quinta-feira, 14 de março de 2013

AINDA O VALE DO CUANGO – II

 


Martinho Júnior, Luanda
 
5 – Tudo seria ainda relativamente inócuo, não fora o facto da atracção migratória clandestina e ilegal integrar cada vez mais gente proveniente de “estados falhados” do espaço CEDEAO, como o Mali, respondendo a estímulos financeiros uma parte dos quais são movidos a partir das monarquias arábicas, mesmo que surjam via de outros estados, incluindo os Estados Unidos, o Canadá e os diversos canais da Europa.
 
Em Angola não se conseguem identificar os interesses que estão por detrás desse “investimento” que impulsiona a migração ilegal com os olhos postos nos diamantes aluviais do Cuango e do Cassai.
 
Alguns dos que vêm integrar a exploração desenfreada de diamantes por via do garimpo, no vale do Cuango, entram normalmente por via legal: os financiadores das operações (escalão operativo superior) e alguns dos executivos (escalão intermédio) que preenchem os “comptoirs”.
 
O grosso dos garimpeiros (entre eles a “mão de obra maliana”), entra todavia ilegalmente (são eles que constituem o escalão de base das redes).
 
O fluxo ilegal de congoleses provenientes da RDC (grande parte deles também interessados no garimpo artesanal) facilita a entrada de migrantes ilegais provenientes de países islâmicos que são utilizados como trabalhadores no garimpo aluvial, o que indicia que quem promove a “excursão” tem também interesses profundos em território da RDC, na capital e nas regiões limítrofes a Angola.
 
Consta que os “libaneses” que operaram antes com o clã de Mobutu, enquanto ele se constituiu em regime, estão agora todos dentro de território angolano, envolvidos nas operações de exploração e negócio de diamantes, o que contribui para indiciar o carácter sócio-político da manobra.
 
Tendo antes servido às redes de suporte a Maurice Tempelsman, agora estão a operar numa região que Tempelsman tinha como alvo, primeiro com o regime servil de Mobutu, depois através dos esforços da American Mineral Fields, imediatamente antes da “saga dos diamantes de sangue” de Savimbi…
 
6 – O grosso dos migrantes islamitas que vêm trabalhar como garimpeiros (mão-de-obra das redes), são provenientes do Mali, da Mauritânia e da Guiné Conacry, entrando em Angola a partir do território da RDC na sua última fase de aproximação a Angola, em grande parte acompanhando o traçado do Cuango e chegando facilmente ao Cuanza.
 
Eles constituem o escalão de base dessas redes pois em resultado da sua actividade de garimpo vendem ou entregam os diamantes aluviais a “comptoirs” que são operados maioritariamente por migrantes islamizados provenientes do Senegal, que se encontram nas localidades; os senegaleses são o escalão intermédio.
 
Os senegaleses dos “comptoirs” são financiados por migrantes “libaneses” que actuam “behind the scenes” como banqueiros e financiadores das operações (escalão executivo superior das redes), ao mesmo tempo financiadores das operações comerciais, de logística e outras, bem como dos “parceiros” angolanos que lhes servem de “cobertura”.
 
Os “libaneses” vendem uma parte das “colheitas” em Luanda, a “escritórios” operados normalmente por cidadãos israelitas, ou mesmo ao próprio estado, mas conseguem reservar-se ao tráfico fora do controlo das autoridades angolanas sempre que acharem conveniente, recorrendo ou não aos seus “parceiros” nacionais de “cobertura” que se comportam como autênticos mercenários.
 
Com o rótulo de “libaneses” (o Líbano não possui nem Embaixada, nem Consulado em Luanda), muitos cidadãos oriundos dos países do Médio Oriente tiram partido de várias identidades e passaportes, sem qualquer obstáculo de natureza jurídica-institucional…
 
7 – A exploração, o negócio e o tráfico ilegais de diamantes fazem o seu entrosamento em muitos casos com o comércio legal, em grande parte “entregue”, sob o ponto de vista de mão-de-obra, a cidadãos de origem maliana e de outras origens islamizadas.
 
No comércio neo liberal em voga em Angola, os empresários angolanos sedentos de lucros fáceis e com pouco trabalho, buscaram parceiros externos que, tirando partido dos alvarás investem por um lado no sistema a grosso e a retalho, por outro recorrem aos migrantes para que sejam eles a trabalhar nas lojas… a baixo custo e com cargas horárias de actividade sem possibilidade de concorrência!...
 
Desse modo os impactos do islamismo na região dos vales do Cuango, do Cassai e do Cuanza, estão intimamente associados aos impactos do islamismo na periferia urbana das grandes cidades do litoral, em especial em Luanda.
 
As periferias do Cacuaco, de Viana e de Benfica espelham essa situação, muito embora em toda a cidade de Luanda hajam negócios e lojas que recorrem ao trabalho dos malianos.
 
A fronteira entre o que é legal, o que é ilegal e o que é “informal” tornou-se assim cada vez mais ténue em Luanda e isso influi no clima dos grandes subúrbios como o Cacuaco, Viana e Benfica, onde a “oposição”, uma “oposição” que se acoberta também no neo liberalismo, arregimenta e mobiliza com maior êxito…
 
Potências com embaixadas em Luanda como os Estados Unidos, não deixam de prestar atenção também ao desenvolvimento dos fenómenos humanos resultantes das políticas “globais” que perseguem a via neo liberal, que implicam a migração islâmica, sobretudo a ilegal e a que é introduzida para efeitos de comércio e exploração / negócio de diamantes.
 
É evidente que este é um fenómeno esperado pelos Estados Unidos, na sequência aliás do que foi criado desde os tempos de Ronald Reagan e dos “freedom fighters” da ocasião: os “contras” na Nicarágua, a UNITA em Angola e os grupos radicais islâmicos, entre eles o de Bin Laden, no Afeganistão!
 
Até onde eles “continuam juntos”?!
 
8 – As leis islâmicas chocam em muitos casos com o quadro de leis de Angola, indexadas a uma outra cultura e motivadas para a recuperação do tecido social do país e para a reconstrução nacional.
 
De entre as leis que chocam estão algumas que se referem ao estatuto da mulher: as leis islâmicas são muito mais compulsivas e restritivas de direitos, enquanto as leis angolanas imprimem a tendência para a igualdade de direitos entre homens e mulheres, vontade aliás expressa na composição dos órgãos do estado a todos os níveis.
 
É evidente que essa situação começa a causar perturbações de ordem psicológica, social e política, ao pôr em causa o quadro das leis que estão a ser implementadas pelo estado angolano, resultando numa forma de desregramento e de “desobediência civil”, muito ao gosto de sensibilidades como a UNITA, o CASA-CE, ou ainda algumas instituições de “direitos humanos” e organizações sociais afins...
 
