domingo, 14 de setembro de 2014

Escócia e Catalunha: semelhanças e diferenças no caminho para a independência




Raphael Tsavkko Garcia, Bilbao – Opera Mundi

Em ambos os casos, vale destacar o incentivo à democracia direta, mas um resultado deverá ter pouca influência no outro

Em 18 de setembro, milhões de escoceses irão às urnas votar em um referendo pela independência do país do Reino Unido da Grã Bretanha e Irlanda do Norte. Pelas pesquisas divulgadas até o momento é impossível saber qual será o resultado, mas há a certeza de que a mera existência de tal referendo é um marco.

Caso semelhante de grande repercussão, o da separação do Quebec do Canadá, acabou com a vitória dos unionistas por pequena margem nos anos 90 e desde então o nacionalismo "quebequense" encontra-se em banho-maria.

A Escócia de William Wallace, famoso guerreiro pela liberdade de seu povo nos séculos XIII e XIV e retratado no grande sucesso do cinema "Coração Valente", de Mel Gibson, em 1995, nunca aceitou totalmente os acordos e arranjos reais que acabaram por uni-la definitivamente ao resto do Reino Unido (na concepção escocesa, unidos à Inglaterra, real "cabeça" deste emaranhado de nações). Chegou o momento de medir forças e buscar um novo caminho.

Alex Salmond, primeiro ministro da Escócia e principal líder do Scottish Nacional Party (SNP), batalhou para conseguir um acordo com Londres e pelo referendo em marcha. Na visão dos ingleses, uma separação parecia improvável. Salmond propôs um referendo com três questões: Sim, pela independência; Não, pela manutenção da união; e uma terceira opção em que buscava mais autonomia.

Seguros da vitória do "não", lideranças inglesas impuseram um referendo com apenas duas alternativas, sim e não. Nas últimas semanas, porém, se viu um crescimento vertiginoso do "sim", que em ao menos uma pesquisa chegou a ultrapassar o "não" e por em perigo a união da Escócia com o resto do reino. Foi o momento de novas negociações e tentativas de convencer líderes escoceses de que, vejam, só, mais autonomia poderia ser garantida.

É muito tarde para recuar, no entanto.

A Catalunha, por sua vez, busca realizar uma consulta à população em 9 de novembro de 2014. Diferentemente da situação escocesa, a Espanha se nega a aceitar que os catalães exerçam este direito e a recusa tem acirrado os ânimos e explica em parte as previsões de uma vitória esmagadora da opção pela independência.

Unidos à força desde 1714, a relação da Espanha com a Catalunha sempre foi tumultuada, conflituosa. O castelhano nunca foi totalmente assimilado pela população catalã, cuja maioria absoluta emprega o catalão como língua veicular e o ensina nas escolas, pese históricas tentativas de suprimi-lo, em especial durante a ditadura de Franco. O "catalanismo" sempre foi um sentimento muito forte, mas a crise que abalou a Europa e que ainda permanece como uma nuvem negra no horizonte acabou por empurrar ainda mais os catalães em direção à rota da independência.

Há semelhanças entre as situações catalã e escocesa no que tange a questões econômicas e sociais. Recortes de benefícios sociais e o excesso de imposto pago por estas duas nações, respectivamente, a Londres e Madri fizeram crescer um sentimento de injustiça que, aliado a outras formas de opressão cultural e mesmo aliado à uma história larga de conflitos e conquista, acabaram por impulsionar o sentimento nacionalista.

Em ambos os casos há também semelhante o terrorismo praticado por bancos e grandes empresários que ameaçam mudar as sedes de suas empresas para Londres e Madri na tentativa de usar a pressão econômica para manipular e pressionar a vontade popular.

O fenômeno político do Podemos, partido de esquerda nascido dos movimentos de rua, dos Indignados e das mobilizações contra as políticas de austeridade durante o auge da crise econômica ajuda a explicar um pouco o que se passa com Escócia e Catalunha na questão da representação.

Tanto o Podemos quanto diversos movimentos pelo mundo, como os Occupy's iniciados nos EUA, a Primavera Árabe e mesmo os protestos de Junho de 2013 no Brasil demonstram uma guinada geral para um modelo mais participativo da e na política, por uma democracia (mais) direta e por menos poder nas mãos de políticos distantes.

Escócia e Catalunha têm o interesse de aproximar o centro de poder de seu povo, aproximar o centro de decisões traçando linhas étnicas e culturais e acentuando diferenças ao ponto de declarar que "os outros" não "nos" entendem como "nós" nos entendemos.

É curioso notar, porém, que este sentimento nacionalista destas nações (e aqui inclui também o forte nacionalismo basco) não tem nada de xenófobo ou excludente. Pelo contrário. São movimentos que, em geral, têm grande apreço pelo imigrante que busca integrar-se - e estes são buscados a integrar-se -, que busca compreender o que se passa.
 São movimentos nacionalistas, baseados em identidades culturais e étnicas que, ao mesmo tempo, são abertos ao diferente e ao que vem de fora aproveitando uma sinergia entre os diferentes. Pode parecer contraditório, mas faz todo sentido, pois parte da força destes movimentos hoje vêm exatamente da maior participação social e horizontal que converge em um sentimento de identidade local.

O direito de decidir é parte do processo democrático, é horizontal, é agregador, ao passo que busca corrigir erros históricos e imposições horizontais vindas de longe. Quanto mais proibição, maior se torna o movimento e mais inclusivo também. A intenção de catalães e escoceses é buscar um caminho próprio, mas não excludente.

Porém, Catalunha e Escócia sustentam diferenças significativas. A principal delas sendo o modelo de decisão. O referendo escocês é legal, irá acontecer com o apoio de Londres e seu resoltado será respeitado (acredita-se). No caso catalão uma consulta seria ilegal, feita na base da desobediência civil e seu resultado dificilmente seria respeitado pela Espanha, trazendo incertezas inúmeras.

Se por um lado é fato que a principal razão para que o referendo aconteça na Escócia seja ou tenha sido a certeza inglesa de que o "não" venceria (e não em si um respeito pela democracia), por outro o referendo sairá e a democracia foi respeitada - a decisão final cabe à população escocesa.

