Angola
está a promover uma acção de formação destinada a agentes do Estado que vão
estar, nos próximos dois anos, ligados a matérias relacionadas com o mandato do
país no Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas.
Orlando
Castro – Folha 8 Diário
Sim.
Todo o cuidado é pouco. Nesta matéria, como em muitas outras, o Presidente da
República (nunca nominalmente eleito e no poder desde 1979) sabe que o regime
não é sério nem íntegro. E exactamente por isso vai fazer tudo para parecer,
durante dois anos, íntegro e sério. A regra de ouro do MPLA é simples: não
importa o que o país é mas, isso sim, o que parece que é.
A
formação de três dias (só por aqui se vê o alcance estrutural do embuste),
ministrada por duas especialistas do Security Council Report, abrange, além de
diplomatas, representantes de vários ministérios e jornalistas/propagandistas
do regime.
Em
declarações à imprensa, o secretário de Estado das Relações Exteriores de
Angola, Manuel Augusto, disse que as autoridades angolanas entenderam que para
um bom exercício do mandato, “com o rigor e a responsabilidade que isso exige”,
deviam ser formados todos os intervenientes.
“Não
só sobre as matérias que são discutidas no Conselho de Segurança das Nações
Unidas, mas, e principalmente, sobe os métodos de funcionamento do CS.
Portanto, contratamos o Security Council Report, que é uma instituição que
funciona junto das Nações Unidas para esse efeito”, referiu.
Segundo
Manuel Augusto, essa instituição existente desde 2005, foi crida depois da
constatação de que muitos países apenas no fim do seu mandato é que começavam a
perceber o funcionamento do CS da ONU.
“Foi
feita já uma formação junto dos nossos funcionários em Nova Iorque e agora
estamos a fazê-la em Luanda e sempre que sentirmos necessidade vamos recorrer
ao Security Council Report”, sublinhou.
Recorde-se
o que se passou recentemente quando Angola foi confrontada perante o Conselho
de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, sobre liberdade de expressão, de
manifestação e restrições a activistas.
O
ministro da Justiça e Direitos Humanos, Rui Carneiro Mangueira, respondeu – por
exemplo – que no caso de processos em tribunal “o interesse particular da
pessoa ofendida suplanta o interesse do Estado nestas matérias, daí que não se
compreenda como pode haver interesse da parte do Estado em violar ou restringir
o direito à liberdade de expressão”.
Como
as perguntas eram uma formalidade, os países que levantaram a questão até
sorriram com o atestado de matumbez que o ministro lhes passou.
Quanto
ao direito de manifestação, o ministro disse – mesmo sem a assessoria da
Security Council Report – que é garantido, mas as manifestações são por vezes
interrompidas quando “os manifestantes e contra-manifestantes desencadeiam
agressões mutuas que levam à perturbação da ordem pública”.
Ninguém
se preocupou em questionar a razão pela qual há cada vez mais angolanos a serem
agredidos, torturados e mortos. É certo que isso é irrelevante para a ONU, até
porque as vítimas não são propriamente angolanos nem gente. Para se ser
angolano e gente é condição sine qua non ser militante do MPLA. Não é o caso
das vítimas. Mera coincidência, como é óbvio.
Rui
Carneiro Mangueira defendeu ainda que o direito de associação é previsto pela
lei angolana e que existem em Angola cerca de 300 associações de defesa dos
direitos humanos.
O
ministro defendeu as acções do Governo para reforçar os direitos humanos em
Angola, citando a reforma da Justiça e do Direito, a melhor distribuição da
riqueza e o programa de habitação e urbanismo e lembrando que o país ainda
sente as consequências do conflito armado, que terminou em 2002.
Como
testemunhas abonatórias do regime, para além de países como a Guiné Equatorial,
Coreia do Norte e Portugal, estão cidadãos como Alves Kamulingue, Isaías
Cassule, Hilbert Ganga, Rafael Marques de Morais e William Tonet. Isto, é
claro, para além dos jacarés.