quarta-feira, 7 de agosto de 2013

PARADOXOS DA QUALIDADE BRASIL

 

Frei Betto – Brasil de Fato, opinião
 
É bom não esquecer que, se há dez galinhas e dez pessoas, não significa que há uma galinha para cada pessoa. Uma delas pode ser dona de 9. Nossa distribuição de renda ainda é das piores do mundo.
 
O Brasil melhora em quantidade e tropeça em qualidade. O IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano) de 5.565 municípios brasileiros, divulgado pelo IPEA a 29 de julho, subiu 47,5% nos últimos 20 anos.

Em 1991, o índice de municípios com IDH “muito baixo” era de 85,8%. Hoje, apenas 0,6%. Naquele ano, nenhum município mereceu a classificação de “muito alto”. Em 2000, apenas São Caetano do Sul, no ABC paulista. Agora, 44 municípios brasileiros têm IDH “muito alto”, entre os quais Belo Horizonte, que ocupa a 20ª posição.
 
Nosso país melhorou na longevidade, no crescimento da renda da população e na educação. Em 20 anos, a vida média do brasileiro passou de 64,7 anos para 73,9. A renda cresceu 14,2%. Um ganho de R$ 346,31.
 
Mas é bom não esquecer que, se há dez galinhas e dez pessoas, não significa que há uma galinha para cada pessoa. Uma delas pode ser dona de 9. Nossa distribuição de renda ainda é das piores do mundo. Basta lembrar que o Brasil é a quarta maior fortuna em paraísos fiscais!
 
Bilionários brasileiros vivem se queixando dos impostos.Da boca para fora. Pesquisa aponta o Brasil como a quarta fortuna mundial em paraísos fiscais: US$ 520 bilhões (mais de R$ 1 trilhão ou quase 1/3 do PIB brasileiro, que foi de R$ 3,6 trilhões em 2010). Tudo dinheiro sonegado.Nem tudo são rosas também em nosso IDH. Quase 30% das cidades brasileiras têm IDH “muito baixo” no quesito educação. E apenas 5 cidades merecem o índice “muito alto”.
 
A educação é o grande entrave da qualidade Brasil. Menos da metade de nossos jovens de 18 a 20 anos termina o ensino médio: 41% dos alunos. Há 20 anos, apenas 13% dos alunos não se diplomavam no ensino médio. Nisso o Brasil anda a passo de caranguejo, para trás. Se 59% dos jovens não possuem ensino médio completo, fica difícil para o nosso país suprir seu atual déficit de profissionais qualificados, como médicos e engenheiros.
 
“O Brasil avançou na universalização do acesso à educação. Agora é preciso universalizar a aprendizagem”, afirma Priscila Cruz, do Todos pela Educação. E resgatar a qualidade de nossas escola públicas, hoje sucateadas.
 
O Distrito Federal possui o melhor IDH entre as unidades de nossa federação. Minas ocupa o 9º lugar. Entre as capitais, Belo Horizonte fica em 5º lugar, atrás de Florianópolis, Vitória, Brasília e Curitiba. Alagoas e sua capital, Maceió, amargam o mais baixo IDH brasileiro.
 
Convém salientar que 99% dos municípios com IDH em educação “alto” ou “muito alto” ficaram abaixo das notas consideradas satisfatórias, em Língua Portuguesa e Matemática, na Prova Brasil de 2011.

Os problemas de nosso ensino médio são a falta de qualidade (sem tempo integral, informática, laboratórios, e com professores mal remunerados e sem formação contínua) e o abismo entre o que se ensina e a realidade em que vivem os nossos jovens (falta de pedagogia e adequação às novas tecnologias).
 
Em 2009, o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) classificou o Brasil na 53ª posição entre 65 países, atrás do México, Uruguai e Chile. Raros os alunos de nossas universidades que conseguem escrever uma simples carta sem graves erros de concordância. Falta à maioria o hábito de frequentar a boa literatura.
 
É preciso ouvir a voz das ruas. De nossos jovens, 85,2% consideram a educação prioridade. O governo federal não pode continuar, em matéria de educação, em passos de escola de dança, um para frente e dois para trás, como no caso dos cursos de medicina. É urgente a aplicação de ao menos 10% do PIB na educação, o incremento do ensino profissionalizante e o resgate da escola pública gratuita, em tempo integral e de qualidade.
 
Em conferência para mais de 5 mil profissionais do ensino, em Brasília, pedi que levantassem as mãos quem era professor. Quase todos o fizeram. Em seguida, pedi que fizessem o mesmo gesto quem sonha em ter o filho ou a filha no magistério. Pouquíssimas mãos se ergueram. Triste o país que não se orgulha de seus professores, concedendo-lhes condições dignas e qualificadas de trabalho.
 
*Frei Betto é escritor, autor de “Alfabetto – autobiografia escolar” (Ática), entre outros livros.
 

Brasil - Mídia Ninja: 'Tomar posição sem vestir manto da falsa imparcialidade da grande mídia'

 


O ao vivo sem pós-produção da Mídia Ninja é capaz de despertar debates sem o aval da mesma mídia que está, hoje, enxugando suas redações e precarizando seus funcionários. Em entrevista à Carta Maior, os ninjas reclamam da falta de um marco regulatório da mídia e dizem que "a ausência de regulação dificulta o exercício da liberdade de expressão da população."
 
Caio Sarack – Carta Maior
 
A simultânea crise e consolidação dos veículos tradicionais também recebe no seu seio mídias agora reconhecidas como alternativas. Com modo de expor particular: o fato tal como ele se dá e "se dando". O "ao vivo" sem pós-produção. O debate, então, é aberto obrigatoriamente sem aval da mesma grande mídia que está, hoje, enxugando suas redações e precarizando seus funcionários.

Desponta um grupo dentre estes que são conhecidos como meios alternativos de informação: o Ninja (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação). O grupo cedeu entrevista por e-mail à Carta Maior e nos contou sobre sua configuração e posição políticas.

A iniciativa fala de dar poder aos novos protagonistas da realidade brasileira, mas também o posicionamento do mercado e Estado traz questionamentos que deverão seguir no horizonte dessa mídia que mesmo incipiente tem seu importante papel. Aprofundar e efetivar a liberdade de expressão para além do capital passa a ser hoje uma das principais pautas da expansão da democracia.

Carta Maior: Quando se iniciaram as atividades do grupo? Quantas pessoas participam do grupo e como são coordenadas suas atividades?

Mídia Ninja: O Ninja surge a partir de um acúmulo de mais de 15 anos de produção midialivrista no Brasil, de experiências que vão desde os fanzines e da blogosfera ao Fora do Eixo, rede que está em mais de 200 cidade no país e vem desenvolvendo tecnologias de comunicação e produção de conteúdo há 7 anos. Nesse processo aproximou de si outras redes, coletivos, jornalistas e midialivristas que, juntos, deram início a um projeto que ao mesmo tempo conseguiu que se fortalecesse um veiculo independente, como também catalisar uma rede de comunicação autônoma que usufrui dos frutos e ferramentas desenvolvidas durante esse histórico.

Hoje ele é uma rede descentralizada de comunicadores que buscam novas possibilidades de produção e distribuição de informação. São milhares de pessoas usando a lógica colaborativa de compartilhamento que emerge da sociedade em rede como premissa e ferramenta. A iniciativa veio à tona há meses atrás, durante a cobertura do Fórum Mundial de Mídia Livre na Tunísia. Desde então, o Ninja vem realizando coberturas por todo Brasil, apresentando pautas e abordagens omitidas na mídia tradicional.

CM: Qual, na opinião de vocês, é a função das narrativas independentes? De que maneira vocês quiseram retratar os atos e protestos dos últimos dois meses?

MN: A função das narrativas independentes é dar poder a cada vez mais gente para contar histórias a partir do ponto de vista do que estão vivendo. Mais do que uma ferramenta, é uma noção que ajuda a dimensionar a comunicação como serviço de utilidade pública.

Além de comunicadores, somos ativistas também. Quando fomos fazer a cobertura da vinda do Papa ao Brasil por exemplo, direcionamos o nosso olhar para entender quem era contra a visita de Francisco, não contra a religião, mas que protestava pela ausência de um Estado laico.

Logo, as nossas coberturas sempre explicitarão aquilo que de fato estamos vendo e vivendo. Nós também tomamos bombas em protesto, dois de nós já foram presos apenas por estar exercendo o direito à comunicação. Quando fazemos a cobertura de um protesto indígena ou quilombola, estamos de fato envolvido com aquela pauta, não se ganha legitimidade com quem está nas ruas apenas com discurso, a nossa prática de mídia precisa estar com a frequência modulada com o espaço-tempo da nossa geração.

CM: O que pensam do Marco Regulatório da Mídia? Como vocês veem o problema da mídia no Brasil?

MN: A ausência de regulação dificulta o exercício da liberdade de expressão da população, e favorece a existência de oligopólios que tanto comprometem a pluralidade nos conteúdos que são veiculados quanto a independência nas pautas.

