quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Moçambique - Eleições: FRELIMO dá nota positiva, MDM quer repetição...




... e RENAMO quer negociações para saída do impasse

Enquanto o apuramento dos resultados prossegue, o nervosismo aumenta. Cada um dos três principais partidos reage à sua maneira. A população também começa a sair à rua, em tom de protesto contra supostas irregularidades.

Em Moçambique, os resultados das eleições, continuam a ser divulgados. A Comissão Nacional de Eleições (CNE) concluiu esta quinta-feira (23.10) o apuramento em todas as 11 províncias, mas ainda não foram divulgados dados oficiais. A lei prevê que o resultado oficial, a nível nacional, seja apresentado - o mais tardar - 15 dias depois do dia das eleições, portanto no final do corrente mês de outubro.

População sai às ruas na província de Manica

Na cidade de Chimoio, capital da província de Manica, simpatizantes da RENAMO manifestaram-se, hoje à tarde (23.10), mostrando o seu agrado pela vitória tangencial de Afonso Dhlakama na província, mas também algum desagrado pelas irregularidades que terão beneficiado o candidato da FRELIMO, "aqui e acolá". Nesta província do interior o candidato da RENAMO, Afonso Dhlakama terá ficado à frente do candidato da FRELIMO, Filipe Nyusi. Dhlakama terá, nomeadamente, conquistado 48,33 por cento dos votos, Nyusi 47,91 por cento. E é essa vitória que os populares quiseram festejar. Ao mesmo tempo queriam manifestar-se contra alegados casos de favorecimento do candidato do partido no poder. Sem irregularidades a vitória da RENAMO, na cidade de Chimoio teria sido maior ainda, afirmam.

A polícia regular e a Força de Intervenção Rápida (FIR), acorreram ao local da manifestação, alegadamente para repôr a ordem. No entanto, não há registo de ocorrência de actos de grande violência. O comandante da Polícia na cidade de Chimoio afirmou que os seus homens tiveram que "repôr a ordem". A polícia apelou à população no sentido de se evitar a violência e destruição de bens e pessoas: "Isso estaremos a proibir uma vez para sempre!"

A situação está, pois, longe de estar calma, sobretudo no centro e no norte do país, agora que surgem cada vez mais resultados e também relatos de irregularidades.

Apuramento Provincial dá vitória à FRELIMO e ao candidato Nyusi

Falando de resultados: segundo os dados hoje (23.10) divulgados, a Frelimo e o seu candidato presidencial, Filipe Nyusi, terão vencido as eleições gerais moçambicanas. Os últimos números disponíveis rezam que 57 por cento dos eleitores moçambicanos terão escolhido o candidato da FRELIMO como futuro presidente do país. O candidato da RENAMO, Afonso Dhlakama, terá conquistado 36 por cento dos votos, enquanto que o candidato do MDM recolheu 6 por cento.

Quanto à composição da futura Assembleia da República, a FRELIMO vai ter o maior grupo parlamentar: cerca de 140 assentos, o que corresponde a 57 por cento dos votos. A RENAMO terá 89 assentos, o que corresponde a 34 por cento dos votos. E o MDM terá apenas 19 assentos o que corresponde a 9 por cento dos votos.

MDM: As eleições defraudaram os moçambicanos e devem ser repetidas

O porta-voz do Movimento Democrático de Moçambique, MDM, Sande Carmona, em conversa hoje à tarde (23.10) com a DW-África, voltou a afirmar que "estas eleições não refletem a vontade expressa pelo povo nas urnas, no dia 15 de outubro. Estas eleições apenas defraudaram mais uma vez as expetativas e o futuro do povo moçambicano."

Sande Carmona recorda que o partido MDM ainda está a estudar a melhor maneira de saír deste impasse. Por isso afirma a título pessoal: "Essas eleições por mim - Sande Carmona - deveriam ser anuladas. Devia-se formar um governo de transição em Moçambique para que não haja candidatos privilegiados."

Um olhar mais profundo para as diferentes províncias evidencia diferenças bastante grandes entre o norte, o centro e o sul do país: no sul, Nyusi ganhou com uma larga vantagem sobre os concorrrentes. No norte, mais precisamente em Nampula, o maior círculo eleitoral do país, Dhlakama ganhou as presidenciais, mas o partido RENAMO terá perdido nas parlamentares.

Os processos de contagem nas províncias do Centro e Norte do país, sobretudo em Sofala e na Zambézia, têm sido marcados por suspeitas de irregularidades, após a chefe de operações do STAE (Secretariado Técnico de Administração Eleitoral) na cidade da Beira ter sido detida por suspeita e falsificação de editais e de, na Zambézia, terem desaparecido dados dos apuramentos em pelo menos 13 mesas, correspondentes a 10,4 mil eleitores.

RENAMO: Queremos negociar como saír desta crise de roubalheira

O porta-voz da RENAMO, António Muchanga, também falou, esta tarde com a DW-África e fez o seguinte comentário: "Os números que estão a ser divulgados são resultados da contagem vergonhosa que já denunciamos em conferência de imprensa. Em Cabo Delgado há distritos em que o número de votos supera o número de pessas inscritas. Em Gaza há distritos onde a votação é de 99 por cento. Eles fizeram enchimentos, ultrapassaram a medida, faltou-lhes inteligência!"

Para o porta-voz da RENAMO a solução agora é negociar com a FRELIMO. Só em conjunto se poderá sair do impasse: "Nós já nos disponibilizámos para um diálogo sério com o governo para discutirmos sobre o melhor caminho para a saída desta crise de roubalheiras."

Os resultados - recorde-se - ainda não são oficiais. Nas palavras do porta-voz da FRELIMO, Damião José, o partido no poder aguarda "serenamente" o anúncio oficial dos resultados.

FRELIMO: Não vemos razão para contestar estas eleições

Como reage a FRELIMO ao facto dos dois maiores partidos da oposição terem exigido a repetição das eleições ou negociações sobre a saída do impasse? Damião José responde: "As posições desses dois partidos da oposição revelam falta de coerência, porque na altura em que o pacote eleitoral foi submetido à Assembleia da República, os três maiores partidos - a FRELIMO, a RENAMO e o MDM - aprovaram esse pacote eleitoral. E as eleições decorreram segundo os princípios democráticos constantes nesse pacote eleitoral."

Segundo o porta-voz, a FRELIMO não vê "nenhuma razão para contestação dos resultados que estão sendo anunciados pela Comissão Nacional de Eleições."

