sábado, 29 de outubro de 2011

AINDA SE LEMBRAM DO CARLOS CARDOSO?




ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA*

Escrevo antes, bem antes, do dia da sua morte (22 de Novembro) para dar tempo, se é que alguém se importa com isso, aos donos da verdade que imperam na imprensa lusófona para não dizerem que ninguém os lembrou…

Carlos Cardoso foi assassinado há 11 anos, em Moçambique, porque como Jornalista fazia uma séria investigação à corrupção que rodeava o programa de privatizações apoiado pelo Fundo Monetário Internacional.

Para Mia Couto, “não foi apenas Carlos Cardoso que morreu. Não mataram somente um Jornalista moçambicano. Foi assassinado um homem bom, que amava a sua família e o seu país e que lutava pelos outros, os mais simples. Mas mais do que uma pessoa: morreu um pedaço do país, uma parte de todos nós”.

Embora sejam uma espécie em vias de extinção, os Jornalistas continuam (em todo o mundo) a ser uma espinha na garganta dos ditadores, mesmo quando eleitos e escudados em regimes democráticos.

Porque morreu Carlos Cardoso? Morreu por entender que a verdade é o melhor predicado dos Homens de bem. Morreu, ainda segundo Mia Couto, porque “a sua aposta era mostrar que a transparência e a honestidade eram não apenas valores éticos mas a forma mais eficiente de governar”.

Morreu, “por ser puro e ter as mãos limpas”. Morreu “por ter recusado sempre as vantagens do Poder”. Morreu por ter sido, por continuar a ser, o que muito poucos conseguem: Jornalista.

“Liquidaram um defensor da fronteira que nos separa do crime, dos negócios sujos, dos que vendem a pátria e a consciência. Ele era um vigilante de uma coragem e inteligência raras”, afirmou Mia Couto num testemunho que deveria figurar em todos os manuais de Jornalismo, que deveria estar colocado em todas (apesar de poucas) Redacções onde se faz Jornalismo.

Nas outras, onde funcionam linhas de enchimento de conteúdos, não deve figurar. E não deve porque Carlos Cardoso não pode ser confundido com a escumalha que vegeta em muitas delas à espera de um prato de lentilhas.

É certo que no mundo lusófono não são muitos os casos de morte física. Mas há, igualmente, muitos assassinatos. O crime contra os Jornalistas é agora muito mais refinado. Não se dão tiros, marginaliza-se. Não se dão tiros, rescinde-se. Não se dão tiros, amordaça-se.

“O sentimento que nos fica é o de estarmos a ser cercados pelo selvajaria, pela ausência de escrúpulos dos que enriquecem à custa de tudo e de todos. Dos que acumulam fortunas à custa da droga, do roubo, do branqueamento de dinheiro e do tráfico de armas. E o fazem, tantas vezes, sob o olhar passivo de quem devia garantir a ordem e punir a barbárie”, disse Mia Couto na cerimónia fúnebre em Honra de Carlos Cardoso.

É isso mesmo. Continua a ser isso mesmo, seja em Moçambique ou na Guiné-Bissau, em Angola ou em Portugal.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

PORTUGAL LIDERA ONU




Luísa Meireles - Expresso

Portugal tem a presidência do Conselho de Segurança em novembro. Cavaco Silva presidirá a uma sessão, Paulo Portas a outras duas.

Durante um mês, Portugal terá de provar o que vale. A agenda do Conselho de Segurança - órgão decisório das Nações Unidas para o qual o país foi eleito há um ano como membro não permanente - está repleta de compromissos obrigatórios, mas o país quer fazer um brilharete.

Pela primeira vez, um Presidente português presidirá a uma das sessões de debate aberto - sobre a Proteção de Civis, no dia 9 de novembro - e o ministro dos Negócios Estrangeiros a outras duas: um debate sobre Timor-Leste (um tema de agenda de particular interesse para Portugal), e um briefing sobre os Novos Desafios à Segurança. O assunto, que abrange as alterações climáticas, refugiados, epidemias ou o crime internacional, deverá contar com a presença de António Guterres, Alto-Comissário para os Refugiados.

A iniciativa que envolve Cavaco Silva encaixa-se na visita que este efetua aos Estados Unidos (8 a 16 de setembro), constituindo o primeiro ato da sua agenda naquele país. O debate sobre a Proteção dos Civis assumiu alguma importância na ONU nos últimos anos, refletindo a questão da intervenção humanitária da ONU nos estados para defender os civis em perigo. "Há uma tentativa de criar um corpo doutrinário estabelecendo um determinado número de princípios", disse uma fonte diplomática ao Expresso.

Timor e métodos de trabalho na agenda

Já o debate sobre Timor-Leste deverá começar a definir qual será o futuro papel da ONU naquele país - uma questão sobre a qual Portugal ainda não se pronunciou. O mandato da UNMIT terminará no primeiro trimestre de 2012, o Governo timorense quer que a organização mantenha uma presença no país, mas alguns membros do Conselho de Segurança (Reino Unido, por exemplo) são contra, por razões orçamentais.

Na agenda, está também previsto um debate sobre os métodos de trabalho no Conselho de Segurança, um tema que foi tanto uma "bandeira" como uma promessa de Portugal na campanha que o elegeu. Dominado pelos cinco membros com direito a veto, o Conselho de Segurança da ONU (15 membros ao todo) é considerado pela generalidade dos Estados-membros da organização como um órgão opaco, sem regras claras de trabalho e pouca prestação de contas.

A discussão sobre a alteração dos seus métodos arrasta-se contudo há anos e Portugal sonha com a possibilidade de poder vir a presidir ao respetivo comité no próximo ano.

Durante o mês da presidência portuguesa do Conselho de Segurança da ONU haverá ainda lugar para uma reunião sobre a Guiné-Bissau e outra sobre o Exército de Resistência do Senhor, responsável por uma verdadeira catástrofe humanitária na África central.

