terça-feira, 2 de junho de 2015

PRESIDENTE ANGOLANO EM VISITA À CHINA NA PRÓXIMA SEMANA




O Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, visitará a China na próxima semana, pela primeira vez em quase sete anos, indicou hoje à agência Lusa fonte diplomática.

Eduardo dos Santos deverá chegar a Pequim na segunda-feira, permanecendo na China até ao dia 12 de junho, adiantou a fonte.

Na segunda-feira passada, em Luanda, o embaixador chinês em Angola, Gao Kexiang, anunciou que o Presidente angolano visitaria "muito em breve" a China, "para aprofundar ainda mais o bom relacionamento" bilateral, mas não precisou as datas.

Eduardo dos Santos visitou a China, pela última vez, em dezembro de 2008, e quatro meses antes assistiu à cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim.

O homólogo chinês, Xi Jinping, esteve em Angola em 2010, quando era vice-presidente da China, e o atual primeiro-ministro, Li Keqiang, foi recebido em Luanda em maio do ano passado.

A China é um dos principais parceiros económicos de Angola, absorvendo cerca de metade do petróleo exportado por aquele país africano.

Mais de 250.000 de chineses trabalhavam há dois anos em Angola, sobretudo na construção e reparação de infraestruturas, nomeadamente caminhos-de-ferro, estradas e habitações.

Lusa, em Notícias ao Minuto

VISITA DO PRIMEIRO-MINISTRO DE CABO VERDE A BISSAU FOI ADIADA




Adiamento foi solicitado pelo Governo da Guiné-Bissau

Voz da América

O primeiro-ministro da Guiné-Bissau pediu o adiamento para o próximo mês de Julho da visita que o seu homólogo cabo-verdiano tinha previsto iniciar amanhã, 3 de Junho, a Bissau.

Em nota enviada por Domingos Simões Pereira a José Maria Neves, ele justificou o pedido com o facto de o país ter acolhido até o passado domingo, 31, a visita do Rei do Marrocos, o que atrasou os preparativos para receber o chefe do Governo de Praia.

Segundo o Gabinete do Primeiro-Ministro cabo-verdiano José Maria Neves, o pedido de adiamento foi feito a 20 de Maio e desde então as duas partes têm vindo a procurar uma data alternativa, que deverá ser em Julho.

Para marcar a visita de Neves, a companhia aérea cabo-verdiana TACV destinou o recomeço das ligações entre Praia e Bissau para amanhã. Apesar do adiamento da visita, os voos da TACV recomeçam como previsto amanhã, 3.

PRESIDENTE DO PARLAMENTO DA GUINÉ-BISSAU PEDE DESCULPAS A ANGOLA




Bissau pediu desculpas ontem ao Governo angolano pelos acontecimentos de 12 de Abril de 2012, o golpe de Estado, que culminaria com o fím da missão militar angolana na MISSANG.

Hoje o reforço da cooperação militar entre Luanda e Bissau esteve na ordem do dia por altura da visita a Luanda de Cipriano Cassamá, presidente da Assembleia nacional popular guineense.

Delegações parlamentares de Angola e da Guiné Bissau encabeçadas pelos seus respectivos líderes, Fernando da Piedade Dias dos Santos e Cipriano Cassamá, respectivamente, decidiram relançar a cooperação entre as duas instituições quebrando o gelo nas relações entre os dois Estados.

O presidente do parlamento guineense termina a sua visita amanhã e antes de deixar Luanda deverá ser recebido em audiência pelo de Angola vice-presidente Manuel Vicente.
Alberto de Jesus, em Luanda, acompanha esta deslocação.

 O golpe de Estado de 12 de Abril de 2012 na Guiné-Bissau derrubou o governo de Carlos Gomes Júnior, que estivera na base da vinda do contingente militar angolano para ajudar na tão falada e sempre adiada reforma do sector da defesa e segurança.

O regresso dos militares ao poder na altura derrubara também o presidente interino, Raimundo Pereira, após a morte do chefe de Estado, Malam Bacai Sanhá, inviabilizando também a segunda volta das eleições presidenciais guineense.

O primeiro-ministro da altura tinha sido o candidato mais votado na primeira volta de então, desde o golpe de Estado ele teve que se refugiar em Portugal.

Angola. ADVOGADOS DE DEFESA SEM ACESSO A KALUPETEKA




Primeiro encontro com advogados de defesa pode acontecer hoje

Voz da América

Advogados de Julino Kalupeteka  continuam a enfrentar dificuldades para contactar o seu constituinte antes da primeira audiência com a presença da defesa.

O advogado da Associação Mãos Livres  Salvador Freire disse à VOA que a Procuradoria Geral da República não permitiu  que a defesa contactasse o líder da seita A Luz do Mundo,  antes da nova inquirição confirmada para as próximas horas desta terça-feira, 2.

Freire considera que a próxima audiência será decisiva porque vai permitir que o acusado seja ouvido na presença dos seus defensores podendo os seus primeiros depoimentos ser considerados nulos.

José Julino Kalupeteka, cujos fiéis se envolveram em confrontos mortais com a polícia, está detido preventivamente desde 16 de Abril na cidade do Huambo.

A Associação Mãos Livres, que já escreveu ao secretário-geral da Organização das Nações Unidas Ban Ki-moon a pedindo uma investigação independente face aos números díspares de mortos nos confrontos, tentou durante várias semanas assumir a defesa de Kalupeteka, o que só se concretizou a 20 de Maio.

A  mediatização deste caso  motivou  a condenação dos seguidores de Kalupeteka, por mais de uma vez, do Presidente angolano, José Eduardo dos Santos.

Talvez por isso, a Mãos Livres afirma que dificilmente Kalupeteka terá um julgamento "justo".

Em causa estão os confrontos de 16 de Abril na Serra Sumi, província do Huambo, entre a polícia, que tentava dar cumprimento a um mandado de captura contra Kalupeteka e outros dirigentes daquela seita ilegal em Angola, e alguns fiéis que estavam concentrados no acampamento daquela igreja.

A oposição angolana, aponta  para "várias centenas" de mortos entre os seguidores da seita.