Já na Catalunha, partidos "espanholistas" como o PP catalão, setores do PSC (PSOE catalão) e Ciutadans apoiam a decisão de Mariano Rajoy, primeiro ministro espanhol, do PP, de se recusar a permitir a consulta, decisão respaldada também pelos tribunais. Apesar dos discursos de que tais partidos respeitam a democracia, não são capazes de aceitar que a população exerça livremente seu direito ao voto, ou seja, trata-se de uma democracia apenas em relação ao que o governo permite.

Para além das diferenças e semelhanças básicas, fica a questão sobre qual efeito terá a consulta escocesa sobre o eleitorado catalão e, mais além, se o governo catalão - Generalitat - capitaneado por Artur Mas, irá levar adiante uma consulta baseada no princípio da desobediência civil - opção apoiada por forças de esquerda nacionalista.

A vitória do "sim" na Escócia poderia ter junto à população catalã o mesmo efeito que jogar gasolina no fogo, mas ao mesmo tempo poderia tornar ainda mais intransigentes as lideranças espanholas em seu rechaço ao exercício democrático. Ao contrário da Escócia, onde o "não" é o favorito, a ampla maioria social catalã apoia a independência. Uma virada do "sim" na Escócia, baseado no princípio democrático, acenderia a luz vermelha na Espanha, demonstrando que a opção por impedir o processo democrático estaria "correta".

Por outro lado, uma vitória do "não" na Escócia teria pouco efeito tanto na Catalunha quanto na Espanha, dado que dificilmente o insucesso de um processo em que desde o começo o "não" liderava faria com que população catalã ou governo espanhol mudasse de posição.

O fato de um referendo ser legal e outro (no caso, uma consulta) ser ilegal acaba por, na prática, diminuir os efeitos - positivos ou negativos - de um sobre o outro. Em outras palavras, o referendo escocês teria a capacidade de traçar um caminho para muitas nações e minorias europeias, ao mesmo tempo em que também iria elevar os alertas de governos estatais que porventura sintam sua unidade ameaçada, mas teria pouco efeito prático sobre a vontade catalã e o rechaço espanhol.

*Raphael Tsavkko Garcia é jornalista. Mestre em Comunicação (Cásper Líbero) e Doutorando em Direitos Humanos (Universidad de Deusto)

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QUEM CRIOU O ESTADO ISLÂMICO E QUEM LUCRA COM ISSO?




Não é por acaso que o mundo teme seriamente o alastramento rápido do grupo terrorista Estado Islâmico (EI). O grupo tem uma grande base financeira. Está avaliado em cerca de dois mil milhões de dólares norte-americanos. O portal russo vestifinance.ru elencou os mais ricos grupos terroristas do mundo. Entre eles encontra-se o EI.

A economia entrelaça-se, de forma intensa, com a política. De acordo com os dados de Igor Pankratenko, redator-chefe da revista Irã Contemporâneo, entre os criadores estrangeiros do EI estão Jeffrey Feltman, ex-embaixador dos EUA no Líbano, o príncipe Bandar bin Sultan, o então chefe das forças especiais sauditas, o emir do Qatar, bem como as lideranças dos serviços secretos turcos, britânicos e franceses.

Ainda em março de 2013, a britânica Guardian, publicou a informação de que na preparação dos guerrilheiros sírios no território da Cisjordânia participam, além da CIA, instrutores da Grã-Bretanha e da França. E o primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, chamando os EUA de “cúmplices” de jihadistas, anunciou que, tal como escreve a Itar-Tass, “uma das bases” onde os EUA preparam os guerrilheiros do EI, fica na Turquia, perto de uma base da OTAN, na região do aeródromo de Inkirlik.

Quanto à participação da Arábia Saudita e do Qatar na criação do EI, é testemunha a publicação, em junho, por parte da agência iraniana Fars de um documento, assinado pelo Encarregado do Negócios do Qatar na Líbia, Nayef bin Abdullah al-Amadi. Nele refere-se que o emirado contratou 1.800 guerrilheiros, provenientes de Marrocos e de outros países do Norte de África, para participarem em ações militares no Iraque, do lado do EI. Os terroristas receberam preparação militar em bases militares na Líbia e receberam o salário em mão, pago pela Arábia Saudita e pelo Qatar, no valor de 700 dólares.

Entretanto, em junho, aquando do início do ataque por parte do EI, as autoridades de Riad, manifestaram-se veementemente contra a intervenção estrangeira no conflito iraquiano, acusando Bagdá de “política sectária”. As autoridades do Qatar manifestaram-se com acusações análogas às das autoridades xiitas. E até Obama, não obstante os pedidos de ajuda de Bagdá, não teve pressa com os raides aéreos para neutralizar o ataque do EI. Parece que todos estavam a espera de que os terroristas se estabelecessem em determinados territórios. Então, em algumas semanas, o EI tomou o controlo de cerca de um terço do território do Iraque, bem como de parte das províncias sírias.

Apesar dos média ocidentais chamarem o EI de "horda de fanáticos religiosos", calam o mais importante: trata-se de uma guerra pelo petróleo. O EI continua a conquistar as regiões ricas em petróleo do Iraque e da Síria. Os terroristas controlam os dois principais oleodutos: um através do qual é fornecido petróleo à Síria, foi fechado, o outro continua a funcionar. Através dele, o petróleo vai do Curdistão iraquiano, para o Djeihan turco, e depois para Israel.

Levanta-se a questão: como é que os terroristas podem vender o petróleo em mercados internacionais, que são controlados, quase totalmente, pelos EUA? A 29 de julho, o Conselho de Segurança da ONU, aprovou a declaração, preparada pela Rússia, contra a aquisição de crude a milícias sírias e iraquianas, incluindo ao Estado Islâmico. Mas o comércio continua. O petróleo é transportado ilegalmente por intermediários turcos, ao preço de 25 dólares o barril.The Telegraph informa que os guerrilheiros recebem quase um milhão de dólares por dia pela venda de petróleo das regiões que controlam.