António Cascais – Deutsche Welle

Brasil: A crise da água em São Paulo, a ONU, as eleições e o tiro pela culatra do governador




Preocupado com as repercussões eleitorais, para o seu partido, da grave crise da água em São Paulo e na tentativa de desqualificar qualquer crítica a seu governo em relação ao tema, o governador Geraldo Alckmin enviou uma “dura” carta ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, queixando-se das análises e condutas da relatora especial da ONU para o direito à água, Catarina de Albuquerque, que visitou o Brasil em missão oficial no final do ano passado.

Alckmin questiona declarações feitas pela relatora à Folha de S. Paulo, em agosto deste ano, ocasião na qual esteve novamente no país, em visita não oficial, a convite da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (Assemae), da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental e de outras instituições, para participar de debates e aulas sobre o tema de sua especialidade – o direito humano à água.

Irritado com as posições da relatora, que questiona a atuação da Sabesp em relação à garantia deste direito para a população de São Paulo, o governador reclama que ela não conversou com a empresa em agosto para ouvir seus argumentos e que incorreu em grave erro ao dizer que as perdas de água em São Paulo são de 40% (e não de 31,2%!, depois corrigido pelo jornal, que reconheceu o erro do jornalista), e ainda afirma que a ONU não pode se manifestar em momentos eleitorais.

Tive a oportunidade de conhecer Catarina de Albuquerque, jurista portuguesa, durante meus dois mandatos como relatora da ONU para o direito à moradia, concluídos em junho deste ano. Neste período pude atestar a seriedade e independência com que Catarina desenvolve seu trabalho. Infelizmente, o governador Geraldo Alckmin demonstra que não conhece o papel de um relator especial, nem o funcionamento do sistema de procedimentos especiais, ao qual as relatorias da ONU estão vinculadas, nem muito menos o “código de conduta” que acusa Catarina Albuquerque de ter violado.

Ao enviar carta ao secretário-geral Ban Ki-moon, Alckmin ignora que a relatora não é funcionária da ONU e que não responde, portanto, ao seu comando central. Os relatores são especialistas eleitos pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU para desenvolver um trabalho com total independência, visitando países e realizando pesquisas temáticas na sua área de atuação. Esse trabalho é então apresentado ao Conselho de Direitos Humanos ou à Assembleia Geral, a partir de relatórios que trazem análises e recomendações.

Além disso, a relação entre o Conselho de Direitos Humanos e os países se dá por meio da representação diplomática dos países junto aos escritórios da ONU em Genebra ou em Nova York. O Estado de São Paulo não é um Estado Membro da ONU. Ao se dirigir diretamente ao órgão, o governador parece também ignorar as atribuições de cada instância de governo em sua relação com a ONU.

Quando da realização de sua visita oficial, em dezembro de 2013, Catarina cumpriu todos os requisitos exigidos: reuniu-se com órgãos governamentais das cidades que visitou, ouviu dirigentes de empresas de abastecimento de água e saneamento, inclusive a Sabesp, visitou municípios em diversos estados e escutou também representantes da sociedade civil. Só depois disso dirigiu-se à imprensa. Quando retornou ao país em agosto, concedeu entrevista à Folha, que queria comentar o seu relatório oficial, já então divulgado publicamente. Evidentemente, como a qualquer membro da imprensa, interessava ao jornalista relacionar o relatório (elaborado antes do colapso da água em São Paulo) à crise, assunto “quente” do momento.

A maior parte do conteúdo da entrevista é uma explicação, em termos mais diretos, do conteúdo de seu relatório oficial. O relatório, aliás, já apontava perigos de desabastecimento de água no país, citando dados da Agência Nacional de Águas (ANA), assim como a inadequação de posturas como a da Sabesp de não fornecer serviços de abastecimento de água e de saneamento em assentamentos informais. De acordo com o marco internacional dos direitos humanos, referência a partir da qual a relatora deve avaliar as situações que analisa, se o abastecimento de água é um direito humano, estamos diante, sim, da uma violação de um direito.

Na entrevista à Folha, Catarina afirma que o governo do Estado viola o direito humano à água ao priorizar a distribuição de recursos entre os acionistas da Sabesp – que tem capital aberto na bolsa de valores – em detrimento dos investimentos necessários à garantia de abastecimento de água para consumo atual e futuro da população. Isso deve ser prioridade em relação aos demais usos da água (industrial, agrícola, turismo), questão que ela também levanta em seu relatório oficial.

Finalmente, exatamente por ser independente, um relator não pode deixar de se manifestar “em função de uma conjuntura eleitoral”, como quer o governador, sob pena de, aí sim, pautar sua postura por cálculos eleitorais e não pelo marco dos direitos humanos, que devem ser cumpridos sempre: antes, durante, depois e – sobretudo – independentemente de eleições.

A tática “shoot the messenger” (mate o mensageiro) é velha conhecida dos relatores independentes: quando um governo não gosta das críticas que ouviu, procura desqualificar quem as formulou.

Infelizmente, para o governador, o tiro saiu pela culatra. Ao tentar desqualificar Catarina, sua atitude apenas chama mais atenção para um tema fundamental no debate público eleitoral deste momento: qual é a responsabilidade do Estado em relação aos direitos humanos dos cidadãos, dos quais o direito à água faz parte? A primazia da lógica de mercado na gestão de empresas que oferecem serviços públicos, como a Sabesp, permite a garantia de direitos? A proposta do não controle do Estado sobre os preços dos serviços públicos em geral – como a que defende o PSDB – pode garantir os direitos da população de acesso a estes serviços?

No debate eleitoral sobre a crise da água, a competência em fazer ou deixar de fazer obras é muito menos relevante do que esta questão de fundo: o papel do Estado na garantia de direitos. Questão que, claramente, também divide as propostas dos candidatos à presidência em campos opostos.

* Arquiteta e urbanista especializada em planejamento e gestão da terra urbana. É professora da FAUUSP e Relatora Especial para o Direito à Moradia do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Foi diretora de Planejamento da Cidade de São Paulo (1989-1992), Secretária Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades (2003-2007), e Coordenadora de Urbanismo do Instituto Pólis (1997-2002). Prestou consultoria a governos, organizações não governamentais e agências internacionais, como UN-Habitat, em política urbana e habitacional. É autora dos livros “A Cidade e a Lei” e “O que é Cidade”, além de vários artigos e publicações sobre a questão urbana. Colabora com o portal Yahoo, onde tem uma coluna quinzenal, e mantém o blog da Raquel Rolnik, onde escreve regularmente sobre questões urbanas.