Por detrás dessa tendência e das correntes que a movem, o acompanhamento de vários sectores da Embaixada dos Estados Unidos está garantido: é só, por exemplo, verificar o papel da Voice of América ao serviço de campanhas que comportam o módulo psicológico do desregramento social, ao serviço dos seus interesses, da “oposição” engajada numa “primavera” de contornos cada vez mais definidos, das multinacionais que servem e dum cartel de diamantes ansioso por continuar a saga de fazer desgastar o que resta do movimento de libertação e do nacionalismo angolano!...
 
Esse clima, ao ser aproveitado por algumas tendências políticas em especial nos subúrbios de Luanda, dá relevo à “desobediência civil” e às tensões, visando confrontar o próprio estado angolano e gerar a atmosfera propícia, análoga à atmosfera das “primaveras árabes”!
 
A radiografia das tendências de voto que fiz sobre as eleições, espelham a conjugação desses factores, que contribuíram para impulsionar a tendência de voto na UNITA e no CASA-CE!
 
A recordar:
 
Fotografia: As quedas Tazua no Cuango internacional.
 
A consultar:
- Le diamant, le commerçant du fleuve Sénégal et la ville – http://www.annalesdelarechercheurbaine.fr/IMG/pdf/Bredeloup_ARU_78.pdf
- La fin du Congo et de l'Afrique coloniale – http://www.congonline.com/Forum1/Forum06/Sikaduma01.htm
- Corrupção nas fronteiras facilita migração ilegal – http://s362849928.onlinehome.us/home/semanario_angolense_464.pdf
- O perigo do Islão em Angola – http://www.opais.net/pt/opais/?det=2703
- Angola não é alvo prioritário do terrorismo islâmico – http://www.opais.net/pt/opais/?det=29888
- DEMOGRAFIA, IDENTIDADE NACIONAL, ASSIMETRIAS E ELEIÇÕES – http://paginaglobal.blogspot.pt/2012/08/angola-demografia-identidade-nacional.html
 
*Ler textos do mesmo título e outros de MARTINHO JÚNIOR
 

GOVERNO BRASILEIRO CONTESTA DADOS SOBRE DESENVOLVIMENTO HUMANO

 


Jornal de Notícias
 
O Governo brasileiro contestou, esta quinta-feira, o Índice de Desenvolvimento Humano, elaborado pelas Nações Unidas, considerando que a classificação do Brasil foi "injusta", por utilizar dados desatualizados sobre educação.
 
De acordo com o relatório anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), divulgado esta quinta-feira, o Brasil manteve-se em 2013 na 85.ª posição no IDH - entre 187 países avaliados - apesar de uma pequena melhoria de pontuação.
 
O ministro da Educação brasileiro, Aloizio Mercadante, salientou, citado pela imprensa brasileira, que o índice considerou dados sobre educação de 2005, de fontes que o Governo não reconhece, enquanto a informação sobre outros países era trabalhada até 2010.
 
"Se estamos tão bem no emprego, se distribuímos riqueza, se reduzimos de forma destacada internacionalmente a população em extrema pobreza, por que é que o indicador de IDH não reflete tudo isso?", questionou Mercadante, citado pelo jornal Folha de São Paulo.
 
A ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, reiterou a opinião de Mercadante, afirmando que o Governo viu o relatório com "sentimento dividido", uma vez que a avaliação qualitativa foi muito positiva para o Brasil, mas a quantitativa não refletiu os avanços destacados.
 
O PNUD refere no relatório que alguns dados são antigos e recomenda que, uma vez que há sempre inovações e acréscimos de países nos cálculos, que não sejam feitas comparações com anos anteriores.
 

Timor-Leste em alta no índice de desenvolvimento, Guiné-Bissau aproxima-se dos últimos

 


PDF/CSR/SBR/FPA/PSP // VM - Lusa
 
Cidade do México, 14 mar (Lusa) -- Timor-Leste ganhou cinco posições, desde 2007, no índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da ONU, enquanto a Guiné-Bissau se aproximou dos últimos lugares, em que continua Moçambique, segundo dados hoje divulgados.
 
Sob o lema "A Escalada do Sul: Progresso Humano num Mundo Diverso", o relatório de 2013 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), hoje divulgado, mostra uma tendência de estagnação da posição dos países lusófonos, sendo a evolução de Timor-Leste a exceção positiva.
 
Entre os países do Leste da Ásia e o Pacífico, Timor-Leste registou o maior crescimento médio anual no índice, entre 2000 e 2012, figurando este ano na 134.ª posição, nos países com IDH médio.
 
Embora em 2013 tenha estagnado, ganhou cinco posições desde 2007, entre os 187 países.
No entanto, no que diz respeito às desigualdades, Timor-Leste apresenta a maior lacuna da região (33%), sendo seguido pelo Camboja (25,9%).
 
A pontuação dos países resulta de uma ponderação de estatísticas económicas e sociais, incluindo Educação, Saúde ou esperança média de vida.
 
Pela negativa, continua em destaque Moçambique, que está em 185.º lugar, apenas à frente do Niger e da República Democrática do Congo, está Moçambique, cujas subidas contínuas de pontuação não têm resultado em subidas na tabela.
 
O relatório situa ainda Moçambique entre os primeiros quatro países do continente africano com maior taxa de incidência de Pobreza (IPM -- Pobreza Multidimensional, que considera as carências de Saúde ou Educação), junto com a Etiópia Libéria e Serra Leoa (77%).
 
Entre os países de desenvolvimento médio, categoria a que foi promovido pela ONU em 2008, Cabo Verde recuou uma posição, de 131.º para 132.º, apesar de uma ligeira melhoria da pontuação.
 
O melhor registo do país remonta a 2009, quando se qualificou na 118ª posição, mas, logo em 2010, registou uma queda de 15 lugares, não alheia ao aumento do número de países analisados pelo IDH.
 
O país lusófono melhor posicionado na tabela é Portugal, o único considerado de desenvolvimento muito elevado, que perdeu quatro posições no ano passado, por ter sido ultrapassado por outros países, uma vez que a sua posição registou uma descida marginal.
 
Entre os países de desenvolvimento elevado, o Brasil estagnou na tabela desde 2007, apesar de muitos dos seus programas de inclusão ao nível da Saúde, Educação ou Rendimento serem modelo a nível internacional.
 
Dos países lusófonos no grupo de baixo desenvolvimento, São Tomé e Príncipe é o melhor colocado (144.ª posição, que mantém desde 2007).
 