O maior prejuízo é sentido pelo Irã, pela Síria e pelos xiitas iraquianos. O território ocupado pelos guerrilheiros está completamente isolado da Síria, dos xiitas iraquianos e do Irã. Os acontecimentos no Iraque reduziram a capacidade do Irã de apoiar Bashar Assad. O avanço futuro do EI para o sul do Iraque foi travado por esforços conjuntos das forças iraquianas de árabes xiitas, bem como divisões das forças especiais iranianas que entraram no Iraque. De acordo com fontes iraquianas, iranianas e ocidentais, o general iraniano Qasem Soleimani encontra-se na capital iraquiana e é responsável pela preparação da defesa da capital e pelas ações militares. Os iranianos estão focados, principalmente nos lugares sagrados xiitas. Parece que apenas Teerã está empenhado na luta contra as milícias EI.

Mas a derrota do EI não é um facto. Existe uma grande probabilidade de se fixar no território ocupado, no mínimo, até continuar a existir o atual regime da Síria e até do Irã. Contudo, quem ganha são outros países – os EUA, Turquia, Israel e Arábia Saudita.

Sonya Boskovich – Voz da Rússia

Brasil – Eleições: MARINA, A PREFERIDA DOS BANQUEIROS



Umberto Martins, São Paulo - Correio do Brasil, opinião

A crescente identificação de Marina Silva como a candidata dos banqueiros e do sistema financeiro tem muito a ver com a reversão da tendência de seu crescimento nas intenções de voto constatada pelas últimas pesquisas de opinião, que sinalizam avanço e vitória de Dilma no primeiro turno e empate técnico no segundo.

Marina e Cia procuram negar as evidências de suas ligações perigosas com os banqueiros. Mas, neste caso, é como tentar tapar o sol com peneira. Sua principal assessora de campanha, a mulher que coordenou o seu controvertido programa de governo, é da família Setúbal, que comanda o Itaú Unibanco, maior banco privado brasileiro.

Maria Alice Setúbal, a Neca, não é uma educadora qualquer como querem fazer crer. Ela contribuiu com a bagatela de dois milhões de reais para a campanha política. Que outra educadora teria cacife para tanto? É a terceira maior doadora do país. Ela é irmã de Roberto Setúbal, presidente do Itaú, que recentemente fez um discurso apaixonado em defesa de Marina.

Eles lucram com a crise

É bem verdade que os interesses fundamentais dos banqueiros não foram colocados em xeque por Lula ou por Dilma. Em nenhum momento da história recente eles deixaram de lucrar, e de fato lucraram muito ao longo dos últimos anos. Nos marcos do capitalismo neoliberal, eles lucram em qualquer tempo ou lugar, faça chuva ou faça sol, independentemente das fases do ciclo de produção. Lucram nos momentos de crescimento e lucram ainda mais quando a economia vai mal, estagnada, em processo de desindustrialização ou em recessão.

Mesmo quando as coisas ficam difíceis para eles (como na crise financeira detonada pelos EUA em 2008, após a quebra do Lehman Brothers em 15 de setembro), governo e bancos centrais dão um jeito de socorrê-los a pretexto de que são “grandes demais para falir”, embora a solução justa seja a nacionalização e a estatização do sistema.

Trilhões de dólares foram gastos pelos EUA e União Europeia para livrar os banqueiros da crise que eles próprios provocaram. Os parasitas continuaram acumulando lucros astronômicos e a conta do resgate, remetida aos contribuintes em geral, vem sendo paga principalmente pela classe trabalhadora, que amarga o desemprego em massa, despejos, arrocho dos salários e a degradação dos serviços púbicos pelas políticas de ajuste fiscal, privatizações e Estado mínimo.

Não é de estranhar que a corja esteja acumulando lucro também nos governos Lula e Dilma. Mas o fato é que não gostou quando a presidenta ousou confrontar seus interesses usando os bancos públicos para forçar a redução das taxas de juros e da lucratividade. A oligarquia financeira sabe que tem muito mais a lucrar se conseguir impedir a reeleição e entronizar no Palácio do Planalto alguém completamente subserviente aos seus interesses e ideologia. Este alguém hoje tem nome: é Marina Silva.

Recessão, desemprego e terceirização

Quem frequenta bancos logo vê que banqueiros não são do tipo que se deixam levar por nobres sentimentos, orientam-se antes pelos próprios interesses e podemos apostar que estão apoiando quem vai lhes proporcionar mais lucros e poder. O debate em torno do programa e compromissos das candidatas mais competitivas à Presidência é revelador a este respeito.

A plataforma e os compromissos que Marina tem assumido publicamente são como poesia e música para os ouvidos dos banqueiros. Destacam-se:

A promessa de ajuste fiscal, uma receita aplicada em muitos países da Europa sob a tutela do FMI, Banco Central Europeu e União Europeia, a troica, cujo objetivo é resguardar o pagamento das dívidas públicas e os interesses dos banqueiros e grandes capitalistas, à custa da estagnação econômica, desemprego em massa e desmantelamento do chamado Estado de bem-estar social. É o que os mercados financeiros, respaldados pela mídia golpista, exigem;

Rigor na aplicação do tripé neoliberal que orienta a política macroeconômica: juros altos, câmbio flutuante e superávit fiscal primário, responsáveis pelo fraco desempenho da economia nos últimos anos;

Independência do Banco Central. Significa entregar a política monetária e cambial ao comando direto dos banqueiros. Os dirigentes dessas instituições, recrutados no próprio mercado financeiro, favorecem os bancos em detrimento dos interesses da sociedade, conforme o Prêmio Nobel de Economia Joseph Stiglitz. (www.vermelho.org.br/noticia/249452)

Redução dos espaços e enfraquecimento dos bancos públicos, tendo por contrapartida o fortalecimento dos bancos privados, o que certamente vai abrir caminho para a privatização do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal;

Fim do crédito direcionado, pelo qual uma parte dos depósitos bancários é destinada obrigatoriamente ao financiamento de projetos com cunho social, como é o caso do Minha Casa, Minha Vida. Com Marina os depósitos serão investidos segundo os interesses e a vontade dos banqueiros, cuja propensão à especulação dispensa maiores comentários;

A terceirização generalizada com que Marina acena em seu programa também é um interesse muito forte que os banqueiros compartilham com outros grandes capitalistas em praticamente todos os setores e ramos da economia nacional.

A candidata da coligação liderada pelo PSB defende outras medidas que vão ao encontro do que pensam e desejam as forças conservadoras, o obscurantismo religioso, o imperialismo, a direita neoliberal, que agora enxerga nela a possibilidade de retomar a Presidência da República.