Governo português está a promover ampla concertação social em apoio a reformas estruturais




RTP

O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, afirmou hoje na Cimeira Ibero-Americana que o Governo português está a promover "uma ampla concertação social" em apoio a reformas estruturais para "estimular a atividade económica" e "modernizar os serviços do Estado".
 
Passos Coelho falava em Assunção, no Paraguai, no segundo e último dia da XXI Cimeira Ibero-Americana, que tem como tema "Transformação do Estado e Desenvolvimento".

Na sua intervenção, o primeiro-ministro considerou que "a crise veio dar uma inequívoca resposta afirmativa" à questão de saber se, "na era digital e da globalização, os estados ainda tem algum papel a desempenhar".

Em seguida, defendeu que o Estado deve ter um papel de "garante dos princípios de base da vida democrática, da regulação transparente da atividade económica e financeira, do fomento do emprego e do crescimento, do acesso ao ensino e à saúde, da proteção dos mais desfavorecidos".

Passos Coelho alegou que os cidadãos não querem "um Estado centralizador e omnipresente", mas um Estado que promova "o diálogo e a concertação social", envolvendo "instituições públicas, empresas privadas, sindicatos, associações, movimentos de juventude e de promoção de igualdade do género" no processo de decisão.

"É precisamente, com essa preocupação, que o meu Governo está a promover uma ampla concertação social em apoio às reformas estruturais que estamos a desenvolver destinadas a estimular a atividade económica e a modernizar os serviços do Estado em prol dos utentes e dos cidadãos", acrescentou.

O primeiro-ministro referiu que o executivo PSD/CDS-PP está "a investir na agilização do sistema judiciário e na simplificação dos processos administrativos, apostando também no sector das novas tecnologias de informação e de comunicação, incluindo na chamada vertente do governo eletrónico", áreas quanto às quais disse estar disponível para "partilhar" a experiência portuguesa.

A DEPRAVAÇÃO DA AMÉRICA




John Kozy - Global Research – Carta Maior

A cultura dos Estados Unidos foi inundada por um tsunami de mentiras. O marketing se tornou a atividade predominante da cultura. É uma coisa seguida por pessoas de negócios, políticos e pela mídia. O dinheiro é tudo o que importa. Foi-se o tempo em que a ética protestante definia o caráter dos EUA. Ela foi usada pelos sociólogos como fator responsável pelo sucesso do capitalismo na Europa do Norte e nos EUA, mas a ética protestante e o capitalismo se tornaram incompatíveis. A "América" está se tornando uma região de depravação raramente superada pelas piores nações da história. O artigo é de John Kozy.

Foi-se o tempo em que a ética protestante definia o caráter dos Estados Unidos. Ela foi usada como fator responsável pelo sucesso do capitalismo na Europa do Norte e na América, pelos sociólogos, mas a ética protestante e o capitalismo são incompatíveis, e o capitalismo, em última análise, faz com que a ética protestante seja abandonada.

Há um novo ethos que emergiu, e as elites governamentais não o entendem. Trata-se do etos da “grande oportunidade”, do “prêmio”, da “próxima grande ideia”. A marcha lenta e deliberada em direção ao sucesso é hoje uma condenação do destino. Junto à próxima grande ideia comercial está o novo modelo do "sonho americano". Tudo o que importa é o dinheiro. Dada essa atitude, poucos na América expressam preocupações morais. A riqueza é só o que se tem em vista; vale inclusive nos destruir para alcançá-la. E se não chegamos lá ainda, certamente em breve chegaremos.

Eu suspeito que a maior parte das pessoas gostaria de acreditar que sociedades, não importa as bases de suas origens, tornam-se melhores com o tempo. Infelizmente a história desmente essa noção; frequentemente as sociedades se tornam piores com o tempo. Os Estados Unidos da América não é exceção. O país não foi benigno em sua origem e agora declina, tornando-se uma região de depravação raramente superada pelas piores nações da história.

Embora seja impossível encontrar números que provem que a moralidade na América declinou, evidências cotidianas estão onde quer que se veja. Quase todo mundo pode citar situações nas quais o bem estar das pessoas foi sacrificado pelo bem das instituições públicas ou privadas, mas parece impossível citar um só exemplo de instituição pública ou privada que tenha sido sacrificada em nome do povo.

Se a moralidade tem a ver com o modo como as pessoas são tratadas, pode-se perguntar legitimamente onde a moralidade desempenha um papel no que está se passando nos EUA? A resposta parece ser: “Em lugar nenhum!” Então, o que tem aconteceu nos EUA para se ter a atual epidemia de afirmações de que a moralidade na América colapsou?

Bem, a cultura mudou drasticamente nos últimos cinquenta anos. Foi isso o que aconteceu. Houve um tempo em que a "América", o "caráter americano", era definido em termos do que se chamava de Ética Protestante. O sociólogo Max Weber atribuiu o sucesso do capitalismo a isso. Infelizmente, Max foi negligente; ele estava errado, completamente errado. O capitalismo e a ética protestante são inconsistentes entre si. Nenhum dos dois pode ser responsável pelo outro.

A ética protestante (ou puritana) está baseada na noção de que o trabalho duro e a ascese são duas consequências importantes para ser eleito pela graça da cristandade. Se uma pessoa trabalha duro e é frugal, ele ou ela é considerado como digno de ser salvo. Esses atributos benéficos, acreditava-se, fizeram dos estadunidenses o povo mais trabalhador do que os de quaisquer outras sociedades (mesmo que as sociedades protestantes europeias fossem consideradas parecidas e as católicas do sul da Europa fossem consideradas preguiçosas).

Alguns de nós afirmam agora que estamos testemunhando o declínio e a queda da ética protestante nas sociedades ocidentais. Como a ética protestante tem uma raiz religiosa, o declínio é frequentemente atribuído a um crescimento do secularismo. Mas isto seria mais facilmente verificável na Europa do que na América, onde o fundamentalismo protestante ainda tem muitos seguidores. Então deve haver alguma outra explicação para o declínio. Mesmo que o crescimento do secularismo tenha levado muita gente a dizer que ele destruiu os valores religiosos juntamente aos valores morais que a religião ensina, há uma outra explicação.