O valor do desenvolvimento são-tomense tem vindo a crescer desde 2005, quando era de 0,488, até 0,525 em 2012.
 
Angola subiu uma posição nos últimos cinco anos, para 148.º, mantendo a tendência de aumento ligeiro da sua pontuação.
 
Em média, os países perdem 23,3% da sua pontuação quando se contabiliza as desigualdades, e Angola é o que mais perde (43,9%), estando a República Checa no extremo oposto (5,4%).
 
Com uma classificação de 0,364 pontos, a Guiné-Bissau está este ano na 176.ª posição do IDH, exatamente o mesmo que em 2011, à frente apenas de 11 países.
 
Apesar de ter vindo a melhorar a pontuação desde 2005 (de 0,348 em 2005 para 0,361 em 2010), a sua posição no ranking desceu quatro lugares desde 2007.
 
Quando se tem em conta as desigualdades, o índice da Guiné-Bissau desce 41,4% para 0,213.
 
* Ler mais sobre Timor-Leste em TIMOR LOROSAE NAÇÃO
 

A FUMAÇA BRANCA E A FUMAÇA SOMBRIA

 


A escolha do nome 'Francisco' pelo novo Papa resgatou a esperança de setores cristãos progressistas numa reconciliação da Igreja com a opção pelos pobres, simbolizada na ordem dos franciscanos, e consagrada nos valores do Vaticano II. A longa noite de repressão doutrinária imposta pelos papados de João Paulo II e Bento XVI, com o aggiornamento dos tribunais da inquisição, teria, desse ponto de vista, atingido o limite de exaustão conservadora na cúpula romana. Crises, escândalos e disputas autofágicas pelo poder entre falanges extremadas desencadearam assim dois movimentos de autopreservação na burocracia de Roma: a renúncia 'sanitária' de Bento XVI e a escolha de um tertius, um papa sulamericano, externo ao embate que corrói o Vaticano. O duplo sinal inauguraria uma espécie de 'abertura lenta, segura e gradual' no interior da igreja. A escolha do nome 'Francisco' pelo novo Papa foi entendida desse modo pela esperança progressista, como um aceno de moderação e retorno a um diálogo reprimido nas últimas décadas. Leonardo Boff, um dos expurgados pelo ciclo Ratzinger, assegura, por exemplo, que o nome escolhido por um Papa não é apenas um ornamento, mas encerra um projeto de Igreja. Isso é o que teria dito a fumaça branca emitida na quarta-feira, em Roma. Pode ser. Mas a ela seguiu-se uma fumaça sombria, densa, carregada de fumos de horror e dúvidas. Uma delas condensa todas as demais: onde estava, e o que fez o cidadão Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco I, entre 1976 e 1983, quando uma ditadura militar aterrorizante matou e desapareceu com 30 mil pessoas no país em que era bispo? (leia nesta pag. as análises e reportagens de Eduardo Febbro, Dermi Azevedo e Martin Granovsky. E também o especial sobre a crise que levou à renúncia de Bento XVI)
 
- Carta Maior; 5ª feira, 14/03/2013
 

O REINO UNIDO E A ARGENTINA DISPUTAM AS ILHAS MALVINAS

 
 
 
The Daily Telegraph, The Guardian, Clarín – Presseurop
 
Foi realizado um referendo sobre o estatuto das Ilhas Falkland (Malvinas) no arquipélago do Atlântico Sul, constituído por 2900 habitantes, que revelou que 99,8 por cento dos habitantes das Malvinas querem que se mantenha a soberania britânica no território, em vez de pertencer à Argentina.
 
Este conflito sobre a soberania do pequeno arquipélago, localizado a 500 quilómetros da costa sudoeste da Argentina já dura há algum tempo e deu origem à guerra das Malvinas entre o Reino Unido e o país da América do Sul em 1982.
 
Recentemente, a Argentina tem vindo a pressionar cada vez mais o Reino Unido para que este abandone os seus direitos sobre a ilha, que controla há mais de 150 anos. Para Neil Tweedie, redator do Daily Telegraph,
 
"os resultados marcaram a posição [do primeiro-ministro britânico] David Cameron, que considerou que o referendo expressou claramente a vontade dos habitantes das Malvinas, e denegriram Cristina Fernandez de Kirchner, Presidente da Argentina, que declarou que este referendo não tem qualquer significado e é o fruto de uma “população implantada”. [...] Esta tem utilizado o conflito para distrair os seus compatriotas dos seus problemas económicos, tendo o país uma das maiores taxas de inflação no mundo, mas esta iniciativa política acabou por se virar fortemente contra ela."
 
No entanto, para o colunista Roy Greenslade do Guardian, que se exprimiu antes da divulgação dos resultados, “o referendo pode ser visto como um escrutínio manipulado”.
 
A resposta da Argentina, segundo a qual o referendo não passa de uma manobra publicitária insignificante, é sem dúvida correta (apesar de discordar da reclamação sobre o território de Buenos Aires). E será encarada assim em todo o mundo, incluindo nos Estados Unidos. [...] A melhor solução para a Argentina talvez seja persuadir 1700 dos seus cidadãos a imigrar para a ilha na esperança de o Reino Unido realizar um novo escrutínio dentro de sete anos.
 
Do lado argentino, o diário Clarín realça que o contexto internacional, “trinta anos após a guerra”, mudou:
 
"O conflito deixou de ser bilateral e passou a ser regional. [...] Surgiu um terceiro ator, o diferendo já não está limitado a Buenos Aires e Londres. Este terceiro ator é a população do arquipélago, que se comporta de forma autónoma em relação ao Governo britânico, e que se exprimiu através da sua autoridade política."
 
No mesmo comprimento de onda, o jornal La Nación considera que, com este referendo,
 
"cerca de 60% dos eleitores definiram uma identidade: os insulares das Malvinas. Quer estejam certos ou errados, pensam ter o poder de decisão sobre questões essenciais e que dizem precisamente respeito à vida da comunidade. Também acham que o melhor para eles é delegar as relações externas e a defesa. Preferem enganar-se assim, e continuar a viver da mesma forma."


JEAN-CLAUDE JUNKER NÃO EXCLUI RISCO DE UMA REVOLTA SOCIAL NA EUROPA

 


Público e agências
 
O primeiro-ministro do Luxemburgo pede mais equilíbrio entre austeridade e crescimento. Manifestação dos sindicatos em Bruxelas mobilizou 15 mil pessoas
 
O primeiro-ministro do Luxemburgo, Jean-Claude Juncker, acredita que há um risco de “revolta social” na Europa e defendeu, nesta quinta-feira, que a União Europeia tem de explicar melhor as suas políticas económicas. À entrada do Conselho Europeu, que reúne entre até sexta-feira em Bruxelas para analisar a situação europeia, Jean-Claude Junker considerou que a UE tem de justificar a necessidade de se cumprirem os limites do défice e da dívida pública.
 