Do ponto de vista de classes, as promessas de Marina correspondem aos interesses dos banqueiros, bem como da elite empresarial, que constituem uma ínfima minoria da sociedade brasileira, embora poderosos (pois o capital, como notou Marx, é poder social concentrado) e responsáveis pelo financiamento das campanhas políticas. Para a classe trabalhadora e a esmagadora maioria do povo brasileiro, em contraposição, é um risco de grave retrocesso com repercussão negativa em todo o mundo e especialmente na América Latina.

Apesar do fraco desempenho da indústria e do PIB, exaustivamente explorado pela mídia, o Brasil não está em crise e o povo sente e sabe disto. A crise para o povo, que em sua maioria é constituída pela classe trabalhadora, se traduz em desemprego, arrocho dos salários, degradação dos serviços públicos, mal estar social. Não é o que se vê hoje no Brasil.

A crise viria com Marina, se a candidata dos banqueiros chegasse lá, pois todos os caminhos que propõe apontam para a recessão, o desemprego e cortes drásticos nos investimentos públicos, ressuscitando a desacreditada política do Estado mínimo. Não creio que isto venha a ocorrer, mas não devemos subestimar o inimigo de classes nem medir esforços para lhe impor uma nova derrota nas urnas.

Umberto Martins,  é jornalista

Brasil - Eleições: Lula diz à Marina que ela ‘pode chorar por outros motivos’, não por ele




Após uma cena em que a candidata Marina Silva (PSB/Rede Sustentabilidade) chorou na presença de um repórter, ao citar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a repercussão não poderia ter sido mais negativa, após ouvir do líder petista que ela não precisa criar “inverdades” sobre ele para chorar. Em ato na Zona Leste de São Paulo, nesta manhã, ao lado do candidato do PT ao governo de São Paulo, Alexandre Padilha, Lula afirmou que Marina, sua ex-aliada, “pode chorar por outros motivos”.

Lula respondeu às declarações de Marina, que chorou ao ser questionada por um jornalista do diário conservador paulistano Folha de S. Paulo sobre a campanha eleitoral. A candidata disse não acreditar no que ele faz contra ela.

– Primeiro, dona Marina não precisa contar inverdades a meu respeito para chorar. (Ela) pode chorar por outros motivos. Nunca deixei de ter relação de amizade por desavenças políticas. Nunca falei mal de dona Marina e vou morrer sem falar mal dela – respondeu Lula.

Em comício organizado em cima de uma caminhão no bairro de Sapopemba, ao lado de políticos como o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), e o senador Eduardo Suplicy (PT), Lula elogiou Dilma Rousseff, voltando a dizer que ela era o melhor nome para sucedê-lo na Presidência.

– A bichinha é inteligente e aprendeu muito – disse, sobre a candidata que defende nestas eleições.

Sem uma referência direta a seu nome, Lula criticou a agora adversária Marina Silva, a principal ameaça à reeleição de Dilma Rousseff.

– Um verdadeiro líder não muda de partido, não muda de opinião. Ele evolui. Ela (Marina) é que precisa explicar o motivo de ter nascido e crescido no PT, ter ganhado cargos do PT, e agora fala mal do PT – disse o ex-presidente, referindo-se à transformação porque passou a ex-ministra do Meio Ambiente em seu governo.

Na foto: Marina já chorou antes, por outros motivos, no ombro do pastor radical de ultradireita Marco Feliciano

Correio do Brasil

Quase 14 % das meninas brasileiras entre 4 e 14 anos trabalham ou já trabalharam




De acordo com uma pesquisa contratada pela organização não governamental inglesa Plan International, quase 14 por cento das meninas brasileiras de 6 a 14 anos afirmam trabalhar ou já ter trabalhado para terceiros. O resultado das entrevistas com mil 771 meninas de cinco capitais – Belém, São Luís, São Paulo, Cuiabá e Porto Alegre – e mais 16 cidades das cinco regiões do país foi divulgado no último dia 10, em Brasília.

Mais de 37 por cento das entrevistadas que dizem trabalhar prestam serviço na casa de outras pessoas, cuidando das crianças, fazendo faxina e outras atividades domésticasDezesseis e meio por cento trabalham em estabelecimentos comerciais; sete por cento em atividades relacionadas à agropecuária ou à pesca e seis por cento em fábricas. Cerca de cinco por cento das meninas revelaram que trabalham nas ruas vendendo coisas, recolhendo material reciclável, vigiando ou limpando carros e em outras atividades informais.

Segundo Luca Sinesi, gerente técnico de Monitoramento, Avaliação e Relatório da Plan International, os dados são assustadores e apontam para a total violação dos direitos das crianças, especificamente das meninas. Ele lembrou que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) proíbe o trabalho antes dos 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos e com o devido acompanhamento.

Outro dado apontado pela pesquisa é de que muitas vezes os pais exigem atividades domésticas das meninas que não são cobradas dos meninos. Enquanto quase 77 por cento das meninas lavam louça, 65 por cento limpam a casa e 41 por cento cozinham. Já entre os meninos, apenas 12,5 lavam louça, 11,4 por cento limpam a casa e cozinham. De acordo com os pesquisadores, tal situação revela a manutenção da desigualdade de gênero entre as famílias, com reflexos sobre a construção do imaginário feminino.  (pulsar/revista fórum)

Pulsar Brasil

RACISMO NO BRASIL É INSTITUCIONALIZADO, DIZ A ONU




O racismo no Brasil é "estrutural e institucionalizado" e "permeia todas as áreas da vida". A conclusão é da Organização das Nações Unidas (ONU), que publicou nesta sexta-feira (12) seu informe sobre a situação da discriminação racial no país.

No documento, os peritos concluem que o "mito da democracia racial" ainda existe na sociedade brasileira e que parte substancial dela ainda "nega a existência do racismo".

A publicação do informe coincide com a volta do debate sobre o racismo no Brasil por causa da expulsão do Grêmio da Copa do Brasil por atos de sua torcida contra o goleiro negro do Santos, Aranha. Nesta semana, Pelé também causou polêmica ao minimizar o problema.

