quarta-feira, 30 de julho de 2014

Portugal: A VÃ GLÓRIA DE UM ATIRADOR FURTIVO



SANTANA CASTILHO – Público, opinião - hoje

Estes exames só servem um maquiavélico projecto de elitização do ensino

Sobre a PACC (Prova de Avaliação de Conhecimentos e Competências) dos professores já me pronunciei sobejas vezes, a primeira das quais nesta coluna, em 7 de Fevereiro de 2008. O que passo a escrever tem duas finalidades: apelar à memória escassa da maioria, para melhor compreendermos a atitude ignóbil de Nuno Crato, e denunciar com frontalidade que a fixação do ministro no papel sacro dos instrumentos de avaliação é demencial.

Com o truque que todos conhecemos, para impedir que os sindicatos pudessem apresentar um pré-aviso de greve, o ministro da Educação actuou sem educação nem escrúpulos. Usou o capote da desfaçatez para bandarilhar uma lei da República, que protege um direito fundamental. Portou-se como um caçador furtivo a atirar sobre cidadãos que o Estado enganou, com dolo agravado por habilidades grosseiras. E foi a primeira vez que assim se desvinculou da ética política e da lealdade que deve àqueles que governa? Não, não foi! Os exemplos repetem-se e há muito que vêm desenhando um carácter.

Foi ele que, em início de mandato, revogou os prémios de mérito dos alunos, sem aviso prévio e atempado, quando eles já tinham cumprido a sua parte.

Foi ele que obrigou crianças com necessidades educativas especiais a sujeitarem-se a exames nacionais, em circunstâncias que não respeitaram o seu perfil de funcionalidade, com o cinismo cauteloso de as retirar, depois, do tratamento estatístico dos resultados.

Foi ele que, dias antes das inscrições nos exames do 12.º ano, mudou unilateralmente as regras, ferindo de morte a confiança que qualquer estudante devia ter no Estado.

Foi ele que, a uma sexta-feira, simbolicamente 13, sem que se conhecessem os créditos atribuídos às escolas, sem que as matrículas estivessem terminadas e as turmas constituídas, obrigou os directores a determinarem e comunicarem o número de “horários zero” para 2012-2013, sob ameaça de procedimento disciplinar, lançando na angústia milhares de docentes com dezenas de anos de serviço para, na semana seguinte, recuperar o que antes havia levianamente subtraído. Foi ele que abriu esse concurso com uma lei e o encerrou com outra, num alarde gritante de discricionariedade nunca vista.

A conferência de imprensa, significativamente marcada para o horário nobre do dia da prova da humilhação dos professores, mostrou-nos um ministro obcecado pela vã glória que a jornada lhe proporcionou, incapaz de discernir, como qualquer alienado, que o seu fundamentalismo patológico sobre o papel dos instrumentos de avaliação está a destruir o sistema nacional de ensino. Os professores são cada vez mais meros aplicadores das mediocridades do IAVE e cada vez menos professores. O tempo do ensino é comido pela loucura de tudo examinar, com provas cheias de erros inconcebíveis e qualidade duvidosa. Todo o ano, tudo se verga aos exames e à alienação que provocam. Preparar exames, treinar para exames, substituir tempos de aulas por tempos para fazer exames, corrigir exames, tirar ilações de rankings, pagar a Cambridge e não pagar aos nacionais. E, quando os problemas surgem, o ministro puxa pela cabeça doente e chama a polícia. Sim, cidadão que me lê, olhe para as televisões e reconheça que, quando se tornou banal a presença da polícia dentro das nossas escolas, algo vai mal com a democracia que devíamos ensinar aos seus filhos.

Para que serviu o segundo exame aplicado às crianças do 1.º ciclo do básico, um mês depois de terem reprovado no primeiro, senão para mostrar que o modelo é inadequado?

Para que serviu a avaliação dos centros de investigação, senão para destruir o que foi laboriosamente construído ao longo das duas últimas décadas, transferir para o estrangeiro uma fatia do parco erário público e mostrar que a fraude é permitida e fica impune?

Em matéria de exames, é factual, o país nunca tinha assistido a tantos dislates como os que o “rigor” de Crato já nos proporcionou: efectivação de provas na ausência de secretariado de exames; exames realizados sem professores suplentes e sem professores coadjuvantes; exames vigiados por professores que leccionaram a disciplina em exame; ausência de controlo sobre a existência de parentesco entre examinandos e vigilantes; salas invadidas e interrupção de provas; tumultos que obrigaram à intervenção da polícia; desacatos ruidosos em lugar do silêncio devido; sigilo quebrado com o uso descontrolado de telefones e outros meios de comunicação electrónica; alunos e professores aglomerados em refeitórios; provas iniciadas depois do tempo regulamentar.