Angola. UMA HISTÓRIA DE FADAS



José Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião

Na passada quarta-feira, 27 de Maio, o representante de Angola no Conselho de Segurança das Nações Unidas votou favoravelmente uma resolução condenando as violações e abusos cometidos contra jornalistas em todo o mundo. No dia seguinte, um tribunal angolano sentenciou Rafael Marques a uma pena suspensa de seis meses de cadeia por calúnia e difamação.

Recorde-se que Marques chegara a acordo com os generais envolvidos, num entendimento que previa a monitorização de possíveis violações de direitos humanos na região das Lundas. Era um acordo inteligente, e que, de certa forma, salvava a face dos generais. Uma solução, aliás, que não fui capaz de prever numa crónica anterior.

Com a presente sentença voltou tudo atrás. Caiu a máscara. A verdade é que o regime angolano fez do cinismo a sua ideologia e da hipocrisia uma religião. Felizmente, pratica o cinismo e a hipocrisia de forma tão ingénua, tão extraordinariamente desastrada, que mesmo os seus clientes mais fiéis e invertebrados começam a sentir enormes dificuldades em defendê-lo publicamente. Em privado é diferente, em privado não conheço uma única pessoa que defenda o actual regime, nem sequer os próprios governantes. Em privado, em Angola, todo o mundo é da oposição.

A intenção da sentença é clara – silenciar Rafael Marques pelo menos durante seis meses. O mais provável é que o tiro saia pela culatra, ferindo o atirador. Por um lado o próprio Rafael já veio a público dizer que, diante desta armadilha infame, irá denunciar todo o processo. Por outro, a mesma voltou a chamar a atenção do mundo para a situação da liberdade de expressão no país. Lendo a imprensa internacional é este o resumo da situação: vigora em Angola um sistema de “justiça” que condena o jornalista e se recusa a investigar quem este denuncia, por crimes gravíssimos, não obstante a exibição de inúmeras provas, presentes no livro que originou todo o processo, “Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola”.

Creio que foi Einstein quem disse haver apenas duas coisas infinitas: o universo e a estupidez humana. O erro de Rafael Marques foi ter subestimado a estupidez do regime. O regime que nos condena manifesta, por vezes, rápidos lampejos de inteligência – como aconteceu com a decisão dos generais – mas quase sempre essas imprevistas manifestações são contrariadas, logo a seguir, por um invencível ataque de cegueira. Já se sabe: a raiva cega.

E agora?

Agora Rafael continuará a falar, e continuará a falar para uma audiência cada vez mais alargada. Virão mais prémios. O seu brilho aumentará na mesma proporção em que a imagem do Presidente da República se irá degradando.

No fim, a inteligência triunfa. É quase uma história de fadas.


ANGOLA E O ATUAL ORDENADO MÍNIMO




Segundo um artigo do Semanário Angolense, assinado por N. Talapaxi S., nas páginas 12 e 13, Angola tem (ou terá, pelo menos, em teoria) o 3º maior vencimento médio da SADC, apesar do nosso ordenado mínimo estar nos 15.003 Kwanzas.

 Todavia o nosso vencimento médio está entre os 15.003,00 Kz e os 22.504,50 Kz  (cerca de 202 USD) onde só somos ultrapassados pelo Botswana (cerca de 229,83 USD), e da África do Sul (213,41 USD). de notar, sublinha o jornalista, que as ilhas Seychelles não estão reflectidas nos gráficos da SADC, o que, dado o seu elevado PIB poderá estar à nossa frente, ou, talvez, superar e encimar a lista, dado que alguns especialistas sugerem que o vencimento médio dos seychellinos deverá rondar os 400 USD. Recorde-se que as Seychelles têm um rendimento per capita de mais de 25.000,00 dólares, tornando este Estado africano como um dos mais ricos do Mundo.

Também a Namíbia (tal como o Zimbabwe) não disponibilizou qualquer informação, em parte devido à liberdade de salário. Mas, segundo o articulista, o vencimento médio dos namibianos, após descontos, no mês de Março, andavam pelos cerca de 650,00 USD.

Já agora, Cabo Verde apresenta um vencimento médio de cerca de 153,75 USD; Guiné-Bissau de cerca de 73,41 USD; e São Tomé e Príncipe cerca de 70,00 USD.

*Investigador do CEI-IUL e CINAMIL

Eugénio Costa Almeida* – Pululu - Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

ATIVISTA ANGOLANO JOSÉ MARCOS MAVUNGO TEME MORRER NA PRISÃO




O estado de saúde de José Marcos Mavungo é preocupante, segundo o ativista Raul Tati. Ele diz que é preciso que Mavungo seja libertado imediatamente, "pelo menos por razões humanitárias".

O ativista angolano José Marcos Mavungo está detido em Cabinda, sem acusação formal, desde 14 de março de 2015, dia para que fora convocado um protesto contra a alegada má governação da província e violação de direitos humanos.

Quase três meses depois, o estado de saúde do ativista é preocupante, diz Raul Tati, ativista e membro do "Grupo de Apoio aos Presos Políticos Angolanos". O movimento já endereçou cartas à governadora de Cabinda, ao Sub-Procurador-Geral da República em Cabinda, ao delegado do ministro do Interior na província e ao diretor da cadeia explicando a situação.

Agora, Tati pede à sociedade civil angolana para ajudar o "Grupo de Apoio" a convencer as autoridades de que é preciso libertar imediatamente o ativista José Marcos Mavungo, "pelo menos por razões humanitárias".

DW África: Qual o estado de saúde de José Marcos Mavungo?

Raul Tati (RT): No sábado, estive com ele no Hospital Central de Cabinda, depois de ele se ter sentido mal durante toda a noite de sexta-feira para sábado. Foram os guardas dos serviços prisionais que o levaram ao hospital, onde fez alguns exames preliminares e lhe foi diagnosticado malária, além dos problemas que já tem de coração. A situação do Marcos Mavungo é preocupante. Ele está visivelmente magro, pálido e até, de certa forma, desfigurado. É uma situação muito grave, que exige a sensibilidade e o bom senso das autoridades. É preciso que Marcos Mavungo seja posto em liberdade imediata e incondicionalmente, para que possa tratar da sua saúde.