“Não excluiria que corremos o risco de assistir a uma revolta social”, disse, citado pela Lusa. O Conselho Europeu deverá ser marcado por um “regresso à normalidade”, sem a “urgência da crise do euro”, e deverá ser “preparatório das decisões de Junho”, altura em que os líderes europeus voltam a reunir-se.
 
De acordo com a AFP, algumas dezenas de manifestantes foram identificados pela polícia, depois de terem invadido um rés-do-chão de um edifício anexo às instalações da Direcção Geral da Economia e Finanças da Comissão Europeia. A operação decorreu sem incidentes.
 
A iniciativa, baptizada de “primavera europeia”, teve como objectivo denunciar a política de rigor da troika, que impõe reformas dolorosas aos países em dificuldade, refere a AFP.
 
15 mil protestam contra austeridade

Esta quinta-feira cerca de 15 mil pessoas manifestaram-se em Bruxelas (sete mil segundo a polícia belga), respondendo ao apelo da confederação europeia dos sindicatos (CES), à qual pertencem a CGTP e UGT. “Juntos por um futuro melhor. Não à austeridade, sim ao trabalho para os jovens", era o lema desta manifestação, que decorreu sem incidentes.

Impedidos pelo perímetro de segurança imposto pela polícia de se aproximarem da emblemática Praça Schuman, situada perto do Conselho Europeu, os manifestantes quiseram passar “uma mensagem de urgência”, segundo a qual “a recessão grave caiu sobre as costas dos trabalhadores”.

A secretária geral da CES, Bernadette Ségol, disse que “a austeridade é um fracasso”, porque está a ter “um efeito social e económico devastador”. Os sindicatos europeus exigiram aos chefes de Estado e de Governo da UE, reunidos em Conselho Europeu desde as 16:30 (hora de Lisboa), uma resposta para a “emergência social” que se vive na Europa, onde mais de 26 milhões de pessoas estão desempregadas e outros 120 milhões vivem em situação de precariedade.
 

TRIBUNAL DA UE DECLARA LEI DOS DESPEJOS EM ESPANHA “ILEGAL” E “ABUSIVA”

 


Félix Ribeiro - Público
 
Sentença do Tribunal de Justiça da União Europeia decreta que lei hipotecária em Espanha viola a protecção do consumidor. Governo tem nova lei preparada.
 
A lei hipotecária espanhola que regula os despejos é “abusiva” e “ilegal”, de acordo com a sentença do Tribunal de Justiça da União Europeia conhecida nesta quinta-feira. O tribunal argumenta que a lei espanhola é “ilegal” por violar a directiva europeia de 1993 que estabelece a protecção do consumidor e “abusiva” por não considerar o desequilíbrio de forças entre as instituições de crédito e quem entra em incumprimento.
 
Mesmo que um despejado, em Espanha, conteste as cláusulas dos empréstimos à habitação, alegando que estas, por alguma razão, são abusivas, os processos de despejo não se interrompem. De acordo com o El País, esta foi a principal razão do veredicto desta quinta-feira do tribunal europeu. A directiva europeia de 1993 determina que a execução de um despejo só pode acontecer depois de ser conhecida a sentença de um tribunal sobre as alegadas cláusulas abusivas denunciadas pelo despejado.
 
Nos casos em que é provada que uma cláusula do empréstimo é, de facto, abusiva, o contraente do empréstimo receberá uma indemnização do banco, explica o El País. No entanto, mesmo que o abuso seja provado, o despejo já está executado. A sentença do Tribunal de Justiça da União Europeia dirige-se também a este aspecto, afirmando que uma indemnização num caso de despejo é “incompleta e insuficiente”.
 
Mas o Tribunal de Justiça da União Europeia declara também que a lei hipotecária espanhola é abusiva. Isto porque não tem em consideração o “importante desequilíbrio” de forças entre o banco que ordena o despejo e o contribuinte que pediu o empréstimo.
 
Governo espanhol tem nova lei preparada
 
A jurisprudência criada pela sentença do tribunal europeu estende-se a toda a União Europeia. No entanto, os Estados-membros não são obrigados a alterar a sua lei hipotecária, caso esta viole os mesmos princípios que o tribunal europeu identificou na sentença conhecida nesta quinta-feira.
 
Em Espanha, porém, o Governo já tem preparada uma nova lei dos despejos, que será em breve apresentada ao Parlamento espanhol. Os deputados e responsáveis do Partido Popular e do Governo estavam, inclusivamente, à espera da sentença do tribunal europeu. De acordo com o El País, o Governo liderado por Mariano Rajoy quer ter em conta as recomendações do Tribunal de Justiça da União Europeia antes de apresentar a forma final da nova lei hipotecária.
 
Os casos de despejos têm-se multiplicado vertiginosamente em Espanha, desde que a taxa de desemprego espanhola disparou nos anos que seguiram ao eclodir da crise económica, em 2008.
 
O movimento popular criado para dar resposta ao crescente número de despejos, o Stop Desahucios, apresentou já três propostas para incorporarem a nova lei: parar com todos os despejos, permitir o pagamento retroactivo de prestações em atraso e, terceiro ponto, criar uma bolsa de habitações sociais para albergar os afectados pelos despejos.
 
As propostas contavam com 1,5 milhões de assinaturas a 6 de Março. Para além do mais, os principais partidos de oposição em Espanha anunciaram já o apoio a estas três medidas e prometeram criar legislação para as ampliar.
 
A lei de Mohamed Aziz
 
Não haveria sentença nesta quinta-feira sem Mohamed Aziz, um marroquino que foi despejado em Barcelona e que está na origem da queixa ao Tribunal de Justiça da União Europeia. Mohamed celebrou um contrato de empréstimo à habitação em 2007, que cedo deixou de ser capaz de pagar. O Caixabank - banco ao qual foi pedido o empréstimo - accionou a lei hipotecária espanhola, que, por sua vez, decretou o seu despejo, a 20 de Janeiro de 2011, escreve o El País.
 
A ordem de despejo avançou acompanhada de uma exigência: Mohamed Aziz teria de pagar a totalidade do empréstimo ao Caixabank e ainda uma taxa de 18% pelo atraso nas prestações. Isto tudo, apesar de Mohamed ter alegado que uma cláusula do empréstimo contraído no Caixabank era abusiva por não lhe ter permitido contestar o despejo.
 