Habitat, em Yahoo

Brasil – Eleições: Para deter a onda conservadora, é preciso derrotar Aécio




Mas limites da esquerda clássica ficaram claros nessa eleição. Saberemos ir além?

Antonio Martins - Colaborou Graziela Marcheti - Imagem: Henri Cartier-Bresson – em Outras Palavras

Houve quem estranhasse quando Outras Palavras estampou em manchete, no domingo do primeiro turno, um texto sobre um partido-movimento espanhol – o Podemos. Não foi premonitório, mas refletiu um desconforto. No momento em que o país vive um impasse; em que o projeto de mudanças suaves realizado com êxito dos últimos doze anos parece esgotado; em que perduram, latentes, o “espírito de junho” e a consciência de que é necessária uma rodada de transformações mais profundas – foi nesse exato instante que o sistema político produziu uma eleição inteiramente vazia de propostas e dirigida pelo marketing.

Os resultados apareceram horas mais tarde, logo após a apuração. Tornou-se evidente o risco de um retrocesso em múltiplos terrenos – político, social, cultural. Inimaginável há algumas semanas, a hipótese de uma vitória de Aécio Neves, com restauração do governo das velhas elites, é agora uma ameaça real. Na Câmara dos Deputados, PT e PCdoB, os principais partidos da esquerda histórica, perderam, respectivamente, 20% e 40% de suas antigas bancadas – ao todo, 24 parlamentares (enquanto o PSDB ganhou 11). Personagens claramente identificados com o conservadorismo moral, a ditadura militar e a repressão aos movimentos sociais – como Celso Russomano (SP), Jair Bolsonaro (RJ) ou Luiz Carlos Heinze (RS) – receberam enxurradas de votos. Quase metade dos deputados eleitos agora (248, entre 513) declara ter patrimônio milionário – eram 116, em 2002. Cresceram as bancadas do fundamentalismo religioso, dos ruralistas e “da bala” – a ponto de um estudo do Diap considerar que este é “o Congresso mais conservador do pós-1964”. No Senado, o passo atrás foi simbolizado pelas vitórias de José Serra sobre Eduardo Suplicy (SP) e de Lasier Martins sobre Olívio Dutra (RS). Na disputa presidencial, a maré pró-Aécio engolfou, como destacaGuilherme Boulos, redutos populares que tradicionalmente votam à esquerda: em São Paulo, por exemplo, estendeu-se a Campo Limpo, Itaquera, Ermelino Matarazzo e Sapopemba…

Até agora, a maior parte das avaliações procura apontar, como causa principal do fenômeno, um recuo do próprio eleitorado, uma “onda conservadora”. Em São Paulo, epicentro da ressaca, abundam os lamentos e as intenções declaradas de mudar-se de estado ou de país… Às vezes, o argumento ganha ares de sofisticação sociológica. Ao engordar a “nova classe média”, argumenta-se, os governos petistas teriam engrossado as fileiras do setor social que, ao fim das contas, desejará liquidá-los.

Mas falta a estas análises algo essencial. Inúmeros exemplos históricos desmentem a hipótese segundo a qual eleitores recém-emersos da pobreza tendem a votar à direita. A “onda conservadora” não era inevitável. Ela formou-se nas três semanas anteriores às urnas, como resultado de um erro tático grosseiro – porém revelador. Ao estabelecer como seu objetivo central a desconstrução de Marina Silva e de seus acenos a uma “nova política”, a campanha de Dilma Rousseff primeiro resgatou Aécio Neves; depois, presenteou-o com o enorme volume de votos antigovernistas gerado pela fadiga e impasse do projeto lulista. Deu asas à cobra. Escolheu como adversário de segundo turno o candidato que unifica e consolida o arco conservador. Imaginou que, ao fazê-lo, pudesse repetir o cenário dos três pleitos presidenciais anteriores – desconsiderando o desgaste do lulismo e o surgimento de uma nova geração de esquerda, com cujo imaginário não quis dialogar.

Erros tão primários nunca são fortuitos. O que levou a campanha de Dilma a demonizar Marina não foram as diversas contradições da candidata do PSB, mas o que ela trazia – ao menos em discurso – de transformador. O atual sistema político aprisiona e paralisa o lulismo, mas também o alimenta e conforta. Diante da possibilidade de ruptura, enunciada em junho de 2013 e relembrada por Marina, ainda que como eco longínquo, a reação foi de assombro e recuo.

Por isso, não bastará derrotar Aécio, em 26 de outubro – por importante que isso seja. A maré conservadora só será enfrentada quando surgirem formas de expressar, articular e mobilizar a vasta galáxia de movimentos e sensibilidades que buscam uma nova onda de mudanças mais profundas. É provável que estas formas não caibam no quadro partidário atual e é instigante examinar alternativas que têm surgido, diante de impasses semelhantes, em outras partes do mundo. Talvez o cenário brasileiro esteja maduro para partidos-movimento como o Podemos, na Espanha, ou o Syriza, na Grécia. É o que veremos, nas quatro matérias que dão sequência a este texto.

> Anatomia de um erro grosseiro
A campanha Dilma queixa-se com razão das ações golpistas de Aécio. Mas quem colocou no segundo turno o candidato das elites?

> Terá chegado a hora de um Podemos?
Por que pode ser útil, ao Brasil, a experiência dos novos partidos-movimento – que querem mudar o sistema político e têm apoio popular crescente

> Por um programa de mudanças profundas
Nas importantes mobilizações dos últimos anos, há esboço de novo projeto para o país. Não será hora de desenvolvê-lo?

> Contra o retrocesso, o “voto Duvivier”
Dilma será incapaz de realizar transformações de que país necessita. Mas esta é uma razão para elegê-la, evitando grande passo atrás…

[ou clique aqui para ler a série toda, num único texto]

Brasil – Eleições - Ibope: Dilma tem 49% e Aécio, 41% das intenções de voto



Mariana Tokarnia - Repórter da Agência Brasil  - Edição: Aécio Amado

A pesquisa Ibope divulgada hoje (23) mostra a candidata do PT, Dilma Rousseff, com 49% das intenções de votos. Aécio Neves, do PSDB, tem 41%. Votos brancos e nulos somam 7% e não sabem ou não responderam 3%. Na pesquisa anterior, divulgada no último dia 15, Aécio tinha 45% das intenções de voto e Dilma, 43%. Brancos e nulos somavam 7%. Os que não sabiam ou não responderam, 5%.