DW África: Portanto, é uma situação de saúde que inspira sérios cuidados.

RT: O Marcos Mavungo tem-me confidenciado até a possibilidade de ele perder a sua vida na cadeia. Já me falou nisso várias vezes. No sábado passado, quando observei o aspeto dele, vi que o que está a dizer não deve ser subestimado. Além disso, a médica [de Mavungo] não o pode acudir quando ele precisa, só pode ir [à cadeia] nos dias destinados às visitas. Isso é também um problema muito sério. Porque o Marcos Mavungo precisa, neste momento, de assistência e tratamento adequado num ambiente adequado. O ambiente onde ele está é um fator de risco para a sua saúde.

DW África: As autoridades de Angola sabem isso? Onde está o aspeto humanitário?

RT: Não sabemos se as pessoas ainda têm coração ou se passaram a ser máquinas que só olham para a maldade. Não sabemos se estamos a viver numa sociedade civil, onde há normas de convivência pacífica, ou se estamos a viver numa selva, onde tudo vale. É preciso transmitir à sociedade a mensagem de que é preciso acudir a esta situação, pelo menos por razões humanitárias. Estamos a caminho dos 90 dias na cadeia e ele não tem culpa formada, não se provou absolutamente nada contra o Marcos Mavungo.

DW África: Marcos Mavungo é, nesse momento, um prisioneiro de consciência?

RT: É um prisioneiro de consciência. Isto é uma questão política, não é mais nada. Não há crime nenhum.

DW África: O que poderão fazer os ativistas e a sociedade civil angolana para que as autoridades de Luanda decidam libertar Marcos Mavungo?

RT: Constituímos um grupo de apoio aos presos políticos em Angola, com alguns amigos, para tentar pressionar. Há duas semanas, estes nossos amigos estiveram em Cabinda a trabalhar e tiveram o ensejo de conversar com o Sub-Procurador-Geral da República em Cabinda sobre esse assunto. As outras entidades negaram-se a receber essa delegação para conversar e encontrar uma saída para este caso, relegando a questão para a Justiça porque é ela que se deve pronunciar, em última instância, sobre este assunto. Todavia, continua este movimento de solidariedade por outras partes de Angola, onde há pessoas que têm consciência do momento político que estamos a viver no país, que é muito sério. O regime parece endurecer cada vez mais os métodos de repressão política, que só nos fazem lembrar os tenebrosos tempos da DISA [Direção de Informação e Segurança de Angola], onde as pessoas eram presas e até mesmo levadas a fuzilamentos, sem culpa formada e sem julgamentos. Portanto, tudo isto nos faz lembrar essas imagens tristes de um passado que gostaríamos de esquecer. Infelizmente, estamos diante de um regime que está a atropelar todas as normas de um país que se diz "Estado de Direito democrático". Não há vontade nenhuma de cumprir o que foi posto na Constituição.

António Rocha – Deutsche Welle. Na foto Raul Tati

ONDA DE GREVES NA ALEMANHA. A DESINTEGRAÇÃO DO “MODELO ALEMÃO”




O país está a viver uma “ampla erosão das normas salariais formais e informais que por várias décadas mantiveram a paz no capitalismo alemão”, afirma o sociólogo económico Wolfgang Streeck, sublinhando que a vaga de paralisações “é mais do que um episódio conjuntural: é outra faceta da desintegração inexorável do que costumava ser o 'modelo alemão'”.

“Este ano, a maior economia da Europa está prestes a bater um novo recorde de greves, com todos os trabalhadores - desde os maquinistas aos professores de jardins de infância e creches e trabalhadores dos correios - a promoverem paralisações nos últimos tempos. Esta onda de greves é mais do que um episódio conjuntural: é outra faceta da desintegração inexorável do que costumava ser o 'modelo alemão'”, assinala Wolfgang Streeck num artigo publicado no Guardian.

“Os sindicatos das prósperas indústrias de exportação não são os únicos que estão em greve nos dias de hoje”, refere o sociólogo económico, exemplificando com as paralisações nos serviços domésticos, especialmente no setor público, que aparentam “ter vindo para ficar”.

Lembrando que “a concorrência internacional já não é apenas sobre a quota de mercado, mas também sobre o emprego”, o que veio, por exemplo, condicionar a ação dos sindicatos metalúrgicos, Wolfgang Streeck assinala que a contestação deslocou-se para os serviços, já que, neste caso, “a exportação do trabalho é mais difícil”.

O sociólogo refere também que “os empregadores públicos, na prossecução da consolidação orçamental, romperam o peculiar regime de contratação coletiva do setor público da Alemanha” que assegurava, no essencial, os mesmos aumentos salariais anuais para todos os trabalhadores. Por outro lado, Wolfgang Streeck aponta que várias ocupações - incluindo a dos maquinistas, professores e trabalhadores dos correios - deixaram de ser reguladas pela legislação específica da Função Pública.

“Além disso, a privatização progressiva dos serviços públicos, combinada com o desemprego e a de-sindicalização que veio com o mesmo, colocou cada vez mais os salários do sector público sob concorrência, levando a problemas até então desconhecidos para os sindicatos, desencadeados por aquilo que rapidamente se estava a tornar num sistema de dois níveis salariais”, avança.

Outro desenvolvimento que, segundo o sociólogo, contribuiu para o conflito laboral tem a ver com o surgimento de novas ocupações, especialmente as relacionadas com a educação dos filhos e cuidados com os idosos. Estes trabalhadores são mal pagos e precários, não obstante “a retórica do Governo sobre a indispensabilidade e a virtude moral do seu trabalho”, vinca Wolfgang Streeck.

A somar a estes fatores surge a forma como o patronato se serve do progresso tecnológico para exercer pressão sobre ocupações anteriormente privilegiadas, como pilotos de avião, controladores de tráfego aéreo e maquinistas, pondo em causa direitos já conquistados.

“Tudo isto resulta numa ampla erosão das normas salariais formais e informais que por várias décadas mantiveram a paz no capitalismo alemão”, salienta o sociólogo económico alemão.