No século XVII, a economia colonial da América era agrária. Trabalho duro e ascese combinam perfeitamente com essa economia. Mas a América não é mais agrária. A economia dos EUA hoje é definida como capitalismo industrial. Economias agrárias raramente produzem mais do que é consumido, mas economias industriais o fazem diariamente. Assim, para se manter a economia industrial funcionando, o consumo deve não apenas ser contínuo, como continuamente crescente.

Eu duvido que haja um leitor que não tenha escutado que 70% da economia dos EUA resulta do consumo. Mas 70% de um é 0,7, ou de dois é 1,4, de três, 2,1, etc. À medida que economia cresce de um a dois pontos do PIB, o consumo deve crescer de 0,7 para 1,4 pontos. Mas o aumento crescente do consumo não é compatível com a ascese. Uma economia industrial requer gente para gastar e gastar, enquanto a ascese requer gente para economizar e economizar. A economia americana destruiu a ética protestante e as perspectivas religiosas nas quais foi fundada. O consumo conspícuo substituiu o trabalho duro e a poupança.

No seu A Riqueza das Nações, Adam Smith afirma que o capitalismo beneficia a todos, desde que cada um aja em benefício dos outros. Agora estão nos dizendo que “economizar mais e cortar gastos pode ser um bom plano para lidar com a recessão. Mas se todo mundo proceder assim isso só vai tornar as coisas piores....aquilo de que a economia mais precisa é de consumidores gastando livremente”. A grande recessão atingiu Adam Smith na sua cabeça, mas o economista admitiria isso. “Um ambiente em que todos e cada um quer economizar não pode levar ao crescimento. A produção necessita ser vendida e para isso você precisa de consumidores”.

Poupar é (presumivelmente) bom para indivíduos, mas ruim para a economia, a qual requer gasto contínuo crescente. Se um economista tivesse dito isso na minha frente, eu teria lhe dito que isso significa claramente que há algo fundamentalmente errado com a natureza da economia, que isso significa que a economia não existe para prover as necessidades das pessoas, mas que as pessoas existem apenas para satisfazer as necessidades da economia. Embora não pareça isso, uma economia assim escraviza o povo a quem diz servir. Então, de fato, o capitalismo industrial perpetrou a escravidão; ele tem reescravizado aqueles que um dia emancipou.

Quando o consumo substituiu a poupança na psique americana, o resto de moralidade afundou junto na depravação. A necessidade de vender requer marketing, o que nada mais é que a mentira das mentiras. Afinal de contas, toda empresa é fundada no que disse o livro de Edward L. Bernays, de 1928: Propaganda. A cultura americana tem sido inundada por um tsunami de mentiras. O marketing se tornou a atividade predominante da cultura. Ninguém pode se isolar disso. É uma coisa seguida por pessoas de negócios, políticos e pela mídia. Ninguém pode ter certeza de estarem lhe contando a verdade a respeito de alguém. Nenhum código moral pode sobreviver numa cultura de desonestidade, e de resto, ninguém pode!

Tendo subvertido a ética protestante, a economia destruiu toda ética que a América um dia promoveu. O país tornou-se uma sociedade sem um etos, uma sociedade sem propósito humano. Os americanos se tornaram cordeiros sacrificáveis para o bem das máquinas. Então, um novo etos emergiu do caos, um etos que a elite governamental desconhece completamente.

Diz-se frequentemente que Washington perdeu o contato com as pessoas que governa, que não entende mais seu próprio povo ou como sua cultura comum funciona. Washington e a elite do país não entendem isso, mas a cultura não valoriza mais o certo sobre o errado ou o trabalho duro e a ascese sobre a preguiça e a extravagância. Hoje os americanos estão buscando a “grande oportunidade”, o “prêmio”, a “próxima grande ideia”. O Sonho Americano foi hoje reduzido ao “acertar em cheio!”. A longa e deliberada estrada para o sucesso é uma condenação. Vejam American Idol, The X-Factor e America’s Got Talent e testemunhe a horda que se apresenta para os auditórios. Essas pessoas, em sua maior parte, não trabalharam duro em nada na vida. Contem o número de pessoas que regularmente apostam na loteria. Esse tipo de aposta não requer trabalho algum. Tudo o que essas pessoas querem é acertar em cheio. E quem é nosso homem de negócios mais exaltado? O empreendedor!

Empreendedores são, na sua maior parte, fogo de palha, mesmo que haja exceções notáveis. O problema com o empreendedorismo, no entanto, é a alta conta em que passou a ser tomado. Mas o único valor ligado a ele é a quantidade de dinheiro que os empreendedores têm feito. Raramente ouvimos alguma coisa a respeito do modo nefasto como esse dinheiro foi feito. Bill Gates e Mark Zuckerberg, por exemplo, dificilmente representam imagens de pessoas com moralidade exemplar, mas na economia sem escrúpulos morais, ninguém se importa; tudo o que importa é o dinheiro.

Dada essa atitude, por que alguém, nessa sociedade, expressaria preocupações morais? Poucos na América o fazem. Assim, enquanto a elite americana fala na necessidade de produzir força de trabalho sustentável para as necessidades de sua indústria, as pessoas não querem nada disso.

A elite frequentemente lastima a falência do sistema educacional americano e tem tentado melhorá-lo sem sucesso, por várias décadas. Mas se alguém presta atenção no atual estado de coisas na América, vê que a maior parte dos empreendedores de sucesso são pessoas que abandonaram faculdades. Como se pode convencer a juventude de que a educação universitária é um empreendimento que vale a pena? Assim como Bill Gates, Steve Jobs e Mark Zuckerberg mostraram, aprender a desenhar um software não requer graduação universitária. Nem ganhar na loteria ou vencer o American Idol. Fazer parte da Liga Nacional de Futebol pode requerer algum tempo na universidade, mas não a graduação. Todo o empreendedorismo requer uma nova ideia mercantil.