No caso dos votos válidos, ou seja,  excluídos brancos, nulos e os eleitores que se declaram indecisos, mesmo procedimento utilizado pela Justiça Eleitoral para divulgar o resultado oficial da eleição, de acordo com o instituto, Dilma aparece com 54% das intenções de votos e Aécio com 46% . Na pesquisa anterior, Aécio tinha 51% e Dilma, 49% dos votos válidos.

Quanto ao percentual de rejeição, de acordo com o Ibope, Aécio tem 42% e Dilma, 36%.

O Ibope ouviu 3.010 eleitores em 203 municípios, entre os dias 20 e 22 de outubro. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos. O nível de confiança é 95%. A pesquisa foi registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o protocolo BR-01168/2014. A pesquisa foi encomendada pela TV Globo e pelo jornal O Estado de S. Paulo.

No primeiro turno das eleições, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Dilma Rousseff obteve 41,59% dos votos válidos e Aécio Neves, 33,55%.

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Presidente da Guiné-Equatorial concede "amnistia geral" aos opositores no exílio



África 21, com agências

Malabo - O presidente equato-guineense, Teodoro Obiang Nguema, concedeu uma "amnistia geral" aos opositores no exílio na prespectiva de um diálogo nacional em Novembro, segundo um decreto presidencial, divulgado quarta-feira (22) pela televisão nacional, noticiou a AFP.

"A amnistia geral visa favorecer a participação dos opositores no exílio ou na diáspora ao diálogo político nacional que terá lugar na primeira quinzena de Novembro", explicou Obiang, após a assinatura do decreto.

Essa amnistia, a primeira do género, "significa um perdão geral, virar a página e esquecer o passado", precisou o presidente Obiang.

No poder desde 1979, o presidente do mais novo membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), apelou no início de Agosto a todos os opositores políticos do país, incluindo a oposição no exílio, a participar a um "diálogo nacional".

Várias figuras da oposição haviam condicionado a sua participação a uma amnistia geral para garantir o  regresso em segurança de dezenas de opositores exilados, nomeadamente em Espanha, antiga potência colonial.

O governo concedeu essa amnistia "para demonstrar à todos que a sua vontade política é firme" e permite "a todos os actores do processo político nacional de meter em execução os seus programas", declarou o chefe de Estado.

A medida será aplicada aos "opositores políticos no exílio condenados por delitos políticos e as pessoas cujo procedimento judicial esteja em curso", afirmou.

O número e a identidade das pessoas que deverão ser amnistiadas não foi revelado.

"Fala-se de manobras, o diálogo é manobras, mas manobras positivas, nós vamos negociar e discutir", acrescentou o presidente Obiang. "Não gostariamos que os nossos compatriotas passam toda a sua vida fora do país".

Segundo a televisão nacional, o governo compromete-se a custear os bilhetes de avião dos opositores para os voos Madrid-Malabo, assegurados pela companhia nacional Ceiba intercontinental. Angop

Filme confronta Indonésia com passado sangrento e a nós com a banalidade do mal



Carlos Fino – África 21, opinião

Perante realidade tão estranha, há um momento em que somos tentados a atribuir ao outro – no caso, o asiático – a origem do problema. Mas é o próprio Joshua Oppenheimer quem nos alerta, em entrevista, que o horror foi estimulado e apoiado pelo ocidente. Todos somos, portanto, responsáveis.

Realizado em 2012, candidato a um Óscar de melhor documentário e premiado em vários festivais internacionais, o filme The Act of Killing (O Acto de Matar), do norte-americano Joshua Oppenheimer, começa agora a ser largamente visto no mundo inteiro e está a provocar na Indonésia um movimento de revisão do seu passado sangrento.

Os factos remontam aos anos 1965-1966, quando o então presidente Sukarno, líder anti-colonialista e inspirador do movimento dos não-alinhados, foi afastado por um golpe militar apoiado pelos Estados Unidos.

Seguiu-se uma violenta onda de repressão em larga escala que levou, em menos de um ano, ao assassinato sumário de mais de um milhão de pessoas – membros do partido comunista, sindicalistas, professores, intelectuais, chineses, javaneses... -  acusadas de participarem ou serem coniventes com uma tentativa (real ou imaginária?) de instaurar no país um regime comunista.

O instrumento desse genocídio foi um corpo para-militar transformado em esquadrão da morte, que recorria aos "serviços" dos elementos sociais mais desclassificados.

O filme mostra-nos um desses torcionários – Anwar Congo - que juntamente com alguns parceiros seus descreve sem aparente remorso a forma como procediam às execuções.

A nova ordem que desde então e até hoje prevalece no país não só nunca questionou esse período sangrento como consagrou até como heróis os assassinos.

Tudo com a conivência cúmplice dos media, com jornalistas confessando terem falsificado os factos para justificar a repressão e órgãos de impacto nacional como a televisão pública acolhendo entre sorrisos e entrevistando em prime time os criminosos, que admitem os assassinatos como se fosse tudo muito natural.

Só no final, depois de ter assumido no cenário o lugar das suas próprias vítimas, é que o assassino confesso esboça um início de arrependimento.

Na Indonésia, apesar de alguma resistência das autoridades, o filme levou a que, pela primeira vez desde os anos 60, as pessoas começassem a interrogar-se sobre a legitimidade do golpe e do genocídio que se seguiu.

O filme – que oscila entre o documentário e a ficção surreal - é perturbador porque recusa a condenação à priori, dá voz aos criminosos e assim fazendo confronta-nos com a aparente banalidade do mal.

Perante realidade tão estranha, há um momento em que somos tentados a atribuir ao outro – no caso, o asiático – a origem do problema. Mas é o próprio Joshua Oppenheimer quem nos alerta, em entrevista, que o horror foi estimulado e apoiado pelo ocidente. Todos somos, portanto, responsáveis.

Quer isso dizer que não há salvação? O filme não chega a ser tão pessimista.

O esboço de arrependimento final – sincero ou encenado, nunca saberemos – resgata-nos para a possibilidade de um sentido de humanidade universal e intrínseco, em que o mal é radicalmente condenado, independentemente quem o pratique e de ser ou não legitimado pela correlação de forças dominante neste ou naquele momento.

