sábado, 17 de dezembro de 2011

ARGENTINA É CONSIDERADA EXEMPLO NA LUTA CONTRA A IMPUNIDADE





Toda uma geração de trabalhadores, estudantes, sindicalistas e intelectuais foi "apagada" do mapa pela ditadura argentina. Hoje, 35 anos depois, o país é considerado um modelo na luta contra a impunidade.

Todo um aparato repressivo, cujos agentes não eram apenas militares, mas também civis, foi responsável por sequestros, torturas e assassinato de 30 mil pessoas, entre as quais grávidas e recém-nascidos na Argentina. A ditadura exercida pela junta militar impôs a censura em todas as expressões da arte, na produção literária, no cinema e na música do país. Dezenas de milhares de argentinos tiveram de se exilar para escapar da morte.

Desde 1983, os governos democráticos têm promovido ações para punir os responsáveis pelo desaparecimento de até 30 mil pessoas, pelo roubo de bens, pela criação de mais de 600 campos de concentração e o perverso plano de sequestro de recém-nascidos das mulheres em cativeiro, depois assassinadas. Os movimentos de direitos humanos e a sociedade civil, com artistas e intelectuais, geraram um amplo debate e uma abertura que levou à busca da verdade. Não fosse isso, a Justiça argentina não teria o êxito que atingiu.

Conscientização contra a impunidade

Ante a recusa das autoridades em dar-lhes uma resposta, em 30 de abril de 1977 um grupo de mães de desaparecidos começou a marchar em silêncio na Praça de Maio, em frente à sede do governo argentino, para questionar o paradeiro de seus filhos.

Os ditadores – e aqueles que negavam seus crimes – as chamaram de "loucas". Esta "loucura" felizmente contagiou outros. Assim nasceu o movimento Mães da Praça de Maio, ao qual se seguiu o das Avós da Praça de Maio, que procuravam seus netos nascidos durante o cativeiro de suas mães. Em 1995, juntou-se a elas o grupo H.I.J.O.S (Filhos pela Identidade e a Justiça, e contra o Esquecimento e o Silêncio, sigla que em espanhol também significa "filhos").

Além de exigir a condenação dos responsáveis pelos crimes, as organizações de direitos humanos na Argentina tentam reconstruir a história recente do país, para a recuperação da identidade em um amplo sentido, incluindo não só a restituição dos filhos desaparecidos às famílias legítimas, mas também um extenso programa integrado ao currículo escolar.

O objetivo é que "crianças e jovens tomem consciência do passado recente de seu país para sensibilizá-los sobre os valores democráticos contra a passividade ante qualquer tentativa de golpe de Estado", explicou Estela Barnes de Carlotto, presidente da associação Avós da Praça de Maio, em conversa com a Deutsche Welle. A luta pelos direitos humanos inclui ainda a produção cultural, a partir da qual compositores, cineastas e escritores oferecem um espaço de reflexão e reconstrução da identidade.

Uma longa jornada

Assim que a democracia foi restaurada na Argentina, em 1983, o então presidente Raúl Alfonsín ordenou a criação da Conadep (Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas), formado por um grupo de cidadãos proeminentes, cujo relatório "Nunca Mais" abriu as portas, em 1985, ao primeiro julgamento das três juntas militares.

Em 1986, no entanto, provavelmente pressionado pela cúpula militar, Alfonsín aprovou a Lei do Ponto Final e a Lei de Obediência Devida, que na realidade eram "leis de impunidade", permitindo a liberdade dos acusados. "Não há obediência devida, e sim obediência de vida" foi a palavra de ordem dos ativistas de direitos humanos na época.

Em 1989-1990, os indultos do então presidente Carlos Menem permitiram que estas leis continuassem em vigor, de forma que a "sociedade argentina vivesse na impunidade por 20 anos", assinalou Carlotto. "É preciso lembrar a convivência dos cidadãos com os assassinos, o que foi uma afronta à democracia em construção", salienta a presidente das Avós da Praça de Maio.

Outro marco importante na busca pelos desaparecidos foi a criação da Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF), em 1984, por iniciativa das Mães da Praça de Maio. O grupo foi dirigido pelo norte-americano Clyde Snow, que desenvolveu técnicas de exumação de cadáveres em valas comuns e estudos de DNA, logo aplicados em outros países latino-americanos.

O Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS) e a Assembleia Permanente de Direitos Humanos (APDH) argentinos desempenharam – e ainda desempenham – um papel-chave no julgamento de crimes contra a humanidade cometidos durante a ditadura.Também em 1984, foi criado o Banco Nacional de Dados Genéticos, "único no mundo", segundo Estela de Carlotto.

Ele nasceu de uma ideia das Avós da Praça de Maio, a fim de identificar, através do chamado "Índice de Abuelidad" (parentesco de avós), os bebês tomados por militares ou entregues ilegalmente para adoção. Mesmo sem o DNA dos pais, tornou-se possível a identificação dos netos desaparecidos durante a ditadura. O índice é obtido por meio de um estudo imunogenético e permite o registro do mapa genético para casos futuros, quando as avós já tiverem falecido.

Sociedade civil, a chave da democracia argentina

O êxito da Argentina no campo dos direitos humanos se baseia, segundo o advogado criminalista Wolfgang Kaleck, em dois fatores: "Em primeiro lugar, o forte movimento pelos direitos humanos que partiu das Mães da Praça de Maio e, em segundo, o uso estratégico que elas fizeram de instâncias políticas e jurídicas, não apenas locais, mas também internacionais, para denunciar crimes e buscar justiça".

Kaleck é membro do Centro Europeu de Direitos Humanos e Constitucionais e da Coalizão contra a Impunidade, organização que busca esclarecer desaparecimentos de alemães e descendentes de alemães durante a última ditadura na Argentina. Segundo Kaleck, a mobilização das organizações argentinas de direitos humanos no exterior, por exemplo junto à Corte Interamericana de Direitos Humanos, e em tribunais europeus fizeram com que a pressão fosse contínua na Argentina. O trabalho das organizações de direitos humanos e as exigências internacionais são "exemplares em todos os sentidos", afirma o advogado.

Segundo ele, isso levou à abertura de centenas de processos contra militares, policiais e outros responsáveis por crimes cometidos durante a ditadura. Nos últimos anos, houve quase 200 condenações de, entre outros, altos ex-oficiais militares.

Desde 2003, e também devido aos esforços do governo de Néstor Kirchner e de sua sucessora, Cristina Fernández de Kirchner, os esforços para esclarecer os crimes e resgatar a memória têm sido constantes.

Processamento e reparação

"Das 500 crianças que estimamos terem sido roubadas, já encontramos 105. Elas hoje estão adultas e podem viver sua identidade real", salientou a presidente das Avós da Praça de Maio.