O caso de Mohamed Aziz foi parar às mãos do advogado catalão José María Seijo, que apresentou o processo ao Tribunal de Justiça da União Europeia. O advogado de Barcelona argumentou que a lei hipotecária espanhola violava as directivas europeias, já que não impede os processos de despejo de avançarem, mesmo quando são contestadas cláusulas dos empréstimos à habitação. O caso era tão exemplar que colocou o Governo de Mariano Rajoy à espera da sentença.
 
O El País, que acompanhou o processo de Aziz, visitou nesta quinta-feira o marroquino e o seu advogado catalão. A data de publicação do veredicto era já conhecida e, quando finalmente foi anunciada, Mohamed recebeu o veredicto com estranheza. O marroquino perguntou ao advogado: “O que quer isto dizer?” “Hombre, significa que ganhámos”, respondeu José María Seijo, a “chorar desconsoladamente”, escreve o El País.
 

Portugal - Cavaco Silva: VINTE PÁGINAS INÚTEIS

 


Baptista-Bastos – Diário de Notícias, opinião
 
Um alvoroço de artigos, crónicas, comentários, depoimentos acolheu o prefácio que o dr. Cavaco apôs ao sétimo volume de Roteiros, singular colecção de trivialidades pretendidamente políticas, e não, como o título sugere, itinerário turístico. Quase todos os preopinantes manifestaram perplexidade porque o autor nada dizia de novo. Estranha conclusão. O homem é o que é: um medíocre brunido, formal e liso. Com penosa disposição li o texto, porque o alarido a tal me impelia. Os habituais tropeços nas preposições, o confuso desalinho com as adversativas, e a ausência total de qualquer ideia. O costume da banalidade, elevado à nobre condição de "tema." Apenas me surpreendeu que tanta gente se sobressaltasse com o chorrilho de bagatelas, e que alguma dessa gente lobrigasse uma grave advertência ao Governo e uma crítica furtiva a Passos Coelho. As vinte páginas do extraordinário texto são o retrato (haja Freud e a nossa paciência!) da insólita personagem que nos coube na vida. Custa-me dizer isto: mas o dr. Cavaco, o que diz e o que não diz, e não faz, estão longe de poder ser levados a sério. Ele, os seus silêncios e as suas evasivas são cúmplices do que nos acontece, desde que foi primeiro-ministro. E a impunidade de que goza é paralela à imensa vaidade que não consegue dissimular com a exposta modéstia grotescamente teatral.
 
O homem é ressentido e rancoroso. O assento que fez com Sócrates e, antes disso, a cilada que montou a Fernando Nogueira, para não aludir, entre outras mais, muitas mais, ao desprezo disfarçado a Santana Lopes, mas suficientemente perceptível para que o próprio percebesse e os outros pressentissem, são características de uma índole embotada.Mesmo Pedro Passos Coelho, com quem teve algumas embirrações, era este um convulsivo dirigente da "jota", mesmo esse tem de se acautelar. E os esgares, feitos sorrisos, com que o dr. Cavaco, o recebe e conversa são máscaras da mais vil duplicidade. Lembro aos distraídos a afabilidade, quase doçura com que recebe Paulo Portas, o qual, quando director de O Independente, conduziu sangrenta campanha jornalística contra o cavaquismo, que levou ao descrédito da doutrina e à queda do seu mentor.
 
A pátria está de pantanas, os jovens abandonam o país onde nasceram; os desempregados fazem multidão; os velhos morrem sós, de fome e de miséria; os suicídios aumentam; todos os ofícios e corporações são atravessados pelo despautério de uma política assassina; e a figura que está em Belém demonstra-se incapaz de admitir qualquer conteúdo dos assuntos correntes.
 
Disse, após mais de um mês de reclusão, que vai ensinar os portugueses a conviver com a crise, e que tem mais experiência política do que a maioria dos seus antecedentes. Perante isto, creio que temos de redefinir a natureza das nossas decepções e os modos de tornar eficazes o que nos indigna.
 
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico
 

PORTUGAL DESCE DOIS LUGARES NO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO DA ONU

 


Jornal i - Lusa
 
Portugal ocupa a 43.ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas relativo a 2012, que avalia 187 países e é liderado pela Noruega, segundo o relatório divulgado hoje.
 
No anterior relatório, Portugal ocupava o 41.º lugar, mas, devido a alterações do índice, a ONU assinala que os valores e classificações do relatório não podem ser comparados diretamente com os dos anteriores.
 
Nesta avaliação anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), os países são divididos em quatro grupos em termos de desenvolvimento humano: muito elevado, elevado, médio e baixo.
 
Portugal integra o grupo de 47 países com “desenvolvimento humano muito elevado” imediatamente a seguir à Lituânia e aos Emirados Árabes Unidos e à frente da Letónia, Argentina, Seychelles e Croácia.
 
Comparando com alguns parceiros da União Europeia, a Alemanha ocupa a 5.ª posição do Índice, a Irlanda a 7.ª, a Espanha a 23.ª e a Grécia o 29.º lugar.
 
De acordo com o relatório da ONU, a esperança de vida à nascença em 2012 em Portugal era de 79,7 anos, enquanto na Alemanha era de 80,6, na Irlanda 80,7, em Espanha atingia os 81,6 e na Grécia os 80 anos.
 
Na média de anos de escolaridade, Portugal tem 7,7 anos de acordo com dados de 2010, contra 12,2 da Alemanha e 11,6 anos da Irlanda. A Espanha e a Grécia têm 10,4 e 10,1 anos, respetivamente, com base em números do ano passado.
 
Em relação ao rendimento nacional bruto ‘per capita’, tendo em conta a paridade de poder de compra em 2005, Portugal apresenta um valor de 19.907 dólares, a Alemanha 35.431, a Irlanda 28.671 dólares, a Espanha 25.947 e a Grécia 20.511 dólares.
 

Portugal: EMPREGO CAIU 4,3% NO QUARTO TRIMESTRE

 


Félix Ribeiro - Público
 
Portugal foi o quinto país da União Europeia que mais destruiu emprego no final de 2012, em comparação com 2011, e o que sofreu a maior queda do terceiro para o quarto trimestre.
 
O Eurostat anunciou nesta quinta-feira que o número de população activa empregada em Portugal caiu 4,3% durante os últimos três meses de 2012, em comparação com o mesmo período de 2011. Do terceiro para o quarto trimestre, Portugal registou , a par da Lituânia, a maior queda europeia no emprego - 2%.
 