Portugal: Os despedimentos na Controlinvest – os poderes hegemónicos ao ataque*




A nova propriedade do grupo Controlinvest reflecte com clareza o figurino da congregação que junta os três poderes hegemónicos ao serviço da classe dominante – o poder económico-financeiro (cada vez mais financeiro do que industrial), o poder político (isto é, dos três partidos que têm ocupado o governo) e o poder mediático (dono de praticamente todos os media – imprensa, rádio, televisão, online – mais influentes nas opiniões e nos comportamentos dos portugueses).

A recente decisão da Controlinvest em proceder ao despedimento de 160 trabalhadores, 66 dos quais jornalistas, vem, de forma violenta e dramática, chamar mais uma vez a atenção para a crescente contradição (em Portugal e nos países capitalistas em geral) entre, por um lado, a importância da informação e do jornalismo na saúde da democracia, e, por outro lado, a apropriação – com fins mercantilistas e ideológicos – dos órgãos de comunicação social por poderosos grupos económicos.

A concentração da propriedade, e a sua natureza de classe, enquanto causa e efeito da predominância adquirida pelo factor económico, reflecte-se no alargamento das lógicas empresariais a tudo o que tem a ver com os critérios informativos, as programações, a escolha dos responsáveis editoriais, a selecção dos conteúdos, etc. Os projectos editoriais foram substituídos por projectos empresariais, o jornalismo foi absorvido pelo negócio da informação.

A decisão de despedir foi justificada pelo conselho de administração pela «evolução negativa do mercado dos media» e pela «acentuada quebra de receitas do sector». Tratou-se de «uma decisão estratégica de redução de custos para garantir a sustentabilidade do negócio».

Recorde-se que em Março deste ano a Controlinvest registou a entrada de novos accionistas e a eleição de novos órgãos sociais, tendo o capital social passado a ficar assim repartido: 27,5% pelo grupo Joaquim Oliveira (antigo accionista maioritário), 27,5% por António Mosquito («investidor» angolano), 15% por Luís Montez (dono de várias estações de rádio, do ex-Pavilhão Atlântico e empresário de espectáculos), 15% pelo BCP e 15% pelo BES.

Foi anunciada pelos novos patrões da Controlinvest «a ambição de crescer nos mercados em que está inserida e de conquistar novos mercados nos espaços da lusofonia». Afirmou-se a necessidade de «assegurar novas condições de capitalização do grupo» e de «um novo plano de negócios devidamente sustentado a longo prazo».

Recorde-se que a Controlinvest é um dos principais grupos nacionais de media, detendo, nomeadamente, o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, o Jogo e a TSF. Pareceria adequado e conveniente que, na sequência da reconfiguração da propriedade da empresa, esta anunciasse os seus planos para a intervenção de tão importantes órgãos nos territórios que tradicionalmente lhes são próprios – a informação, a formação, o entretenimento. Ao que parece, porém, as suas «estratégias» não passam pela conciliação entre o combate à real crise do sector e o interesse público da comunicação social, mas sim, mais prosaicamente, pela «sustentabilidade do negócio».

A nova propriedade do grupo reflecte com clareza, dir-se-ia simbolicamente, o figurino da congregação (pouco católica) que junta os três poderes hegemónicos ao serviço da classe dominante – o poder económico-financeiro (cada vez mais financeiro do que industrial), o poder político (isto é, dos três partidos que têm ocupado o governo) e o poder mediático (dono de praticamente todos os media – imprensa, rádio, televisão, online – mais influentes nas opiniões e nos comportamentos dos portugueses). Mas há outros sinais simbólicos.

Um campeão na presidência

Uma notícia publicada em 16 de Abril de 2010 informava, com base em contas feitas pelo próprio jornal:

«Proença de Carvalho é o responsável com mais cargos entre os administradores não executivos das companhias do PSI-20, e também o mais bem pago. [Os nomes que se seguem na lista daqueles a quem a notícia chama “campeões” deste tipo de funções, são António Nogueira Leite, José Pedro Aguiar-Branco e António Lobo Xavier]. O advogado é presidente do conselho de administração da Zon, é membro da comissão de remunerações do BES, vice-presidente da mesa da assembleia geral da CGD e presidente da mesa na Galp Energia. E estes são apenas os cargos em empresas cotadas, já que Proença de Carvalho desempenha funções semelhantes em mais de 30 empresas. Considerando apenas estas quatro empresas (já que só é possível saber a remuneração em empresas cotadas em bolsa), o advogado recebeu 252 mil euros. Tendo em conta que esteve presente em 16 reuniões, Proença de Carvalho recebeu, em média e em 2009, 15,8 mil euros por reunião.»