A par da deterioração das condições de trabalho, da perda de rendimentos e dos cortes nos serviços públicos e prestações sociais a que é sujeita a maioria das famílias, os salários dos gestores de topo crescem “especialmente, mas não exclusivamente, na área financeira”, refere Streeck, que assinala um aumento das desigualdades salariais.

“O sistema de fixação dos salários alemã está a aproximar-se de uma condição de ausência de normas, semelhante ao que a Grã-Bretanha experimentou na década de 1970. À época, o sociólogo John Goldthorpe Oxford diagnosticou um estado de anomia laboral: uma ausência fundamental de consenso sobre os princípios legítimos de distribuição entre capital e trabalho, bem como entre grupos de trabalhadores”, afirma.

Segundo Wolfgang Streeck, “o governo alemão, com o seu ministro do Trabalho social-democrata, está a tentar suprimir a vaga de conflitos laborais reduzindo o direito de organização e de greve, ilegalizando as greves de sindicatos setoriais - como os maquinistas”.

“Mas isso irá falhar, muito provavelmente no Tribunal Constitucional e, certamente, na prática, num mundo em que a estrutura das empresas e sectores não é mais favorável ao sindicalismo que se baseia na doutrina 'um local de trabalho, um sindicato', e onde os maquinistas, pilotos e outros vão sentir-se no direito de se defender, se necessário, entrando em greve, diga a lei o que disser”, remata.

Esquerda.net – foto der dennis. flickr

ÚLTIMOS DIAS DA GRÉCIA NA ZONA EURO? - opinião




O mês de junho chegou, e com ele, a urgência de um acordo entre Atenas e credores internacionais. Se o premiê Tsipras não agir em vez de falar, novas eleições são a solução, opina o correspondente da DW Bernd Riegert.

O mês de junho pode ser o último da Grécia na zona do euro, caso a coalizão eurocética de esquerda e direita – formada pelo Syriza, do premiê Alexis Tsipras, e o partido nacionalista Gregos Independentes – não se mexer.

Novamente Atenas está diante de prazos para pagamentos ao Fundo Monetário Internacional (FMI)e, mais uma vez, ouvimos o concerto cacofônico de vozes dos ministros, em que ressoam tanto uma falência próxima quanto um iminente acordo nas negociações com os credores internacionais. É difícil manter uma visão geral sobre como realmente está a situação das finanças gregas. Pelo que parece, o governo radical na Grécia também não sabe.

Em vez de impulsionar as negociações com o chamado "grupo de Bruxelas" com propostas concretas e efeitos calculáveis, Tsipras concentra sua energia na preventiva atribuição de culpados. Ele fareja o trabalho de um bando neoliberal de conspiradores na União Europeia (UE), que sobrecarrega a Grécia com exigências absurdas. Absurdas são unicamente as teses ideológicas que Tsipras expressou ao jornal francês Le Monde. Culpados seriam somente os maus europeus e o FMI, lamentou o premiê grego.

Deve-se lembrar que a Grécia concordou, em 20 de fevereiro, em apresentar dentro de poucos dias uma lista concreta de reformas, que tornariam possível que novos recursos de resgate fossem desembolsados em abril. Até hoje, a lista não foi apresentada.

O governo grego apenas enumerou uma série de reestruturações administrativas em órgãos fiscais e uma reforma sobre o Imposto sobre o Valor Agregado. Essas propostas visam à ampliação da base tributária e a um aumento da receita fiscal. Isso já é um começo, mas as propostas são insuficientes para reequilibrar o orçamento público e revitalizar a economia grega.

O desafortunado ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, desperdiçou muito tempo precioso, principalmente com sua autoafirmação. Agora o tempo está se esgotando, pois o prazo para novas ajudas à Grécia expira em 30 de junho. Seria necessário um acordo com os credores no mais tardar até meados de junho, a fim de manter tecnicamente viável novos pagamentos.

Esse acordo, no entanto, ainda requer a aprovação dos ministros das Finanças do Eurogrupo e de vários parlamentares dos Estados-membros da UE. O Parlamento grego teria de, ao menos, encaminhar algumas reformas legislativas, o que não deve ser fácil, considerando as brigas internas na coligação da esquerda radical Syriza.

Mas o que Tsipras está fazendo? Ao invés de se ater aos processos cristalinos no Eurogrupo, ele se esforça no aconselhamento por telefone. Quase que diariamente, ele faz uma ligação à chanceler federal alemã, Angela Merkel, e ao presidente francês, François Hollande. Ele quer alcançar uma "solução política" de alto nível.

Porém, em várias cúpulas europeias foi deixado claro que não falta vontade política para manter a Grécia na zona do euro. Simplesmente não há o compromisso claro por parte de Atenas de que cumprirá as condições de novos empréstimos.

Obviamente, é preciso conversar e negociar sobre o curso de reestruturação da Grécia, também nos níveis mais altos da política. Mas, primeiramente – e isso Tsipras deveria saber – a aguda crise financeira no país, que pode excluir os gregos da zona do euro em poucas semanas, precisa ser solucionada. Algo para o qual até mesmo os ministros das Finanças do G7 já alertaram, principalmente o dos Estados Unidos.

A Grécia precisa de ar para respirar. Tsipras pode se encontrar com Merkel, Hollande e o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, quantas vezes quiser, mas decisões são tomadas pelo Eurogrupo, por todos os 19 Estados e por unanimidade.

A culpa pela cada vez mais grave crise financeira na Grécia é, em grande parte, da atual liderança em Atenas, que aparentemente não consegue ou não sabe como lidar melhor com a situação. Desde o começo do mandato, em fevereiro, a economia grega voltou à recessão, da qual ela tinha acabado de sair. Após a dedução de dívidas, o excedente orçamental se transformou num déficit orçamentário. A confiança dos investidores está completamente abalada. O número de reservas feitas por turistas diminuiu.

A fim de permanecer solvente, o governo junta os últimos recursos de seguradoras públicas, universidades e hospitais. Uma conta de reserva do FMI foi usada para outros fins. Os bancos gregos estão sendo "alimentados a soro" pelo Banco Central Europeu (BCE), enquanto poupadores e investidores retiram dinheiro dos bancos e o despacham ao exterior ou colocam debaixo de travesseiros. Assim não tem como continuar.