A queda homóloga mantém-se assim em linha com os valores dos três trimestres anteriores: redução de 4,3% no primeiro trimestre, de 4,2% no segundo e de 4,1% no terceiro trimestre.
 
A destruição de emprego em Portugal ficou significativamente acima da média da quebra na Zona Euro, de 0,8% no quarto trimestre, em termos homólogos. No conjunto dos 27 Estados-membros, o valor de redução do emprego foi mais ténue, tendo-se ficado nos 0,4%.
 
Portugal foi o quinto país que mais perdeu postos de trabalho durante o último trimestre de 2012. A queda mais grave aconteceu na Grécia, onde o emprego afundou 6,5% em comparação com o último trimestre de 2011, um resultado destacado no contexto europeu. À Grécia seguiu-se a Bulgária, com uma redução de 4,9% no emprego, o Chipre, com menos 4,8%, e Espanha, onde o emprego sofreu uma contracção de 4,5%.
 
Por outro lado, o maior crescimento do emprego foi registado no Leste e no Norte da Europa. O emprego na Roménia deu um salto destacado de 3,5% no último trimestre de 2012. Áustria, Alemanha e República Checa tiveram o mesmo crescimento homólogo de 0,8% no quarto trimestre.
 
O gabinete de estatística da Comissão Europeia desdobra apenas a quebra europeia no emprego. O sector da construção destaca-se na redução do emprego dentro da Zona Euro: menos 4,9% no quarto trimestre, em termos homólogos. Aliás, a queda destacada do emprego na construção foi registada também ao longo de 2012.
 
O sector de comunicações e indústria de informação sofreu a segunda maior quebra nos últimos meses de 2012, de 2%, em linha com as reduções no sector agrícola, de 1,9%, e no sector das artes, de 1,8%. Indústria e Comércio registaram, respectivamente, reduções de 1,4 e 1,2%.
 

Portugal: SR. ISALTINO MORAIS, FAÇA JUSTIÇA PELOS SEUS PRÓPRIOS PÉS

 


Tiago Mesquita – Expresso, opinião
 
Não vejo outra solução para levar Isaltino Morais a cumprir a pena de prisão a que foi condenado que não passe por um pedido dirigido ao próprio para que colabore com a justiça, que faça justiça pelas próprias mãos. Ou deveria dizer pés? Dirija-se até à cadeia da área de residência, entregue-se e mostre ao país o homem proactivo que diz ser. Pode, inclusivamente, pedir ao sobrinho taxista uma boleia, para tornar a situação ainda mais deliciosamente estúpida. É que só mesmo um político português para conseguir engavetar-se a ele próprio, depois de gozar com a justiça portuguesa durante o tempo que bem entendeu.
 
Quarenta e quatro recursos e centro e trinta e três mil euros depois, Isaltino Morais continua a ver o sol sem ser aos quadradinhos. Correção: esteve preso durante 23 horas. Repito: 23 horas. Jantou, viu a bola, leu os jornais do dia, tratou da papelada que tinha em atraso, e saiu fresquinho que nem uma alface, a tempo de ir à pastelaria Garrett tomar o pequeno-almoço depois de o motorista o apanhar junto ao Estabelecimento Prisional de Lisboa. A situação é de tal forma ridícula que começaram a surgir pedidos desesperados. Segundo o jornal i noticiou esta semana, um magistrado do MP insiste que a juíza de Oeiras que tem em mãos o processo tem de ter a "coragem" de emitir um mandado de captura. "A partir do momento em que está transitado em julgado é para executar. Nenhum recurso terá influência sobre a condenação."
 
Ora bem, vivendo num Estado apelidado de direito, julguei, na minha inocência, que não seria necessário chegarmos ao ponto de magistrados andarem a pedinchar coragem na aplicação da justiça nos casos que têm em mãos. Deveriam limitar-se a fazer cumprir a lei, independentemente dos cidadãos, das susceptibilidades feridas e dos desconfortos políticos e institucionais causados. Mas a verdade é que prender um político em Portugal é menos provável do que encontrar um pinguim a chupar cubos de gelo na praia da Oura.
 
O facto de o senhor Isaltino Morais, ao dia de hoje, não se encontrar a cumprir a pena de prisão a que aparentemente já foi condenado há muito tempo só demonstra uma coisa simples: a justiça em Portugal tarda e falha.
 
Adenda: aparentemente o "Tribunal Constitucional recusou o recurso de Isaltino Morais, o que deixa agora ao Tribunal de Oeiras a decisão de ordenar o cumprimento da pena de dois anos de prisão efetiva, aplicada ao autarca." (notícia lida enquanto escrevia este texto)
 
Não me atrevo a pedir à senhora juíza que emita um mandado de captura e faça cumprir a lei. Não sou tão ousado. Peço antes a Isaltino Morais, até porque já provou ser competente em matéria judicial, que não deixe que a justiça portuguesa continue a envergonhar-se a ela própria, e ao país, e acabe com a palhaçada. Senhor Isaltino, importa-se, por favor, de ir preso pelos próprios pés?
 

Passos fala em “consequências sociais”, CDS em desespero. Austeridade mantém-se

 


Liliana Valente – Jornal i
 
Avaliação da troika já terminou. Passos diz que vai defender no Conselho Europeu o crescimento económico
 
A troika mostrou-se preocupada com a comunicação do governo e com a coesão social, e o executivo tentou emendar a mão e tentar falar mais para (e das) pessoas. Ontem, no debate de preparação do Conselho Europeu de hoje e de amanhã, o primeiro-ministro, apesar de focar o seu discurso nas questões económicas e financeiras, falou por três vezes na necessidade de apaziguar “as consequências sociais da crise” e o CDS lembrou que “o desespero” pode agravar um problema político. A austeridade, essa é para continuar, mesmo que haja uma extensão de prazos para o cumprimento do défice.
 
A manifestação nas ruas foi há cerca de 15 dias, mas as marcas da contestação social ficaram no discurso da maioria. É que, depois do aviso da troika para uma melhor comunicação, de acordo com o “Expresso”, o executivo deixa escapar algumas intervenções nesse sentido. Ontem, Passos Coelho falou três vezes nas “consequências sociais” da crise, e o CDS no “desespero”. Nuno Magalhães, líder parlamentar do CDS, avisou que é necessário ter em atenção que o “desespero” social pode levar ao aparecimento de movimentos radicais que agravem um “problema político” e que, por isso, “é bom que esta Europa, e estou certo que também este governo, tenha em conta o problema que não é só económico e social, mas também político”.
 