Pois é: o novo presidente do Conselho de Administração da Controlinvest é… Proença de Carvalho. Ironias do destino: a notícia, com base nas contas feitas pelo próprio jornal, foi publicada… no Diário de Notícias.

*Este artigo foi publicado no “Avante!” nº2121, 24.07.2014

Na foto: Joaquim Oliveira

Portugueses continuam desiludidos com a economia - Eurobarómetro




Continua a desconfiança e pessimismo dos portugueses em relação à economia do país, como se conclui dos dados do Eurobarómetro de julho de que a edição diária do Expresso dá conta. Aos portugueses juntam-se ainda espanhóis e gregos com uma opinião negativa sobre as respetivas economias na ordem dos 96%.

O Sul e o Norte da Europa continuam separados pela diferença. Neste caso falamos das perspetivas sobre a economia do respetivo país.

Segundo avança o Expresso, citando o Eurobarómetro de julho, portugueses, espanhóis e gregos mantém uma opinião negativa sobre a economia na ordem dos 96%.

No caminho oposto surgem Dinamarca e Alemanha que têm uma opinião favorável sobre a economia dos seus países na ordem dos 85% e dos 82%, respetivamente.

A média da União Europeia (UE) a 28 é, no entanto, negativa: os inquiridos apontam para uma média de 63% de opiniões negativas sobre esta questão.

Relativamente às expectativas económicas para o próximo ano, 37% consideram que a economia ainda vai pior e 40% consideram que se manterá na mesma. Somente 17% acredita que a situação económica irá melhorar em 2015. Na UE a 28, a média aponta para 24% a considerar que a economia irá melhorar.

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O SOL QUANDO NASCE EM PORTUGAL JÁ NÃO É PARA TODOS


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Clemente Alves* - em Facebook

O Sol quando nasce já não é para todos, pelo menos na Praia de Carcavelos. Já aqui vim chamar a atenção para o roubo que a comandita do Passos, Portas & Cavaco, SA nos queriam fazer das praias que são de todos desde que há humanidade. Muitos me chamaram alarmista, tendencioso e até "politicamente venenoso". 

Agora, olhem bem para a fotografia, que por gentileza do meu amigo Júlio Vintém, aqui publico. 

Trata-se da Praia de Carcavelos, talvez a mais frequentada em todo o país, onde já foi privatizado um grande pedaço para uso de quem tenha dinheiro para pagar pela areia e pelo Sol em condições previligiadas, arredando para o aperto os demais banhistas.

Depois de Carcavelos, quantas mais praias, até que os comuns mortais tenham que pegar em varapaus para se baterem contra o "apartheid" a que nos estão a sujeitar ?

Sou português, cidadão, munícipe de Cascais e quero saber porque me roubam aquilo que, por direito natural, é meu e dos meus semelhantes.

*Vereador da CDU na Câmara Municipal de Cascais

NÃO EM MEU NOME




Recuso-me a acumpliciar-me com esta agressão. O exército israelense não me representa, o governo ultranacionalista não me representa. Os assentados ilegalmente são meus inimigos. Eu, judeu brasileiro, digo: ACABEM COM A OCUPAÇÃO!!!

Marcelo Gruman – Brasil de Fato, opinião

Na minha adolescência, tive a oportunidade de visitar Israel por duas vezes, ambas na primeira metade da década de 1990. Era estudante de uma escola judaica da zona sul da cidade do Rio de Janeiro. As viagens foram organizadas por instituições sionistas, e tinham por intuito apresentar à juventude diaspórica a realidade daquele Estado formado após o holocausto judaico da Segunda Guerra Mundial, e para o qual todo e qualquer judeu tem o direito de “retornar” caso assim o deseje. Voltar à terra ancestral. Para as organizações sionistas, ainda que não disposto a deixar a diáspora, todo e qualquer judeu ao redor do mundo deve conhecer a “terra prometida”, prestar-lhe solidariedade material ou simbólica, assim como todo muçulmano deve fazer, pelo menos uma vez na vida, a peregrinação a Meca. Para muitos jovens judeus, a visita a Israel é um rito de passagem, assim como para outros o destino é a Disneylândia.