Mas as constatações dos peritos da ONU, que visitaram o Brasil entre os dias 4 e 14 de dezembro de 2013, são claras: os negros no país são os que mais são assassinados, são os que têm menor escolaridade, menores salários, maior taxa de desemprego, menor acesso à saúde, são os que morrem mais cedo e têm a menor participação no Produto Interno Bruto (PIB). No entanto, são os que mais lotam as prisões e os que menos ocupam postos nos governos.

Para a entidade, um dos maiores obstáculos para lidar com o problema é que "muitos acadêmicos nacionais e internacionais e atores ainda subscrevem ao mito da democracia racial". Para a ONU, isso é "frequentemente usado por políticos conservadores para descreditar ações afirmativas".

"O Brasil não pode mais ser chamado de uma democracia racial e alguns órgãos do Estado são caracterizados por um racismo institucional, nos quais as hierarquias raciais são culturalmente aceitas como normais", destacou a ONU.

A entidade sugere que se "desconstrua a ideologia do branqueamento que continua a afetar as mentalidades de uma porção significativa da sociedade".

Mas falta dinheiro, segundo a ONU, para que o sistema educativo reforce aulas de história da população afro-brasileira, um dos mecanismos mais eficientes para combater o "mito da democracia racial".

Justiça

Para a ONU, essa situação ainda afeta a capacidade da população negra em ter acesso à Justiça. "A negação da sociedade da existência do racismo ainda continua sendo uma barreira à Justiça", declarou, apontando que mesmo nos casos que chegam aos tribunais, a condenação por atos racistas é dificultada "pelo mito da democracia racial".

Para chegar à conclusão, a ONU apresentou dados sobre a situação dos negros no país. Apesar de fazer parte de mais de 50% da população, os afro-brasileiros representam apenas 20% do PIB. O desemprego é 50% superior ao restante da sociedade, e a renda é metade da população branca.

A expectativa de vida para os afro-brasileiros seria de apenas 66 anos, contra mais de 72 anos para o restante da população. Mesmo no campo da cultura, a participação desse grupo é apenas "superficial", e as taxas de analfabetismo são duas vezes superiores ao restante da população.

A violência policial contra os negros também chama a atenção da ONU, que apela à polícia para que deixe de fazer seu perfil de suspeitos baseado em cor da pele. Em 2010, 76,6% dos homicídios no país envolveram afro-brasileiros.

"Uma das grandes preocupações é a violência da polícia contra jovens afro-brasileiros", indicou. "A polícia é a responsável por manter a segurança pública. Mas o racismo institucional, discriminação e uma cultura da violência levam a práticas de um perfil racial, tortura, chantagem, extorsão e humilhação em especial contra afro-brasileiros", disse.

"O uso da força e da violência para o controle do crime passou a ser aceito pela sociedade como um todo porque é perpetuada contra uma setor da sociedade cujas vidas não são consideradas como tão valiosas", criticou a ONU.

Os peritos apontam que avaliam esse fenômeno como "a fabricação de um inimigo interno que justifica táticas militares para o controle de comportamentos criminosos".

"O direito à vida sem violência não está sendo garantido pelo Estado para os afro-brasileiros", insistiu o informe.

Governo

Para a ONU, houve um avanço nos últimos anos no esforço do governo para lidar com o problema. Mas alerta que muitos dos organismos criados não contam com financiamento suficiente e nem recursos humanos para realizar seus trabalhos. "Muitos ainda têm baixa visibilidade em termos de presença física e posição dentro dos governos dos Estados e dos municípios."

A ONU também denuncia a resistência de grupos políticos diante de projetos de leis que tentam lidar com a desigualdade racial. Os peritos declararam estar "preocupados que o progresso feito até agora corra o risco de sofrer uma regressão diante das ameaças de grupos de extrema-direita".

Mesmo dentro da estrutura do Estado, os afro-brasileiros são "sub-representados". Eles ocupam raramente uma posição de chefia e, em Salvador, a única secretaria municipal comandada por um negro é a da Ação Afirmativa. O município conta com 12 secretarias.

Estadão, em UOL

MILITARES DA UNIÃO AFRICANA FORÇAM SEXO COM REFUGIADAS A TROCO DE ALIMENTOS




Escândalo sexual na Somália

Roger Godwin – Jornal de Angola

A história volta a repetir-se: soldados da União Africana são seriamente acusados de envolvimento num novo escândalo sexual.

Desta vez o cenário do crime foi a Somália, um país extremamente pobre, assolado por uma prolongada guerra contra o extremismo islâmico e desprovida de quase tudo.

As acusações são feitas por organizações humanitárias internacionais que operam na Somália e foram devidamente documentadas com diverso tipo de provas, como fotografias de jovens raparigas envolvidas em orgias com militares daquela força de intervenção e depoimentos de algumas das jovens forçadas a manter relações sexuais como modo de terem assim acesso a bens alimentares.

A quase totalidade dessas jovens raparigas são muçulmanas que fogem da raiva assassina do el Shabab e que julgavam ter da parte daqueles militares africanos o devido amparo e a sombra protectora para escaparem ao perigo que as espreitava.

É, pois, imprevisível o efeito psicológico que a prática dessas violações sexuais terá junto dessas jovens, que se vêm confrontadas com uma situação que as marginaliza socialmente e que as marca de forma indelével para um futuro de todo incerto.

Existem neste momento na Somália cerca de 22 mil militares de diversas nacionalidades envolvidas na força de intervenção com que a União Africana pretende ajudar o governo a combater os extremistas do grupo al Shabab.

Eles estão, sobretudo, concentrados em redor da capital, Mogadíscio, mas multiplicam-se em incursões pelo interior do país como forma de alargar o “anel de segurança” em redor daquele centro urbano. E, segundo as denúncias, é mesmo quando são efectuadas essas acções pelo interior do país que esses abusos sexuais são cometidos com maior intensidade e envolvendo jovens que, nalguns casos, apenas têm 11 e 12 anos de idade.

O assunto já foi endereçado às mais altas instâncias da União Africana que, laconicamente, se limitou a dizer que iria providenciar no sentido de ser feita uma ampla investigação.

Nada do que se está a passar na Somália é assunto novo. Umas vezes a história envolve soldados das Nações Unidas e noutras da União Africana. Em comum está, igualmente, a impunidade com que esses crimes são cometidos, tudo ficando abafado no segredo dos gabinetes.