Passos mostrou-se preocupado com a ideia: “Há, hoje em dia, uma corrente de opinião que justamente põe em causa a nossa resiliência democrática face à dimensão das consequências sociais da crise”, disse. Apesar disso, o caminho é o mesmo. Numa resposta à deputada do PEV Heloísa Apolónia, o primeiro-ministro garantiu que a negociação dos prazos com os parceiros é muito importante para mitigar os riscos, mas “não tem efeito directo na austeridade”.
 
O governo, através de Paulo Portas e de Vítor Gaspar, já tinha feito uma tentativa de mudar o discurso falando na necessidade de manter o “consenso político” e o “acordo social” no debate de urgência marcado pelo PS no início do mês, mas depois Passos saiu da rota na intervenção na semana passada. Ontem, apesar de ter sido um debate mais quente sobre questões mais económicas, frisou, nas respostas às bancadas da maioria, essa necessidade de responder às “consequências sociais” da crise.
 
Crescimento Hoje, o primeiro-ministro terá um papel mais reservado no Conselho Europeu, uma vez que este é dedicado ao Semestre Europeu, mas sobretudo para os países que não estão sujeitos a programas de ajustamento. E aos deputados garantiu que o que irá dizer mais não é do que pedir uma “resposta muito importante relativamente ao desemprego e às consequências sociais, modernizar a administração pública e promover o crescimento e a competitividade”, numa altura em que, em Portugal, o ministro das Finanças dá conta, numa conferência de imprensa marcada para sexta-feira de manhã, dos resultados da sétima avaliação da troika ao cumprimento do Memorando.
 
Sobre a avaliação da troika, Passos Coelho pouco disse, apenas que estava a ser concluída, que o essencial estava fechado. A confirmação do final chegou à tarde, à hora a que, na televisão, aparecia o fumo branco e era anunciado que tinha sido eleito o novo Papa. Desta vez, o governo enveredou pela estratégia de passar a ideia de que pressionou a troika para flexibilizar alguns pontos (daí a demora na conclusão da avaliação). No debate, Passos lembrou que a pressão foi feita, não só com os técnicos, no sentido de uma “necessidade de fazer uma flexibilização do nosso programa em termos que nos permitam realizar, tornar estáveis e duráveis os esforços de correcção dos desequilíbrios e a nossa aposta em termos estruturais para que a economia torne a crescer”.
 
Palavras que não agradaram ao líder socialista, que salientou o facto de o primeiro-ministro até falar agora em crescimento económico - “quem o via e quem o vê”, disse -, mas que isso de nada serve se continuar com a mesma política. E questionou: “Vai manter a sua opção de fazer um corte de quatro mil milhões de euros nas funções do Estado?” Do outro lado, não obteve resposta sobre o corte na despesa, apenas uma lista dos “resultados positivos” que o governo vai mostrar aos parceiros europeus - isto porque António José Seguro tinha questionado que resultados tinha o governo para mostrar, falando no desemprego, no défice e na dívida.
 

O ESCRAVO E A MADAME

 


Luís Rosa – Jornal i, opinião
 
Portugal tem de lutar abertamente pelas mesmas ajudas europeias que a Irlanda vai ter
 
Se há princípios que nunca foram praticados na União Europeia (UE), o da igualdade entre os Estados- -membros é certamente um deles. A principal regra da realpolitik da velha Europa é simples: Alemanha, França, Grã-Bretanha, Itália e Espanha decidem entre si e os restantes obedecem em maior ou menor grau de submissão.
 
Portugal sempre foi dos países mais submissos - uma espécie de escravo que obedece sem pestanejar a todas as ordens da madame Bruxelas. Com sorte, receberá alguns fundos monetários. É um hábito introduzido pelos nossos políticos desde que entrámos para a CEE e que nasce do complexo de inferioridade do nosso povo perante tudo o que é estrangeiro.
 
O grau de subserviência que o governo de Passos Coelho tem demonstrado perante a troika (União Europeia e FMI) insere-se nessa linha estratégica da diplomacia portuguesa, não contendo, em si mesmo, nenhuma novidade.
 
Vem isto a propósito das melhorias das condições dos programas de assistência financeira da Grécia, Irlanda e Portugal. Desde o início do Mecanismo Europeu de Estabilidade e do Fundo de Estabilidade Financeira que ficou estabelecido que os países beneficiam de igual tratamento. Logo, se a Grécia conseguiu em Dezembro de 2012 um acréscimo de 30 anos para pagar a parte europeia do empréstimo da troika e uma moratória de 10 anos para pagar os respectivos juros, seria de esperar que essas condições fossem estendidas a Portugal e à Irlanda. Seria uma decisão lógica, atendendo a que os três países têm problemas em comum: a insustentabilidade da dívida pública, claramente acima dos 120% do PIB, agravada pelos programas da troika, e a necessidade de reduzir o seu valor total.
 
Passados três meses, não é nada disso que está em discussão. Sem nenhuma decisão ainda tomada, Portugal arrisca-se mesmo a ser o país mais prejudicado. Os irlandeses querem mais 15 anos para pagarem a dívida, tendo já conseguido a aprovação da troika para uma troca de dívida que lhes permitirá chegar a um défice de 2,4% em 2015.
 
Ao pé destas condições, ter mais um ano para corrigir o défice, cinco anos para pagar a dívida ou mais alguns anos para fazer a reforma do Estado parece uma esmola inaceitável. Não chega Vítor Gaspar afirmar subliminarmente que um prazo de 15 anos (para os irlandeses) é inaceitável. Portugal tem de lutar abertamente por condições iguais às da Irlanda. Ficar calado em vez de lutar abertamente representa um exercício de masoquismo político - a juntar a muitos outros desde 1986.
 

A UNIDADE DOS DIREITOS E SUAS FRONTEIRAS AMEAÇADAS

 


O jornalista Bernardo Kucinski disse certa vez que a primeira vítima do neoliberalismo é a verdade. Violada a verdade, tudo é permitido. Há indícios preocupantes de que se espalha hoje pelo mundo uma onda de violação de direitos em cascata: direitos humanos, sociais, trabalhistas, ambientais e culturais.
 
Marco Aurélio Weissheimer – Carta Maior
 
Uma das consequências mais danosas do neoliberalismo é a precarização e supressão de direitos. Quantos direitos foram precarizados ou simplesmente suprimidos nas últimas décadas? Ninguém deve ter feito essa contabilidade, mas o número certamente é impressionante. Um número, aliás, que não para de crescer, uma vez que se trata de um fenômeno que segue se repetindo no presente. A crise econômica que atingiu em cheio a Europa e os Estados Unidos a partir de 2007-2008 é um terreno fértil para a extinção de direitos. A ideologia da austeridade que varre a Europa tem como pilares centrais a demissão de servidores públicos, a diminuição de salários, o corte de direitos sociais e trabalhistas e a repressão a lutas por direitos humanos fundamentais. Direitos estes que foram conquistas de décadas de luta e que tiveram a Europa como um de seus palcos centrais.