Entretenimento e esportes, loterias e programas de jogos e disputas, produtos de consumo de que as pessoas não tiveram necessidade por milhões de anos são agora as coisas que formam a cultura americana. Mas não são coisas, são lixo; não podem formar a base de uma sociedade humana estável e próspera. Esta é uma cultura governada meramente por um atributo: a riqueza, bem ou mal havida!

A capacidade humana de autoengano é sem limites. Os estadunidenses vêm se enganando com a crença de que a riqueza agregada, a soma total de riquezas, em vez de como ela é distribuída, dá certo. Não importa como foi obtida ou o que foi feito para se obter tal riqueza. A riqueza agregada é a única coisa que se tem em vista; é algo pelo que vale à pena destruir a nós mesmos. E mesmo que não o tenhamos alcançado ainda, em breve certamente o conseguiremos.

A história descreve muitas nações que se tornaram depravadas. Nenhuma delas jamais se reformou. Nenhum garoto bonito pode ser convocado para desfazer a catástrofe do Toque de Midas. O dinheiro, afinal de contas, não é uma coisa de que os humanos precisem para sobreviver, e se o dinheiro não é usado para produzir e distribuir as coisas necessárias, a sobrevivência humana é impossível, não importa o quanto de riqueza seja agregada ou acumulada.

(*) John Kozy é professor aposentado de filosofia e lógica que escreve sobre assuntos econômicos, sociais e políticos. Depois de ter servido na Guerra da Coréia, passou 20 anos como professor universitário e outros 20 trabalhando como escritor. Publicou um livro de lógica formal, artigo acadêmicos. Sua página pessoal é http://www.jkozy.com onde pode ser contatado.

Tradução: Katarina Peixoto

BLOGUEIROS DE 23 PAÍSES APROVAM, CARTA DE FOZ DO IGUAÇU




MARCEL GOMES - CARTA MAIOR
 
Documento defende luta por liberdade de expressão, contra qualquer tipo de censura ou perseguição política dos poderes públicos e das corporações do setor, por novos marcos regulatórios da comunicação, pelo acesso universal à banda larga de qualidade e contra qualquer tentativa de cerceamento e censura na internet. Próximo encontro já está marcado para novembro de 2012, também em Foz do Iguaçu.
 
O 1º Encontro Mundial de Blogueiros, realizado em Foz do Iguaçu (Paraná, Brasil), nos dias 27, 28 e 29 de outubro, confirmou a força crescente das chamadas novas mídias, com seus sítios, blogs e redes sociais. Com a presença de 468 ativistas digitais, jornalistas, acadêmicos e estudantes, de 23 países e 17 estados brasileiros, o evento serviu como uma rica troca de experiências e evidenciou que as novas mídias podem ser um instrumento essencial para o fortalecimento e aperfeiçoamento da democracia.

Como principais consensos do encontro – que buscou pontos de unidade, mas preservando e valorizando a diversidade –, os participantes reafirmaram como prioridades:

- A luta pela liberdade de expressão, que não se confunde com a liberdade propalada pelos monopólios midiáticos, que castram a pluralidade informativa. O direito humano à comunicação é hoje uma questão estratégica;

- A luta contra qualquer tipo de censura ou perseguição política dos poderes públicos e das corporações do setor. Neste sentido, os participantes condenam o processo de judicialização da censura e se solidarizam com os atingidos. Na atualidade, o WikiLeaks é um caso exemplar da perseguição imposta pelo governo dos EUA e pelas corporações financeiras e empresariais;

- A luta por novos marcos regulatórios da comunicação, que incentivem os meios públicos e comunitários; impulsionem a diversidade e os veículos alternativos; coíbam os monopólios, a propriedade cruzada e o uso indevido de concessões públicas; e garantam o acesso da sociedade à comunicação democrática e plural. Com estes mesmos objetivos, os Estados nacionais devem ter o papel indutor com suas políticas públicas.

- A luta pelo acesso universal à banda larga de qualidade. A internet é estratégica para o desenvolvimento econômico, para enfrentar os problemas sociais e para a democratização da informação. O Estado deve garantir a universalização deste direito. A internet não pode ficar ao sabor dos monopólios privados.

- A luta contra qualquer tentativa de cerceamento e censura na internet. Pela neutralidade na rede e pelo incentivo aos telecentros e outras mecanismos de inclusão digital. Pelo desenvolvimento independente de tecnologias de informação e incentivo ao software livre. Contra qualquer restrição no acesso à internet, como os impostos hoje pelos EUA no seu processo de bloqueio à Cuba.

Com o objetivo de aprofundar estas reflexões, reforçar o intercâmbio de experiências e fortalecer as novas mídias sociais, os participantes também aprovaram a realização do II Encontro Mundial de Blogueiros, em novembro de 2012, na cidade de Foz do Iguaçu. Para isso, foi constituída uma comissão internacional para enraizar ainda mais este movimento, preservando sua diversidade, e para organizar o próximo encontro.

CRISE, DOGMAS, MÍDIA E MENTIRAS




SAUL LEBLON – CARTA MAIOR, Blog das Frases

Entre as incógnitas embutidas nas decisões anunciadas pela cúpula do euro desta semana, a mais intrigantes é aquela que informa o corte de 50% da dívida da Grécia. Há outras zonas nebulosas num carretel cujo desenrolar operacional não foi ainda explicitado. Por exemplo, como foi tão simples dotar o fundo de estabilização europeu de 1 trilhão de euros para se contrapor às manadas de credores ariscos, cujo trote desordenado potencializa insolvências de governos e bancos? Se a panacéia do dinheiro chinês explica tudo, por que não foi acionada antes?

Outra: como, subitamente, as necessidades de capitalização de bancos micados pela podridão de suas carteiras caiu de 300 bi de euros, calculados originalmente pelo FMI, para os 100 bi decretados na 4ª feira?