O reconhecimento dado à Argentina na busca pela justiça para os crimes da ditadura se deve, segundo Estela de Carlotto, "ao trabalho do povo junto ao Estado para transformar cada centro de detenção clandestino em memorial, para legislar de forma a acabar com a impunidade, rejeitando as leis declaradas inconstitucionais, para restituir economicamente netos e vítimas em todos os sentidos, seja com moradias ou com subsídios".

Muito que fazer

Segundo Wolfgang Kaleck, o processamento legal dos crimes da ditadura na Argentina poderia ser acelerado se houvesse mais funcionários e salas de audiência. "Há melhorias que estão nas mãos dos políticos. Para acelerar os julgamentos, seria preciso mudar as regras que regem a ordem processual", sugere Kaleck.

Ele lembra que também deve ser responsabilizado quem colaborou com a ditadura, seja da sociedade civil ou do setor econômico. "Por exemplo, empresas alemãs. Uma delas é a Mercedes, em que desapareceram 16 sindicalistas, e a outra é Azúcar Ledesma, que também pactuou com os militares. Ambas as investigações estão em fase inicial, naturalmente devido às considerações políticas frente às empresas, que são muito poderosas", observa o advogado.

Entre as questões pendentes estão também desaparecimentos (como o da testemunha de acusação Julio López, em 2006), e casos de violência policial, cujas vítimas foram, em sua maioria, jovens de classe baixa e minorias marginalizadas.

Em 1992, foram criadas a Comissão de Familiares de Vítimas Indefesas da Violência Social (Cofavi), a Coordenadoria contra a Repressão Institucional e Policial (Correpi), e a Unidade Familiar e Vítimas contra Impunidade (Ufavici). Segundo a Correpi, entre 1983 e 1997, foram relatados 400 casos de pessoas assassinadas por forças de segurança.

Autora: Cristina Papaleo (rw) - Revisão: Carlos Albuquerque

DÍVIDAS PAGAM-SE, PROMESSAS NÃO!




ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA*

"Tal como as dívidas são para se pagar, os acordos são para se cumprir" afirmou hoje o primeiro-ministro do reino lusitano, o mesmo que andou a prometer bacalhau a pataco para conseguir que os portugueses lhe passassem um cheque em branco.

Pedro Passos Coelho afirmou hoje que, "tal como as dívidas são para se pagar, os acordos são para se cumprir", defendendo a inscrição no "direito primário" português da "regra de ouro" sobre o défice acordada no Conselho Europeu.

"Não podemos continuar de cimeira em cimeira anunciando compromissos que acabam por não ser cumpridos. Os acordos são para ser cumpridos e respeitados", afirmou Pedro Passos Coelho, já esquecido que ostenta no peito a medalha que diz: ainda está para nascer um primeiro-ministro que tenha mentido tanto quanto eu.

Pedro Passos Coelho também afirmou, na altura referindo-se ao governo de José Sócrates, que “estas medidas põem o país a pão e água. Não se põe um país a pão e água por precaução”, acrescentando que estava “disponível para soluções positivas, não para penhorar futuro tapando com impostos o que não se corta na despesa”.

O mesmo Pedro Passos Coelho também afirmou que “aceitava reduções nas deduções no dia em que o Governo anunciar que vai reduzir a carga fiscal às famílias” e que “nas despesas correntes do Estado, há 10% a 15% de despesas que podem ser reduzidas”.

Também foi o mesmo Passos Coelho quem disse que “aqueles que são responsáveis pelo resvalar da despesa têm de ser civil e criminalmente responsáveis pelos seus actos”, acrescentando que “ninguém nos verá impor sacrifícios aos que mais precisam. Os que têm mais terão que ajudar os que têm menos”.

E foi o mesmo que hoje diz que "tal como as dívidas são para se pagar, os acordos são para se cumprir", que garantiu que “para salvaguardar a coesão social prefiro onerar escalões mais elevados de IRS de modo a desonerar a classe média e baixa”, afirmando que “posso garantir que não será necessário despedir pessoas nem cortar mais salários para sanear o sistema português”.

Pedro Passos Coelho disse igualmente que “a pior coisa é ter um Governo fraco”, pois “um Governo mais forte imporá menos sacrifícios aos contribuintes e aos cidadãos”.

Por tudo isto, faço minhas as palavras de Passos Coelho quando perguntava: “Como é possível manter um governo em que um primeiro-ministro mente?”

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor, compilado em Página Global: GALO ALIMENTADO A LAGOSTA NÃO VOA

Portugal: Objetivo "mais amplo" da auditoria cidadã será o de "desarmar ideias feitas"



RTP

O "grande" contributo da Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública poderá ser conseguir desarmar ideias feitas, defendeu hoje o secretário-geral da CGTP, dando como exemplos a responsabilidade pela crise e a inevitabilidade da atual situação do país.

Durante o dia de hoje, a Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública realiza a "Convenção de Lisboa" com o propósito de debater o projeto e eleger os nomes da comissão que vai realizar a auditoria.

Trata-se de uma iniciativa lançada por um grupo de cidadãos, entre os quais a antiga secretária de Estado da Educação socialista Ana Benavente, o economista José Castro Caldas e o secretário-geral da Confederação-Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP-In), aprovada na assembleia popular com que terminou a manifestação de movimentos sociais que ficaram conhecidos pelos "indignados", realizada em Lisboa a 15 de outubro.

Em declarações à Lusa, no final da primeira parte dos trabalhos, durante a manhã de hoje, o líder da CGTP apontou que o país não vai conseguir sair do "buraco" em que está metido "sem a consciencialização, a mobilização e responsabilização das pessoas e organizações na sociedade".

"Esse é um grande desafio, mas esta iniciativa tem objetivos muito mais amplos, pode ser um contributo extraordinariamente importante para desarmar ideias feitas que estão inculcadas, metidas à força na cabeça das pessoas, como seja de que somos todos responsáveis, como se fossemos todos responsáveis por igual", defendeu Carvalho da Silva.

Na opinião do sindicalista, o país e a sociedade portuguesa não podem saber para onde caminhar em segurança, se não sabem de onde vêm e porque é que aconteceu o atual nível de endividamento de Portugal.

Carvalho da Silva acredita que há alternativas para o país, contrariando aquilo que diz ser a ideia generalizada de que a atual crise económico-financeira era inevitável e acreditando que a auditoria às contas públicas pode revelar uma história diferente.

"A propaganda tem sido que temos todos andado a viver acima das nossas possibilidades e essa treta toda. É evidente que os grandes buracos que deram origem à situação em que estamos, os grandes buracos foram outros, foram, se quisermos, a utilização indevida de recursos que eram de todos e o encaminhamento para formas de funcionamento dos negócios que eram fraudulentos", sublinhou o líder da CGTP.