Grécia e Europa precisam de decisões corajosas do governo em Atenas. Ou o governo grego terá que dar espaço a uma nova equipe capaz de realizar um trabalho melhor. Até então, a atuação do Syriza foi um fracasso. Mesmo que a Grécia consiga, de última hora, se manter na zona do euro, não está claro o que pode vir depois de junho.

A confiança no governo da Grécia está sustentavelmente comprometida entre europeus e investidores. Quem negociará e financiará o certamente necessário terceiro pacote de resgate financeiro para a Grécia a partir de julho?

Atribuições de culpa em artigos de jornais e chamadas telefônicas simultâneas com outros chefes de governo, que por outro lado pertencem aos "conspiradores neoliberais", não servem à causa. A Grécia merece algo melhor. Tsipras precisa finalmente agir em vez de falar. Se ele não conseguir, novas eleições são a melhor solução.

Bernd Riegert – Deutsche Welle, opinião

GRÉCIA APRESENTA PLANO DE REFORMAS A CREDORES




Sem dar detalhes, Tsipras afirma que lista de medidas de austeridade apresentada a FMI, Comissão Europeia e BCE contém concessões difíceis para os gregos. Com proposta, Atenas esperar desbloquear nova parcela de resgate.

O governo grego anunciou nesta terça-feira (02/06) ter apresentado aos credores – Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia – um abrangente plano de reformas, que seria suficiente para desbloquear mais 7,2 bilhões de euros do pacote de resgate.

"Apresentamos um plano realista para que a Grécia saia da crise. Um plano realista, cuja aceitação por parte das instituições, nossos credores e os nossos parceiros na Europa vai marcar o fim do cenário de divisões na Europa", disse Tsipras a repórteres. "Fica claro agora que a decisão sobre se eles querem se ajustar ao realismo [...] cabe à liderança política da Europa."

Na madrugada de segunda para esta terça-feira, um encontro de alto nível reuniu em Berlim os líderes das duas maiores economias da Europa e os chefes do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Central Europeu (BCE) e da Comissão Europeia, para discutir a futura ajuda ao país endividado.

Inicialmente, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, receberia apenas o presidente francês, François Hollande, e o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, para o encontro. Mas, já no final da noite, juntaram-se a eles o chefe do BCE, Mario Draghi, e a do FMI, Christine Lagarde.

Com base em fontes presentes às negociações, o jornal alemão Welt escreveu que os credores teriam feito uma "última oferta" a Atenas. O comissário europeu da Economia, Pierre Moscovici, afirmou nesta terça-feira que houve "sérios progressos" no encontro. Mas que, para se chegar a um consenso, ainda seria preciso "caminhar um bom trecho".

Não ficou claro de imediato se o documento apresentado por Atenas abre algum espaço para as principais questões pendentes sobre reformas do mercado de trabalho e na previdência, metas fiscais e a dimensão da máquina pública, questões que permearam os últimos quatro meses de duras negociações.

Uma porta-voz da Comissão Europeia disse que muitos documentos estão sendo trocados entre os negociadores, o que "já é um bom sinal". "As conversações com a Grécia continuam e nós não chegamos lá ainda", afirmou.

Previsão de mês difícil

Até a sexta-feira, Atenas terá que desembolsar uma primeira parcela de 300 milhões de euros ao FMI. No total, deverá devolver, só neste mês, cerca de 1,6 bilhão de euros aos credores. Caso não consiga, teme-se o início de um efeito dominó, que, num caso extremo, poderia levar a Grécia a sair da zona do euro.

Apesar de tudo indicar que há fundos para devolver 300 milhões, há sérias dúvidas sobre a capacidade de Atenas de arcar com as parcelas restantes e a despesa estatal, que soma mensalmente 2,8 bilhões de euros, entre salários, pensões e seguridade social.

A Comissão Europeia insiste que não há uma data limite para conseguir um acordo e que o único prazo estabelecido é 30 de junho, quando expira o prolongamento de quatro meses do resgate.

Caso haja acordo, seriam abertas as portas à pronta convocação de uma reunião do Eurogrupo, onde se poderia aprovar o desembolso para a Grécia, pelo menos parcial, dos 7,2 bilhões de euros pendentes do resgate.

Deutsche Welle - CA/ap/rtr

Sete pontos para entender o que está acontecendo nas relações entre Cuba e EUA



Sergio Alejandro Gómez – Granma, Washington – Opera Mundi

Após restabelecimento de relações, “desafio maior é construir convivência civilizada baseada no respeito às profundas diferenças”, diz jornalista

Passaram-se cinco meses desde que os presidentes Barack Obama e Raúl Castro anunciaram, no último 17 de dezembro, sua intenção de abrir um novo capítulo de relações entre Estados Unidos e Cuba.

Depois de um encontro histórico entre os dois governantes na VII Cúpula das Américas, começou em Washington a terceira rodada de debates de funcionários para avançar no restabelecimento de relações diplomáticas e na reabertura de embaixadas.

Içar as bandeiras das missões de Washington e Havana já seria um marco entre as duas nações vizinhas que careceram de laços formais durante mais de meio século. No entanto, constituiria somente o início de uma etapa muito maior e complexa.

Os mal-entendidos e também as manipulações intencionadas têm acompanhado esse processo desde o início. O Granma compartilha com seus leitores sete pontos para ajudar a entender a dimensão do que está acontecendo entre Havana e Washington e a etapa que vem pela frente:

1. Os presidentes tomaram uma decisão, o que falta é colocá-la em prática

No dia 17 de dezembro, entre outras notícias importantes para os dois povos, Raúl Castro e Barack Obama anunciaram simultaneamente que decidiram restabelecer relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos, rompidas há mais de meio século.

Agora, a vontade dos presidentes deve passar pelos canais oficiais de cada país para materializar esse passo.

As delegações que se reuniram em Havana e Washington em várias rodadas de debates e encontros técnicos, estão levando esse processo adiante.

A importância dessas reuniões é que estabelecerão as bases sobre as quais vão funcionar os elos diplomáticos, para que não se volte a cometer erros do passado.