Sem dúvida, porém, o calote de 50% da dívida grega é a viga estrutural de todas as dúvidas. Tome-se o exemplo da Argentina. O país decretou um calote de 70% da dívida em 2005. Até hoje é demonizado pela mídia, tendo vetado o acesso a novos empréstimos no mercado mundial. Como então, súbito, a cúpula liderada pela conservadora Angela Merkel abona 50% da dívida grega, a mídia aplaude, as bolsas sobem e os bancos aquiescem, sem um piu? Como fica o jornalismo de economia que, antes, encampou os cálculos e o terrorismo ortodoxo para legitimar sacrifícios, perdas e danos que devastaram a sociedade grega, a ponto de gerar uma epidemia de suicídios em sua população?

A ser efetivo tudo o que se anunciou na 4ª feira, e não apenas um truque contábil, chega-se a conclusões interessantes:

a) o governo de Papandreu não merece mais 24 no poder; açoitou seu povo com sacrifícios devastadores para honrar uma dívida que, de uma penada, caiu à metade, sem que tenha havido mais caos do que o já produzido pelas suas decisões;

b) o mesmo raciocício vale para a crise bancária do euro, em nome da qual Espanha, Portugal e outros estão sendo esfarelados com sucessivos cortes de gastos para 'acalmar os mercados'. Se bastava uma penada para impor calotes e recapitalização aos banqueiros, por que tanto sacrifício inútil, que já arrastou 43 milhões de europeus à vida abaixo da linha da pobreza?

Só um fator empresta coerência ao conjunto: a pressão ascendente das ruas, sempre omitida, desdenhada ou desqualificada pelo conservadorismo midiático. Com a palavra, o jornalismo de economia.

BRASIL TEM ELEVADO ÍNDICE DE ACEITAÇÃO DE REFUGIADOS – E PROBLEMAS DE INTEGRAÇÃO




DEUTSCHE WELLE

Em números absolutos, a quantidade de refugiados que vive no Brasil ainda é pequena, mas o índice de pedidos aceitos é considerado alto. Os refugiados enfrentam, no entanto, dificuldades com emprego e formação.

Com a fama internacional de país acolhedor, o Brasil virou a pátria de 4.500 refugiados de 77 nacionalidades. A quantidade é numericamente pequena – o território brasileiro está distante dos grandes centros de conflitos. Mas a receptividade das autoridades brasileira é alta.

"Pelo menos nos últimos anos, o índice de reconhecimento dos pedidos de refúgio varia entre 30% e 35% das solicitações. Esse é um índice muito alto em relação aos demais países do mundo", comparou Rosita Milesi, do Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH). Estatístas da Eurostat mostram que na Alemanha e no Reino Unido, por exemplo, cerca de 24% dos pedidos são aceitos.

Segundo dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, Acnur, 64% das pessoas que se refugiam no Brasil são de origem africana, de países como Angola e Congo (38% e 10% do total respectivamente). Da vizinha Colômbia, vieram 14% dos asilados que moram em solo brasileiro.

Em viagem recente pela Europa, a presidente Dilma Rousseff citou o país que governa como "exemplo de integração" para aqueles que, como seu pai, foram buscar uma vida melhor no Brasil. Para quem chegou recentemente, no entanto, a inserção ao cotidiano brasileiro não é tão suave assim: o acesso à educação e a conquista de um emprego ainda são pontos sensíveis. Embora não existam estatísticas que mostrem com clareza a parcela desse grupo ocupada formalmente, estima-se que a minoria trabalhe com carteira assinada.

"Temos uma tradição quanto à receptividade, mas há um pouco de preconceito. Temos que trabalhar melhor na sociedade brasileira essa questão do direito humano de migrar. Por outro lado, às vezes o refugiado também não se adapta à cultura do país, ou à economia", comentou Paulo Abrão, secretário nacional de Justiça.

O Acnur se mostra engajado a melhorar esse quadro. Depois de lançar um portal online para cadastrar refugiados e empregadores em potencial, a agência da ONU realiza, com ajuda do Ministério do Trabalho, seminários para promover empregabilidade e qualificação profissional dos refugiados. Mas a resposta do setor empresarial ainda é tímida.

Um caso especial

Quando haitianos começaram a entrar ilegalmente no Brasil pela fronteira amazônica, no início do ano, o Ministério Público do Acre soou o alarme. Apesar de não se enquadrarem na definição clássica de refugiados – dada a quem é efetivamente obrigado a sair de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política –, eles entravam com o pedido para que o governo brasileiro os considerasse dessa maneira.

Uma situação preocupante, avalia Milesi. "Segundo a nossa interpretação, vários grupos ou descobriram ou foram orientados por redes de tráfico de imigrantes a virem para o Brasil, garantido que aqui eles têm documentos."

Desde então, cerca de 2 mil solicitações de haitianos foram protocoladas no Brasil. O governo brasileiro ouviu o apelo e decidiu legalizar a situação de alguns desses imigrantes fornecendo um visto humanitário para, até agora, 418 haitianos. "Essa posição do Brasil é muito avançada e muito importante", disse em entrevista à Deutsche Welle Luiz Fernando Godinho, da Acnur em Brasília.

Segundo Godinho, o governo brasileiro tem observado a indicação da ONU: "Temos feito um apelo global para que os países não devolvam os haitianos que chegam em seus territórios. O que o Brasil fez é muito bem visto e foi elogiado", completou Godinho.

Compromisso brasileiro

Para Paulo Abrão, trata-se de "uma medida de justiça". O secretário lembra que o Brasil coordena a missão das Nações Unidas no Haiti e que, portanto, acaba sendo um referencial naquele país. "Encaramos o fornecimento desses vistos como parte do nosso compromisso com a reconstrução do Haiti."

Questionado sobre a possível ação de "coiotes" nas fronteiras brasileiras, e sobre uma possível intensificação nos pedidos de asilo feitos por haitianos junto ao governo brasileiro, Abrão afirmou que não existe expectativa de aumento. "E também não falamos em temor, não existe um 'temor' em relação a esse quadro", acrescentou.