Outro ponto: a falta de um marco regulatório não condiz com o contexto político, que apresenta o empoderamento de uma nova geração de protagonistas. As possibilidades que temos com a tecnologia disponível hoje em dia e as possibilidades de democratização da produção de conteúdo também não são contempladas.

É dever do estado também promover a diversidade de opiniões. Uma lei contribuiria necessariamente para a não criminalização dos movimentos sociais, por exemplo. Além de garantir a diversidade e o direito de manifestação e liberdade de expressão, distribuindo de forma mais equânime e democrática o recurso público ou o espectro eletromagnético.

Da forma que está hoje, a Globo recebe uma porcentagem gigantesca das verbas de publicidade do governo e uma emissora como a Jovem Pan ocupa uma faixa de espectro equivalente a de centenas de rádios comunitárias.

CM: De que maneira vocês se colocam no debate político hoje?

MN: A mídia livre é um ato político, e todo ato precede necessariamente de um debate. Tomar uma posição diante do que estamos cobrindo sem vestir o manto da falsa imparcialidade da grande mídia já é uma forma de se colocar.
 

QUASE 90% DOS BRASILEIROS QUER REFORMA POLÍTICA - sondagem

 

Notícias ao Minuto - Lusa
 
Um total de 87 % dos brasileiros quer discutir e aprovar uma reforma política, que foi uma das muitas reivindicações das manifestações em massa que atingiram o Brasil em Junho, segundo uma sondagem divulgada na terça-feira.
 
A consulta, realizada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE), indica que, das pessoas que se manifestaram a favor de uma reforma política, 78 % considera que o financiamento das campanhas eleitorais deve ser exclusivamente público.
 
Até agora, as campanhas dos partidos políticos recebem apoio público, mas podem ser financiados também por empresas, o que tem dando lugar a vários escândalos de corrupção.
 
Segundo a sondagem, 90 % dos inquiridos exigiu sanções mais duras para os delitos com dinheiro público e para os que ocorrem com o financiamento das campanhas.
 
O IBOPE indicou que a sondagem foi realizada entre 27 e 30 de Julho, período em que foi consultada a opinião de 1.500 eleitores de todas as regiões do país.
 
Para responder às reivindicações das manifestações, a Presidente brasileira, Dilma Rousseff, propôs realizar um plebiscito para consultar a sociedade sobre os moldes da reforma política, a qual poderia estar em vigor para as eleições de Outubro de 2014.
 
Segundo a legislação brasileira, uma reforma dessa natureza deve ser aprovada um ano antes das eleições, pelo que o prazo para realizar o plebiscito e posterior debate parlamentar venceria em Outubro próximo.
 
Além disso, a Constituição reserva o poder de convocar um plebiscito ao Congresso, que perante o curto espaço de tempo rejeitou a proposta feita pela Presidente brasileira.
 
A Câmara dos Deputados decidiu então avançar a discussão de um projecto de reforma política, o qual poderia ser submetido a um referendo, uma vez aprovado.
 
Para acelerar a discussão da reforma, o Congresso criou um grupo de trabalho que vai tentar chegar a acordo sobre uma proposta que, de acordo com os planos do presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, poderia ser aprovado antes do final do ano.
 

PAÍSES DEVEM RESPEITAR TRATADOS QUE PROTEGEM OS ÍNDIOS - ONU

 

Notícias ao Minuto - Lusa
 
A alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navy Pillay, apelou hoje aos países que aumentem os seus esforços para respeitarem os tratados que protegem os povos indígenas, que comemoram o seu dia internacional na sexta-feira.
 
"A mensagem para este Dia Internacional dos Povos Indígenas é que se deve redobrar os esforços para construir uma colaboração entre os Estados e os povos indígenas que esteja baseada na confiança, no respeito mútuo, no direito e na afirmação da cultura e costumes dos aborígenes", disse a comissária da ONU, num comunicado.
 
O Dia Internacional dos Povos Indígenas foi instituído pela ONU em 1995 e é celebrado a 09 de agosto.
 
A comissária disse que é preciso respeitar todos os tratados, incluindo os já assinados há mais de um século.
 
"Estes (tratados) continuam a ser a pedra angular da proteção da identidade, da terra e dos costumes destes povos", declarou a comissária da ONU.
 
Navy Pillay recordou que estes tratados muitas vezes permitem colocar fim a períodos de conflito, exploração e expropriação, pedindo aos governos para honrá-los e respeitá-los.
 
"No entanto, em inúmeras ocasiões, as comunidades indígenas se veem obrigadas a recorrer aos tribunais para forçar os Estados a cumprirem as suas promessas", acrescentou.
 
Navy Pillay assegurou que o facto de a exploração e a expropriação contra os indígenas continuarem a acontecer nos dias de hoje "sublinha a necessidade de trabalhar mais para proteger os direitos de cerca de 370 milhões de índios no mundo".
 

Moçambique: Parlamento aprova Estatuto dos Médicos que não responde aos anseios da classe

 

Alfredo Manjate – Verdade (mz)
 
O Parlamento moçambicano aprovou esta quarta-feira (07) o Estatuto dos Médicos na Administração Pública. Este documento já vinha sendo esperado a cerca de 17 anos, porém, a sua aprovação não aliviou as expectativas dos médicos uma vez que o mesmo ainda não responde de forma cabal aos anseios destes profissionais.
 
Segundo o presidente da Associação Médica de Moçambique (AMM), Jorge Arroz, o instrumento, ora aprovado na generalidade e em consenso pela Assembleia da Republica (AR), está aquém das perspectivas da classe médica moçambicana. O aspecto primordial de discórdia é relativo à sua abrangência, pois o mesmo apenas veicula a actividades dos médicos pertencentes à Administração Pública, sendo que os profissionais que se encontra afectos em instituições privadas ainda continuam órfão deste dispositivo legal.
 
"Era nossa expectativa termos um Estatuto dos Médicos mais abrangente ao nível do Sistema Nacional de Saúde, mas o que vemos é, nesta primeira fase, ao nível da Administração Pública”, disse Jorge Arroz, que ressalvou, contudo, que a aprovação deste Estatuto representa um marco histórico para aquela classe e, como tal, merece ser comemorado.
 
Um exemplo que dos aspectos que não deixa acomodados os médicos é relativo ao artigo 28 que versa sobre o “tempo de serviço a prestar ao aparelho do Estado após a Formação”, que na opinião destes devia ser retirado. Este artigo determina no seu número um que, “os médicos e médicos dentistas, formados nas Universidades Públicas estão obrigados a prestar Serviço do Estado por um período equivalente ou superior ao período da sua formação”.
 
O número seguinte do mesmo artigo estabelece que “os médicos e médicos dentistas, funcionários ou agentes do Estado que beneficiaram de uma bolsa de estudo são obrigados a trabalhar por um período equivalente ou superior ao período da sua formação”. O Estatuto estabelece ainda que “os médicos do Serviço Nacional de Saúde exercem as suas funções em regime de ocupação exclusiva”, facto que não deixa acomodados estes profissionais, uma vez que consideram que existem outros regimes que o Governo podia adoptar de modo a satisfazer as necessidades das partes.
 
A questão da responsabilidade individual impostas ao médicos em caso de prejuízos a terceiros também deixa desconfortáveis os médicos. Sobre este aspecto, Arroz disse que a mesma consta do Estatuto da Ordem dos Médicos e do Código Deontológico. Entretanto, “existe um Conselho Jurisdicional da Ordem dos Médicos que está a trabalhar à volta da responsabilidade individual dos médicos no exercício da sua profissão”.
 
CACDHL desaconselha regime de exclusividade
 
Na apresentação do seu parecer sobre a proposta do Estatuto dos Médicos, a Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direito Humanos e de Legalidade (CACDHL) mostrou-se desfavorável ao regime de exclusividade previsto neste documento.
 
Segundo apresentou o presidente da CACDHL, Teodoro Waty, permitir que os médicos exerçam outras actividades fora deste serviço pode trazer algumas vantagens. “O médico do Sistemas Nacional de Saúde que trabalhe igualmente, por exemplo, no sector privado ou numa organização não governamental, pode, de certa forma, acumular experiência e beneficiar de formação”, o que, por conseguinte, iria beneficiar o próprio Estado.
 
Assim, aquela comissão, no seu parecer, refere que “seria de admitir que os médicos do SNS exerçam a função, uns em regime de exclusividade e outros sem esse regime, podendo-se para o efeito, fixar um subsídio de dedicação exclusiva”.
 
Entretanto, o ministro de Saúde, Alexandre Manguele, a quem coube a tarefa de apresentar em Plenário a proposta do Estatuto em causa, tentou desestruturar o argumento apresentado por Waty, afirmando que “até agora é no serviço público que se formam os médicos, porque os privados querem já um médico em experiência”.
 
Porém, o ministro disse ter acolhido todas as propostas levantadas tanto pelas comissões da AR bem como as que vem dos parlamentares e que não ferem o espírito do Estatuto proposto. O Estatuto dos Médicos estará novamente na agenda do Parlamento esta sexta-feira (09), para ser apreciado na especialidade.
 