Igualmente presente no decorrer dos trabalhos, o presidente do Comité belga para a anulação da dívida do terceiro mundo (CADTM), que esteve envolvido na auditoria à dívida do Equador, lembrou as diferenças com a atual dívida portuguesa.

No caso do Equador, a auditoria foi pedida pelo próprio presidente da República que se comprometeu a resolver uma "dívida ilegítima", ao contrário do que sucede em Portugal, onde a iniciativa é popular.

"É uma iniciativa da sociedade civil que vai tentar compreender o que representa a dívida, porque é que se endividaram, se é legítimo ou não o país endividar-se para de seguida, através da mobilização da sociedade, fazerem pressão", explicou Éric Toussaint.

Na opinião do especialista em ciências políticas, esta iniciativa em Portugal pode também querer dizer que os cidadãos estão a querer quebrar com um aparente estado de apatia e a querer envolver-se na causa pública.

Éric Toussaint defendeu também a criação de uma Federação das Iniciativas para uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública, uma vez que já alastrou a outros países europeus como a Espanha, Grécia, França ou Irlanda, como estratégia de força para motivar a solidariedade de outros países europeus.

Durante a tarde de hoje, será tempo de discutir a proposta de resolução para uma iniciativa de auditoria cidadã e a ratificação da constituição da comissão da auditoria.

Portugal: SAÚDE S.A.




JOSÉ MANUEL PUREZA – DIÁRIO DE NOTÍCIAS, opinião      

"Melhor negócio que a saúde só mesmo a indústria de armamento!" Estas são palavras claras proferidas em 2008 por alguém com responsabilidades de chefia da área negocial de saúde de um grupo económico privado. Há muito que quem assim pensa a saúde tomou conta dos destinos desta área da nossa vida colectiva. E, passo a passo, foi esvaziando o serviço público e criando condições para o florescimento do negócio privado. Como em tantos outros sectores - no ensino, na cultura, na segurança social - a tomada do Estado pelos liberais serve sobretudo para, a partir dele, criar um mercado e (des)regulá-lo a contento.

O anúncio, no início desta semana, do agravamento drástico do valor das taxas moderadoras pelo Governo segue esse rumo. A estratégia é clara: encurtando o mais que pode a diferença entre pagamentos de saúde pelas famílias no sector público e no sector privado, o Governo fomenta a transferência de utentes do Serviço Nacional de Saúde para a medicina privada. Esse é o seu desígnio. Definitivamente, a única coisa que as taxas moderadoras querem passar a moderar é a reserva de muitas pessoas a engrossarem as fileiras dos consumidores de serviços privados de saúde.

O Governo sabe, e não o disfarça, que a forma mais eficiente de, no curto prazo, reduzir despesa pública de saúde é ter menos doentes em tratamento. A canção de embalar dos "ganhos de gestão" chegou portanto ao fim. É de cortes no tratamento que se trata - não há outra interpretação possível para esta decisão do Governo de, no momento mais duro do aperto dos orçamentos familiares de quem ganha já tão pouco, aumentar brutalmente a co-responsabilização das famílias pelo pagamento da saúde. Menos doentes no SNS e mais clientes dos seguros de saúde privados - eis o que hoje anima a política governamental de saúde.

E a procissão ainda vai no adro. No seu afã de ir sempre mais além do que o programa da troika impõe, Passos Coelho veio, lesto, avisar que se está ainda "muito longe de esgotar o plafond de crescimento das taxas moderadoras". Para bom entendedor... Aliás, o novo quadro legal aprovado pelo Governo mantém, a este respeito, um truque extraordinário: as taxas moderadoras não poderão exceder um terço dos valores da tabela de preços do SNS, mas quem fixa essa tabela é o mesmo Governo. Por outras palavras: o plafond de crescimento das taxas moderadoras nunca estará esgotado, basta que o Governo actualize a tabela de preços do SNS em conformidade. Sabemos bem o que isto significa. Preparemo-nos para muito más notícias: hoje, o Governo sobe as taxas moderadoras, amanhã porá os doentes a pagar os cuidados de saúde que recebem no SNS.

Os liberais disfarçados de tecnocratas alegam, como sempre, que não há alternativa. Desta vez porque, dizem, os custos da saúde aumentaram exponencialmente. É certo. E os submarinos, desceram porventura de preço? E os juros das parcerias público-privado, terão parado de crescer? E o financiamento do buraco do BPN, encolheu? Ou, pelo contrário, em todos estes e outros rombos ao erário público, o respectivo "plafond de crescimento" parece ilimitado? A questão verdadeira não é, pois, a de um crescimento singular da despesa em saúde. Não, a questão é de opção política. Quisera o Governo impor aos operadores privados o mesmo corte de 15% que impôs aos hospitais públicos e pouparia 150 milhões de euros anuais. Quisera o Governo impor às parcerias público-privado na saúde essa mesma redução de financiamento de 15% e aforraria 45 milhões de euros. Quisera, enfim, o Governo aumentar para 50% a quota de mercado dos genéricos e pouparia 200 milhões de euros por ano.

Na saúde é a democracia que se joga. Ou prevalecem os direitos ou floresce o negócio. Não há terceira via.

LUÍS FIGO ESTÁ MUITO PARECIDO COM PORTUGAL



António Fernando NabaisAventar

“Quero vender tudo o que tenho em Portugal”

Esta afirmação de Luís Figo tem muito em comum com aquilo que Portugal quer fazer: vender tudo o que tem em Portugal, sendo a entrega – venda é outra coisa – da EDP um dos exemplos mais recentes.

É claro que há algumas diferenças: Figo vende tudo o que tem aqui para ficar melhor lá fora; Portugal venderá o que tem e ficará mal cá dentro. O ex-jogador conserva os dedos e troca de anéis; Portugal nem orelhas para brincos terá, até porque já perdeu a cabeça.

Na mesma entrevista, Luís Figo declara o seu arrependimento por ter apoiado José Sócrates e comenta a crise com esta clarividência: “Não me venham dizer que há uma crise financeira, uma crise mundial. Há é políticos que gastam mais do que há para gastar. E isso é o bê-à-bá da economia. Não é preciso ser muito inteligente para perceber isto – eu não sou muito e não gasto mais do que aquilo que tenho.”

Não sou obrigado a gostar do homem, mas esta frase poderia ser aproveitada para epígrafe das conclusões da Iniciativa por uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública.

*Pode ler a entrevista do Público aqui em Página Global

PR de Cabo Verde: CESÁRIA ÉVORA REPRESENTAVA A NOÇÃO DE SER CABO-VERDIANO



DIÁRIO DE NOTÍCIAS

O Presidente de Cabo Verde considerou hoje a morte de Cesária Évora uma "grande perda" para todos os cabo-verdianos, afirmando que se calou uma voz que representava "um pouco a noção de ser cabo-verdiano".