2. Nenhuma das partes condicionou o restabelecimento de relações

Uma das principais linhas de ataque midiático contra os debates tem sido falar de “condições” entre as partes.

Tanto os diplomatas cubanos, como os estadunidenses, têm sido claros sobre o fato de o ambiente de trabalho ser de respeito e profissionalismo, em um clima de reciprocidade e sem interferências.

O que Cuba fez desde o começo foi apontar aspectos que precisariam ser solucionados antes de dar um passo: o final de sua injusta inclusão na lista de países terroristas, que ocorreu na última semana, e a situação de sua missão em Washington, que não tem serviços bancários há mais de um ano.

Entretanto, os funcionários estadunidenses têm falado sobre a mobilidade de seus representantes na futura embaixada de Havana (a dos diplomatas cubanos também está limitada a Washington), assim como o acesso dos cubanos às suas instalações.

A esse respeito, Cuba insistiu na importância de cumprir com as convenções de Viena sobre Relações Diplomáticas e Consulares, que estabelecem a importância de cumprir as leis do país anfitrião e não se intrometer em assuntos internos.

Uma missão deve poder se relacionar com as pessoas do país anfitrião, mas respeitando preceitos e normas, explicou recentemente um diplomata cubano.

3. O restabelecimento de relações não é o mesmo que a normalização de relações

Confundir o processo de restabelecimento dos elos diplomáticos, que é muito maior e mais complexo, com o de normalização de relações, é outro erro comum.

Depois de contar com embaixadas em ambas as capitais, se abriria a etapa da busca completa de “normalidade” entre os dois países, que compartilham uma turbulenta história bilateral.

As autoridades cubanas apontaram várias questões que consideram indispensáveis para falar de uma normalização: a suspensão do bloqueio, a devolução do território da base naval de Guantánamo, o fim das transmissões ilegais de rádio e televisão, o cancelamento dos planos de mudança de regime e a compensação pelos danos causados ao povo cubano durante mais de meio século de agressões, entre outros.

Nunca se disse que esses pontos precisam ser solucionados para que as embaixadas fossem abertas, como alguns meios de comunicação têm tentado fazer crer.

Até as autoridades estadunidenses reconheceram a posição cubana.

“Relações completamente normais não incluem um embargo econômico, não incluem sanções econômicas”, disse recentemente uma funcionária do Departamento de Estados dos Estados Unidos, que pediu anonimato.

Sem dúvida, esta nova etapa inclui a discussão de outros assuntos de interesse para ambas as nações. Mas Cuba tem sido clara sobre não ser possível pedir que se “dê algo em troca”. Nosso país não aplica essas medidas aos Estados Unidos, nem tem bases militares em território norte-americano, nem promove [nos EUA] uma mudança de regime.

Da mesma forma, Cuba disse que não se pode exigir que tenha de renunciar a seus ideais de independência e justiça social, nem afrouxar nenhum de seus princípios, nem ceder um milímetro na defesa da soberania nacional.

4. A mudança de política de Washington é um triunfo do povo cubano e da integração latino-americana

Não pareceríamos chauvinistas ao reconhecer, como fez a maioria da comunidade internacional, que o fato de que Cuba ter chegado a esse ponto é resultado de quase meio século de heroica luta e fidelidade a seus princípios.

Da mesma forma, não se poderia pensar em mudanças de política dessa proposta sem entender a nova época que vive a nossa região, e a sólida e valente reivindicação dos governos e povos da Celac (Comunidade e Estados Latino-americanos e Caribenhos).

Na II Cúpula da Celac em Havana foi assinado um documento que não tem precedente na história do hemisfério: a declaração da região como Zona de Paz, a mesma que reconhece “o direito alienável de todo Estado a eleger seu sistema político, econômico, social e cultural, como condição essencial para garantir a convivência pacífica entre as nações”.

5. Os Estados Unidos mudam os métodos, mas não os objetivos

Uma das grandes perguntas que surgiram nesse processo é em que consiste e qual é o alcance da mudança de política dos Estados Unidos. A questão não tem uma resposta fácil e talvez seja muito cedo para poder fazer uma análise cabal.

Quando o presidente Obama fez seu anúncio, ele disse que depois de 50 anos de uma política fracassada, era hora de tentar algo novo.

“Estamos caminhando em direção ao futuro, deixaremos para trás as coisas que tornaram o passado complicado”, disse Obama no Panamá, em relação a Cuba. No entanto, em vários momentos, as autoridades estadunidenses disseram que os métodos mudam, mas os objetivos não. Nesses objetivos está, desde 1 de janeiro de 1959, a derrubada da Revolução.

“Em Cuba, não estamos no negócio da mudança de regime”, afirmou Obama durante a VII Cúpula das Américas, em uma declaração que encheu de esperança muitas pessoas.

No entanto, ainda milhões de dólares são destinados publicamente a pagar a subversão em Cuba, ao que se somam outros fundos que não são declarados. Por sua vez, as autoridades cubanas nunca demonstraram ingenuidade. “Ninguém poderia sonhar que a nova política que se anuncia aceite a existência de uma Revolução socialista a 90 milhas da Flórida”, disse Raúl em seu discurso durante a III Cúpula da Celac.

6. Obama pode fazer muito mais

Obama somou aos anúncios de 17 dezembro um grupo de medidas que modificaram uma pequena parte da aplicação do bloqueio, mas essa medida de agressão se mantém de pé.

Cuba reconheceu a valente posição de Obama de se envolver em um debate com o Congresso para colocar fim à medida, algo que nenhum outro presidente estadunidense tinha feito.

No entanto, é falsa e matriz midiática de que o presidente “fez tudo o que ele pôde”.

Obama poderia utilizar com determinação suas amplas faculdades executivas para modificar substancialmente a aplicação do bloqueio, o que está em suas mãos fazer, ainda que sem a decisão do Congresso.

Poderia permitir, por exemplo, em outros setores da economia, tudo que autorizou no âmbito das telecomunicações, com o evidente objetivo de [exercer] influência política em Cuba.

7. No que diz respeito à soberania, não há temas tabus

Uma das lições dos últimos cinco meses – e talvez também do ano e meio de diálogos secretos que os antecederam – é que Cuba e Estados Unidos podem abordar qualquer assunto sempre que seja de forma respeitosa.

