderes para responder com medidas concretas”, assinalou o secretário geral Salil Shetty”.

Londres - Em meio à crise econômica e política no mundo árabe e na União Europeia o informe anual da Anistia Internacional criticou duramente os governos por sua falta de resposta às demandas sociais. “De Nova York e Moscou a Londres e Atenas, de Dakar e Kampala a La Paz e Cuernavaca, de Phom Penh a Toquio, as pessoas saíram às ruas. Foi patente o contraste entre a valentia dos que exigem direitos e a incapacidade dos líderes para responder com medidas concretas”, assinalou o secretário geral da Anistia Internacional Salil Shetty”.

O informe global 2012 da organização de direitos humanos com sede em Londres envolve desde as rebeliões que sacudiram o mundo árabe a partir da imolação de um vendedor ambulante tunisiano no início do ano passado até as manifestações contra os programas de austeridade que sacodem o mundo desenvolvido. “A crise econômica expôs uma ruptura do pacto social entre o governo e a cidadania. No melhor dos casos, os governos se mostraram indiferentes. Muitas vezes só se preocuparam em proteger os poderosos”, destacou Shetty.

No mundo árabe esse pacto social era uma quimera que só começou a aparecer com o começo da rebelião. “A resposta dos governos à Primavera Árabe foi brutal e o Ocidente se preocupou mais em manter o status quo do que em promover a democracia, tudo agravado por uma retórica crescentemente xenófoba da União Europeia ante o considerável número de refugiados que começaram a chegar do norte da África. Hoje a Primavera Árabe está se convertendo em muitos aspectos em um inverno”, disse à Carta Maior Javier Zuñiga, assessor do secretário geral da Anistia Internacional.

O Egito é um caso paradigmático. Divulgado no mesmo dia das eleições presidenciais nesse país, o informe assinala que os ideais revolucionários estão em perigo. O Conselho Supremo das Forças Armadas, que assumiu o poder após a queda de Hosni Mubarak, com a promessa de dirigir a transição, processou ou levou aos tribunais mais de 12 mil civis, muito mais do que ocorreu durante os 30 anos do governo de Mubarak.

As mulheres foram especialmente afetadas. Em março de 2011, as forças de segurança obrigaram um grupo de detidas em uma manifestação a submeter-se a “provas de virgindade”. A Anistia Internacional destaca que um tribunal administrativo egípcio determinou que tais provas não tinham valor legal, mas quando a organização pediu aos partidos políticos que se comprometessem a proteger princípios básicos de direitos humanos, os dois partidos que obtiveram a maioria dos votos nas eleições parlamentares se negaram a fazê-lo. O Partido da Liberdade e da Justiça, da Irmandade Muçulmana, que conseguiu 235 cadeiras (47%), não respondeu à petição e o partido salafista Al Nur, que ficou em segundo lugar com 121 cadeiras (24%), negou-se a promover os direitos das mulheres ou a abolição da pena de morte.

Austeridade, multinacionais e direitos humanos

A Anistia Internacional é igualmente dura com os países desenvolvidos e sua resposta à crise econômica. Coerente com a extensão feita do conceito de direitos humanos para o campo econômico e social, em seu informe de 2009, a Anistia critica “as políticas internas que levaram à persistente crise econômica e a uma grande tolerância com a desigualdade”. Os protestos na Europa e na América do Norte mostraram que “as pessoas perderam a fé nos governos que desprezaram várias vezes a prestação de contas, a justiça e a promoção da igualdade”. Esta crescente deslegitimação teve um claro impacto político: desde o início da crise da dívida, 16 países dos 27 que formam a União Europeia mudaram de governo.

Dada a profundidade da crise, a legitimidade dos novos governos não dura muito e diminui ainda mais com a repressão policial dos protestos. “Na Grécia, a polícia utilizou reiteradamente força excessiva e fez amplo uso de produtos químicos contra pessoas que protestavam pacificamente. Na Espanha, houve um uso excessivo da força contra manifestações que pediam mudanças políticas, econômicas e de política social”, assinala o secretário geral da Anistia Internacional.

Este “singular fracasso da liderança nacional e internacional” é também evidente, segundo o informe, no crescente poder das multinacionais para evitar toda regulação e obter benefícios a custa das comunidades locais. “Desde a Shell, no delta do Níger, até a Vedanta Resources, em Orissa, Índia, os governos não garantem que, minimamente, as empresas respeitem os direitos humanos. Em muitos países, centenas de milhares de pessoas são alvo de remoção forçada quando chegam as empresas mineradoras e reclamam as terras onde há recursos naturais”, diz ainda o secretário geral Salil Shetty.