A equivalência de Israel e Disneylândia tem um motivo. A grande maioria dos jovens não religiosos e sem interesse por questões políticas realizam a viagem apenas para se divertir. O roteiro é basicamente o mesmo: visita ao Muro das Lamentações, com direito a fotos em posição hipócrita de reza (já viram ateu rezando?), ao Museu da Diáspora, ao Museu do Holocausto, às Colinas do Golan, ao Deserto do Neguev e a experiência de tomar um chá com os beduínos, ir ao Mar Morto e boiar na água sem fazer esforço por conta da altíssima concentração de sal, a “vivência” de alguns dias num dos kibutzim ainda existentes em Israel e uma semana num acampamento militar, onde se tem a oportunidade de atirar com uma arma de verdade. Além, é claro, da interação com jovens de outros países hospedados no mesmo local. Para variar, brasileiros e argentinos, esquecendo sua identidade étnica comum, atualizavam a rivalidade futebolística e travavam uma guerra particular pelas meninas. Neste quesito, os argentinos davam de goleada, e os brasileiros ficavam a ver navios.

Minha memória afetiva das duas viagens não é das mais significativas. Aparte terconhecido parentes por parte de mãe, a “terra prometida” me frustrou quando o assunto é a construção de minha identidade judaica. Achei os israelenses meio grosseiros (dizem que o “sabra”, o israelense “da gema”, é duro por natureza), a comida é medíocre (o melhor falafel que comi até hoje foi em Paris...), é tudo muito árido, a sociedade é militarizada, o serviço militar é compulsório, não existe “excesso de contingente”. A memória construída apenas sobre o sofrimento começava a me incomodar.

Nossos guias, jovens talvez dez anos mais velhos do que nós, andavam armados, o motorista do ônibus andava armado. Um dos nossos passeios foi em Hebron, cidade da Cisjordânia, em que a estrada era rodeada por telas para contenção das pedras atiradas pelos palestinos. Em momento algum os guias se referiram àquele território como “ocupado”, e hoje me envergonho de ter feito parte, ainda que por poucas horas, deste “finca pé” em território ilegalmente ocupado. Para piorar, na segunda viagem quebrei a perna jogando basquete e tive de engessá-la, o que, por outro lado, me liberou da experiência desagradável de ter de apertar o gatilho de uma arma, exatamente naquela semana íamos acampar com o exército israelense.

Sei lá, não me senti tocado por esta realidade, minha fantasia era outra. Não encontrei minhas raízes no solo desértico do Negev, tampouco na neve das colinas do Golan. Apesar disso, trouxe na bagagem uma bandeira de Israel, que coloquei no meu quarto. Muitas vezes meu pai, judeu ateu, não sionista, me perguntou o porquê daquela bandeira estar ali, e eu não sabia responder. Hoje eu sei por que ela NÃO DEVERIA estar ali, porque minha identidade judaica passa pela Europa, pelos vilarejos judaicos descritos nos contos de Scholem Aleichem, pelo humor judaico característico daquela parte do mundo, pela comida judaica daquela parte do mundo, pela música klezmer que os judeus criaram naquela parte do mundo, pelas estórias que meus avós judeus da Polônia contavam ao redor da mesa da sala nos incontáveis lanches nas tardes de domingo.

Sou um judeu da diáspora, com muito orgulho. Na verdade, questiono mesmo este conceito de “diáspora”. Como bem coloca o antropólogo norte-americano James Clifford, as culturas diaspóricas não necessitam de uma representação exclusiva e permanente de um “lar original”. Privilegia-se a multilocalidade dos laços sociais. Diz ele:

As conexões transnacionais que ligam as diásporas não precisam estar articuladas primariamente através de um lar ancestral real ou simbólico (...). Descentradas, as conexões laterais [transnacionais] podem ser tão importantes quanto aquelas formadas ao redor de uma teleologia da origem/retorno. E a história compartilhada de um deslocamento contínuo, do sofrimento, adaptação e resistência pode ser tão importante quanto a projeção de uma origem específica.