Consenso das bancadas
 
As três bancadas que compõem a Assembleia da República, num acto pouco comum, uniformizaram o seu voto para a aprovação dos Estatuto dos Médicos, reconhecendo-lhe mérito e pertinência.
 
Entretanto, a deputada do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Alcinda da Conceição sublinhou o facto de este documento não responder aos anseios da classe médica do país. A mesma posição foi defendida bancada da Renamo. Por sua vez, a bancada maioritária, a Frelimo, considera que o instrumento vem responder à longa espera dos médicos.
 

Avaliação da ONU sobre corrupção em Moçambique "não é transparente" - ONG

 

Notícias ao Minuto
 
O Centro de Integridade Pública de Moçambique (CIP), organização não-governamental que monitoriza o setor público, considerou hoje que a implementação de legislação contra a corrupção no país não está a ser "transparente".
 
Num relatório que divulgou hoje em Maputo, o CIP refere que a República Dominicana, um dos países escolhidos para integrar a equipa internacional de avaliação do desempenho de Moçambique na implementação da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (CNUCC), não esteve presente num debate sobre a matéria em Maputo.
 
Aquela ONG acusa as autoridades moçambicanas de falta de transparência e discriminação em reuniões destinadas a ouvir a sociedade civil sobre as ações de implementação da CNUCC pelo país.
 
"O que se notou é que este processo não foi publicamente divulgado e nem o foram os mecanismos pelos quais a sociedade civil e o setor privado poderiam partilhar informação relevante para que o relatório de avaliação venha a refletir os reais problemas do país na aplicação das recomendações da CNUCC", salienta o CIP.
 
A equipa de avaliação da ONU, assinala aquela ONG, não ouviu as posições de várias organizações que trabalham no domínio do combate à corrupção, uma situação que, de acordo com o CIP, manchou a qualidade do trabalho dos avaliadores.
 
"É de realçar que várias organizações da sociedade civil, a seu modo, deveriam ter sido chamadas a dar a sua contribuição para o processo de avaliação, atendendo que a corrupção é um fenómeno generalizado na sociedade moçambicana e envolve diversas áreas do desenvolvimento socioeconómico do país. No entanto, as mesmas não foram auscultadas", enfatiza o CIP.
 
O CIP defende que Moçambique deve receber uma avaliação negativa da ONU no que diz respeito ao seu empenho no combate à corrupção, apontando o facto de a Assembleia da República ter novamente adiado a aprovação de um novo Código Penal, que contemple a tipificação de práticas consideradas corrupção na CNUCC.
 
"No caso de Moçambique, embora tenha ratificado a convenção, esta carece de ser domesticada para, de entre outros, prever as respetivas molduras penais e, dessa forma, poder-se perseguir e sancionar os prevaricadores dos seus comandos normativos. De entre os vários comportamentos considera-os corruptos, a CNUCC recomenda a punição da corrupção no sector privado, nomeadamente de práticas como o peculato, tráfico de influências, abuso de funções, enriquecimento ilícito, entre outras", destaca o documento do CIP.
 

RELATÓRIO DENUNCIA “DILEMA DA SUPERLOTAÇÃO” EM VÁRIAS ESCOLAS DE ANGOLA

 

Notícias ao Minuto
 
Muitas escolas de três municípios angolanos, monitorados pelo Conselho das Igrejas Cristãs em Angola (CICA), continuam ainda a enfrentar "o dilema da superlotação", com salas que chegam a albergar 70 alunos, indica um relatório da organização.
 
O Relatório de Monitoria Social do CICA, que analisou 22 programas de investimentos públicos, de 2012, nos municípios do Negage, província do Uíge, do Cubal (Benguela) e da Cela (Cuanza Sul), relativamente à construção de escolas e de hospitais e a reabilitações, foi hoje divulgado em Luanda.
 
Como conclusão, o documento refere que "houve um grande esforço" das administrações municipais para iniciar os projetos nas datas previstas, mas "uma boa parte das obras não foram concluídas", o que representa uma queda no grau de execução observado em 2011.
 
O documento inscreve-se no projeto social denominado "Boa Governação e Monitoria Social", que o CICA está a executar para "contribuir na boa e justa gestão das receitas públicas".
 
No seu relatório, o CICA lamenta que "nem sempre as reais prioridades das comunidades foram tidas em conta, pelo facto de os beneficiários não terem sido inclusos no processo de planificação".
 
Para o CICA, essa falta de observância das necessidades dos beneficiários nos projetos "coloca em risco a relevância e a qualidade para os beneficiários dos bens e serviços fornecidos com fundos públicos".
 
Nesse sentido, o relatório, que tem como objetivo primordial "contribuir para a construção da relação harmoniosa e saudável entre governantes e governados", recomenda a reativação do papel de vários atores na promoção da cultura de participação, "inibida pelos longos anos de conflito armado".
 
Entre as várias recomendações ao Governo central, governos provinciais, administrações municipais e igrejas, o relatório apela às autoridades tradicionais a ajudarem e encorajarem as populações "a romper a cultura do medo, de modo a participarem nos processos que visam o seu próprio desenvolvimento".
 
O apelo às igrejas vai no sentido de reforçarem a educação ética e moral "para a conservação dos bens públicos pelas populações".
 
O CICA sublinha no relatório que a sua monitoria social, realizada no âmbito do projeto criado em 2010, não visa fiscalizar, mas sim acompanhar e controlar o trabalho das autoridades governamentais.
 
No município do Negage foram analisadas nove obras (construção e reabilitação de escolas, hospitais, estradas, quadra desportiva e residências) das quais cinco foram concluídas e quatro continuam por terminar.
 
Relativamente ao Negage, o relatório conclui que além do baixo grau de execução das obras, o orçamento das mesmas não está aberto ao público, "limitando a transparência da gestão dos fundos públicos".
 
No Cubal foram monitoradas seis obras, cuja execução foi realizada a cem por cento e a disponibilização dos valores orçamentados para cada projeto divulgado, representando "grande contribuição para a transparência orçamental".
 
Já na Cela, os sete projetos fiscalizados foram todos concluídos e os custos divulgados.
 

MAIOR ÁREA TRANSFRONTEIRIÇA DE CONSERVAÇÃO DO MUNDO FICA NO SUL DE ANGOLA

 

EL – APN - Lusa
 
Cinco países da África Austral reúnem-se hoje em Menongue, capital provincial do Cuando Cubango, sul de Angola, para aprovar um fundo de gestão da maior área transfronteiriça de conservação do mundo.
 
Trata-se do projeto KAZA, acrónimo da língua inglesa para designar a bacia do OKavango/Zambeze, que liga Angola aos vizinhos Botsuana, Namíbia, Zâmbia e Zimbabué.
 
Os ministros da Hotelaria e Turismo das cinco nações vão aprovar um fundo que vai financiar a gestão do ambicioso projeto, que tem já o apoio das Nações Unidas e que, avançando, transformará aquela região austral de África num dos maiores destinos turísticos do mundo.
 
O objetivo do fundo que vai ser criado é garantir que algumas atividades relacionadas com o projeto turístico internacional possam ser executadas sem qualquer sobressalto.
 
Os cinco ministros vão ainda avaliar o grau de execução das tarefas agendadas no encontro anterior, com realce para a parte angolana que, fruto da guerra civil, mais atrasos regista na aplicação do projeto.
 

CRISE NA ZONA EURO: TEMOS DE APRENDER A VIVER SEM O FMI

 


Les Echos, Paris – Presseurop – imagem Kazanevsky
 
O apelo à experiência do Fundo Monetário Internacional permitiu salvar o euro no auge da crise, mas o empenhamento, na primeira pessoa, do BCE e, depois, a criação de instrumentos financeiros específicos tornam agora inútil o recurso à instituição de Washington, defende um economista
 
 
A decisão do Brasil e de alguns outros países de deixarem de apoiar o programa do FMI na Grécia veio, oportunamente, levantar uma vez mais a questão do apoio do FMI aos Estados membros da zona euro.
 
Lembremo-nos, antes de mais, que a intervenção do FMI na zona euro não é óbvia. De facto, o FMI vai normalmente em socorro de um país que tem grandes desequilíbrios na sua balança de pagamentos, o que se traduz, frequentemente, numa fuga de capitais estrangeiros, numa quebra nas reservas do banco central e numa depreciação da moeda nacional.
 
Ao emprestar novamente reservas, através de um programa de apoio que tem como condição a realização de reformas, o FMI tranquiliza os investidores e inverte os fluxos para o país em crise. Ora, a balança de pagamentos da zona euro está equilibrada e o euro é uma moeda forte, não justificando, por isso, em nada uma intervenção do FMI. Além do mais, foi o que levou Jean-Claude Trichet, na altura o governador do BCE, no início da crise, em 2010, a dizer que o recurso ao FMI seria um fracasso para a zona euro.
 