Ver mais sobre este tema:
1.     http://www.theguardian.com/film/2013/jun/20/joshua-oppenheimer-act-of-killing
2.     https://www.youtube.com/watch?v=hHGbb64YxAk
3.     https://www.youtube.com/watch?v=Q3FcB1UZHlg&feature=share

* Carlos Fino, jornalista português, foi enviado especial e correspondente internacional da RTP - televisão pública portuguesa - em Moscou, Bruxelas e Washington, e correspondente de guerra em diversos conflitos armados na ex-URSS, Afeganistão,  Albânia, Oriente Médio e Iraque.  Foi conselheiro de imprensa da Embaixada de Portugal em Brasília (2004/2012), cidade onde atualmente reside.

Forças Armadas de Portugal contribuem para o desenvolvimento da Defesa de Timor-Leste



23 de Outubro de 2014, 15:22

As Forças de Defesa de Portugal continuam a mostrar o seu compromisso de ajudar os recursos humanos das Forças de Defesa de Timor-Leste, segundo o Timor Digital.

O compromisso foi anunciado pelo antigo Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas (FA) de Portugal, Luís Vasco Valênça Pinto, que reuniu com o Presidente da República, Taur Matan Ruak, ontem em Díli, na sequência de uma visita oficial.

Durante a sua estadia no país encontrou-se também com outros líderes, incluindo das Forças de Defesa de Timor-Leste.

Após a reunião com Taur Matan Ruak, o General Luís Vasco Valênça Pinto disse que a sua instituição está a apoiar alguns oficiais das Forças de Defesa de Timor, para estudarem no Instituto de Tecnologia em Portugal.

A Universidade Autónoma portuguesa providenciou a formação, segundo o responsável Luís Pinto.

O Chefe de Estado Maior General das FA de PT revelou que irá fazer tudo para continuar a apoiar o desenvolvimento dos Recursos Humanos das Forças de Defesa de Timor-Leste, incluindo a formação ao nível universitário e cursos de língua portuguesa.

O responsável disse ainda que a Universidade de Lisboa está disposta a oferecer cursos de língua portuguesa aos membros das Forças de Defesa de Timor-Leste.

SAPO TL com Timor Digital – Foto Samuel Soares/SAPO TL

Moçambique – Eleições: Mais de 60 por cento de eleitores não foram votar em Nampula




O elevado número de abstenções no escrutínio do passado 15 de Outubro é preocupante, na cidade nortenha de Nampula

Mais de sessenta por cento de eleitores inscritos não foram  votar e dos que se dirigiram às urnas, cerca de sessenta mil depositaram votos em branco.

Segundo dados apresentados ontem pela Comissão Provincial de Eleições (CPE) de Nampula, num universo de 2.077.660 eleitores inscritos, foram às urnas 816.827 votantes.

Deste número de eleitores que votaram para as eleições legislativas, 64.327 depositaram votos em branco, enquanto 34.328 votaram sem seguir as regras requeridas no processo, provocando igual número de votos nulos.

Já na eleição referente à Assembleia Provincial, o número de votos em branco aumentou em cerca de 30 mil, quando comparados com os votos à Assembleia da República, calculando-se em 94.418 votos.

O País (mz)

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Moçambique – Eleições: Frelimo perde 50 deputados, mas controla Parlamento




Frelimo “esmagado” no sul do país: dos 61 lugares em disputa nos quatro círculos, assegurou 49

Quando a Assembleia da República abrir as portas para a VIII Legislatura, a Frelimo vai entrar com uma maioria absoluta de 145 deputados, pelo menos. Trata-se de uma vitória confortável para viabilizar os projectos do futuro governo de Filipe Nyusi sem necessidade de negociações com a oposição. Ainda assim, o número de assentos regrediu e está longe dos 191 que, em 2004, enformaram o discurso de vitória retumbante e esmagadora.

Em sentido contrário, a Renamo e o MDM ganharam mais lugares, o que abre boas perspectivas para uma confrontação de ideias na chamada “Casa do Povo”. O partido de Afonso Dhlakama, que desde 1994 luta contra a hegemonia política da Frelimo, elegeu 88 deputados, contra os 51 que fizeram a VII Legislatura. Trinta e sete (37) lugares é uma recuperação significativa após a hecatombe de 2009.

Já o MDM duplicou o registo de há 5 anos, com 16 assentos. Trata-se de resultado muito abaixo das perspectivas que se abriram após o notável desempenho nas eleições autárquicas de 2013. No círculo da capital, por exemplo, o MDM perdeu 56 317 votos dos 120 807 obtidos nas autárquicas.

Ainda assim, a cidade de Maputo é o círculo onde o partido de Daviz Simango foi mais votado: 64 490, seguido de Nampula, o maior círculo eleitoral, onde foi preferido por 57 416. Mas o registo de 16 lugares é substantivo para travar a bipolarização da Frelimo e Renamo.

O País (mz)

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DEZASSEIS MIL CRIANÇAS CONTRAEM SIDA POR ANO EM MOÇAMBIQUE



Coutinho Macanandze – Verdade (mz)

Anualmente, pelo menos 16 mil crianças moçambicanas, de 10 a 15 anos de idade, ficam infectadas pelo VIH/SIDA em todo o território moçambicano devido à violação sexual, ao inicio precoce de relações sexuais, à vulnerabilidade deste grupo por causa de problemas relacionados com a pobreza e os hábitos culturais.

A informação consta de um relatório sobre “Situação das Crianças em Moçambique 2014”, lançado esta quarta-feira (22), em Maputo. O estudo indica que ainda prevalecem as altas taxas de propagação de VIH/SIDA nesta faixa etária. Concorrerem para esta situação a violação sistemática do direitos dos petizes e a sua maior exposição ao início precoce da actividade sexual, o que resulta dos altos índices de pobreza urbana e rural.

O representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) em Moçambique, Koenraad Vanermelingen, disse que a situação é preocupante. Crianças de 10 a 15 anos de idade praticam relações sexuais antes de estarem preparadas para o efeito com o intuito de adquirir dinheiro para satisfazer as necessidades básicas das suas famílias.

Vanermelingen explica que há necessidade de impedir, por via da legislação, algumas práticas culturais que colocam a criança em situação de risco. Deve haver maior respeito pelos direitos deste grupo cujos pais e encarregados de educação são também os protagonistas de actos que atentam contra a sua saúde.

“O nível de contaminação pelo VIH/SIDA duplicou em Moçambique, este ano, quando comparado com 2008, altura em que se registou metade do número acima referido, o que quer dizer que 12 porcento das 12 milhões de crianças [que existem em todo o país] contraem o SIDA anualmente”.

Outro aspecto apontado por Vanermelingen prende-se com a fraca rede de serviços sociais básicos, que, na sua opinião, não respondem à demanda por causa da exiguidade de infra-estruturas; por isso, o número de assistentes sociais reduziu.