"Essa ideia do estrangeiro como inimigo precisa ser enfrentada. Diferentemente de alguns países, essa concorrência entre a mão de obra local e estrangeira não é percebida no Brasil", avalia o secretário. A atitude das autoridades brasileiras não deve mudar, caso os pedidos de haitianos continem chegando em grandes quantidades, afirma Abrão. "Nós só tomamos todas as precauções já conhecidas, como, por exemplo, checar se não há crimonosos procurados pela polícia entre os solicitantes."

Autora: Nádia Pontes - Revisão: Francis França

ESPANHA E PORTUGAL PEDEM AJUDA FINANCEIRA PARA AMÉRICA LATINA





Durante Cúpula Ibero-americana no Paraguai, europeus recorrem a suas antigas colônias para tentar reerguer suas economias, abaladas pela crise da dívida na zona do euro. Brasil teria demonstrado interesse em ajudar.

A crise da dívida que atinge a Europa é assunto dominante nos dois dias da 21º Cúpula Ibero-americana, que termina neste sábado (29/10), em Assunção. Ainda sem encontrar uma saída definitiva para a crise enfrentada por alguns de seus países-membros, a zona do euro busca ajuda de economias emergentes com alta liquidez, como China e Brasil.

"Pela primeira vez a América Latina não é parte do problema, mas sim da solução", disse o titular da Secretaria-Geral Ibero-americana (Segib), Enrique Iglesias. O economista apelou aos países da América Latina por solidariedade para com Espanha e Portugal, países os quais, segundo ele, fizeram investimentos importantes e crescentes no continente americano.

"Agora o processo é inverso, o que vai criar um balanço positivo entre as duas partes", disse o economista. "Esta cúpula coincide com um dos momentos mais confusos e turbulentos da economia mundial nos últimos 70 anos", ressaltou.

O encontro na capital paraguaia reúne os chefes de governo dos 19 países latino-americanos, além de Espanha e Portugal. A situação dos europeus ainda preocupa. Portugal precisou de recursos do fundo de resgate do euro para alavancar sua economia e a Espanha implantou duras medidas de austeridade para tentar reconquistar a confiança de seus investidores.

Ajuda brasileira

Depois de Grécia e Irlanda, Portugal foi o terceiro país da zona do euro a se ver obrigado a apelar para o pacote de resgate europeu. Seus parceiros no bloco e o Fundo Monetário Internacional (FMI) autorizaram uma injeção financeira no país de 78 bilhões de euros.

Para o primeiro-ministro de Portugal, Pedro Passos Coelho, a crise mundial obriga os países afetados a rever sua gestão política e econômica a fim de que possam se manter competitivos. Antes de sua chegada em Assunção, Coelho e o presidente português, Aníbal Cavaco e Silva, visitaram São Paulo e Brasília, onde se reuniram com a presidente brasileira, Dilma Rousseff. O teor da conversa entre os chefes de Estado durante a visita não-oficial não foi divulgado, mas há especulações de que os portugueses tenham interesse na participação de empresas brasileiras em processos de privatização em Portugal.

O Brasil – sétima maior economia do mundo – teria apresentado, segundo o FMI, planos para comprar títulos da dívida europeia juntamente com outros integrantes dos BRICS (que, além de Brasil reúne Rússia, Índia, China e África do Sul). A proposta brasileira, no entanto, teria sido retirada após a manifestação morna de seus parceiros emergentes.

Os europeus querem incrementar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF) por meio de um instrumento chamado "veículo de inversão com propósito especial" (SPIV, sigla em inglês). Fontes do governo brasileiro afirmaram que o país está disposto a ajudar a Europa por meio de um acordo com o FMI, descartando no momento, porém, investir no SPIV, já que os detalhes do plano ainda não estão claros. A maior economia da América Latina acredita que rota bilateral, no qual o FMI repassaria recursos brasileiros a um país atribulado, seria a forma mais rápida de ajudar os países da zona do euro, que tentam recuperar a confiança dos mercados.

Grandes expectativas

A Espanha ainda não precisou de ajuda do fundo. No entanto, após o estouro da bolha imobiliária, o país alcançou um máximo histórico em sua taxa de desemprego, que alcançou 21,5% da população economicamente ativa – o mais alto da União Europeia. Além disso, a população espanhola vem se submetendo a duras medidas de austeridade introduzidas por Zapatero. Os mercados financeiros ainda se mostram desconfiados e pedem altas taxas de juros em troca de capital. Já os bancos espanhóis também enfrentam um grande desafio: reunir 26 bilhões de euros para elevar sua taxa de capital básico.

"Esta crise nos mostra que não há saídas isoladamente, por mais poderosos que sejam os países", afirmou o presidente paraguaio, Fernando Lugo, anfitrião do encontro, em seu discurso de abertura.

Antes do início da cúpula, o primeiro-ministro espanhol, José Luis Zapatero, afirmou que as expectativas para a cúpula eram grandes. " A América Latina está passando por um momento muito bom e esperamos que este encontro sirva para fortalecer vínculos", disse.

Durante o encontro também foi debatidos o papel dos governos na atual conjuntura financeira. Apesar da crise financeira, a América Latina prevê alcançar um crescimento médio este ano de 6%, embora a prosperidade não chegue a todos os habitantes. Um em cada três habitantes do continente vive na pobreza. A região é considerada como uma das mais desiguais do mundo no que diz respeito à distribuição de renda.

Autora: Eva Usi (msb)

Portugal: PROFESSORES CONCENTRAM-SE FRENTE AO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO




Expresso

Sindicato Nacional do Ensino Superior reúne hoje docentes frente ao Ministério da Educação e Ciência, contra os cortes no setor em 2012.

O Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup) reúne hoje dezenas de docentes frente ao Ministério da Educação e Ciência, em Lisboa, contra a redução de vencimentos e outros cortes previstos para o setor em 2012.

A concentração realiza-se na avenida 05 de outubro pelas 14:00, seguindo-se uma reunião do conselho nacional da estrutura sindical, em que vão ser decididas outras ações, nomeadamente a possibilidade de adesão à greve geral de 24 de novembro e à manifestação da administração pública, no dia 12.