Mecanismos próprios
 
O FMI interveio, finalmente, na zona euro (Grécia, Irlanda, Portugal e Chipre) por três razões principais. Uma, porque simplesmente nada tinha sido previsto para fazer face à uma situação de falência orçamental de um Estado da zona euro. O FMI era o único instrumento financeiro disponível para ir em socorro dos Estados que enfrentavam necessidades de financiamento a muito curto prazo.
 
Outro, era político: o FMI tinha de desempenhar o seu papel de bode expiatório, de instituição que exige condições impopulares de recuperação, coisa que os Estados da zona euro não estavam preparados para fazerem sozinhos. Por fim, acrescente-se que a capacidade do FMI para arquitetar programas económicos em poucas semanas é incontestável e justificava, igualmente, um tal apoio numa situação caótica.
 
Ao longo dos últimos três anos, no entanto, a zona euro começou a mexer-se. Por um lado, pôs em funcionamento os instrumentos financeiros de solidariedade necessários. O BCE dotou-se de OMT(“outright monetary transactions”), o que permite financiar um Estado a muito curto prazo, justificando assim a afirmação do atual governador, Mario Draghi, segundo a qual o BCE está empenhado a fazer “tudo o que for necessário” para preservar o euro.
 
As instituições da zona euro criaram, igualmente, o Mecanismo Europeu de Solidariedade (MES) que, de facto, desempenha o papel de um fundo monetário europeu, um instrumento financeiro de empréstimos aos Estados mais frágeis. Por fim, politicamente, os Estados mais sólidos, a começar pela Alemanha, assumem cada vez mais a sua posição, exigindo as medidas de recuperação ao mesmo tempo que se mostram solidários (através, por exemplo, dos fundos de ajuda aos jovens e às PME).
 
Uma opção a meio-termo existe
 
Neste contexto, não é já tempo de a zona euro dizer que pode viver sem o FMI? A segunda moeda de reserva do mundo não pode recuperar a sua soberania total e mostrar que é capaz de ser plenamente solidária e protetora para com os seus? Não recorrer ao FMI terá uma dupla consequência.
 
Primeiro, financeiramente. Terá de fazer os empréstimos, neste momento, no entanto, já marginais, do FMI à Grécia, Portugal e Chipre. Ora, esses fundos estão agora disponíveis através do MES. Depois, politicamente, a zona euro ficará entregue a si própria e às suas fraquezas, especialmente a fraca convergência das economias do Sul e do Norte.
 
Mas os governos, nestes últimos anos, quiseram mostrar que esta zona não é apenas uma união monetária, mas também um ato político. E o gesto será importante: depois de uma fase difícil, a zona euro estará a afirmar que está pronta a enfrentar os seus desafios por si própria (como, por exemplo, a anulação ou não de uma parte da dívida soberana da Grécia, que foi objeto de divergências entre o FMI e a zona euro).
 
Antes de deixar de recorrer ao FMI, uma opção poderá recorrer-se a uma solução de meio-termo. Como já fez em alguns países, o FMI poderá assinar com os países da zona euro sob resgate um acordo dito de precaução, isto, bem entendido, em concertação com as instâncias da zona euro. Trata-se de acordos sem ajuda financeira, mas sob a forma de cheque em branco sobre a condução da política económica. Assim, a zona euro preservará a sua autonomia financeira, aproveitando, ao mesmo tempo, a experiência do FMI. Será uma primeira etapa. Porque a zona euro deverá, no fim, afirmar-se politicamente.
 

“AS ORELHAS DA ESPIONAGEM NORTE-AMERICANA EM BUCARESTE”

 


Jurnalul Naţional - Presseurop
 
O sítio norte-americano Cryptome.org acaba de publicar um mapa mostrando a colocação dos servidores X-Keyscore da NSA, que permitem aos serviços secretos americanos vigiarem a atividade na Internet.
 
São cerca de 150 servidores em 85 centros espalhados pelo mundo, sobretudo dentro de embaixadas norte-americanas e, nomeadamente, a de Bucareste, escreve Jurnalul naţional. Surpreendentemente, escreve o jornal, o sítio da NSA no Havai – onde trabalhou Edward Snowden, o homem que está na origem das revelações sobre o escândalo Prism — não consta do mapa.
 
Interrogado pelo diário, o embaixador americano em Bucareste recusou qualquer comentário, argumentando que “os assuntos de segurança não são para comentar”.
 

SNOWDEN VAI TRABALHAR COM PARLAMENTO RUSSO. RECOLHA DE FUNDOS PARA SNOWDEN

 


Snowden é convidado para trabalhar em parceria com o parlamento russo
 
Sandro Fernandes, correspondente da RFI em Moscou
 
A câmara alta do Parlamento russo anunciou na terça-feira (6) que pretende convidar Snowden para participar de uma equipe que vai investigar como a privacidade dos cidadãos russos está sendo violada por grandes empresas. Segundo Snowden, que recebeu asilo por um ano na Rússia na semana passada, os dados pessoas dos usuários do Facebook, Yahoo e Google podem ser acessados por terceiros.
 
O senador Ruslan Gattarov, chefe da comissão parlamentar sobre os direitos de privacidade, disse que quer que Snowden ajude a descobrir como acontecem estes vazamentos de dados e assim conseguir proteger informações privadas a nível nacional e internacional. O político russo deixou claro que a comissão não tem nenhum interessse nas relações entre os governos nem na questão das agências de segurança, reforçando que o foco destas consultas com Snowden seria exclusivamente a respeito da segurança das informações pessoais.
 
Um dos requisitos de Putin para que fosse concedido o asilo ao jovem americano era que ele não revelasse mais informações sigilosas que pudessem prejudicar os Estados Unidos.
 
“Eu não acho que ele vai ter que romper nenhum compromisso para nos dizer o que sabe. O tema é sobre a segurança das informações pessoais e diz respeito a dezenas de milhões de pessoas na Rússia e bilhões em todo o mundo”, explicou Gattarov.
 
A comissão faz parte de uma iniciativa do Governo russo para proteger o espaço virtual do país, considerado uma questão de segurança nacional.
 
A oposição critica a ideia do parlamento russo e acusa o Kremlin de querer usar a desculpa da segurança dos dados pessoais para ter ainda mais controle sobre a internet e sobre a informação que circula na rede.
 
Em junho, o vice-presidente da Duma, Sergei Zheleznyak, pediu “medidas urgentes” para restabelecer o que ele chamou de "soberania digital" da Rússia, logo após as primeiras revelações de Snowden. A ideia é que empresas como Facebook, Apple, Microsoft, Yahoo e Twitter tenham seus servidores com dados pessoais baseados na Rússia como condição para que tenham a autorização para continuar a operar no mercado russo. O governo brasileiro discute a aprovação da mesma medida depois que foi descoberto que os Estados Unidos mantiveram em Brasília uma estação de espionagem com dados coletados de outros países.
 
Senador russo promove angariação de fundos para apoiar Snowden
 
Notícias ao Minuto
 
Um senador russo anunciou hoje que pretende promover uma angariação de fundos na Internet para ajudar o ex-analista informático da NSA Edward Snowden, que obteve no início de agosto asilo temporário na Rússia.
 
Em declarações à agência russa Interfax, o senador Rousslan Gattarov, líder do grupo de trabalho do Conselho da Federação (câmara alta do parlamento russo), responsável por garantir o respeito da privacidade dos cidadãos, referiu que o informático norte-americano precisa de ajuda financeira.
 
A ideia da angariação de fundos foi lançada por ‘bloggers’ e representantes do mercado russo de Internet, explicou o senador.
 
“Afirmaram que Snowden poderá precisar de dinheiro e estão disponíveis para ajudar”, afirmou Gattarov, avançando ter já contactado representantes do setor informático norte-americano que “aprovaram” a ideia.
 
“Snowden não tem dinheiro e uma coleta será oportuna”, sublinhou o senador.
 
De acordo com Gattarov, esta ação poderá passar pela criação de um site que receberá as contribuições provenientes da Rússia, mas também do estrangeiro.
 
“Não tenho qualquer dúvida que os representantes da comunidade internacional querem também apoiar Snowden (…). Muitas pessoas manifestaram a sua simpatia sincera”, concluiu o senador, que pretende convidar o norte-americano para trabalhar no seu grupo de trabalho no Conselho da Federação.
 
Edward Snowden, que trabalhou como analista informático para a Agência Nacional de Segurança norte-americana (NSA), revelou em junho último a existência de programas de vigilância em massa de comunicações telefónicas e via internet de milhões de norte-americanos e estrangeiros.
 
Os Estados Unidos, que acusam Snowden de espionagem, reclamam a sua extradição. No mesmo dia da concessão de asilo, as autoridades norte-americanas afirmaram estar “extremamente desiludidas” com a Rússia.
 
Uma ideia que foi reforçada na terça-feira à noite pelo Presidente norte-americano, Barack Obama, durante um programa na televisão norte-americana.
 
“Fiquei desapontado, porque ainda que não tenhamos um tratado de extradição com eles, tradicionalmente tentamos respeitar [os seus pedidos] se existir um infrator, ou alegado infrator”, afirmou Obama, no programa “The Tonight Show”, com Jay Leno, na estação norte-americana NBC.
 