Cuba mostrou sua vontade de abordar inclusive aqueles temas que mais foram utilizados e manipulados para atacar nosso país, como democracia, liberdade de expressão e direitos humanos, assuntos sobre os quais tem muito para mostrar e opinar.

Talvez o ponto mais importante de todos, e o que resume esse artigo, é que o desafio maior entre Cuba e Estados Unidos é construir uma convivência civilizada baseada no respeito às suas profundas diferenças.

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Bilbao e Barcelona, entre a opressão espanhola e o direito de protestar



Raphael Tsavkko Garcia, Bilbao – Opera Mundi, opinião

Líderes espanhóis querem punir clubes por vaias de torcedores bascos e catalães contra hino espanhol tocado na final da Copa do Rei

A final da Copa do Rei 2015 jogada entre Athletic Club de Bilbao e Barcelona, partida vencida pelo segundo por 3 a 1 e um show de Lionel Messi, esteve envolta em polêmicas fora do campo antes mesmo de começar.

Athletic e Barça são dois clubes com amplo histórico nacionalista, representam respectivamente o País Basco e a Catalunha (ou ao menos passam esta imagem para quem vê de fora de suas respectivas regiões, dado que não são os únicos clubes relevantes locais, pese serem os mais famosos e mais bem sucedidos) e chegam a representar mesmo a identidade de suas nações.

O Athletic é famoso por só aceitar jogadores nascidos no País Basco ou descendentes que tenham treinado em categorias de base de clubes da região, o que já chegou a lhes valer acusações injustas até de racismo. Dizia-se que não aceitavam jogadores negros, porém hoje um dos titulares do time é Iñaki Williams, uma das grandes promessas do clube, jogador basco filho de um ganês e uma liberiana.

Ambos os clubes pediram à Federação Espanhola de Futebol para não usar nas mangas de seus uniformes a bandeira espanhola e sim a imagem da taça pela qual competiam e sabendo da contrariedade dos torcedores de ambos os clubes pelos símbolos espanhóis, o presidente do PNV (Partido Nacionalista Basco, atualmente no poder na região) chegou a pedir que os hinos basco e catalão fossem também tocados no estádio da final, o Camp Nou, do Barcelona. A organização do torneio não atendeu a solicitação, buscando baixar um pouco a tensão contra o hino espanhol.

Diversas organizações nacionalistas convocaram uma vaia contra o hino espanhol e tudo que ele representa para as minorias nacionais na Espanha: opressão. Entre 10 e 15 mil apitos foram distribuídos por estas organizações para a torcida que, além de apitar, gritou e vaiou o hino, tornando impossível que este fosse escutado.  Enquanto isso, a rede de TV que transmitia o evento tentava disfarçar o ocorrido, cortando rapidamente para os comerciais e dando a impressão de que reduzia artificialmente o som da torcida e elevava o do hino.

Na área VIP, fotos de um Rei Felipe contrariado, de cara fechada, circulavam pela internet ao lado da imagem de um contido, mas divertido sorriso de Artur Mas, presidente nacionalista da Generalitat, o governo catalão.

Quase 100 mil torcedores formaram um mosaico com as cores do Barcelona e da Catalunha por um lado, e com as cores do Athletic e uma Ikurriña (bandeira basca) gigante do outro. Novamente foi exibida uma imensa faixa com o escudo do Athletic, um leão (seu mascote) e a frase em euskera "Jo Ta Ke Irabazi Arte", que em português seria algo como "Sem parar, até a vitória", mas que calha ser, também, um grito de guerra do movimento nacionalista de esquerda quando este toma as ruas em seus imensos protestos.

Em linhas gerais, uma coincidência: apesar de ser usado por grupos políticos que a Espanha acusa de ter ligações com o ETA, a frase é um grito relativamente comum na língua dos bascos.

Logo, porém, a mídia - especialmente a de extrema-direita, como o periódico ABC - começou com provocações, ilações e acusações de uma suposta ligação da torcida do Athletic com o "terrorismo".

Imediatamente começaram as piadas, os memes, provocações e lembranças de que, mesmo com mais de 100 mil corpos em valas comuns e sem identificação pós-Guerra Civil e Franquismo, a imprensa espanhola se preocupa com o que grita uma torcida de futebol ou com um hino. Imprensa que, no caso do ABC e de outras, manteve fortes ligações com o Franquismo e mantém com o PP, hoje no poder, partido que é herdeiro de Franco e de seus aliados.

O vice-secretário-geral do PP, Vicente Floriano, chegou a declarar que "a liberdade de expressão não pode permitir ataques a símbolos nacionais", deixando claro que "democracia" é realmente incompreensível para franquistas e simpatizantes.

Nas redes sociais milhares de mensagens de ódio contra bascos e catalães foram enviadas, tuidadas e postadas, algumas inclusive com ameaças de cunho terrorista. Estes ataques dificilmente serão investigados, já que no raciocínio torpe das autoridades espanholas, só há violência se for cometida pelo oprimido, jamais pelo opressor.

Na Espanha, vaiar o hino é um "ataque à democracia", ainda que isto signifique duas nações sob controle, torturando cidadãos, censurando e fechando jornais e mídias, ilegalizando partidos e enviando políticos e ativistas para a cadeia por divergir e lutar, criando um clima de terror permanente.

Líderes espanhóis querem punir os dois clubes, além de buscar bodes expiatórios entre a torcida e movimentos que ajudaram a organizar as vaias, em clara demonstração de que ainda não conseguiram se acostumar com o conceito de democracia após décadas de cruel ditadura.

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O CASTIGO DE JULIAN ASSANGE: CONDENADO SEM TER SIDO ACUSADO




Há cerca de três anos que Julian Assange está preso na embaixada, sem sequer ter a possibilidade de ver a luz durante uma hora por dia, um direito de que goza a maioria dos prisioneiros.


Escondido numa rua lateral de um dos mais refinados bairros londrinos, em frente do enorme edifício dos armazéns Harrods, ergue-se um edifício de apartamentos da época vitoriana onde se encontra a Embaixada do Equador. Julian Assange, o fundador e redator responsável da Wikileaks, o site que divulgou documentos secretos, entrou na embaixada a 19 de junho de 2012 e desde então não pôs um pé na rua.