"Mais uma redução nos vencimentos dos docentes e investigadores"

"Os nossos objetivos são chamar a atenção para as medidas vertidas na proposta de orçamento para 2012 e contestar mais uma redução nos vencimentos dos docentes e investigadores", disse à agência Lusa o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), António Vicente.

O sindicato pretende ainda alertar para a diminuição do financiamento das instituições de Ensino Superior e para as consequências na qualidade do trabalho que estes profissionais desenvolvem.

Por outro lado, contestam a "limitação à autonomia das instituições", afirmando que acarreta "problemas acrescidos" à sua gestão.

Nuno Crato não respondeu a pedido de reunião

O dirigente sindical lamenta ainda não ter resposta do ministro, Nuno Crato, ao pedido de reunião que lhe foi endereçado.

A Federação Nacional dos Professores (FENPROF) apelou já para uma grande adesão dos profissionais do setor à greve geral da administração pública, apoiada pelas duas centrais sindicais (CGTP e UGT) e à manifestação, insurgindo-se contra um corte de cerca de 200 milhões de euros no Ensino Superior.

O Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) alertou, por seu lado, que os cortes previstos para estas instituições públicas as colocam em "situações extremas".

O CRUP anunciou, na quinta-feira, que além da redução de 8,5 por cento nas transferências do OE, a proposta do Governo se afigura "alarmante" do ponto de vista das "severas limitações" à autonomia.

*Foto em Expresso

Portugal: GOVERNO ADMITE DESPEDIMENTOS NA FUNÇÃO PÚBLICA




Rosa Pedroso Lima e João Silvestre (texto) e Nuno Botelho (fotos) em Expresso

Em entrevista ao Expresso, o secretário de Estado de Administração Pública admite que a redução de pessoal é um imperativo e que os cortes podem ir ainda mais longe: despedimentos ou o pagamento de 12 salários anuais não estão afastados.

A edição do Expresso deste sábado, 29 de outubro, inclui um dossiê especial sobre as mudanças a efetuar na Administração Pública. Para além da redução salarial -que pode atingir, em dois anos, 40% dos atuais rendimentos dos trabalhadores do Estado - o Governo vai reduzir em 2% ao ano o número de funcionários públicos.

A redução de pessoal pode ser atingida com a simples passagem à aposentação dos trabalhadores, mas, admite o Governo, "não poderão à partida ser excluídas quaisquer possibilidades ou medidas que possam vir a concretizar esse ajustamento".
Entrevistado pelo Expresso, Hélder Rosalino, secretário de Estado da Administração Pública, fala assim na possibilidade de o Estado poder despedir trabalhadores, assim como na hipótese - para depois de 2013 - de se integrarem nos 12 salários anuais os montantes equivalentes aos subsídios de férias e de Natal pagos à Função Pública. A redução salarial prevista no próximo Orçamento do Estado é "um imperativo" e uma necessidade de "ganhar tempo", até o Governo concluir uma profunda reforma da Administração do Estado.

A meta de redução de funcionários do Estado poder ser atingida através dos mecanismos da mobilidade geral e especial, ou pode o Governo ter de recorrer a despedimentos? Já admitiu essa possibilidade em entrevista recente...

No que respeita à redução do número de funcionários, a Lei do Orçamento reforçará muito significativamente o mecanismo de controlo das entradas de novos efetivos, admitindo-se que com as naturais passagens à situação de aposentação dos trabalhadores em funções públicas a meta de redução de 2%, prevista para 2012, seja atingida ou mesmo ultrapassada. Estamos num contexto de emergência nacional em que se impõem ajustamentos muito significativos para conter o défice orçamental no limite quantitativo que consta no Programa de Assistência Económica de que Portugal está a beneficiar. É nesse contexto que terá que ser encarada a série de medidas, muito restritivas é certo, que estão previstas no Orçamento para 2012 em matéria de Administração Pública, em que a redução das despesas com pessoal é uma das condições da necessidade imperativa de ajustar o peso do Estado às capacidades financeiras do país. A redução da despesa com pessoal em 2012 será conseguida fundamentalmente pela via da redução salarial já anunciada, mas esse não poderá ser o nosso objetivo final permanente. Temos que criar condições para reverter a médio prazo essas medidas, o que exigirá um esforço de ajustamento muito grande das Administrações Públicas, a concretizar em poucos anos. O Governo dará prioridade ao desenvolvimento de uma estratégia de médio prazo que venha a permitir que o ajustamento dos efetivos da Administração Pública se possa fazer de forma programada e sustentada nos próximos dois ou três anos, quer pela via da gestão criteriosa das entradas e saídas de efetivos, quer pela utilização de outros instrumentos de gestão de recursos humanos que terão que ser desenhados e implementados num futuro próximo. Neste capítulo não poderão, à partida, ser excluídas quaisquer possibilidades ou medidas que possam vir a concretizar esse ajustamento.

Qual o número "ideal" de funcionários da Administração Pública necessários para que o Estado continue a poder cumprir as suas funções?