Angola: GENERAL KANGAMBA – UMA VIDA EM ESQUEMAS



Folha 8 Diário, opinião

Há quase um ano, publiquei com dois colegas um apanhado desses esquemas, que já tinham preocupado as autoridades judiciais francesas e brasileiras. O que segue é um extracto do livro “Os Donos Angolanos de Portugal”.

Francisco Louçã (*)

Parece que as autoridades portuguesas se interessaram pelos negócios do General Kangamba em Portugal. Há quase um ano, publiquei com dois colegas um apanhado desses esquemas, que já tinham preocupado as autoridades judiciais francesas e brasileiras. O que segue é um extracto do livro “Os Donos Angolanos de Portugal” (Jorge Costa, João Teixeira Lopes e Francisco Louçã, publicado pela Bertrand Editora, primeira edição em Janeiro de 2014).

Bento dos Santos, dito Kangamba, é um filho do regime angolano e a sua história mistura-se com a das personalidades mais marcantes do país. Casado com Avelina dos Santos, filha do irmão mais velho de José Eduardo dos Santos, é portanto sobrinho, por afinidade, do Presidente. Escolheu como seu padrinho de casamento o general Higino Carneiro, governador do Kuando Kubango, figura sempre poderosa em Angola. Faz parte da Casa Militar do Presidente, dirigida pelo homem forte do regime, o general Kopelipa. É dono de um clube de futebol, o Kabuscorp — Sport Clube do Palanca, para o qual contratou o antigo treinador da selecção de Moçambique, e financia dois clubes em Portugal, o Vitória de Setúbal (RR, 9.3.2012) e o Vitória de Guimarães (A Bola, 27.10.2013). Bem relacionado, Kangamba tem estado no centro da atenção da vida social e empresarial de Angola.

A ligação ao futebol é o seu cartão de visita. O seu clube sagrou-se campeão nacional em 2013 e o oficial Jornal de Angola descreve em termos apoteóticos a consagração do empresário no final do jogo decisivo, ainda antes do final do campeonato: “Com o apito final foi a festa, com o champanhe a jorrar à grande no estádio municipal de Benguela, com o presidente do clube, Bento Kangamba a ser o protagonista dos festejos no relvado. Mas, a ambição do empresário, já chamado de ‘Abramovich angolano’, é terminar a competição sem qualquer derrota” (JA, 7.10.2013).

Apesar de reformado, foi ainda promovido a general de três estrelas uns anos depois, em Abril de 2012.

O “Abramovich angolano” nasceu em 1965 e foi portanto poupado pela idade aos combates da guerra anti-colonial, mas distinguiu-se mais tarde no exército angolano. Fez dois anos de formação em Cuba, no início dos anos oitenta, de onde regressou com uma especialização em contabilidade. Tornou-se, como contou à Rádio Ecclesia, um “comandante da retaguarda” (RE, 5.7.2012). A partir de 1985 foi para Luanda, onde foi responsável pela logística e fez uma carreira meteórica, tendo chegado a brigadeiro, posto em que se reformou, em condições que vamos analisar adiante. Apesar de reformado, foi ainda promovido a general de três estrelas uns anos depois, em Abril de 2012. Criou entretanto um universo empresarial, o Grupo Kabuscorp, com interesses no imobiliário, na exploração de diamantes e noutros sectores económicos.

Esta brilhante carreira militar tem no entanto algumas nódoas. Kangamba adquiriu experiência empresarial como responsável pela logística do exército, mas também viveu alguns dissabores. Acusado de vender em benefício próprio a carne de frango destinada ao exército, foi posto em tribunal por vendedoras dos mercados paralelos, que argumentavam ter pago o que não teriam recebido. Mas a acusação não dispensa a prova nem a condenação, e o general podia ser vítima de inveja e chantagem, como tem evocado em público (RE, 5.7.2012).

No entanto, o próprio Supremo Tribunal Militar condenou-o a dois anos e oito meses de prisão em 2000, tendo dado como provado que recebera em 1996 cinco contentores com óleo alimentar, atum, sardinha, frigoríficos, mobiliário, equipamento desportivo, colchões e outros produtos enviados pelo empresário português Manuel Lapas Correia, gerente da Filapor, e que os usara para venda em proveito próprio, tendo pago unicamente uma parte dos duzentos e cinquenta mil dólares devidos. Pressionado para pagar a dívida, o brigadeiro Kangamba teria falsificado documentos que lhe confeririam poderes para negociar em nome da Direcção Logística do Estado-Maior, de modo a obrigar o exército angolano a cobrir a diferença, o que veio a desencadear a sua acusação e condenação por burla, falsificação de documentos e conduta indecorosa (acórdão STM 2/98 de 27.10.2000). Cumpriu dois anos de prisão e foi expulso do Comité Central do MPLA e do partido. O brigadeiro tinha caído em desgraça.

A 19 de Junho de 2002, outra condenação: quatro anos de prisão, por burla, desta vez tendo como alvo duas empresas, a Nutritiva e a Lokali. O mesmo esquema, o mesmo fracasso, a mesma condenação.

Na sequência do primeiro processo, também o Tribunal de Sintra, em Portugal, decidiu muito mais tarde, a 7 de Maio de 2012, a apreensão de bens de Kangamba para garantir a indemnização à Filapor, que não teria sido paga: um apartamento em Oeiras, dois Mercedes e seis contas no BCP e BES que totalizariam cerca de quinze mil euros. Kangamba, já general, seria ao mesmo tempo assalariado de uma empresa a Lapigema, Lapidação e Comércio de Gemas, Lda., com sede na Rua Tomás Ribeiro, em Lisboa. Mas, porque só receberia o salário mínimo português, 485 euros, o tribunal considerou este valor impenhorável.

Em 2009, tudo passou e em Luanda a sua condenação e prisão já estava esquecida e perdoada. Popular dono de um clube de futebol, organizador de jovens e influente figura do bairro Palanca, Kangamba regressa ao Comité Central do MPLA. É nomeado secretário para a organização e mobilização periférica e rural, no comité provincial de Luanda. É eleito deputado à Assembleia Nacional em 2012, apesar de protestos de alguns grupos de oposição que alegam, sem vencimento, que a Constituição impede candidaturas de quem tenha sido condenado a mais de dois anos de prisão. Em Abril de 2012, nas vésperas das eleições, tinha sido promovido a general de três estrelas pelo Presidente. Em 2013, como vimos, ganhou o campeonato nacional de futebol.