Há muita confusão quando se trata de definir o que é judaísmo, ou melhor, o que é a identidade judaica. A partir da criação do Estado de Israel, a identidade judaica em qualquer parte do mundo passou a associar-se, geográfica e simbolicamente, àquele território. A diversidade cultural interna ao judaísmo foi reduzida a um espaço físico que é possível percorrer em algumas horas. A submissão a um lugar físico é a subestimação da capacidade humana de produzir cultura; o mesmo ocorre, analogamente, aos que defendem a relação inexorável de negros fora do continente africano com este continente, como se a cultura passasse literalmente pelo sangue. O que, diga-se de passagem, só serve aos racialistas e, por tabela, racistas de plantão. Prefiro a lateralidade de que nos fala Clifford.

Ser judeu não é o mesmo que ser israelense, e nem todo israelense é judeu, a despeito da cidadania de segunda classe exercida por árabes-israelenses ou por judeus de pele negra discriminados por seus pares originários da Europa Central, de pele e olhos claros. Daí que o exercício da identidade judaica não implica, necessariamente, o exercício de defesa de toda e qualquer posição do Estado de Israel, seja em que campo for.

Muito desta falsa equivalência é culpa dos próprios judeus da “diáspora”, que se alinham imediatamente aos ditames das políticas interna e externa israelense, acríticos, crentes de que tudo que parta do Knesset (o parlamento israelense) é “bom para os judeus”, amém. Muitos judeus diaspóricos se interessam mais pelo que acontece no Oriente Médio do que no seu cotidiano. Veja-se, por exemplo, o número ínfimo de cartas de leitores judeus em jornais de grande circulação, como O Globo, quando o assunto tratado é a corrupção ou violência endêmica em nosso país, em comparação às indefectíveis cartas de leitores judeus em defesa das ações militaristas israelenses nos territórios ocupados. Seria o complexo de gueto falando mais alto? 

Não preciso de Israel para ser judeu e não acredito que a existência no presente e no futuro de nós, judeus, dependa da existência de um Estado judeu, argumento utilizado por muitos que defendem a defesa militar israelense por quaisquer meios, que justificam o fim. Não aceito a justificativa de que o holocausto judaico na Segunda Guerra Mundial é o exemplo claro de que apenas um lar nacional única e exclusivamente judaico seja capaz de proteger a etnia da extinção.

A dor vivida pelos judeus, na visão etnocêntrica, reproduzida nas gerações futuras através de narrativas e monumentos, é incomensurável e acima de qualquer dor que outro grupo étnico possa ter sofrido, e justifica qualquer ação que sirva para protegê-los de uma nova tragédia. Certa vez, ouvi de um sobrevivente de campo de concentração que não há comparação entre o genocídio judaico e os genocídios praticados atualmente nos países africanos, por exemplo, em Ruanda, onde tutsis e hutus se digladiaram sob as vistas grossas das ex-potências coloniais. Como este senhor ousa qualificar o sofrimento alheio? Será pelo número mágico? Seis milhões? O genial Woody Allen coloca bem a questão, num diálogo de Desconstruindo Harry (tradução livre):

- Você se importa com o Holocausto ou acha que ele não existiu?

- Não, só eu sei que perdemos seis milhões, mas o mais apavorante é saber que recordes são feitos para serem quebrados.

O holocausto judaico não é inexplicável, e não é explicável pela maldade latente dos alemães. Sem dúvida, o componente antissemita estava presente, mas, conforme demonstrado por diversos pensadores contemporâneos, dentre os quais insuspeitos judeus (seriam judeus antissemitas Hannah Arendt, Raul Hilberg e Zygmunt Bauman?), uma série de características do massacre está relacionada à Modernidade, à burocratização do Estado e à “industrialização da morte”, sofrida também por dirigentes políticos, doentes mentais, ciganos, eslavos, “subversivos” de um modo geral. Práticas sociais genocidas, conforme descritas pelo sociólogo argentino Daniel Feierstein (outro judeu antissemita?), estão presentes tanto na Segunda Guerra Mundial quanto durante o Processo de Reorganização Nacional imposto pela ditadura argentina a partir de 1976. Genocídio é genocídio, e ponto final.

A sacralização do genocídio judaico permite ações que vemos atualmente na televisão, o esmagamento da população palestina em Gaza, transformada em campo de concentração, isolada do resto do mundo. Destruição da infraestrutura, de milhares de casas, a morte de centenas de civis, famílias destroçadas, crianças torturadas em interrogatórios ilegais conforme descrito por advogados israelenses. Não, não são a exceção, não são o efeito colateral de uma guerra suja. São vítimas, sim, de práticas sociais genocidas, que visam, no final do processo, ao aniquilamento físico do grupo.