Reagindo logo após ter recebido a notícia, interrompendo mesmo o almoço num restaurante da Cidade da Praia, Jorge Carlos Fonseca afirmou que com a morte da "Diva dos Pés Descalços", falecida aos 70 anos no Mindelo, desaparece uma das maiores figuras da cultura cabo-verdiana.

"O sentimento que me invade é de profunda tristeza e de grande desolação, porque com o desaparecimento físico de Cesária Évora desaparece uma das maiores figuras da cultura cabo-verdiana, particularmente da nossa música. Diria mais, que Cesária Évora representa um pouco a noção de ser cabo-verdiano", defendeu.

Segundo o Presidente cabo-verdiano, Cesária Évora constituía uma "referência incontornável" da Nação cabo-verdiana.

"Quando pensamos em Cabo Verde seguramente pensamos em Cesária Évora. E quando as pessoas ouvem Cesária, a referência é Cabo Verde, o que dizer que é uma das grandes figuras da Nação cabo-verdiana. O falecimento representará para todos os cabo-verdianos uma grande perda e os cabo-verdianos estarão atravessados por um profundo sentimento de pesar e de tristeza", avançou.

Recordando que esteve com Cesária Évora, há pouco tempo "por ocasião do aniversário dela" (27 de Agosto), Jorge Carlos Fonseca afirmou que a notícia da morte surgiu de forma inesperada, já que havia ainda a esperança de uma recuperação da cantora, apesar dos graves problemas de saúde que enfrentava.

"Conhecíamos o estado de saúde dela, mas confiamos sempre na recuperação das pessoas. Parecia-nos uma questão conjuntural e que se recomporia rapidamente. Infelizmente, as coisas aconteceram e, neste momento, temos o conforto de ficar com a imagem, com a figura, com a música. A voz, essa, que é imperecível", lamentou.

Jorge Carlos Fonseca frisou ainda que a melhor homenagem que os cabo-verdianos podem fazer a "Cize", como também é conhecida, é "recordar a figura" e "enaltecer" o papel" que teve e, sobretudo, ter permanente o registo da "grande voz".

Jorge Carlos Fonseca garantiu que "se não houver nenhum condicionalismo" vai fazer tudo para estar presente nas cerimónias fúnebres de Cesária Évora.

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Moçambique: MAIS DE 200 MIL CRIANÇAS SEM ACESSO À ESCOLA



Simião Pongoane, Maputo VOA News

Gastos na educação aumentam mas não são suficientes para o crescimento populacional

Mais de 200 mil crianças vão ficar fora das salas de aula das escolas públicas em 2012 em Moçambique. É um problema que se vêm arrastando ao longo dos anos e que não parece ter solução imediata.

A procura de ensino é muito grande e o governo e seus parceiros não conseguem resolver o problema, pese embora o esforço de construção de novas salas de aula.

A população está a crescer a uma velocidade que ultrapassa de longe a capacidade de construção de novas escolas, num país com muitas necessidades noutras áreas sociais, com a saúde à cabeça.

No próximo ano mais de duzentas mil crianças vão mesmo ficar fora por falta de vagas nas escolas públicas.

O orçamento alocado para 2012 ao sector da educação ronda os vinte e seis mil milhões de Meticais, cerca de mil milhões de dólares norte-americanos, um aumento na ordem de catorze por cento, incluindo o das onze direcções provinciais.

Mas o valor está muito longe de satisfazer as actividades programadas para o próximo ano.

Os vinte e seis mil milhões de Meticais alocados pelo governo para o sector da educação em 2012, deverão cobrir várias actividades programadas na área, entre contratação de 8.500 professores, pagamento de salários para os funcionários a nível das províncias e demais acções.

Os montantes devem ser geridos pelo sector da educação, que procura junto dos parceiros de cooperação e sociedade civil reprogramar actividades que devem ser financiadas pelo orçamento do Estado.

O Fundo de contribuição, que envolve parceiros de cooperação denominado FASE, e canalizado através do tesouro, mantém-se na ordem dos cento e trinta milhões de dólares. É pouco dinheiro para as necessidades anuais do sector da educação, que está a registar uma queda acentuada de qualidade, basicamente por causa da superlotação.

É considerado quase normal um professor do ensino secundário ter 12 turmas com 60 alunos cada. Por enquanto, ninguém tem solução para este problema a curto prazo. É uma geração condenada ao fracasso em pleno século 21 pela pobreza.

* Foto: VOA - A. Fortier

Distanciamento entre o Estado e o cidadão preocupa sociedade civil angolana



Armando Chicoca, Luanda – VOA News

A sociedade civil angolana considera de abismal o distanciamento existente, entre o cidadão e o estado angolano. Em saudação ao aniversário da declaração universal dos direitos humanos, activistas dos direitos humanos, reuniram-se em Luanda e reflectiram sobre a matéria em causa.

A Conferencia Nacional sobre o direito dos cidadãos á participação na vida pública do país, que decorreu na passada quarta-feira, 14 do mês em curso em Luanda, na sala diamante, do hotel Alvalade, defendeu a necessidade de se privilegiar uma discussão aberta e franca sobre os problemas que diz respeito a todos.

Suzana Mendes da rede Mulher diz que o país continua a registar problemas de posicionamento dos dois lados, o que pressupõe um trabalho mais acutilante, capaz de trazer a mesa do diálogo, governantes dos vários sectores da vida Publica e organizações da sociedade civil.

«Nós continuamos a ter alguns constrangimentos em função ao problema de posicionamento dos dois lados É preciso que nós membros da sociedade civil, entendamos que as instituições do estado são parceiros privilegiados para o processo do nosso trabalho de desenvolvimento social, portanto, devemos trabalhar cada vez mais, com vista trazer para os nossos eventos, também os membros do executivo do estado, para termos um diálogo franco e aberto», defendeu.

No domínio do sector de educação, Susana Mendes disse que há experiencias positivas que concorrem e acalentam boas esperanças naquilo que se pretende no país em relação à aproximação do cidadão e do governante.

Entretanto muitos angolanos continuam a queixar-se da exclusão dos seus direitos de cidadania, que começam desde a falta do bilhete de identidade, o emprego, oportunidades, ausência de uma informação diversificada no contexto da comunicação social entre outras. A violação dos direitos humanos, com realça para as demolições na cidade do Lubango onde já se fala em perda de vidas humanas, foi igualmente reflectida neste fórum.

A sociedade civil exorta a população para a cultura de denúncia e participação às instituições judiciais, ainda que estas não correspondam a ansiedade da população, tal como acontece um pouco por todas as províncias de Angola. O Activista dos direitos humanos da Huíla Guilherme dos Santos apela a população visada, a inundar os tribunais em processos de queixa.