Casado com Avelina dos Santos, aproxima-se dos círculos íntimos do poder. Avelina é directora-adjunta do gabinete do Presidente, além de ser sua sobrinha. Homem de família, Kangamba compra um apartamento de luxo em Lisboa, alegadamente para o sogro, por dois milhões de euros, na urbanização Jardins do Cristo Rei, em Moscavide, onde será vizinho de outras figuras angolanas. Para si, compra um apartamento de doze milhões de euros em Madrid, no condomínio de La Finca, onde terá como vizinhos Cristiano Ronaldo e outros futebolistas. Terá ainda comprado uma vivenda no Mónaco, além do referido apartamento em Oeiras (Maka, 27.7.2013). O general é um modelo de “acumulação primitiva”, declarando em Portugal o salário mínimo e tendo contas registadas que se ficam pelos quinze mil euros, mas conseguindo boas poupanças e prósperas aplicações imobiliárias.

Apesar desta opulência, o general não terá pago as suas dívidas. A indemnização imposta pelo tribunal e que devia ter sido paga à Filapor, nunca chegou aos destinatários. O ministro da Defesa de Angola, o general Kundy Paihama, teria mesmo escrito, a 17 de Dezembro de 2001, ao então secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros Luís Amado, para “express(ar) o meu sentimento de reprovação pela prática criminosa do réu supracitado cujo comportamento mereceu condenação do Supremo Tribunal Militar”. O ministro sugeria ainda as formalidades a seguir para obter o pagamento da indemnização (Maka, 13.7.2012). Sem sucesso.

Dez anos depois desta carta, o empresário Manuel Lapas Correia andava pelo tribunal de Sintra a pedir o arresto dos bens do general e, em desespero de causa, conseguiu a retenção de um avião da TAAG no Porto, que só obteve autorização para descolar depois de ter assegurado uma caução de 360 mil euros – uma parte do devido pelo general Kangamba. Segundo o empresário, “há danos irreversíveis que durante mais de uma década foram provocados intencionalmente pelas autoridades angolanas. Eu estou causticado porque é uma luta desigual, estou cansado.

Normalmente os Estados comportam-se de uma forma desprezível perante os seus cidadãos e [isso] culmina quase sempre com o abate dos cidadãos pela exaustão” (DN, 20.9.2012). Explica Manuel Correia que algum do pagamento teria ficado retido na embaixada de Angola em Portugal, o que o autorizaria a pedir a retenção de bens do Estado angolano, como é o caso do avião da companhia nacional. Dez anos depois, era a medida do seu desespero. Kangamba não pagou as suas dívidas.

Novos problemas – e não menos graves – surgem em dois outros países. Em 14 de Junho de 2013, dois carros foram apreendidos, com poucas horas de diferença, em portagens no sul de França. Num deles, foram encontrados dois milhões de euros, em quarenta sacos de cinquenta mil cada. No outro, foram encontrados mais 910 mil euros. Oito homens foram detidos. Pelo menos cinco deles, angolanos, cabo-verdianos e portugueses, estariam relacionados com o general Kangamba, segundo a polícia francesa (La Provence, 10.7.2013).

Um dos carros tem matrícula portuguesa e é de Portugal que provêm ambos. Carlos Silva, angolano de nascimento e português por naturalização, está num deles: é apresentado como o secretário de Kangamba, tem um cartão do patrão, e alega que leva o dinheiro para o general jogar no casino. Kangamba, como vinte amigos, estava instalado no Hotel Metrópole, em Monte Carlo. O general teria pago 86 mil euros pelos 22 quartos para os seus amigos (Le Parisien, 12.7.2013). A imprensa francesa descreve que a polícia tentou deter o general, acusando-o de branqueamento de capitais e associação criminosa, mas que este usou o passaporte diplomático para abandonar o país. Kangamba desmente esta versão e afirma que não foi acusado, que não é o dono desse dinheiro e que não houve tentativa de o deter (Agora, 30.7.2013). De onde vêm os três milhões de euros, como é que viajam de Portugal para França, não sabe nem faz a mínima ideia.

Três meses depois, em 25 de Outubro de 2013, nova acusação: desta vez é a justiça brasileira, que emite um mandato de captura em nome do general, acusado de ser o responsável por uma rede de tráfico de mulheres brasileiras, para se prostituírem em Portugal, Angola e outros países, supondo-se que esta actividade teria produzido um lucro de 45 milhões de euros desde 2007. Foram emitidas dezasseis ordens de prisão. A Interpol ficou encarregue de fazer cumprir o mandato, mesmo que as autoridades brasileiras tivessem reconhecido ter pouca expectativa de a polícia angolana vir a executar a decisão judicial, como seria sua obrigação.

Mais uma vez, Kangamba desmentiu a acusação. Declara que, nestas notícias, “a intenção de citar o seu nome visa atingir e caluniar outras personalidades” (Angop, 26.10.2013), ou seja, envolver o topo do regime angolano.”

(*) In: Esquerda.net

ESCÂNDALO QUE SE PREZE TEM ANGOLA LÁ PELO MEIO




Vários processos, entre os quais os relatórios anuais das actividades do Centro Português para a Cooperação (CPPC) e os projectos submetidos à aprovação governamental, para efeitos de financiamento, não constam dos registos do Instituto Camões, IP e do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, segundo avançou o Jornal Público.

Em resposta a um requerimento apresentado pelo Público, datado de 3 de Outubro, que solicitava a consulta de todos os documentos arquivados no Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social “que tenham a ver com projectos e pedidos de financiamento apresentados entre 1996 e 1999” pelo CPPC, o gabinete do ministro Mota Soares esclareceu que “não foi localizado nos serviços tutelados por este ministério qualquer documento relacionado com essa organização”.

Segundo lembra o jornal diário, os únicos documentos tornados públicos até à data sobre as relações entre o CPPC – fundado por Pedro Passos Coelho em 1996 – e o Estado português estão arquivados no Instituto Camões. No entanto, entre os mesmos não se encontram, por exemplo, o processo inicial de registo do CPPC como Organização Não-Governamental para o Desenvolvimento (ONGD) e os relatórios anuais das suas actividades. Não constam também dos arquivos deste instituto os projectos submetidos à aprovação governamental, para efeitos de financiamento.

O Instituto Camões apenas deu a conhecer aos jornalistas “o processo de revalidação do registo do CPPC enquanto ONGD, em 1999, e uma troca de ofícios entre a antiga Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e o instituto que nessa altura tratava dos assuntos da cooperação no Ministério dos Negócios Estrangeiros”, avança o Público.