Na mesma entrevista, o chefe de Estado norte-americano admitiu que o caso de Snowden ilustra “de certa forma” algumas dificuldades que Washington tem sentido na relação com Moscovo.
 
“Há momento em que voltam ao pensamento e à mentalidade da Guerra Fria”, referiu Obama, salientando, no entanto, que tem existido, em vários assuntos, uma cooperação entre os dois países, como foi o caso do atentado bombista durante a maratona de Boston, ocorrido em abril passado.
 
Ainda no programa, o chefe de Estado norte-americano confirmou que irá participar na cimeira do G20 (países mais ricos do mundo e as potências emergentes), prevista para setembro em São Petersburgo (Rússia), mas sem adiantar se terá na altura um encontro bilateral com o Presidente russo, Vladimir Putin.
 

SNOWDEN DEU CERCA DE 20 MIL DOCUMENTOS A JORNALISTA DO GUARDIAN

 

Jornal i - Lusa
 
O jornalista Glenn Greenwald, colaborador do jornal britânico The Guardian no Brasil, afirmou hoje ter recebido cerca de vinte mil documentos secretos do fugitivo norte-americano Edward Snowden, que recebeu asilo da Federação Russa.
 
Greenwald fez a revelação ao prestar declarações na comissão das Relações Externas do Senado brasileiro, que o inquiria a propósito das revelações do ex-consultor da Agência dos EUA para a Segurança (NSA, na sigla em Inglês) Edward Snowden sobre a dimensão do programa de vigilância de comunicações eletrónicas pelo serviço de informações norte-americano.
 
“Não contei de forma exata, mas entregou-me entre 15 mil e 20 mil documentos, muito, muito completos e muito compridos”, declarou Greenwald, um jornalista norte-americano na origem das primeiras revelações do caso Snowden pelo The Guardian.
 
“Os artigos que publicámos representam uma parte muito pequena” do conteúdo daqueles documentos, acrescentou, sem dar mais pormenores.
 
Os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa da Rússia e os seus homólogos norte-americanos têm uma reunião, no âmbito dos chamados encontros "2+2", em Washington, informou hoje a Casa Branca.
 

OBAMA CANCELA CIMEIRA COM RÚSSIA. KREMLIN FICA “DESAPONTADO”

 


Obama cancela cimeira bilateral com Putin
 
 
O Presidente norte-americano, Barack Obama, decidiu cancelar a cimeira com o seu homólogo russo Vladimir Putin prevista para o início de setembro em Moscovo, divulgou hoje a Casa Branca.
 
"Após uma avaliação profunda (...) concluímos que as relações bilaterais com a Rússia não registaram progressos recentes suficientes para que uma cimeira tenha lugar no início de setembro", referiu o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, num comunicado.
 
Durante as últimas semanas, as relações entre Washington e Moscovo têm vindo a deteriorar-se na sequência do caso do ex-analista informático da NSA Edward Snowden, que obteve no início de agosto asilo temporário na Rússia.
 
No mesmo dia da concessão de asilo a Snowden, que revelou a existência de programas de vigilância em massa de comunicações telefónicas e via internet de milhões de norte-americanos e estrangeiros, os EUA afirmaram estar "extremamente desiludidos" com a Rússia e admitiram que estavam a refletir sobre a manutenção de uma cimeira conjunta prevista para setembro.
 
A reunião bilateral teria lugar antes da cimeira do G20 (países mais ricos do mundo e as potências emergentes), também agendada para setembro em São Petersburgo (Rússia).
 
"Atribuímos uma grande importância aos progressos alcançados com a Rússia durante o primeiro mandato do Presidente (2009-2013), incluindo o novo tratado START [desarmamento nuclear] e a cooperação no Afeganistão, Irão e na Coreia do Norte", explicou Jay Carney.
 
"No entanto, dada a falta de progressos em assuntos como a defesa antimíssil e controlo de armas, as relações comerciais, as questões de segurança global e de direitos civis e humanos nos últimos 12 meses, informámos o Governo russo que pensamos que seria mais construtivo adiar a cimeira até que tenhamos mais resultados na nossa agenda comum", disse o porta-voz da Casa Branca.
 
Por outro lado, "a decisão dececionante da Rússia ao conceder asilo temporário a Edward Snowden também foi um elemento que foi levado em consideração para avaliar o estado das nossas relações", salientou o mesmo representante.
 
O comunicado da Casa Branca foi divulgado após Barack Obama ter admitido, na terça-feira à noite, durante um programa na televisão norte-americana, estar "desapontado" com a Rússia.
 
"Fiquei desapontado, porque, ainda que não tenhamos um tratado de extradição com eles, tradicionalmente tentamos respeitar [os seus pedidos] se existir um infrator, ou alegado infrator", afirmou Obama, no programa "The Tonight Show", com Jay Leno, na estação norte-americana NBC.
 
Na mesma entrevista, o chefe de Estado norte-americano admitiu que o caso de Snowden ilustrava "de certa forma" algumas dificuldades que Washington tem sentido na relação com Moscovo.
 
"Há momentos em que voltam ao pensamento e à mentalidade da Guerra Fria", referiu Obama.
 
Kremlin "desapontado" com cancelamento de cimeira bilateral com EUA
 
Notícias ao Minuto
 
A Rússia afirmou hoje estar “desapontada” com a decisão do Presidente norte-americano, Barack Obama, de cancelar a cimeira bilateral com o seu homólogo russo Vladimir Putin agendada para o início de setembro em Moscovo.
 
“Estamos desapontados com a decisão da administração norte-americana de cancelar a visita do Presidente Obama a Moscovo”, declarou Iouri Ouchakov, conselheiro diplomático do Kremlin.
 
O representante afirmou que ficou claro para Moscovo que a decisão está ligada ao caso do ex-analista informático da Agência Nacional de Segurança norte-americana (NSA) Edward Snowden, que obteve no início de agosto asilo temporário na Rússia.
 
Ainda sobre Snowden, Iouri Ouchakov afirmou que este caso revelou que os Estados Unidos não querem cooperar com a Rússia “em pé de igualdade”.
 
Esta situação “sublinha que os Estados Unidos não estão dispostos a cooperar com a Rússia em pé de igualdade”, afirmou o conselheiro, em declarações à imprensa.
 
Edward Snowden revelou em junho último a existência de programas de vigilância em massa de comunicações telefónicas e via internet de milhões de norte-americanos e estrangeiros. Os Estados Unidos, que acusam Snowden de espionagem, reclamam a sua extradição.
 
Nas mesmas declarações, o conselheiro do Kremlin garantiu que o convite para Barack Obama visitar a Rússia mantém-se.
 
A Casa Branca divulgou hoje que o chefe de Estado norte-americano decidiu cancelar a cimeira com o seu homólogo russo Vladimir Putin na capital russa, justificando a decisão com a falta de progressos nas relações entre Washington e Moscovo.
 
“Após uma avaliação profunda (…) concluímos que as relações bilaterais com a Rússia não registaram progressos recentes suficientes para que uma cimeira tenha lugar no início de setembro”, referiu o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, num comunicado.
 
A reunião bilateral teria lugar antes da cimeira do G20 (países mais ricos do mundo e as potências emergentes), também agendada para setembro em São Petersburgo (Rússia). Obama já confirmou que irá participar na cimeira do G20.
 

EUA: O MUNDO ORWELLIANO DA NSA

 


Onde internet e telefonia globais são interceptadas? Como Obama manteve espionagem ilegal de Bush? Por que esquema faz lembrar “1984″?
 
James Bamford, New York Review of BooksOutras Palavras - Tradução: Cristiana Martin - Imagem: William Betts
 
Desde 20 de maio, quando Edward Snowden obteve licença para deixar a base de espionagem da NSA no Havaí e tomou um avião para Hong Kong, abriu-se uma caixa preta de segredos muito relevantes, até então ocultados da opinião pública. As revelações são feitas aos poucos. Sabe-se que os Estados Unidos articularam e operam uma imensa rede de espionagem global, capaz de interceptar virtualmente toda a comunicação humana por internet e telefone. Alguns dos mecanismos de interceptação começaram a ser desvendados e têm nomes estranhos: PRISM e UPSTREAM, por exemplo. Mas como, exatamente, isso se faz. Quais os alvos? Quem seria capaz de processar informações sobre bilhões de pessoas? O que há de real e de fantasia, em toda a história.
 
Talvez o jornalismo de profundidade possa ajudar a responder. O veterano repórter e escritor norte-americano James Bamford acaba de publicar, no “New York Review of Books“, um ensaio esclarecedor. Baseia-se tanto numa análise meticulosa do que já foi revelado por Snowden quanto em suas décadas de experiência como estudioso dos serviços de espionagem de Washington. Vasculha os aspectos técnicos e políticos da grande rede de vigilância.
 