Os órgãos de comunicação social devem ser outro recurso para as denuncias, no caso de a Rádio nacional de Angola recusar-se dar voz aos angolanos sem voz, recorrem a outros órgãos privados existentes no pais e fora do país, ainda que por mensagens telefónicas, portanto um dos mecanismos de pressão, visando acabar com alguns excessos, frisou o activista da Huíla.

Luanda: DESIGUALDADES SOCIAIS MAIS VISÍVEIS NA ÉPOCA DO NATAL



Esperança Gaspar, Luanda – VOA News

Mais uma vez, o Natal acontece em Luanda, com muito para alguns e sem nada para outros.

A poucos dias do Natal, em que os católicos celebram o nascimento do menino Jesus, algumas famílias residentes em Luanda, andam já num corre-corre para garantirem que nada falte no dia 25. Outras, contudo, aguardam por uma bênção de Deus para que o negócio ande e consigam proporcionar um dia diferente aos seus filhos com o lucro que obtiverem do negócio.

Nas ruas de Luanda, o cenário para a época natalícia já foi montado:cor,luz e os enfeites de Natal, anunciam a festa que se aproxima.Mas,na casa de Esperança Salvador,nenhum cenário foi montado para a quadra festiva. Não há árvore, presépio, enfeites de natal nem mesmo jogo de luzes, porque,segundo a dona da casa,não a dinheiro para comprar os enfeites de Natal.

Mãe de seis filhos, Esperança é vendedeira de fardos,ou seja, de roupa usada, no Mercado do São Paulo.A dona de casa diz que é desta forma que, quase todos os anos, passa o dia 25. No entanto,o famoso cozido à meia-noite já foi providenciado.

Já Meli, uma outra dona de casa, apesar dos poucos recursos financeiros,fez questão de assegurar que nada falte neste dia.A árvore já foi montada.As cores verde e vermelha emprestam à sua casa o espírito natalício.Os presentes para os seus três filhos, também já foram colocados debaixo da árvore de Natal.

Apesar das diferenças sociais, tanto Meli como Esperança partilham a mesma ideia: a saúde é o mais importante neste dia.

Para o padre Armando Pinho,da Igreja da Sagrada Família,devido a essa disparidade social existente no mundo inteiro,o espírito de solidariedade humana deve constituir uma atitude permanente no homem e, em especial, entre os angolanos. Aquele sacerdote falou do significado do Natal para o mundo cristão. Segundo o padre Armando,o Natal continua a ter o mesmo simbolismo em relação a séculos passados,pois traz uma dimensão de paz,uma paz que, na sua óptica, deve ser preservada.

O padre Armando Pinho olha para o Natal como sendo o dia da família,uma festa familiar que, a cada ano,perde o seu verdadeiro sentido. Num país, como Angola, onde a desigualdade social é cada vez mais acentuada, o padre Pinho fala da necessidade de se criar um espírito messiânico para a garantia da harmonia social.

Essa é também a chamada época da especulação do preço. Cidadãos e clientes, em Luanda, reagem à subida dos preços de alguns produtos nos mercados formais e informais.

Os preços do leite, da manteiga e de outros produtos, que são de grande necessidade por esta altura do ano,sofreram um aumento considerável.E os cidadãos já estão a sentir as consequências desta mudança de preços consequente da quadra festiva.

Hilário dos Santos disse mesmo que o Estado, através dos seus organismos competentes, deve trabalhar de forma a pôr fim aquela prática especulativa.

Por sua vez, Marinela dos Santos, na condição de cliente, pensa que há necessidade de os responsáveis de algumas lojas fornecedoras de produtos alimentares pensarem mais nos cidadãos.

Por esta razão o padre Armando Pinho,chama atenção para o espírito consumista que afecta alguns dos angolanos nesta época natalícia.

O padre Armando Pinho realçou ainda que a unidade familiar é fundamental para uma quadra festiva em harmonia. É desta forma que, mais uma vez, nasce o Natal em Luanda, com muito para alguns e sem nada para outros.

AS DOENÇAS QUE MAIS VENDERÃO EM 2012




Martha Rosenberg*, AlterNet - Tradução: Daniela Frabasile – Outras Palavras

“Se há um remédio capaz de gerar lucros, deve haver consumidores”

O que as corporações querem que você compre agora

Como a indústria farmacêutica conseguiu que um terço da população dos Estados Unidos tome antidepressivos, estatinas, e estimulantes? Vendendo doenças como depressão, colesterol alto e refluxo gastrointestinal. Marketing impulsionado pela oferta, também conhecido como “existe um medicamento – precisa-se de uma doença e de pacientes”. Não apenas povoa a sociedade de hipocondríacos viciados em remédios, mas desvia os laboratórios do que deveria ser seu pepel essencial: desenvolver remédios reais para problemas médicos reais.

Claro que nem todas as doenças são boas para tanto. Para que uma enfermidade torne-sc campeã de vendas, ela deve: (1) existir de verdade, mas ser constatada num diagnóstico que tem margem de manobra, não dependendo de um exame preciso; (2) ser potencialmente séria, com “sintomas silenciosos” que “só pioram” se a doença não for tratada; (3) ser “pouco reconhecida”, “pouco relatada” e com “barreiras” ao tratamento; (4) explicar problemas de saúde que o paciente teve anteriormente; (5) precisar de uma nova droga cara que não possui equivalente genérico.

Aqui estão algumas potenciais doenças da moda, que a indústria farmacêutica gostaria que você desenvolvesse em 2012:

Déficit de atenção com hiperatividade em adultos

Problemas cotidianos rotulados como “depressão” impulsionaram os laboratórios nas últimas duas décadas. Você não estava triste, bravo, com medo, confuso, de luto ou até mesmo sentindo-se explorado. Você estava deprimido, e existe uma pílula para isso. Mas a depressão chegou a um ápice, como a dieta Atkins e Macarena. Com sorte, existe o transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (DDAH) em adultos. Ele dobrou em mulheres de 45 a 65 anos e triplicou em homens e mulheres com 20 a 44 anos, de acordo com o Wall Street Journal.

Assim como a depressão, a DDAH em adultos é uma categoria que pode englobar tudo. “É DDAH ou menopausa?” pergunta um artigo na Additude, uma revista voltada exclusivamente à doença DDAH. “DDA e Alzheimer: essas doenças estão relacionadas?” pergunta outro artigo da mesma revista.

“Estou deprimida, pode ser DDAH?” diz um anúncio na Psychiatric News, mostrando uma mulher bonita, mas triste. Na mesma publicação, outro anúncio diz “promessas quebradas – adultos com DDAH têm quase duas vezes mais chances de se divorciar”, enquanto estimula médicos a checar a presença de DDAH pacientes para DDAH em seus pacientes.