A Anistia elogia o papel das novas tecnologias na democratização, mas critica muitas de suas empresas. “Ficou demonstrado que empresas que, aparentemente, se dedicam à expressão e ao intercâmbio de opiniões (e se beneficiam disso), como Facebook, Google, Microsoft, Twitter, Vodafone e Yahoo, estão colaborando na promoção de violações de direitos humanos”, acrescenta o secretário geral.

Sobre a América Latina, a Anistia Internacional destaca que a demanda por direitos humanos foi ouvida por toda a região durante 2011: nos tribunais nacionais, no sistema interamericano e nas ruas. “As petições de justiça realizadas por cidadãos individuais, defensores e defensoras dos direitos humanos, organizações da sociedade civil e povos indígenas seguiram ganhando força e, frequentemente, foram encaminhadas por setores que realizavam enfrentamento direito com poderosos interesses econômicos e políticos”, diz Shetty.

Os contextos políticos mais dramáticos dessas mobilizações se deram com os massacres promovidos pelo narcotráfico no México (mais de 12 mil mortes no ano passado) ou pelo conflito armado na Colômbia. No caso do Brasil, o elevado índice de criminalidade violenta e as práticas das forças de segurança foram os pontos mais ressaltados pela Anistia que destacou que o atentado contra a juíza Patricia Acioli “mostra o alcance e a confiança com que operam as milícias”. A isso, soma-se a expulsão, frequentemente violenta, de grupos indígenas de suas terras tanto no Brasil, como na Colômbia, Guatemala ou México. “Às vezes multinacionais, outras vezes grupos nacionais, iniciam explorações petroleiras, mineiras ou de recursos florestais sem respeitar os direitos indígenas e das comunidades que vivem no lugar”, disse Javier Zuñiga à Carta Maior.

Uma nova oportunidade

Segundo a Anistia, os governos terão uma nova oportunidade, em julho de 2012, de reverter essa situação e mostrar uma nova liderança quando se reunirem para acordar o texto definitivo do tratado para o comércio de armas. “Um tratado sólido impediria a transferência internacional de todo tipo de armas convencionais, incluindo as armas pequenas, armas leves, munição e componentes-chave, para países onde exista um risco provável de que sejam utilizadas para cometer graves violações do direito internacional humanitário e dos direitos humanos. Para atingir esse objetivo, o tratado exigiria que os governos realizassem uma rigorosa avaliação do risco para os direitos humanos antes de conceder uma licença de exportação de armas”, assinala Sajil.

No informe, a Anistia é cética. Em 2010, pelo menos 70% do total das exportações importantes de armas corresponderam aos seguintes países: Estados Unidos (30%), Rússia (23%), França (8%), Reino Unido (4%) e China (3%). “ Em todo o mundo, o fluxo irresponsável de armas procedentes destes cinco países causou inúmeras mortes de civis e outras graves violações dos direitos humanos e das leis da guerra”, enfatizou o secretário geral da organização Salil Shetty.

Tradução: Katarina Peixoto

Zona Euro: “CHEGOU AO FIM A HEGEMONIA ALEMÔ




To Vima, Atenas - Presseurop

Com a nova orientação, impulsionada por Paris, o equilíbrio interno de poder na União Europeia torna-se desfavorável a Berlim e ao rigor defendido pela Alemanha. Essas circunstâncias permitem aos gregos vislumbrar uma luz ao fundo do túnel e recuperar a esperança, congratulam-se em Atenas.


A cimeira extraordinária de ontem à tarde teve qualquer coisa de diferente em relação ao que nos foi dado a conhecer nestes últimos dois anos: não havia uma “linha diretriz” preparada com algumas horas de antecedência pela chanceler alemã Angela Merkel e pelo Presidente francês. François Hollande não deu continuidade à “tradição” de Nicolas Sarkozy. O seu “batismo de fogo” em Bruxelas foi “direto” e não via Berlim.

Esta cimeira teve também uma outra particularidade. A Alemanha ia enfrentar, pela primeira vez desde há muito tempo, uma Ordem de Trabalhos que não tinha ditado: relacionada com questões ligadas ao crescimento. É provável que nenhuma decisão tenha sido tomada esta quarta-feira à tarde, mas há uma constatação clara: a hegemonia alemã é agora posta em causa pela Europa. E Berlim sabe disso muito bem. Os dirigentes alemães já sentiram que foram destronados.