O Equador deu-lhe asilo político, mas o Reino Unido nega-se a conceder-lhe o visto para sair do país e quer extraditá-lo para a Suécia, onde teria de comparecer perante um promotor acusado de denúncias de abuso sexual, apesar de nunca terem sido apresentadas acusações formais contra ele. Há cerca de três anos que está preso na embaixada, sem sequer ter a possibilidade de ver a luz durante uma hora por dia, um direito de que goza a maioria dos prisioneiros. Durante os dois anos anteriores ao seu refúgio na embaixada, Assange esteve preso ou em prisão domiciliária na Inglaterra, tudo isto sem que tenha sido apresentada uma acusação contra ele. Quando esta semana viajei para Londres para o entrevistar na embaixada, Assange reafirmou-me a sua convicção de que esta fase prévia ao julgamento está a ser utilizada como castigo e também como elemento dissuasor. Além disso, sustentou que a Suécia está a atuar como substituta dos Estados Unidos, que deseja vê-lo atrás das grades para impedir o trabalho da Wikileaks.

Não obstante, a Wikileaks continua a funcionar e a publicar informação sem precedentes sobre as condições possivelmente catastróficas em que se encontram os submarinos de armas nucleares da Grã-Bretanha, ou capítulos inteiros sobre o secreto e extremamente polémico Acordo Estratégico Transpacífico de Associação Económica (TPP, na sigla em inglês), entre outros. Foi a partir da embaixada do Equador em Londres que Assange ajudou o ex-contratado da Agência de Segurança Nacional Edward Snowden a escapar para Hong Kong, depois de ter publicado milhões de documentos em que se detalhavam os programas de vigilância do Governo dos Estados Unidos. Quando se dirigia de Hong Kong para a América Latina, onde solicitaria asilo político, Snowden ficou barrado no aeroporto de Moscovo, depois de os Estados Unidos terem anulado o seu passaporte, após o que a Rússia lhe deu asilo político temporário.

Quando foram divulgadas as denúncias de abuso sexual contra Assange em finais de 2010, o fundador da Wikileaks ficou em Estocolmo para ser interrogado pelo promotor, que depois retiraria as acusações. Assange obteve autorização para sair da Suécia. Quando já estava no Reino Unido, uma segunda promotora, Marianne Ny, voltou a apresentar as acusações contra Assange. A promotora teve tempo de o interrogar nestes anos, quer pessoalmente em Londres ou mediante vídeo-conferência. No entanto, fez questão de que Assange fosse extraditado à força. Finalmente, um tribunal sueco instou-a a que viajasse a Londres. A promotora assinalou que se dirigiria lá para o interrogar, mas até ao momento não especificou quando.

Julian Assange, os seus advogados e os seus apoiantes estão preocupados que, sendo extraditado, a Suécia o entregue aos Estados Unidos, onde tudo parece indicar que está em marcha uma investigação judicial secreta contra ele e contra a Wikileaks. “Julian já teria ido à Suécia há tempo se a Suécia lhe tivesse garantido que não o entregaria aos Estados Unidos para ser julgado por acusações de espionagem”, afirmou o advogado de Assange Michael Ratner, presidente emérito do Centro de Direitos Constitucionais. Ratner explicou: “A Suécia nunca esteve disposta a dar essa garantia, e sabemos que tem muito má reputação quanto a isso já que é um país conhecido por cumprir com os pedidos dos Estados Unidos, seja o de enviar pessoas da Suécia para o Egito, para serem torturadas, ou o de deportar pessoas com asilo político, rasgando o seu compromisso de não deportação”.

O Vice-presidente dos Estados Unidos Joe Biden qualificou Assange de terrorista de alta tecnologia”, enquanto representantes eleitos e comentadores políticos de ambos os partidos têm expressado publicamente que Assange deveria ser assassinado. A este respeito Assange disse-me na embaixada: “A investigação dos Estados Unidos contra a Wikileaks por denúncias penais é considerada a maior investigação jamais realizada contra um meio de comunicação. É extraterritorial. Está a lançar novos precedentes sobre a capacidade do Governo dos Estados Unidos perseguir os diretores de qualquer meio de comunicação da Europa ou do resto do mundo e tentar julgá-los. Eles dizem que os delitos cometidos são conspiração, conspiração para cometer espionagem, violação da Lei de Abuso e Fraude Informática, pirataria informática, apropriação indevida e roubo de documentos do governo”. A serem confirmadas as acusações de espionagem poderiam levar Assange a ser condenado à pena de morte. A Suécia, assim como a maioria dos países europeus, não pode extraditar uma pessoa que considera que poderá ser condenada à pena capital.

Todos os possíveis delitos pelos quais Assange é procurado na Suécia, exceto um, prescreverão em agosto. O Supremo Tribunal sueco negou-se a anular as ordens de detenção apresentadas contra ele no final de 2010, numa decisão de 4 votos a favor e um contra. O magistrado Svante Johansson, o juiz que votou contra, disse que a detenção “de facto” de Assange “viola o princípio da proporcionalidade”. Sentado à minha frente na sala de conferências da pequena embaixada que durante os últimos três anos tem sido o seu lar, o seu refúgio e o seu cárcere, Assange disse-me: “Como acusados não temos direitos uma vez que ainda não se abriu um processo formal. Não há acusação, não há julgamento, não há possibilidade de defesa, nem sequer o direito de aceder à documentação, porque não és nem sequer arguido”. O tom pálido da pele de Julian Assange depois de ter passado anos sem ver a luz do sol combina com a cor do seu cabelo, prematuramente branco. No entanto, a sua vontade permanece inquebrantável e os documentos secretos que inicialmente se propôs publicar quando fundou a Wikileaks, há quase dez anos, continuam a ser divulgados.

Esquerda.net

Artigo publicado em Democracy Now em 28 de maio de 2015. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna. Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol para Democracy Now. Tradução para português de Carlos Santos para Esquerda.net

Amy Goodman - Co-fundadora da rádio Democracy Now, jornalista norte-americana e escritora.

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