As vítimas e as suas famílias, na maioria das vezes, remetem-se a um confrangedor silêncio, nuns casos com receio dos militares armados e, noutros, aliciadas com algumas compensações que ajudam a minorar os efeitos da extrema pobreza em que vivem.

Mas é o aproveitamento que esses predadores sexuais fazem da extrema pobreza e vulnerabilidade das suas vítimas que mais choca aqueles que, intransigentemente, lutam pela dignidade da pessoa humana e pelo prestígio que devem ter as organizações internacionais, civis e militares, que dão o seu melhor para ajudar os mais desprotegidos.

Numa altura em que a Somália conseguiu algumas conquistas militares face as investidas dos rebeldes islâmicos, estas denúncias apenas podem servir para ajudar a propaganda dos que usam a religião como modo de sobreposição aos valores da democracia, de modo a conseguirem aliciar populações indefesas para os seus mórbidos objectivos. Fragilizado por uma conjuntura interna extremamente adversa, o governo da Somália sente naturais dificuldades para fazer impor a sua autoridade, seja no combate ao extremismo islâmico seja na defesa das suas populações face aos perigos que ela enfrenta, mesmo os que são representados por militares da União Africana claramente impreparados para desempenhar a sua nobre missão com o necessário zelo e competência.

Por isso, compete aos países que integram aquela organização criarem os mecanismos capazes de julgar e punir todos aqueles que não se mostrem dignos da missão que foram chamados a cumprir e da qual depende a vida e o futuro de gente inocente, sobretudo de mulheres e crianças às quais a única esperança que resta é a do direito a uma vida condigna a resguardo dos apetites criminosos de meia dúzia de bandidos. Seria pois bom que a nível dos responsáveis políticos da União Africana este assunto tivesse prioridade, de modo a que se possam evitar futuras situações idênticas a esta e que não só desprestigiam a organização como dão alento e total razão à propaganda das seitas radicais que se alimentam do ódio que a prática de tais crimes cria junto de pessoas de bem.

É evidente que não se pode tomar o exemplo do que acaba de ser denunciado na Somália como sendo uma prática generalizada por parte das tropas da União Africana. Longe disso. Mas se nada for entretanto feito, se o silêncio continuar a ser a forma dos responsáveis lidarem com o problema, o assunto pode atingir proporções desconcertantes e fazer com que os justos sejam considerados absolutamente iguais aqueles que mancham o prestígio da instituição a que pertencem.

*Título PG

Angola: UNIDADES PRISIONAIS RECUPERAM RECLUSOS



André da Costa – Jornal de Angola, entrevista

O diretor nacional dos Serviços Penitenciários defendeu, em entrevista ao Jornal de Angola, a a­dopção de uma perspectiva mais humana no tratamento dos reclusos.

No cargo desde Fevereiro deste ano, o comissário prin­cipal António Joaquim Fortunato enumera uma série de medidas a serem tomadas para re­estruturar o Sistema Penitenciário, torná-lo sustentável e capaz de reeducar de facto os cidadãos privados de liberdade.

JA - Que novas ideias pretende introduzir nos Serviços Penitenciários?

AF- Começamos por introduzir mudanças ao nível do próprio raciocínio penitenciário, ao incutir nos nossos efectivos a mentalidade de que o recluso é um ser humano. A sociedade tem de afastar a ideia de que as cadeias são locais onde se guardam indivíduos inúteis. Pretendemos uma maior equiparação no tratamento entre o recluso e agente penitenciário. Colocamos um psicólogo a dirigir a área de reeducação penal, por ser a arma principal do sistema penitenciário, a que vai permitir uma reintegração social normal dos reclusos.

JA - Os reclusos já participam em actividades produtivas?

AF - Pretendemos fomentar o trabalho da reeducação penal para fazer com que os reclusos se integrem mais no trabalho social e na actividade produtiva, quer no sentido lucrativo quer no da formação profissional. Uma vez terminada a pena, eles levam consigo uma profissão e trabalham para dar resposta às necessidades.

JA - Existem projectos para rentabilizar a produção agro-pecuária feita pelos reclusos?

AF - Queremos criar um sistema penitenciário lucrativo com base na produção industrial e agro-pecuária. O programa “Novos Rumos e Novas Oportunidades” é de cariz lucrativo e visa a obtenção de fundos próprios para colmatar as dificuldades financeiras que existem e apoiar outros órgãos do Ministério do Interior. Trabalhamos também na melhoria das condições dos efectivos, os salários foram aumentados e a remuneração é feita mediante a patente.

JA - O tratamento dado aos reclusos ajuda a evitar a reincidência?

AF – No novo Estatuto Orgânico do Ministério do Interior, o Serviço Prisional passou a denominar-se Sistema Penitenciário. Isso porque o raciocínio em volta do que é prisional é muito restritivo. Há várias tendências jurídicas, psicológicas, psiquiátricas e antropológicas que defendem que o homem, quando privado de liberdade, deve ser tratado no sentido de assimilar novas ideias para impedir a reincidência.

JA - Mas a reincidência passa também pela falta de emprego.

AF - Estamos a trabalhar na criação de novas áreas, como a reinserção social, que vai fazer o acompanhamento dos reclusos postos em liberdade e fazer com que prestem serviços úteis à sociedade e afastem a possibilidade de cometer crimes.

JA - Como combater o excesso de população prisional em Luanda?

AF - Isso passa pela transferência de reclusos na cadeia da Damba em Malanje onde temos 1.700 vagas, e 700 vagas no Kapolo no Bié que ainda não estão a funcionar. Luanda tem cerca de 1.040 reclusos em excesso de prisão preventiva. Uma vez consolidada essa transferência evitamos estes casos. Nós temos 39 estabelecimentos prisionais em Angola.

JA- Vão continuar a ser construídas cadeias para transferência de reclusos?

AF - Vamos suspender a construção de cadeias e melhorar as que já existem. Temos cadeias com debilidades arquitectónicas e vamos reforçar os cordões de segurança. Pretendemos reabilitar e modernizar as cadeias e introduzir meios modernos de gestão e controlo de reclusos, e condições de habitabilidade para os efectivos que trabalham em zonas distantes de casa.

JA - Os cordões de segurança não são os mais desejados?