Adultos com DDAH são normalmente “menos responsáveis, confiáveis, engenhosos, focados, autoconfiantes, e eles encontram dificuldades para definir, estabelecer e propor objetivos pessoais significativos”, diz um artigo escrito pelo dr. Joseph Biederman, psiquiatra infantil de Harvard, que leva os créditos por colocar “disfunção bipolar pediátrica” no mapa. Eles “mostram tendências de ser mais fechados, intolerantes, críticos, inúteis, e oportunistas” e “tendem a não considerar direitos e sentimentos de outras pessoas”, diz o artigo, numa frase que poderia ser usada por muitas pessoas para definir seus cunhados.

Adultos com DDAH terão dificuldade em se manter em um emprego e pioram se não forem tratados, diz WebMD, apontando para o seguindo requisito para as doenças campeãs de venda – sintomas que se agravam sem medicação. “Adultos com DDAH podem ter dificuldade em seguir orientações, lembrar informações, concentrar-se, organizar tarefas ou completar o trabalho no prazo”, de acordo com o site, cujo parceiro original era Eli Lilly.

Como as empresas farmacêuticas conseguiram fazer com que cinco milhões de crianças, e agora talvez seus pais, tomem remédios para DDAH? Anúncios em telas de 9 metros por 7, quatro vezes por hora na Times Square não vão fazer mal. Perguntam: “Não consegue manter o foco? Não consegue ficar parado? Seu filho pode ter DDAH?” (Aposto que ninguém teve problemas em se focar neles!).

Porém, convencer adultos que eles não estão dormindo pouco, nem entediados, mas têm DDAH é apenas metade da batalha. As transnacionais farmacêuticas também têm que convencer crianças que cresceram com o diagnóstico de DDAH a não pararem de tomar a medicação, diz Mike Cola, da Shire (empresa que produz os medicamentos para DDAH: Intuniv, Addreall XR, Vyvanse e Daytrana). “Nós sabemos que perdemos um número significativo de pacientes com mais ou menos vinte anos, pois saem do sistema por não irem mais ao pediatra”.

Um anúncio da Shire na Northwestern University diz “eu lembro de ser uma criança com DDAH. Na verdade, eu ainda tenho”, a frase está escrita em uma foto de Adam Levine, vocalista do Maroon 5. “É sua DDAH. Curta”, era a mensagem subliminar. (O objetivo seria: “continue doente”?).

Claro, pilhar crianças (ou qualquer um, na verdade) não é muito difícil. Por que outra razão traficantes de metanfetamina dizem que “a primeira dose é grátis”? Mas a indústria está tão empenhada em manter o mercado pediátrico de DDAH que criou cursos para médicos. Alguns exemplos: “Identificando, diagnosticando e controlando DDAH em estudantes”. Ou “DDAH na faculdade: procurar e receber cuidado durante a transição da infância para a idade adulta”.

Para assegurar-se de que ninguém pense que a DDAH é uma doença inventada, WebMD mostra ressonâncias magnéticas coloridas de cérebros de pessoas normais e de pacientes com DDAH (ao lado de um anúncio de Vyvanse). Mas é duvidoso se as duas imagens são realmente diferentes, diz o psiquiatra Dr. Phillip Sinaikin, autor de Psychiatryland. E mesmo que forem, isso não prova nada.

“O ponto central do problema é que simplesmente não existe um entendimento definitivo de como a atividade neural está relacionada à consciência subjetiva, a antiga relação não muito clara entre corpo e mente”, Sinaikin contou ao AlterNet. “Não avançamos muito além da frenologia, e esse artigo do WebMD é simplesmente o pior tipo de manipulação da indústria farmacêutica a fim de vender seus produtos extremamente caros. Nesse caso, um esforço desesperado da Shire para manter uma parte do mercado quando o Addreall tiver versão genérica”.

Artrite Reumatóide

A Artrite Reumatoide (AR) é uma doença séria e perigosa. Mas os supressores do sistema imunológico que a indústria farmacêutica oferece como alternativa – Remicade, Enbrel, Humira e outros – também são. Enquanto a AR ataca os tecidos do corpo, levando à inflamação das articulações, tecidos adjacentes e órgãos, os supressores imunológicos podem abrir uma brecha para câncer, infecções letais e tuberculose.

Em 2008, a agência norte-americana para alimentação e medicamentos (FDA) anunciou que 45 pessoas que tomavam Humira, Enbrel, Humicade e Cimzia morreram por doenças causadas por fungos, e investigou a relação do Humira com linfoma, leucemia e melanoma em crianças. Esse ano, a FDA avisou que as drogas podedm causar “um raro tipo de câncer nas células sanguíneas brancas” em jovens, e o Journal of the American Medical Association (JAMA) advertiu o aparecimento de “infecções potencialmente fatais por legionela e listeria”.

Medicamentos que suprem o sistema imunológico também são perigosos para os bolsos. Uma injeção de Remicade pode custar US$ 2.500; o suprimento de um mês de Enbrel custa US$ 1.500; o custo anual do Humira é de US$ 20 mil.

Há alguns anos, a AR era diagnosticada com base na presença do “fator reumatóide” e inflamações. Mas, graças ao marketing guiado pela oferta da indústria farmacêutica, bastam hoje, para o diagnóstico, enrijecimento e dor. (Atletas e pessoas que nasceram entes de 1970, entrem na fila, por favor).

Além do espaço de manobra para o diagnóstico e um bom nome, a AR possui outros requisitos das doenças campeãs de vendas. “Só vai piorar” se não for tratada, diz WebMD, e é frequentemente “subdiagnosticada” e pouco relatada, diz Heather Mason, da Abbott, porque “as pessoas costumam não saber o que têm, por algum tempo”.

Uma doença tão perigosa que o tratamento custa US$20 mil por ano, mas que é tão súbita que você pode não saber que tem? AR desponta como uma doença da moda.

Fibromialgia

Outra doença pouco relatada é a fibromialgia, caracterizada dores generalizadas e inexplicadas no corpo. Fibromialgia é “quase a definição de uma necessidade médica não atendida”, diz Ian Read, da Pfizer, que fabrica a primeira droga aprovada para fibromialgia, o medicamento anticonvulsivo Lyrica. A Pfizer doou US$ 2,1 milhões a grupos sem fins lucrativos em 2008 para “educar” médicos sobre a fibromialgia e financiou anúncios de serviço da indústria farmacêutica que descreviam os sintomas e citavam a droga. Hoje, a Lyrica lucra US$ 3 bilhões por ano.