Algumas de suas observações provocam calafrios. Os EUA podem promover espionagem global porque são encruzilhada decisiva do tráfego mundial de comunicações. Cerca de 1/3 das chamadas telefônicas internacionais passam por seu território. Na internet, este poder estratégico é ainda mais avassalador: em 2002, 99% das comunicações utilizavam-se, de alguma maneira, das redes norte-americanos.
 
Bamford descreve os aparatos construídos pela Agência Nacional de Segurança (NSA) para monitorar este imenso fluxo. As centrais de telefonia e internet dos EUA, pelas quais trafega a comunicação global, praticam algo que poderia ser chamado de duplicação de fluxos. Um feixe paralelo de todos os dados é desviado para a NSA e armazenado. É, evidentemente, impossível analisá-lo em tempo real. Mas registra-se e cataloga-se tudo. Monitora-se diretamente, sempre que se julga necessário, o conteúdo das conversas telefônicas e das trocas via internet (emails, atividade em redes sociais, postagem de textos) de um número muito menor de pessoas. Segundo Snowden, um analista de informações em seu nível hierárquico tinha, quando na NSA, capacidades suficientes para vigiar qualquer pessoa.
 
Este monitoramento é ilegal, tanto nos termos do Direito Internacional quanto da própria legislação norte-americana. Mas uma das qualidades do texto de Bamford é descrever as circunstâncias políticas que permitiram à chamada “comunidade de informações” contornar a lei. Um ponto decisivo é o 11 de Setembro. Desde então, a NSA e agências semelhantes passaram a descumprir a legislação de 1975 — que exigia ordem de uma corte especializada para colocar cidadãos sob espionagem. O presidente Bush mentiu sistematicamente, quando negou esta vigilância extra-judicial.
 
O mesmo procedimento foi mantido pelo governo Obama, num sinal de como é forte a presença das agências de espionagem (e, portanto, do Exército, ao qual são subordinadas…) no Estado norte-americano. É esta influência, crescente e ameaçadora, que leva Bamford a lançar um alerta. Ele lembra que, do ponto de vista tecnológico, o esquema de vigilância revelado agora é tão onipresente quanto o do Grande Irmão, em “1984″ a ficção distópica de George Orwell. Que ocorrerá se as democracias ocidentais, já tão contaminadas pela promiscuidade com os grandes poderes econômicos, degenerarem para regimes abertamente tirânicos?
 
Não chegamos a tal ponto; é possível agir, revelar fatos, explorar contradições, mudar as condições políticas. O ato de Snowden é um sinal que talvez fique registrado na História. Não há, por isso, como não comemorar o fato de ele estar desde quinta-feira livre, em Moscou. Ironia destes tempos conturbados: os Estados Unidos, que durante tantos anos apresentaram-se como defensores da liberdade e dos direitos humanos, sofrem impotentes a humilhação de ver um jovem cidadão sentir-se mais seguro na Rússia de Vladimir Putin que em seu território… Fique com o texto de Banford, acessível em português graças ao esforço de Cristiana Martin, integrante de nossa rede de tradutores voluntários. (A.M.)
 
No meio de maio, Edward Snowden, um norte-americano na casa dos vinte anos, caminhou pela entrada de ônix do Mira Hotel na Nathan Road, em Hong Kong, e fez check-in. Carregava uma pequena mala de viagem preta e tinha algumas pastas com laptops penduradas nos seus ombros. Dentro destas pastas havia quatro computadores que continham alguns dos segredos mais preciosos de seu país.
 
Alguns dias depois dos documentos de Snowden terem aparecido no The Guardian e no The Washington Post, revelando muitos dos inúmeros programas domésticos de vigilância da Agência Nacional de Segurança (National Security Agency, ou NSA), as livrarias notaram um aumento súbito nas vendas do clássico romance distópico de George Orwell, intitulado 1984. Na Amazon.com, o livro foi parar na lista dos “Movers & Shakers” e disparou 6021% em um único dia. Escrito há 65 anos, ele descreve uma sociedade totalitária fictícia, onde um líder sombrio conhecido como “Big Brother” controla sua população através de vigilância invasiva. “As teletelas,” escreveu Orwell, “têm microfones e câmeras escondidos. Estes dispositivos, ao lado de informantes, permitem que a Polícia do Pensamento espione a todos.”
 
Hoje, como os documentos de Snowden deixam claro, é a NSA que rastreia ligações telefônicas, monitora comunicações e analisa o pensamento das pessoas através de dados mapeados de pesquisas do Google e outras atividades online. “Qualquer som que Winton fizesse, um pouco mais alto que um sussurro, poderia ser captado por eles,” Orwell escreveu sobre seu protagonista Winston Smith.
 
Não havia, é claro, nenhuma maneira de saber se você estava sendo vigiado em um dado momento. Com qual frequência, ou em qual sistema a Polícia do Pensamento plugaria em qualquer rede individual era um trabalho de adivinhação. Era até concebível que eles espionassem a todos o tempo todo. Mas de qualquer forma, eles poderiam se conectar-se a você quando quisessem. Você tinha que viver – do hábito que virou instinto — na suposição de que todo o som feito era escutado e de que, exceto na escuridão, cada momento era examinado.
 
É claro que os Estados Unidos não são uma sociedade totalitária e que não há equivalentes do “Big Brother” que a comandem, como mostram as informações de Snowden, que foram espalhadas pelo mundo. Nós sabemos pouco sobre os usos que a NSA faz da maioria das informações que lhe são disponíveis – ela alega ter exposto uma série de conspirações terroristas. Ainda estão por aparecer os efeitos que essas atividades terão nas vidas da maioria dos cidadãos. Comitês do Congresso e uma Corte Federal especial estão encarregadas de inspecionar esses trabalhos, apesar de a Corte estar comprometida com o sigilo e de ela só poder receber apelações do governo.
 
Mesmo assim, a inteligência norte-americana também parece ter adotado a ideia de Orwell de duplipensar – “estar consciente da veracidade completa,” ele escreveu, “enquanto conta cuidadosamente mentiras construídas.” Por exemplo, James Clapper, o diretor da inteligência nacional, foi perguntado, em uma audiência no Senado realizada em março, se “a NSA coleta algum tipo de informação sobre centenas de milhões de americanos.” A resposta de Clapper: “Não, senhor… Não conscientemente.”
 
Três meses depois, seguido das revelações do programa de escutas telefônicas no qual a NSA coleta informações sobre ligações – os dois números envolvidos em cada chamada e a duração delas – sobre centenas de milhões de americanos, Clapper repensou o que disse. Ele afirmou que sua resposta anterior não era uma mentira; ele apenas optara responder “da maneira menos inverídica.” Com um conceito tão orwelliano da verdade agora sendo usado, é útil prestar atenção no que o governo Obama vem dizendo publicamente, ao longo dos anos, sobre suas atividades de vigilância; e comparar com o que nós sabemos agora, através de documentos extremamente secretos e outras informações reveladas pelo ex-empregado da NSA, Edward Snowden.
 
Olhando em retrospectiva, a NSA e seus predecessores obtêm acesso a segredos e monitora ilegalmente as comunicações há quase um século. No dia 1o de Julho de 1920, um homem magro, careca, de trinta e poucos anos mudou-se para uma casa de quatro andares no endereço 141 East 37th Street em Manhattan. Este foi o nascimento da Black Chamber (Câmara Negra), o mais antigo antecessor da NSA e que ficaria escondido em um discreto predinho de tijolos. Mas seu chefe, Herbert O. Yardley, tinha um problema. Para reunir a inteligência para o governo de Woodrow Wilson, ele precisava de acesso aos telegramas que entravam, saíam e que cruzavam o país. Mas por conta de uma versão precária das Leis de Comunicação (Radio Communications Act), tal acesso era ilegal. Com um aperto de mão, no entanto, Yarley convenceu Newcomb Carlton, o presidente da Western Union, a garantir o acesso secreto à Black Chamber diariamente para as mensagens privadas que transitavam em suas redes – a Internet da época.
 
Por boa parte do século seguinte, a solução seria a mesma: a NSA e seus predecessores entrariam em acordos secretos ilegais com as empresas de telecomunicação para obter acesso às comunicações. Eventualmente com o codinome “Project Shamrock” o programa finalmente chegaria a um impasse que levaria à sua suspensão em 1975, quando um comitê do Senado que estava investigando abusos dos agentes de inteligência descobriu o esquema. O senador Frank Church, o presidente do comitê, disse que o programa da ANS foi “provavelmente o maior programa de interceptação governamental já realizado”.
 
Como resultado de décadas de vigilância ilegal da ANS, em 1978 foi assinada a Lei de Supervisão da Inteligência Estrangeira (Foreign Intelligence Surveillance Act, FISA). Ela criou a Corte de Supervisão de Inteligência Estrangeira (Foreign Intelligence Surveillance Court, FISC). Seu objetivo era exigir, pela primeira vez, que a NSA tivesse uma aprovação legal para espionar os cidadãos. Embora a corte raramente tenha negado uma requisição — ou “ordem”, como são chamados os pedidos de vigilância — serviu ainda assim como uma salvaguarda razoável, protegendo a população de uma agência com um passado problemático e com tendência de ultrapassar os limites de espionagem, exceto quando verificada.
 
