Roberto Almeida,
Berlim – Opera Mundi
Trabalhadores são
aliciados com promessas que não são cumpridas e passam a ser vigiados por
seguranças ligados a grupos neonazistas
Um documentário da
TV estatal alemã Hessischer Rundfunk, afiliada à rede nacional ARD,
gerou forte repercussão sobre as péssimas condições de trabalho na Amazon.de,
versão local da gigante do varejo online. Com meia hora de duração, “Entrega
feita! Os Temporários da Amazon” (que pode ser visto aqui), dos jornalistas Peter Onneken e Diana Löbl,
apresenta o recrutamento de pessoas com promessas salariais vazias, alojamento
em hotéis abandonados e intimidação por seguranças ligados a grupos neonazistas.
As filmagens ocorreram durante novembro e dezembro do ano passado, período em
que a Amazon saiu em busca de temporários para suprir a demanda e cumprir seu
cronograma apertado de entregas no Natal europeu. O roteiro, que denuncia
abusos trabalhistas, é facilmente reconhecível, semelhante a casos na América
Latina. O que chama a atenção é a origem da mão de obra aliciada: são espanhóis
expostos pela crise, onde o desemprego bateu na casa dos 26% em janeiro.
Eles contam que estavam animados com a possibilidade de trabalhar em uma
gigante multinacional, com salários de cerca de 8 euros por hora (em torno de
R$ 20), mas que acabaram indo parar em empresas terceirizadas, ganhando até 12%
menos. Em seguida, seus direitos foram cerceados. Entre eles, o da privacidade.
É o caso de Silvina, uma professora de artes desempregada, que embarcou na
promessa de uma das subcontratadas pela Amazon alemã. Entrariam no pacote casa
e comida, que são na verdade um hotel fechado a quilômetros do local de
trabalho, na região de Bad Hersfeld, centro da Alemanha.
A área é vigiada por seguranças vestindo uniformes paramilitares, alguns
claramente associados a grupos de extrema-direita que, segundo as vítimas,
dizem ter poderes de polícia. Se não forem obedecidos, eles ameaçam expulsar os
trabalhadores do hotel sem comida e sem salário, o que chocou a população
local. Há semelhanças demais com os campos de trabalho forçado do período
nazista. Um deles tenta evitar as filmagens e intimida os produtores.
O documentário já
teve mais de 4 milhões de visualizações e gerou debates sobre o boicote à
Amazon na Alemanha. A classe política local também se envolveu. A ministra do
Trabalho, Ursula von der Leyen, da CDU (União Democrática-Cristã), mesmo
partido da chanceler alemã, Angela Merkel, cobrou uma posição da gigante
multinacional sobre as condições de trabalhadores temporários.
O primeiro resultado veio à tona no dia 18 de fevereiro. Em nota, a
multinacional afirmou que é responsável pelo bem-estar de seus empregados e
que, por isso, terminaria imediatamente o contrato com a empresa que forneceu
alojamento, transporte e os serviços de segurança para seus funcionários. Mas a
agência federal de emprego alemã encontrou violações de leis trabalhistas. O
caso ainda está sob apuração.
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