Estes documentos estarão relacionados com a manutenção do estatuto de pessoa colectiva de utilidade pública atribuído ao CPPC, que lhe permitia usufruir das isenções fiscais previstas na lei, bem como com a possibilidade da Tecnoforma beneficiar do regime de isenção de IRC, com base nos donativos em dinheiro ou em espécies concedidos pela empresa à ONGD.

O processo do CPPC arquivado no instituto Camões inclui ainda o “Balanço de Actividades 1998” e o “Orçamento para 1999”.

Conforme é avançado no balanço, o principal projecto formulado pela equipa liderada por Passos Coelho para Angola – o Programa de Reabilitação e Promoção Activa do Emprego para o Desenvolvimento – foi entregue ao Instituto da Cooperação Portuguesa (ICP) no final de 1997, tendo sido posteriormente encaminhado para o Ministério do Emprego e Qualificação Profissional, do qual obteve um parecer técnico favorável em Junho de 1998.

Mediante o reacender da guerra, este projecto acabou por nunca sair da “carteira”.

Um antigo vice-presidente do ICP, em funções aquando da formalização do pedido do CPPC, afirmou, em declarações ao Público, que era prática corrente conservar uma cópia deste tipo de documentos, pelo que o mesmo deveria estar arquivado no instituto Camões. O ex-responsável do IPC referiu ainda que, caso o exemplar não constasse dos arquivos, pelo menos deveria existir o registo da sua eventual eliminação.

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Estado anulou em 2011 um financiamento de 727 mil euros atribuído à Tecnoforma




O Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu reclamou em tribunal a restituição de cerca de 66 mil euros “indevidamente recebidos” pela empresa. Financiamento de acções de formação foi revogado por incumprimento em Julho de 2011.

Entre as muitas dezenas de credores que reclamam cerca de 2,3 milhões de euros no processo de insolvência da Tecnoforma, há um que chama a atenção: o Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu (IGFSE). A dívida não é das mais elevadas — cerca de 65 mil euros —, mas é particularmente relevante por ter origem em acções de formação profissional subsidiadas, actividade em que a empresa se especializou pela mão de Passos Coelho, que foi contratado para o efeito em 2002.

A dívida em causa nasceu em 2011, mas as dificuldades com que a empresa se dabatia na área da formação profissional já eram indesmentíveis em 2007, quando o actual primeiro-ministro era seu administrador. Num documento interno elaborado pelo próprio e pelo seu amigo Francisco Nogueira Leite (actual presidente da Parvalorem), em Maio de 2007, quando ambos deixaram a administração da empresa, refere-se expressamente que esta se encontrava “nos patamares da falência técnica”. 

Meses depois da saída dos dois gestores foi a vez de um dos principais accionistas, o advogado João Gonçalves, secretário-geral da JSD quando Passos Coelho era seu presidente, entrar em litígio com os seus sócios (Manuel Castro e Sérgio Porfírio) e deixar a empresa.

Nesse ano, 2008, a Tecnoforma, ainda conseguiu, pelo menos, dois financiamentos públicos no total de 3,1 milhões de euros. O dinheiro veio do Programa Operacional Potencial Humano (POPH) e destinou-se à realização de cursos de educação e formação de adultos e também às chamadas “formações modulares certificadas”.

Dois anos depois, em 2010, conseguiu mais 4 milhões de euros do POPH, programa que contou com uma dotação global de 8800 milhões de euros no período 2007-2013, dos quais 6100 milhões vieram do Fundo Social Europeu e o resto do Estado português. Finalmente, em 2012, verifica-se nas listagens publicadas duas vezes por ano no Diário da República, obteve um último financiamento no valor de 741 mil euros.

No início de 2011, porém, teve uma outra candidatura aprovada para formar 60 jovens em Espinho e em Avintes, com uma subvenção total de 727 mil euros, Este projecto, todavia, não consta das listas de subsídios relativas àquele ano por uma simples razão: o financiamento foi revogado pela Comissão Directiva do POPH, em Julho de 2011, por incumprimento das obrigações, nomeadamente  a nível da qualidade pedagógica dos cursos, a que a Tecnoforma estava vinculada.

A revogação foi aprovada na sequência de uma acção de fiscalização realizada nas instalações em que decorriam os cursos, por determinação da autoridade de gestão do programa, que confirmou um conjunto de “desconformidades” denunciadas por alguns formadores e que foram consideradas “muito graves”. Em causa estavam problemas como a “falta de assiduidade” de formadores e formandos, falta de condições das instalações e dívidas a formadores.

A Tecnoforma ainda interpôs uma providência cautelar contra a revogação do financiamento, mas o Supremo Tribunal Administrativo não lhe deu razão. Foi então que o IGFSE (actual Agência para o Desenvolvimento e Coesão) exigiu a restituição de cerca de 65.000 euros, correspondentes à parcela já paga dos 727 mil aprovados.

Atendendo a que aquele valor não foi devolvido e que o processo de insolvência da empresa entrou em tribunal em 10 de Outubro de 2012 — dias antes de o PÚBLICO ter iniciado a publicação de um conjunto de notícias sobre as relações que a Tecnoforma tinha tido com Passos Coelho e Miguel Relvas —, o IGFSE apresentou no Tribunal de Comércio de Lisboa, em Maio do ano passado, uma reclamação de créditos no valor de 65.404 euros, correspondentes às “comparticipações financeiras indevidamente recebidas”.

O pedido do IGFSE continua por satisfazer, tal como o dos restantes credores, na medida em que o plano de revitalização apresentado pela empresa ainda não foi aprovado pelo tribunal. 

Insolvência culposa?

Entretanto, um pequeno accionista  e antigo funcionário, João Lucas Rosa, requereu ao juiz que a insolvência pedida pelos principais accionistas, Manuel Castro e Sérgio Porfírio, seja qualificada como “culposa”. Requereu também que o seu pedido seja transmitido ao Ministério Público para averiguação dos “ilícitos penais” que entende terem sido praticados pelos seus sócios na gestão da empresa.

João Rosa diz que a  insolvência se deveu “à actuação dolosa e com culpa grave” dos administradores Castro e Porfírio que, em 2010, criaram uma outra empresa, a Tecnoforma II, de que são sócios e que concorre directamente com a primeira. O empresário acrescenta que os seus sócios prejudicou gravemente a Tecnoforma, entre outras razões, por terem transferido para a Tecnoforma II vários contratos que tinham sido adjudicados à primeira.

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