Durante um quarto de século, as regras foram seguidas e não houve problemas relacionados à NSA. Mas em seguida aos ataques do 11 de Setembro, o governo Bush decidiu desviar-se ilegalmente da corte e começou seu programa de escutas telefônicas ilegais. “Basicamente todas as regras foram jogadas pela janela; qualquer desculpa passou a ser usada para para contornar e corte e espionar cidadãos,” disse-me Adrienne J. Kinne, que em 2001 tinha 24 anos e era operadora de interceptação de voz que conduziu várias das escutas. Nem ela nem seus superiores precisaram de uma permissão para cada interceptação. “Era incrivelmente desconfortável ouvir conversas pessoais privadas,” ela disse. “E é como mexer nas coisas de alguém, encontrar um diário pessoal e lê-lo.”
 
Durante todo este tempo, o governo Bush dizia à população o oposto: que, a cada vez que um cidadão tornava-se alvo, era preciso obter uma permissão de vigilância. “Sempre que você ouvir o governo americano falando sobre uma escuta, ela requer uma ordem da corte,” disse o Presidente George W. Bush a uma multidão, em 2004. “À propósito, nada mudou. Quando falamos sobre perseguição de terroristas, nós estamos falando em primeiro lugar em obter uma permissão da corte para poder fazê-lo.” Após a exposição da operação no The New York Times em 2005, no entanto, ao invés de fortalecer os controles que orientavam as espionagens da NSA, o Congresso votou para enfreaquecê-los, transformando em lei, como emendas ao FISA, o que anteriormente era ilegal.
 
Ao mesmo tempo, ao invés de processar os dirigentes de empresas de telecomunicações, por colaborarem ilegalmente com o programa de espionagem, ou pelo menos exigir que prestassem contas publicamente, o Congresso simplesmente garantiu a eles imunidade — não apenas nas acusações criminais, mas também nos processos civis. Assim, há praticamente um século, as companhias de telecomunicação têm tido permissão para violar a privacidade de milhões de norte-americanos impunemente.
 
Com o início do governo Obama os poderes da NSA continuaram a se expandir, ao mesmo tempo em que os dirigentes da Casa Branca e os da NSA mantinha a população enganada sobre os limites das espionagens. Além da negação de James Clapper, que mencionei, o general Keith Alexander, diretor da NSA, negou de modo enfático que sua agência mantivesse gravações de milhões de americanos. Em março de 2012, a revista Wired publicou uma matéria de capa que escrevi, sobre o novo data center da NSA, de 93 mil m2 que estava sendo construído em Bluffdale, Utah. No artigo, entrevistei William Binney, um ex-official de alta patente da NSA que era largamente responsável por automatizar a rede de escutas globais. Ele saiu da agência em 2001 em protesto, depois ver o sistema pensado principalmente para ameaças estrangeiras voltar-se internamente para a população americana. Na entrevista, contou como a agência estava se infiltrando nas comunicações do país e nas redes de Internet. Também revelou que estavam secretamente obtendo acesso ilitimitado a bilhões de gravações telefônicas de americanos, incluindo as da AT&T e da Verizon. “Eles estão armazenando todas as informações que conseguem,” disse.
 
Nos meses em que se seguiram, o general Alexander negou repetidas vezes as acusações de Binney. “Não, nós não mantemos informações sobre cidadãos americanos,” ele disse à Fox News. E, em uma conferência no Aspen Institute, afirmou, “Pensar que estamos coletando informações de cada pessoa nos Estados Unidos… isso seria contra a lei.” Ele acrescentou, “O fato é que nós somos uma agência de inteligência estrangeira.”
 
Mas os documentos apresentados por Edward Snowden mostram que a NSA possui um enorme programa para coletar as gravações de telefone de todos os clientes da Verizon, incluindo ligações locais, e presume-se que haja um acordo semelhante com a AT&T e outras empresas. Registra-se quem ligou para quem e quando, não do conteúdo das conversas, embora a ANS também tenha, por outros métodos, acesso ao conteúdo das chamadas. Mas a ANS tem, diariamente, acesso a praticamente todos os registros telefônicos de todas as pessoas, seja de um aparelhos celulares ou fixos, e pode armazená-los por prospecção de dados (data-mining), mantendo-os indefinidamente. Os documentos de Snowden descrevendo o programa PRISM mostram que a agência também está acessando os dados em nove grandes empresas de Internet nos Estados Unidos, incluindo Yahoo e Google.
 
As declarações e os documentos de Snowden ampliam em muito a compreensão de como a NSA conduz seus grampos telefônicos e os programas de data-mining e o quão enganosa têm sido tanto a agência quanto o governo Obama, ao descreverem as suas atividades. No vídeo de uma entrevista feita em sua sala no Mira Hotel, Snowden falou sobre a extensão das capacidades da NSA. “Qualquer analista, a qualquer tempo pode rastrear qualquer um, em qualquer lugar,” ele disse.
 
Se essas comunicações serão captadas, depende do alcance do sensor da rede e com quais autoridades um analista específico está trabalhando. Nem todos os analistas têm o poder de rastrear tudo. Mas eu, sentando à minha mesa, tinha as autorizações que poderiam grampear e rastrear qualquer um, desde você ou seu contador até um juiz federal ou quem sabe até o presidente, se eu tivesse o e-mail pessoal dele.
 
O que Snowden estava discutindo é a maneira como os analistas na NSA podem colocar tais informações como nomes, números de telefone e endereços de e-mail na lista de alvos, provocando interceptações nas comunicações que possuíssem tais seletores. Ele parecia estar indicando – embora isto continue a ser oficialmente confirmado – que, de acordo com a FISA, seria necessária uma ordem judicial da corte para inserir um cidadão na lista de alvos; mas que um analista tinha a capacidade de contornar unilateralmente o procedimento, sendo necessário apenas listar um nome ou um endereço de e-mail na lista de alvos. Para entender o que Snowden estava dizendo, é necessário discorrer um pouco sobre como a NSA conduz suas escutas telefônicas.
 
Durante a última década, a agência tem trabalhado secretamente para obter acesso a praticamente todas as mensagens que entram, que saem ou que circulam no país. O motivo principal, de acordo com o rascunho de um relatório geral ultra secreto da NSA, produzido por um inspetor e que vazou através de Snowden, é que aproximadamente um terço de todas as chamadas telefônicas internacionais do mundo são efetuadas, recebidas, ou transitam nos Estados Unidos. “A maioria das chamadas telefônicas internacionais são encaminhadas através de um pequeno número de switchers [interruptores] ou ‘pontos de estrangulamento’ no sistema de comunicação telefônica internacional, no caminho até seu destino final,” diz o relatório. “Os Estados Unidos são uma tremenda encruzilhada no tráfego da telefonia comutada internacional.” Ao mesmo tempo, de acordo com o relatório de 2009, praticamente todas as comunicações na Internet em todo o mundo atravessavam os país. Por exemplo, o relatório observa que durante 2002, menos de 1% da largura da banda da Internet no mundo todo – isto é, a ligação internacional entre a Internet e os computadores — “era entre duas regiões que não incluíam os Estados Unidos.”
 
O acesso a estas informações é possível através de uma combinação de técnicas. Com a mais efetiva delas, a NSA pode obter acesso direto aos cabos de fibra ótica que hoje transportam a maioria dos tipos de informações sobre comunicações. De acordo com um slide revelado por Snowden, a operação de infiltração nos cabos tem o codinome de “UPSTREAM” e é descrita como a “captura de comunicações e infraestrutura nos cabos de fibra, conforme as informações fluem”. Também aparenta ser muito mais secreto e muito mais invasivo do que o PRISM, programa revelado por Snowden. Embora o PRISM dê à ANS acesso às informações de empresas de Internet individuais, como Yahoo, Google e Microsoft, as companhias alegam que não deram à Agência acesso direto a seus servidores. Através da UPSTREAM, no entanto, a Agência obtêm acesso direto aos cabos de fibra ótica e à insfraestrutura de apoio que porta quase todo o tráfego de Internet e de telefone do país.
 
Como parte desse programa de infiltração nos cabos, a NSA secretamente instalou um grande número de filtros computadorizados nas infraestruturas de telecomunicação por todo o país. De acordo com o relatório geral que foi vazado, a agência tem acordos cooperativos com as três maiores empresas de telefonia do país. Embora o relatório disfarce seus nomes, elas provavelmente são AT&T, Verizon e Sprint:
 
A ANS determinou que sob a autorização, poderiam obter acesso a aproximadamente 81% das chamadas internacionais para e dos Estados Unidos, através de três corporações sócias: Companhia A tinha acesso a 39%, a Companhia B 28% e a Companhia C 14%.
 