AF - Os cordões de segurança devem ser encarados numa perspectiva dinâmica e não apenas estática. Por exemplo, um muro de uma cadeia, deve ter mais de três metros para impedir que o recluso pense em fugir. A segurança dinâmica passa pela formação do homem. Precisamos de 2.500 efectivos para atender uma população de 22 mil reclusos.

JA – Continua a registar-se a introdução de drogas nos estabelecimentos prisionais?

AF - Existe tráfico e consumo de drogas nas cadeias do país. Não devemos esconder essa realidade. É uma forma de alertamos as pessoas que estamos atentos a essa situação. Por isso, pretendemos pôr fim à entrada de comida confeccionada em casa. Estamos a trabalhar para reforçar e melhorar a dieta alimentar dos reclusos.

JA - Como é que a droga entra, se existe um sistema de segurança que controla as entradas e saídas?

AF - Parte da droga entra pela comida vinda de casa e em outros objectos. Temos meios técnicos que permitem alertar e vigiar, mas é muito complicado. Por isso, a segurança não pode ser apenas dinâmica. Temos homens com outros problemas e não estão livres da corrupção.

JA - Em relação à comida, há reclusos doentes com alimentação específica como os diabéticos, por exemplo?

AF - Estamos a modernizar o sistema prisional com a introdução de novas condições para que os reclusos não recebam comida vinda de casa. Só reclusos com uma dieta especial vão receber alimentação de fora. Aí cortamos em 50-60 por cento a entrada de drogas.

JA - O Sistema Penitenciário tem funcionários dedicados ao trabalho.

AF - Alguns agentes entendem mal o seu papel no sistema prisional. Acham que o sistema ajuda-os a perseguir interesses individuais. Estamos a trabalhar para detectar esses indivíduos. Estamos a louvar agentes que trabalham com abnegação e disciplina. Estamos a fazer todos os esforços para melhorar os salários. Houve agora um incremento salarial e estamos a tratar da motivação dos efectivos, com a reposição dos postos e distintivos.

JA- Existe diálogo regular entre os agentes prisionais e reclusos?

AF - Há maior diálogo e coordenação com os reclusos e estamos a separá-los por tipo de crime. A ideia é agrupá-los numa determinada brigada mediante o crime cometido. É uma actividade que está a ser feita com cuidado, porque a separação deve ter em conta o aspecto físico e arquitectónico das cadeias.

JA- Os jovens que entram para as novas cadeias recebem alguma formação?

AF - Temos em funcionamento o Centro de Jovens do Waco Cungo, onde os detidos dos 16 aos 21 anos, vindos de Luanda, Huambo e Bié, aprendem artes e ofícios.

JA- O sistema tem quadros para atender o número de presos.

AF – Luanda tem mais de sete mil reclusos e só a cadeia de Viana tem mais de cinco mil. Temos 105 reeducadores e, destes, só 80 trabalham de facto. A ideia é ter um reeducador para cada 35 reclusos. Os reeducadores vão trabalhar com dois a três psicólogos, para que, na ausência de um, o outro possa substituir.

JA-Que acompanhamento tem o recluso quando volta à liberdade total?

AF - Esse acompanhamento é feito apenas aos que saem em liberdade condicional, porque são obrigados apresentar requerimentos às empresas empregadoras.

JA - Ainda se registam casos de maus-tratos nas cadeias, como vimos em vídeos publicados na Internet?

AF - O sentido de humanidade para com os reclusos tem de ser cumprido porque a nossa disciplina e organização permite afirmar isso. Os reclusos não têm que ser maltratados nem enxovalhados.  Quem maltratar um recluso é sancionado. Há neste momento um processo de inquérito no Bengo sobre uma denúncia de maus-tratos.

JA – Viu as imagens de maus-tratos? Como qualifica aquela situação?

AF- É de uma desumanidade incrível. Nunca imaginei ser possível alguém ter tanta crueldade para agir daquela forma. A maior parte destes efectivos foi expulsa do Ministério do Interior. Visito com regularidade as cadeias, inclusive de forma inesperada.

JA - Há reclusos que dão muito trabalho para serem reeducados?

AF - Temos de olhar para os reclusos como seres humanos, embora reconheçamos existirem reclusos maldosos, que desafiam os efectivos. São estes jovens que, quando são libertados, cometem crimes violentos.

JA - Que tipo de acompanhamento têm as reclusas gestantes?

AF - Está em curso a construção de uma creche junto da cadeia feminina para tratar dos filhos das reclusas. As mulheres têm estado envolvidas em trabalhos diversos e beneficiam de acompanhamento psicológico.

JA – As visitas íntimas funcionam em todas as cadeias do país?

AF - Temos vários actos jurídicos importantes, segundo o que defende o Direito Penitenciário, um dos quais é a visita, no sentido de se esta é benéfica para o recluso, incluindo a visita íntima. Temos as visitas conjugais, com quartos disponíveis para o efeito só em Luanda.

JA - Porque só em Luanda?

AF - A visita conjugal persegue a relação sexual. Se é isso que se pretende, é preciso haver um conjunto de situações em volta dessa questão. Estamos a trabalhar no regulamento relativo a este aspecto. A visita é um direito que o recluso deve conquistar mediante o bom comportamento.

JA - Quanto é que o Estado gasta por dia com cada recluso?

AF - Estudos feitos em tempos apontavam 30 dólares. Hoje, está entre 35 a 40 dólares vezes os mais de 22 mil reclusos existentes nas cadeias do país. Só recebemos cerca de sete por cento desse valor. Mas há investimentos em curso e a direcção do Ministério do Interior tem apoiado, porque queremos revitalizar a produção agro-pecuária e industrial para melhorar essa quota.

Foto: José Cola

Angola: MILHARES DE HABITAÇÕES ESTÃO QUASE CONCLUÍDAS



Victorino Joaquim – Jornal de Angola

O ministro do Urbanismo e Habitação, José Silva, disse ontem em Luanda que até 2016 ficam concluídas 150 mil habitações em todo o país, no âmbito dos projectos em curso.

José Silva falava à imprensa, no final de uma jornada de campo que serviu para constatar o andamento das obras de construção de 20 mil habitações no Zango 4, que vão servir para o realojamento das populações retiradas das zonas de risco e a viver em condições precárias.

O projecto conta com uma área de expansão e vai servir também para atender a franja da população que não tem recursos financeiros nem condições para aderir aos projectos habitacionais existentes.