Mais do que pensar sobre o número ideal de funcionários da Administração Pública, importa sublinhar que a principal intenção e ação do Governo passa por reorganizar o Estado, quer ao nível das suas estruturas orgânicas, quer ao nível dos seus modelos de governação. Nestas áreas, penso que o Governo tem vindo a fazer um trabalho cujos resultados são já muito visíveis e impressivos, e que vão desde o PREMAC, que permitiu uma redução muito significativa de estruturas e de cargos dirigentes, passando pela revisão do Estatuto do Pessoal Dirigente e pela revisão que irá ocorrer nos próximos dias do Estatuto do Gestor Público e da Lei-Quadro dos Institutos Públicos, diplomas que se encontram já em fase de aprovação pelo Conselho de Ministros. Nesta matéria haverá importantes alterações. Estamos a promover uma transformação muito importante no modelo de funcionamento e de governação do Estado, num contexto muito difícil, mas em que a mudança é a única solução. Porém e não fugindo à questão, é minha convicção de que terá que ocorrer uma redução com significativa no número de efetivos da Administração Pública nos próximos anos, de modo a que seja possível acomodar uma redução sustentada dos custos com pessoal do Estado, que não seja exclusivamente baseada na variável preço (salários).Temos, por outro lado, que olhar para a estrutura de efetivos da Administração Pública e para as políticas salariais vigentes, no sentido de as compatibilizar devidamente. Temos, porventura, que melhorar a competitividade do Estado relativamente a alguns grupos profissionais e ajustar para os níveis de mercado a remuneração de outros grupos profissionais, relativamente aos quais a Administração pagará acima do que é a prática no privado. Essa análise tem que ser feita e, como disse, estamos a preparar uma estratégia de médio prazo que promova a requalificação da Administração e, simultaneamente, a redução do seu peso nos encargos gerais do Estado.

O Governo - e o seu Ministério em especial - continua preocupado com os eventuais "tumultos" e o acréscimo da tensão social, agora que estão anunciadas as primeiras manifestações e greves?

Tem havido uma preocupação grande de elucidar a população para o facto de a proposta de orçamento para 2012 ter subjacente a necessidade de evitar o colapso financeiro do país. Nesta matéria, o comprometimento de todos em matéria de coesão social é fundamental. Entendo que a redução do peso do Estado na Economia tem que ser efetuada de forma cautelosa e faseada. Foi a situação de emergência nacional que obrigou a cortes transversais duros, mas absolutamente necessários. Porém, a tónica deve ser dada ao facto de estes cortes permitirem ganhar algum tempo para que se possa definir e cumprir os ajustamentos necessários, no sentido de diminuir eficientemente o peso do Estado e a relançar a economia portuguesa. Penso que os portugueses têm a real perceção da situação de emergência nacional em que o país se encontra e que percebem que este Governo está a trabalhar no sentido de garantir o futuro das gerações futuras. Há a perceção de que é preciso passar por um processo de ajustamento muito difícil para garantir a sustentabilidade futura do país. O diálogo com os sindicatos tem sido muito franco nesta matéria. Este governo e eu próprio damos muita importância ao diálogo social, o qual é absolutamente indispensável no momento em que vivemos.

Admite a necessidade de adoção de mais cortes na Administração Pública para além de 2013? Ou mesmo a entrada em vigor de novas medidas, como, por exemplo, a integração dos subsídios de férias e de Natal nos vencimentos dos trabalhadores do Estado?

Retomo o raciocínio da resposta anterior. Os cortes salariais na função pública previstos no Orçamento de 2012 devem ser compreendidos pelos próprios funcionários (e pela sociedade em geral) como uma forma de ganhar tempo enquanto se põe o Estado a gastar menos. Tenho consciência que há muito por fazer, mas é importante ter presente que reformas demoram algum tempo. A redução do peso do Estado na economia tem que ser feita de forma cautelosa e faseada. A suspensão progressiva dos subsídios de natal e de férias, no contexto de emergência nacional, teve três grandes ordens de razão para incidir sobre os funcionários públicos: A primeira - incontornável - é que a redução de salários da função pública concorre para a consolidação do défice do Estado, na medida em que representa redução da despesa do Estado. A segunda, teve que ver com os incentivos relacionados com a proteção do emprego que existem para a maioria dos funcionários públicos e que não existe para o sector privado, o que tem como corolário, o facto de os trabalhadores do privado poderem perder a totalidade da remuneração em casos de redução dos postos de trabalho ou de encerramento de empresas. A terceira razão baseia-se na disfunção salarial conhecida entre a média dos salários na função pública e a média dos salários no sector privado. De facto, existem estudos que demonstram que o prémio é mais elevado no sector público do que no privado, embora isso não se verifique para todos os grupos profissionais do Estado, sobretudo para os mais qualificados. O estado actual da Administração Pública, e o seu peso incomportável que tem na despesa pública, teve o seu epílogo num corte salarial transversal que não distingue qualitativamente os trabalhadores. Foi uma decisão tomada num contexto de emergência nacional, em que o fator tempo não permitiu que outras variantes desta solução pudessem ser equacionadas. A integração dos subsídios de férias e de Natal nos vencimentos dos trabalhadores do Estado não é uma questão que se coloque no contexto atual, até porque esses subsídios estarão suspensos em 2012 e 2013, mas naturalmente não poderá ser afastada no futuro a discussão em torno desse tópico no quadro de reforma global da Administração Pública, no sentido em teremos que promover, de forma sustentada, o ajustamento do peso financeiro do Estado às reais condições financeiras do país. Neste contexto, todas as soluções terão que ser colocadas em cima da mesa. Mas, como disse, essa questão não está em discussão no momento atual.

O modelo de austeridade agora seguido para os funcionários públicos é extensível aos trabalhadores da Administração local, Governos Regionais e organismos e empresas do Estado? Prevê aqui que volume de redução no número de trabalhadores (incluindo rescisões, passagem a quadro de excedentários ou despedimentos?

O modelo de redução da despesa pública por via da redução remuneratória e da suspensão do pagamento de subsídios de férias e de Natal, para exemplificar duas das mais relevantes medidas, aplicam-se a todos os trabalhadores da administração direta e indireta do Estado, Regiões Autónomas e Autarquias Locais. Relativamente ao assunto da redução do número de trabalhadores importa sublinhar que o meio preferencial para atingir os objetivos de decréscimo de pessoal na Administração Central, Regional e Local, fixado para 2012 no valor mínimo de 2%, resulta da conjugação do reforço das restrições colocadas sobre a admissão de pessoal e das saídas de trabalhadores em funções públicas por motivos de aposentação ou reforma. A adoção de outro tipo de medidas em 2012 para alcançar os objetivos de decréscimo acima assinalados, como sejam as rescisões por mútuo acordo, despedimentos e outros mecanismos, não se encontram contempladas no Orçamento.

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