O domínio da Alemanha é ativamente contestado. E isso afeta diretamente a Grécia. Ontem, antes do início da cimeira, o Banco Central alemão divulgou publicamente um comunicado a indicar que não voltaria a tomar qualquer iniciativa em relação à Grécia. E que, se este país entrasse em bancarrota, seria uma maneira “de acabar com esta história”… Ao mesmo tempo, François Hollande reafirmava o seu apoio e a sua confiança no país e no povo grego.

A política de Merkel já não tem aliados

Porém, o novo equilíbrio europeu que toma forma neste momento está nas conclusões da cimeira: “Faremos com que os fundos europeus e todos os meios sejam mobilizados para que a Grécia retome a via do crescimento e da criação de emprego.”

A hegemonia alemã na Europa terminou. Como grande parte da imprensa alemã sublinha, desde ontem, Angela Merkel está cada vez mais isolada perante os seus parceiros, mas não só. Na realidade, a sua política já não tem aliados. Desde organizações internacionais nos EUA, passando por Paris e Madrid, já ninguém a defende.

Que irão fazer os alemães? Esquecerem tudo e adaptarem-se à nova realidade, como se nada se tivesse passado? Seguramente que não. Vão bater-se e muito. Têm vontade e poder. Mas já não estão sozinhos no comando. Já não determinam sozinhos a política a seguir. Isso suscita enormes esperanças na Europa e, sobretudo, na Grécia.

Grécia vislumbra a luz ao fundo do túnel

Para o nosso país, as circunstâncias alteraram-se radicalmente nestes últimos tempos. A Grécia tem agora a possibilidade de reivindicar um futuro melhor. Bem entendido, é preciso que cumpra o que prometeu, como sublinha a grande maioria dos nossos parceiros. É um facto. Mas há um mês ninguém diria o que se passou ontem, este novo equilíbrio europeu. Os “compromissos” a que todos se referem, e com razão, deixaram de ser um conjunto de dogmas herméticos em que não se podia tocar. O parâmetro do “crescimento”, neste momento em cima da mesa, altera as regras do jogo.

A Grécia pode apoiar-se nisso, ou fazer ainda mais. Pode bater-se, simplesmente porque alcançámos o fim do rigor atrás do qual se escondia a política nacionalista alemã. Berlim deixou de ser o nosso único interlocutor... Agora talvez comecemos a ver resultados, por exemplo, em relação às privatizações, ou no setor da energia. Até que ponto é importante, sobretudo neste momento, registar estes avanços?

O país sai do túnel do desespero no qual foi posto pela hegemonia alemã. Mas temos de provar que acreditamos ser capazes de vir a ser um verdadeiro estado europeu que deseja viver sem muletas. Temos de fazer o que é absolutamente necessário para não desaparecermos, no interior e no exterior da Europa. E podemos fazer isso muito mais facilmente agora que o estado de asfixia está prestes a acabar.

O nosso futuro está hoje muito mais nas nossas mãos do que estava ontem. E isso é um bom augúrio. Mas precisamos de uma política. E a política é a arte do possível. Consequentemente, o fanatismo será agora o nosso maior inimigo. Temos fanáticos de sobra e de todos os lados. Que havemos de fazer contra isso? A primeira observação que devemos fazer hoje é a de que a posição da Grécia nestas últimas semanas, apesar daquilo que se disse, melhorou.

Temos de nos agarrar a esta réstia de luz que vemos ao fundo do túnel e batermo-nos para mudar a nossa sorte. Neste momento, somos capazes. A Europa já não é a que era há poucas semanas. O contexto é outro. Para além disso, esta mudança resulta da expressão da vontade de dois povos: o francês e o grego. Os franceses foram capazes de contrariar a todo-poderosa Alemanha que subjugou tão completamente o anterior Presidente ao ponto de o fazer perder as eleições. E os gregos foram capazes de mostrar, nas urnas, o seu descontentamento. Hoje, com a mudança na toda-poderosa Alemanha, a via europeia da Grécia voltou a estar aberta. Provemos que compreendemos e que nos iremos bater para reconquistar o nosso futuro. De qualquer forma, agora, temos condições para isso.

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