Nos próximos tempos, frisou o ministro, é realizado um encontro entre os operadores imobiliários intervenientes no projecto e o Ministério do Urbanismo e Construção, para discutir as novas tipologias de construção que se pretendem para o futuro, a conservação do ambiente, os preços, quantidade de habitações disponíveis e os critérios de acesso às habitações por parte das pessoas interessadas.

José Silva garantiu que vão ser alteradas as tipologias de habitação a serem construídas futuramente, para melhor racionalização dos espaços, com a construção de habitações de quatro pisos, em vez da construção extensiva.

O ministro considerou positiva a construção de habitações do tipo pré-fabricado, por meio de uso de aço-galvanizado. “Com este projecto, vamos construir habitações mais rapidamente e com custos mais reduzidos, sem perder a qualidade”, salientou.

Das 20 mil habitações em construção no Zango 4, 16 mil já estão concluídas e habitadas, enquanto as outras quatro mil ainda estão em obras.

Durante quase quatro horas, José Silva, acompanhado por técnicos do Ministério, percorreu quase toda a extensão do Zango 4, visitou as casas já concluídas e inacabadas e orientou o empreiteiro para que tudo seja cumprido de acordo com os prazos firmados.

Foto: Domingos Cadência

DESBRAVANDO A LÓGICA COM SENTIDO DE VIDA! – VII



Martinho Júnior. Luanda (Continuação – ver anteriores

18 – O esforço do MPLA no sentido de se alcançar a paz no início da década de 90, mereceu de Savimbi uma resposta ideologicamente agressiva, que por seu turno teve aceitação em muitos dirigentes de África, em especial daqueles que, nunca se tendo envolvido na luta contra o colonialismo e o “apartheid”, eram susceptíveis de manipulação neo colonial, ou por parte de entidades como Savimbi.

A ideologia que Savimbi contrapôs à paz possível de Bicesse e Lusaka redundava de todo o seu percurso profundamente contraditório e era tão a “preto e branco” quanto lhe foi possível e ao seu entrevistador, o togolês Atutsé Kokouvi Agbobli, autor de “Combats por l’Afrique et la démocratie”!...

Durante muitos anos os aspectos essenciais dessa ideologia foram mantidos na seguinte direcção:“ASSOCIATION FRANCO – AFRICAINE POUR LA RENAISSANCE ET LA DÉMOCRATIE”(“AFARD”), com sede no nº 66 da Avenida Champs – Elysées, 75.008, PARIS, http://www.afard-unita.asso.fr/

19 – Na síntese-analítica das ideias-força da ideologia protagonizada por Savimbi, face à oportunidade da paz e da democracia, evidenciava-se:

- No que diz respeito à geografia político cultural, a UNITA era o “interior” e o MPLA o “litoral”; por isso a UNITA assumia identidade negro-africana, integrando o pelotão dos autênticos nacionalistas africanos de autóctones negros que permanecem no campo, enquanto o MPLA assumia uma cultura luso-crioula, que fazia discriminação racial e se assumia nas cidades (onde se presumem mais civilizados).

- Em relação à composição humana a UNITA identificava-se com o sofrimento do povo face às elites mulatas e assimilados que compunham o MPLA.

- Quanto às raças, a UNITA detinha mobilização na maioria negra, enquanto o MPLA se confinava à primeira linha de mulatos.

- Quanto à atitude política, Savimbi dizia que nada de paz na humilhação e por isso estava disposto a servir a causa da liberdade, da independência e da democracia dos autóctones negros, enquanto o MPLA era anti nacionalista, sectário e oportunista, procurando uma hierarquização da sociedade (brancos, mulatos e assimilados) fazendo assim a ligação dos traços coloniais com os neo coloniais.

- Por fim e quanto aos apoios, a UNITA tinha-os no campo do nacionalismo africano autêntico e o MPLA no mundo ibero-americano e nas grandes potências.

20 – Para Savimbi o que era importante para fugir à paz possível, era encontrar um argumento justificativo contraditório que fundamentasse a continuação da guerra que lhe iria permitir alcançar o poder pela força.

Com isso ele foi evidenciando o seu carácter autoritário e fascizante.

Como havia perdido o apoio directo do “apartheid”, foi nessa África retrógrada que foi buscar justificações e apoios, não se coibindo de, ao utilizar uma ideologia caracterizada pela divisão, pelo etnicismo exacerbado, pelo racismo e pela negação do outro, fomentar a dicotomia entre os dois principais sectores produtivos do país, de forma a melhor se posicionar em relação a dois “lobbies”preponderantes: o do petróleo que ele indiciava como apoiante do estado angolano e o dos“minerais” (sobretudo o “cartel de diamantes”), que ele, da (pior) maneira que lhe era possível, reservava para seu proveito e interesse!

Ao invés de aceitar a paz que lhe era estendida, Savimbi enveredou uma vez mais pela guerra e para isso lançou desde uma ideologia, a uma acção oportunista, que explorava as debilidades do estado angolano em época de transição, debilidades essas que atingiam profundamente os próprios instrumentos de poder do estado!

Essa deliberada subversão, interligar-se-ia a factores de desestabilização externos, africanos uns, provenientes de fora do continente outros.

O Zaíre sob a orientação de Mobutu, se antes se coibiu face às iniciativas de paz na região por parte do Presidente Agostinho Neto, agora nos limites de sua sobrevivência e pondo em evidência o seu carácter, alinhou com a desestabilização e na aventura da exploração de imensos recursos minerais para enriquecimento de uns quantos e para organizar recursos para levar a cabo a guerra.

Mobutu foi nessa fase, um aliado inequívoco de Savimbi, fornecendo-lhe o que ele mais necessitava: a retaguarda onde poderia organizar uma parte de sua logística… Maurice Tempelsman, um dos mais poderosos “homens de mão” do “cartel de diamantes”, foi enquanto pôde, um reitor da situação que resvalava para uma grande crise!

Foto: Mandela e Savimbi, conformes ao peso do “cartel dos diamantes”: uma ambiguidade que em 1991/1992 não beneficiou a paz possível em Angola, muito pelo contrário, sempre a contrariou! Da parte de Mandela a ideia da “terceira via”contribuiu para a sua posição face ao desenrolar dos acontecimentos em Angola e na região.

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