Mesmo assim, a Lyrica concorre com Cymbalta, o primeiro antidepressivo aprovado para fibromialgia. A Eli Lilly propôs o uso de Cymbalta para a “dor” física da depressão, em uma campanha chamada “depressão machuca” antes da aprovação do tratamento para fibromialgia. O tratamento de pacientes com fibromialgia com Lyrica ou Cymbalta custa cerca de US$10 mil, segundo diários médicos.

A indústria farmacêutica e Wall Street podem estar felizes com os medicamentos para fibromialgia, mas os pacientes não. No site de avaliação de medicamentos, askapatient.com, pacientes que usam Cymbalta relatam calafrios, problemas maxilares, “pings” elétricos em seus cérebros, e problemas nos olhos. Nesse ano, quatro pacientes relataram a vontade de se matar, um efeito colateral frequente do Cymbalta. Usuários de Lyrica relatam no askapatient perda de memória, confusão, ganho extremo de peso, queda de cabelo, capacidade de dirigir automóveis comprometida, desorientação, espasmos e outros ainda piores. Alguns pacientes tomam os dois medicamentos.

Disfunções do sono: Insônia no meio da noite

Disfunções do sono são uma mina de ouro para os laboratórios porque todo mundo dorme – ou assiste TV, quando não consegue. Para agitar o mercado de insônia, as corporações criaram subcategorias de insônia, como crônica, aguda, transitória, inicial, de início tardio, causada pela menopausa, e a grande categoria de sono não reparador. Nesse outono [primavera no hemisfério Sul], as apareceu uma nova versão do Ambien para insônia “no meio da noite”, chamado Intermezzo – ainda que Ambien seja, paradoxalmente, indutor de momentos conscientes durante o sono. As pessoas “acordam” em um blackout do Ambien e andam, falam, dirigem, fazem ligações e comem.

Muitos ficaram sabendo desse efeito do Ambien quando Patrick Kennedy, ex-parlamentar de Rhode Island, dirigiu até Capitol Hill para “votar” às 2h45min da manhã em 2006, sob efeito do remédio, e bateu seu Mustang. Mas foi comer sob o efeito do Ambien que trouxe a pior discussão sobre o medicamento. Pessoas em forma acordavam no meio de montanhas de embalagens de pizza, salgadinhos e sorvete – cujo conteúdo tinha sido comido pelos seus “gêmeos maus”, criados pelo remédio.

Sonolência excessiva e transtorno do sono por turno de trabalho

Não é preciso dizer: pessoas com insônia não estarão com os olhos brilhando e coradas no dia seguinte – tanto faz se elas não tiverem dormido, ou se tiverem, em seu corpo, resíduos de medicamentos para dormir. Na verdade, essas pessoas estão sofrendo da pouco reconhecida e pouco relatada epidemia da Sonolência Excessiva durante o Dia. As principais causas da SED são apnéia do sono e narcolepsia. Mas no ano passado, as corporações farmacêuticas sugeriram uma causa relacionada ao estilo de vida: “transtorno do sono por turno de trabalho”. Anúncios de Provigil, um estimulante que trata SED, junto com Nuvigil, mostram um juiz vestindo um roupão preto, no trabalho, com a frase “lutando para combater o nevoeiro?”.

Obviamente, agentes estimulantes contribuem com a insônia, que contribui com problemas de sonolência durante o dia, em um tipo de ciclo farmacêutico perpétuo. De fato, o hábito de tomar medicamentos para insônia e para ficar alerta é tão comum que ameaça a criação de um novo significado para “AA” – Adderal e Ambien.

Insônia que é depressão

Disfunções do sono também deram nova vida aos antidepressivos. Médicos agora prescrevem mais antidepressivos para insônia que medicamentos para insônia, de acordo com a CNN. É também comum que eles combinem os dois, já que “insônia e depressão frequentemente ocorrem conjuntamente, mas não fica claro qual é a causa e qual é o sintoma”.

WebMD concorda com o uso das duas drogas. “Pacientes deprimidos com insônia que são tratados com antidepressivos e remédios para dormir se saem melhor que aqueles tratados apenas com antidepressivos”, escreve.

De fato, muitas das novas doenças de massa, desde DDAH em adultos e AR até fibromialgia são tratadas com medicamentos novos junto com outros que já existiam e que não estão funcionando. É uma invenção das corporações polifarmácia. Isso lembra do dono de loja que diz “eu sei que 50% da minha propaganda é desperdiçada – só não sei qual 50%”.

(*) Martha Rosenberg escreve sobre o impacto das indústrias farmacêuticas, alimentícias e de armamentos na saúde pública.

Teoria da conspiração: A SOCIEDADE SECRETA DOS MÉDICOS





Médicos sempre foram intrigantes para mim. Aquelas figuras de branco, cheias de autoridade, sabendo sobre a gente um monte de coisas de que a gente nem desconfia, alternando frases lapidares com longos e simbólicos silêncios…

Claro, a expressão reverente de minha avó e de minha mãe, enquanto o doutor as examinava — ou a um de nós, quando éramos crianças — sempre me pareceu meio exagerada, quase religiosa. E era coisa da cultura da época mesmo. Um pouco como a admiração do analfabeto, diante daquele que lê “de carreirinha”. Mas eu custei a perceber que também tinha por eles um certo temor respeitoso do qual não me dava conta antes, e que aquilo me causava algum incômodo. Aqueles papos entre médicos, que a gente escutava sem querer, quando um pedia a opinião do outro sobre um determinado problema, só serviam pra piorar as coisas. Não basta o jargão, ainda tinham de complicar? “Há indícios de alopecia androgênica”, dizia um. “Não tenha dúvida, vai ter de fazer uma laparo”, sentenciava outro. Ou “não se pode desprezar uma possível glicosúria”, considerava um terceiro. Frases soltas que a gente colhia aqui e ali, e ficava com a impressão de que eles, apesar de salvarem vidas, falavam de fato uma língua morta.

Teoria da Conspiração

Com os anos (e a idade), me esqueci um pouco disso tudo. Achei que, enfim, estava exagerando. Médicos passaram, então, a ser… médicos! Gente que estuda pra consertar gente, e para adiar o máximo possível o descarte de nossas carcaças, mas que são humanos, limitados em seus poderes, como todo mundo. Aquela visão incômoda deles como personagens até misteriosos, quase sobre-humanos, que viam através da gente, acabou se esvaindo pelo caminho, até não restar mais nada daquilo.