Empresas e governos alegam dificuldades econômicas para cortar ou precarizar direitos, invocando a necessidade de sacrifícios de quem vive do mundo do trabalho. E esses sacrifícios estão sendo impostos, aceite-se ou não. Uma das faces mais perversas e dramáticas desse processo pode ser vista hoje na Espanha com o alto número de suicídios de pessoas que estão perdendo suas casas por não poderem pagar financiamentos imobiliários. Neste caso, não se trata apenas de precarização ou perda de direitos, mas da supressão da própria dignidade, uma condição da própria vida. O retrocesso conceitual, do ponto de vista da luta por direitos humanos e sociais, é enorme. Assistimos a uma naturalização do discurso que prega a necessidade da supressão de direitos para resolver determinados problemas econômicos e sociais. Os direitos, segundo esse discurso, tornam-se entraves para a economia e para a sociedade. Teríamos, em vários casos, um “excesso de direitos”, um exagero a ser corrigido. E, de preferência, corrigidos rapidamente.

A supressão de direitos atinge também as relações de consumo. Não é um acaso que planos de saúde, cartões de crédito, operadoras de telefonia e de televisão a cabo liderem os rankings de reclamações de consumidores. A diferença entre o que é prometido na propaganda e o que é oferecido na prática é bem conhecida por parte dos “usuários”. No setor da alimentação, a situação é ainda mais grave, pois envolve a saúde e a vida das pessoas. A quantidade de porcarias que são vendidas sem o mínimo controle ou pudor, com o apoio de uma máquina publicitária que não poupa sequer as crianças, ou, pior ainda, as tem como alvo privilegiado, é uma realidade diária.

O que ameaça a liberdade de expressão
 
Outro traço dessa realidade de supressão de direitos é a progressiva redução do jornalismo em atividade submissa a interesses privados. A transformação dos meios de comunicação em grandes corporações com tendências monopolistas e interesses econômicos em outras áreas que não exclusivamente a midiática uniformizou as pautas e as orientações editoriais. Apesar do discurso em favor da liberdade de expressão, o que menos se vê nestes veículos é diversidade de informação e de opinião. A aversão que as grandes empresas brasileiras de mídia têm ao debate sobre um novo marco regulatório para o setor é um exemplo do espírito reacionário e atrasado que as anima.

Esse cenário implica outra violação de direito, a saber, a supressão do direito a uma comunicação de qualidade e a serviço do interesse público. O fato de boa parte das notícias e suas respectivas abordagens serem praticamente as mesmas todos os dias deveria nos dizer algo a respeito do que significa liberdade de expressão e diversidade de opinião. Se você fica restrito ao circuito da grande mídia comercial jamais ficará sabendo, por exemplo, que está em curso nos Estados Unidos uma mobilização nacional pela retomada o compromisso com a ideia de que direitos trabalhistas são direitos humanos. Quem quiser informações sobre esse movimento pode encontrá-las neste #]artigo de John Nichols, no The Nation. Encontrará aí também a íntegra do premiado documentário We Are Wisconsin, que mostra a mobilização de estudantes, professores, profissionais da saúde e de outros setores, em 2010, contra a política de demissões e cortes de direitos de servidores públicos levada a cabo pelo governador Republicano, Scott Walker.

Violada a verdade, tudo é permitido

O que se viu nos Estados Unidos, a partir do estouro da bolha imobiliária de 2007-2008, e também na Europa, serve para mostrar que, assim como o sistema de direitos forma uma unidade (fruto de décadas de lutas sociais), o processo de supressão e precarização de direitos também compõe uma unidade. Ou seja, a violação de um determinado tipo de direito nunca é isolada, ela se propaga também para outros direitos. O jornalista Bernardo Kucinski disse certa vez que a primeira vítima do neoliberalismo é a verdade. Violada a verdade, tudo é permitido. Há indícios preocupantes de que se espalha hoje pelo mundo uma onda de violação de direitos em cascata: direitos humanos, sociais, trabalhistas, ambientais e culturais. Esse tema, por si só, já é suficiente para compor uma agenda e desmentir aqueles que repetem ladainhas sobre o suposto fim da distinção entre esquerda e direito, ou entre o capital e o trabalho. Essas distinções sofreram mudanças qualitativas, mas estão aí para quem quiser ver.

O Brasil e a maioria dos países da América Latina viveram nos últimos anos um processo de retomada ou mesmo de instauração de direitos até então inexistentes, graças a uma geração de governos com um DNA distinto daquele que governou a região nas décadas anteriores. Neste sentido, caminharam no sentido inverso daquele visto na Europa e nos Estados Unidos. Mas é justamente o que sê vê agora nestes países que serve de advertência eloquente a respeito dos riscos de retrocesso. A melhor maneira de alimentar esses riscos é achar que estamos livres deles, em um mundo paralelo. Os cidadãos espanhóis que decidiram por um fim à própria vida, num gesto de desesperança total, simbolizam mais que tragédias pessoais. O pano de fundo desse gesto de desespero é um mundo onde o direito à vida é subordinado ao direito de propriedade.

Há fenômenos que, tomados isoladamente, podem ter um significado circunscrito à sua própria ocorrência, mas que, vistos num contexto mais amplo, podem ser indicadores de movimentos ainda subterrâneos na sociedade. A crise na revista Caros Amigos, com greve na redação e demissão dos jornalistas grevistas, a escolha do pastor Marco Feliciano para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias na Câmara Federal, e a do ruralista Blairo Maggi para a Comissão de Meio Ambiente da mesma Câmara indicam um contexto político de grave relativização e banalização de valores e princípios que não deveriam ser relativizados e muito menos banalizados. E esses são apenas três eventos recentes. Há vários outros como, por exemplo, as ameaças a comunidades indígenas e urbanas que têm suas vidas viradas ao avesso e ameaçadas por grandes obras.

Mesmo considerando as exigências de uma certa dose de pragmatismo na política, há linhas que não deveriam ser ultrapassadas. Ao ultrapassá-las, em nome de razões pragmáticas ou de um simples desprezo pela sua importância, estamos entrando num território estranho e perigoso. E esse território, definitivamente, não é o mundo dos direitos e do Direito.

Marco Aurélio Weissheimer é editor-chefe da Carta Maior (correio eletrônico: gamarra@hotmail.com)
 

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