Os filtros estão localizados em pontos de junção chave, conhecidos como “switchers”. Por exemplo, várias comunicações – de telefone e Internet – do e para o Noroeste dos Estados Unidos passa por um prédio de nove andares quase sem janelas na Folsom Street, número 611 em São Francisco. Este é o “switching center” regional da AT&T. Em 2003, a ANS construiu uma sala secreta no local e a preencheu com computadores e softwares de uma companhia chamada Narus. Estabelecida em Israel por israelenses, e agora pertencente à Boeing, a Narus especializou-se em programas de espionagem, equipamentos que examinam tanto metadados – nomes e endereços de pessoas que se comunicam pela Internet – quanto o conteúdo dos tráfegos digitais, como e-mails, sendo capaz de dar zooms sobre o passado na velocidade da luz.
 
A agência também tem acesso aos metadados do telefone – os números chamados e os que fazem a chamada, além de outros detalhes – de todos os cidadãos. Chamadas de números de telefone que foram selecionados como alvo podem ser rastreadas diretamente para serem gravadas. De acordo com William Binney, o ex-alto funcionário da NSA, a agência estabeleceu entre dez e vinte destas salas secretas, próximas ao switchers das companhias de telefone em todo o país.
 
É este acesso diário aos metadados dos telefones de todos os cidadãos, sem as permissões da FISA, que a NSA e o Escritório de Inteligência Nacional tentaram esconder, quando falsamente negaram que a agência tinha gravações de vigilância de milhões. Durante anos, a agência também teve uma maciça coleção de metadados de e-mail e Internet, além de um programa de armazenamento, apesar de ter sido encerrado em 2011 por “razões operacionais e de recursos” de acordo com o diretor de inteligência nacional.
 
Mas de acordo com uma declaração conjunta no dia 2 de Julho, os senadores Ron Wyden e Mark Udall, o real motivo pelo qual o programa foi desativado foi que a NSA não estava apta a provar a utilidade da operação. “Nós estávamos muito preocupados com os impactos deste programa nos direitos civis, de privacidade e de liberdade dos americanos,” eles disseram, “e nós gastamos uma boa parte do ano de 2011 pressionando os oficiais da inteligência para fornecerem evidências da eficácia do programa. Eles não as conseguiram e assim o programa foi desativado naquele ano.” Os senadores ainda acrescentaram: “Também é importante notar que os agentes de inteligência fizeram declarações tanto para o Congresso como para a Corte de FISA que exageraram significativamente a eficácia deste programa. Esta experiência nos demonstra que a avaliação dos agentes de inteligência sobre a utilidade de uma coleção ou programa em particular – até mesmo as significativas – nem sempre são precisas.”
 
Falando no Meet the Press, Glenn Greenwald, um advogado e jornalista que escreveu a história sobre a coleção de informações telefônicas da ANS para o The Guardian, também mencionou um relatório ainda secreto de oito páginas da FISA, com opiniões da corte que, ele disse, criticavam a NSA por violação tanto da Quarta Emenda quanto do estatuto da FISA. De acordo com Greenwald, “ele especificamente disse que estão coletando transmissões em massa, multiplas conversas de milhões de americanos… e que isso é ilegal.” A NSA, disse ele, “planejava tentar ajustar este regulamento.” No mesmo programa, o parlamentar Mike Rogers, presidente republicano do Comitê de Inteligência, confirmou que a corte da FISA tinha emitido uma opinião crítica e disse que a NSA “tinha descoberto como corrigir isso.”
 
De acordo com a The Economist de 29 de Junho, “a NSA forneceu aos comitês de inteligência do congresso mais de cinquenta casos nos quais os programas divulgados por Snowden tinham contribuido para o “entendimento e, em muitos casos, o rompimento de conspirações terroristas nos Estados Unidos e em mais de vinte outros países.” Em um recente post no The New York Review, Kenneth Roth, diretor do Human Rights Watch e ex- procurador federal, comentou que “após exames” muitas das conspirações referidas pela ANS
 
"parecem de fato ter sido descobertas não por conta da coleta maciça de nossos metadados, mas através de vigilância mais específica de números de telefone e endereços de e-mail particulares – o tipo de inquéritos de alvo que facilmente teriam justificado uma ordem judicial, permitindo a revisão das gravações mantidas por companhias de comunicações ou mesmo monitorando o conteúdo destas comunicações."
 
Nas instalações da AT&T em Folsom Street e em outras localidades, os cabos de fibra ótica que contém milhões de dados, entram no prédio e vão para um “beam-splitter” (divisor de feixe). Esse é um tipo de aparelho de prismas que produz uma duplicata, uma imagem espelhada dos dados originais. Os feixes originais, contendo as informações da Internet, continuam até onde quer que eles tenham sido originalmente destinados. O feixe em duplicata vai para a sala 641A, a sala secreta da ANS um piso abaixo, uma descoberta feita por um outro denunciante, o técnico da AT&T, Mark Klein. Lá, os equipamentos Narus escaneiam todo o tráfego de Internet para os “selecionados” – nomes, endereço de e-mail, palavras, frases, ou até mesmo indicadores que a NSA tenha interesse. Qualquer mensagem contendo um seletor é transmitida na íntegra para a NSA para mais análises, assim como os conteúdos de chamadas de telefone selecionadas. Os números selecionados são fornecidos à respectiva operadora telefônica, que dá então, à NSA, acesso para monitorá-los.
 
Os seletores são inseridos por controle remoto nos equipamentos da Narus por analistas da NSA sentados em suas mesas nos prédios da Agência em Fort Meade em Maryland ou em uma dúzia de outras localidades por todo o mundo. O que Snowden pareceu estar dizendo na sua entrevista é que desde que um analista possua um endereço de e-mail, por exemplo, ele pode simplesmente colocar aquela informação no sistema e recuperar o conteúdo dos e-mails enviados para e deste endereço. Não há, por seu relato, qualquer verificação judicial ou balanços para assegurar que o alvo tenha sido aprovado por uma ordem judicial da corte da FISA e não apenas por empregados da NSA. Essas alegações de Snowden e outras revelações dos documentos que ele entregou, devem ser investigadas por um seleto comitê do Congresso como o Comitê Church ou um corpo independente, como a Comissão do 11 de Setembro.
 
Embora o UPSTREAM capture a maioria das telecomunicações globais – cerca de 80% de acordo com Binney – ainda há lacunas na cobertura. É aí em que o programa PRIM entra. Com ele, a NSA pode ir diretamente às empresas de comunicações, incluindo as maiores companhias de Internet para conseguir o que quer que tenha faltado com o UPSTREAM. De acordo com o relatório ultra-secreto do inspetor geral, “a NSA mantém relacionamentos com mais de cem empresas americanas,”. Soma-se a isso que os Estados Unidos têm a vantagem de “estar jogando em casa, com as grandes empresas de telecomunicação mundiais.”
 
De acordo com um slide recente divulgado por Snowden, a NSA tinha, em 5 de Abril de 2013, 117.675 alvos ativos de vigilância em seu programa programa e estava apta a acessar dados em tempo real de chamadas telefônicas, mensagens de texto, e-mails ou serviços de chat online além da análise de dados já armazenados.
 
No fim, tanto o UPSTREAM como o PRISM podem ser apenas as pistas de um sistema muitíssimo maior. Um outro novo documento entregue por Snowden diz que, na véspera do Ano Novo de 2013, um programa de metadados que tinha por alvo comunicações internacionais, chamado SHELLTRUMPET, tinha acabado de “processar o seu trilionésimo registro de metadado.” Começou há cinco anos e observou que metade do trilhão tinha sido adicionado em 2012. Também observou que dois novos programas, MOONLIGHTPATH e SPINNERET, “estão planejados para ser adicionados em Setembro de 2013.”
 
Um homem que estava ciente o bastante para perceber o que estaria por vir era o senador Frank Church, a primeira ‘pessoa de fora’ que teve condições de investigar o passado obscuro da NSA. Em 1975, quando a agência ameaçava a privacidade dos cidadãos em apenas uma fração do que ameaça hoje com o UPSTREAM, PRISM, e centenas de outros programas de coleta e data-mining, Church lançou um grande alerta:
 
Estas capacidades poderiam, a qualquer momento, voltar-se contra a população e nenhum cidadão teria nenhuma privacidade restante, tamanha seria a capacidade de monitorar tudo: conversas telefônicas, telegramas, não importa. Não haverá local para se esconder. Se este governo algum dia tornar-se uma tirania, se um ditador, algum dia, assumir o comando deste país, a capacidade tecnológica que a comunidade da inteligência deu ao governo poderá impor uma tirania total, e não haverá meios de lutar contra ela, pois o governo terá meios para descobrir o esforço mais cuidadoso para resistir a ele, não importa o quão privadamente tenha sido pensado. Tamanha é a capacidade desta tecnologia… Eu não quero nunca ver este país passar dos limites. Eu sei as possibilidades disponíveis para impor uma tirania total na América, e precismos fazer com que esta agência e todas as que possuem esta tecnologia operem dentro da lei e sob supervisão adequada, de modo que nunca passem dos limites. Este é o abismo do qual não há retorno.
 
Church escreve como se estivesse inspirado pelas lições de 1984. Pelas recentes evidências, falta muito para que elas sejam aprendidas.
 

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