Bem, em termos. Recentemente fiquei a par de uma teoria da conspiração que renovou meus temores a respeito dos homens e mulheres de branco. Alguém me segredou ao ouvido que eles, claro, não são seres sobrenaturais, mas integram uma temível sociedade secreta internacional, encarregada não apenas de curar, ou salvar vidas, mas também, dentre outras coisas, de castigar-nos por nossas faltas e nosso pouco caso com a saúde. Essa sociedade, segundo a teoria, seria um emaranhado de células secretas, misteriosas câmaras subterrâneas e corredores sombrios e clandestinos, que, na superfície, manifestam assépticas clínicas, consultórios, hospitais (às vezes não tão assépticos assim), laboratórios e até setores significativos da indústria farmacêutica. Tudo fachada…

A princípio achei exagero. Mas meu interlocutor tinha excelentes argumentos. “Já reparou como os exames que os médicos nos solicitam são quase sempre uma fonte de sofrimento”? Não pude deixar de levar em consideração aquelas palavras. Isso é castigo mesmo… Quando me lembro dos exames preventivos das mulheres, por exemplo, afasto rapidamente aquelas imagens da minha imaginação, temendo pesadelos à noite. Sempre que elas me narram como se lhes apertam, amassam os seios, eu peço pra mudarem de assunto. E nós, homens de mais de cinqüenta, que temos de fazer o nosso preventivo anualmente? Antes, havia apenas a constrangedora prática dos médicos, entrando com o dedo onde não são chamados, para examinar a próstata pelo método Braille…Tá, tá certo, não demora tanto tempo assim, é coisa rápida, sem dúvida. Mas já poderia ter sido abolido, com as novas tecnologias, os exames químicos e tudo mais que está agora à disposição dos urologistas. Hoje em dia, eles podem fazer uma leitura quase perfeita de nossa situação hormonal, por exemplo — por exames clínico-químicos. Ou mesmo dar uma sacada no jeitinho da próstata, que a ultrassonografia revela claramente e sem maiores problemas. Pra que o dedo, gente? Não adianta, a prática Braille continua. “É ainda muito confiável”, asseguram maleficamente os doutores…

E olha que nem precisava mais do dedo, para castigar o infeliz. A tecnologia atualmente em uso pelo urologista já traz um duplo avanço: tanto mostra claramente a próstata, quanto castiga exemplarmente o paciente. Ficar uma hora sem urinar, depois de haver ingerido cinco ou seis copos com água, um imediatamente seguido do outro, sem intervalos, tanto facilita a observação da próstata (pela dilatação da bexiga, sei lá!), quanto traz indizível sofrimento e exemplar castigo para o paciente, algumas vezes causando conseqüências surreais, que não ficaria bem examinar aqui.

A tecnologia aperfeiçoa tudo…

A coisa da ressonância, então… Já viu o que é você entrar naquela máquina, com o ferreiro do inferno martelando aquela lataria, e ainda sem poder se mexer? Se rolar uma coceirinha, corre o risco de ser advertido. Se não for chegado a dormir fechado num caixão, como Drácula, aí então a coisa piora ainda mais. Tem gente que nunca entra numa engenhoca daquelas. E há exames ainda mais cascudos, como aquele em que o proctologista (por que alguém escolhe uma especialização dessas, meus deuses?) examina o você-sabe-o-que enfiando literalmente uma câmera, sei lá se fazendo algum documentário tipo Nat Geo explorando os submundos do Umbral, ou algo assim.

E há ainda muitos outros exemplos. Alguns deles na medicação que os homens e mulheres de branco receitam. Não sei se a indústria farmacêutica tem a sua própria sociedade secreta, ou se é um ramo avançado da misteriosa sociedade dos doutores. “Não leia a bula!”, advertem alguns deles. Aí você espera chegar em casa e, pá!, vai ler a bula. Imprudente paciente! Os eventuais efeitos paralelos desses remédios maravilhosos variam desde prosaicas diarréias, até convulsões, cegueiras temporárias e perda de memória e de cabelo. Perda de dinheiro não, que a maioria deles já traz isso embutido no preço pra gente, e nem precisa constar na bula.

O braço acadêmico da misteriosa sociedade

Meu interlocutor — que prefere manter-se no anonimato, pelo menos até o seu próximo check-up anual — me revelou algo ainda mais espantoso. Um aspecto do ensino em medicina que, ao que tudo indica, é a cereja no bolo da rotina prática médica. Na fase final dos estudos, no último semestre da faculdade de Medicina, eles freqüentam aulas de uma cadeira que é obrigatória e absolutamente secreta: Anticaligrafia. As aulas constituem-se, praticamente, em exercícios para piorar a letra de quem quer que tenha cometido a imprudência de tentar a carreira de médico, tendo letra legível. Eles aprendem a ter letra de médico, aquela mesma com que escrevem as receitas e pedidos de exame, que precisamos fazer decifrar na farmácia ou no laboratório, onde há especialistas nesse tipo de criptografia.

Há tempos, meu cardiologista revoltou-se contra esse estado de coisas e, num gesto comovente de solidariedade para com seus pacientes, passou a fazer tudo pelo computador. Até mesmo as receitas. Tinha, inclusive, um programa especial pra isso… Mas a sociedade secreta é onipresente. Tudo sabe, tudo vê. De repente, de uma hora pra outra, ele voltou à antiga prática da letra ininteligível. Quando perguntávamos o porquê daquilo, sempre desconversava. Diz o meu interlocutor que o pobre médico sofreu pesadas ameaças da Sociedade, que iam desde promessas de duas horas sem urinar, depois de doze copos d’água, a três horas ininterruptas dentro da máquina de ressonância magnética, sob a égide do ferreiro do inferno…

Entendi que estava sendo ridículo

Mas… quer saber? Aos poucos percebi o tanto de bobagem que eu vinha falando, com essa história de sociedade secreta, teoria da conspiração e tudo mais. Pra falar a verdade, eu nunca acreditei muito nisso. Foi má influência de Julio, meu irmão mais velho. É ele o meu misterioso “interlocutor”, e foi ele que inventou essas bobagens, só de onda, pra provocar minhas neuroses e pirar a minha cabeça. Brincadeira de mau gosto em cima da minha paranóia.

Saquei isso há pouco tempo, quando conversei com uma querida amiga, ela mesma médica, a respeito dessa temível teoria da conspiração, tecida em torno dos médicos. Foi bom, porque ela me tranqüilizou, e seu bom humor me fez ver o quanto eu estava paranóico. Cheguei a me achar ridículo. Ela riu muito e fez piada com aquilo, dizendo que até que não seria má idéia, que eles, médicos, precisavam mesmo domar a gente, porque nós éramos muito irresponsáveis com a saúde, etc.

Mas quando eu entrei no detalhe da cadeira de Anticaligrafia, ela ficou séria de repente. Simulou um abraço, abriu um sorriso amarelo e forçado, e segredou ao meu ouvido:

— Por favor, mude de assunto. Nós não estamos autorizados a falar sobre isto…

*Marco Antonio Coutinho é escritor, mora no Rio de Janeiro e anima o blog “E por falar nisto…” (http://eporfalarnisto.blogspot.com). Suas crônicas são publicadas aqui com autorização expressa do autor.

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