Recuso-me a acumpliciar-me com esta agressão. O exército israelense não me representa, o governo ultranacionalista não me representa. Os assentados ilegalmente são meus inimigos.

Eu, judeu brasileiro, digo: ACABEM COM A OCUPAÇÃO!!!

(1) Marcelo Gruman é antropólogo.

Referências bibliográficas: CLIFFORD, James. (1997). Diasporas, in Montserrat Guibernau and John Rex (Eds.) The Ethnicity Reader: Nationalism, Multiculturalism and Migration, Polity Press, Oxford.

Vídeo: Tortura de crianças palestinas: https://www.youtube.com/watch?v=z5AkFlAeCHE

Contra palestinos - 6 mil soldados estadunidenses, canadenses e europeus na Faixa de Gaza




Forças armadas estariam se juntando ao exército israelense contra os palestinos; médicos denunciam bloqueios na região que dificultam o atendimento dos feridos

A Rede Euro-Mediterrânea de Direitos Humanos (REMDH) revelou que cerca de seis mil soldados, vindos principalmente dos Estados Unidos, Canadá e Europa estão participando do bombardeio de Israel contra os palestinos na Faixa de Gaza.

O exército israelense já confirmou a morte de um soldado francês de 22 anos. Na última semana, o Ministério das Relações Exteriores dos Estados Unidos também já declarou a morte de dois soldados. 

Fontes palestinas dizem que a medida está sendo tomada porque muitos israelenses estão fugindo do campo de batalha e as autoridades são obrigadas a substituí-los pelos estrangeiros. Mais de 90 soldados de Israel morreram desde o começo da ofensiva contra Gaza. Enquanto do lado palestino, ao menos 1048 pessoas foram mortas além de mais de 6300 feridas. 

“Crime contra a humanidade”

Vinte e quatro médicos europeus que estão em Gaza lançaram uma carta aberta descrevendo os ataques de Israel de “um crime contra a humanidade”.

"Solicitamos aos nossos colegas que denunciem a agressão de Israel. Estamos combatendo a propaganda do governo que transforma o massacre pela denominada ‘agressão defensiva’. A realidade é que se trata de uma agressão cruel com duração e intensidade ilimitadas”, diz a carta que também reforça que a maioria dos alvos israelense são civis inocentes.

Os médicos também denunciam que Gaza está sendo bloqueada, e os feridos não podem buscar socorro em hospitais fora da região, além do acesso a comida e medicamentos ser limitado.

“Israel está insultando nossa humanidade, inteligência e dignidade. Os médicos que tentam viajar para Gaza, não conseguem chegar por conta de bloqueios”, denunciam.

Recém nascidos

Outro aspecto pouco conhecido da ofensiva israelense em Gaza é a morte de bebês abandonados na região, já que recém-nascidos não podem ser levados pelos seus pais para um local seguro.  

É o caso da maternidade do hospital Shifa, onde três bebês dividem a mesma incubadora. A falta de energia e de mantimentos nos hospitais fez com que a Organização Mundial da Saúde (OMS) solicitasse um “corredor humanitário” para tratar dos feridos.

Brasil de Fato – Foto: Librered.net


A GUINÉ EQUATORIAL E A BARULHEIRA DE LISBOA


Alberto Castro é correspondente de Afropress em Londres
Alberto Castro – Afropress, em colunistas

A X Cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada no passado 23 de julho em Díli, capital de Timor-Leste, admitiu por unanimidade a Guiné Equatorial como o nono Estado-membro de pleno direito da organização, culminando assim um processo de dez anos de aproximação ao bloco lusófono pelo único país africano de língua castelhana cujas partes do território, entre os séculos XV e XVIII, pertenceram à Coroa portuguesa.

Um processo nada pacífico, principalmente pela forte oposição à adesão do país de Teodoro Obiang, o homem que o dirige com pulso de ferro há mais de três décadas, por parte de setores da política, imprensa e sociedade civil portuguesa. Os argumentos dos críticos, essencialmente políticos, assentam em temas como a ditadura, corrupção, falta de transparência na governança e violações dos direitos humanos e, entre estes, principalmente a existência da pena de morte no regime de Malabo.

Mas, mesmo perante aquelas fortes e justificadas críticas, o Governo de Lisboa, ainda mergulhado numa grave crise econômico-financeira, foi praticamente forçado pelos demais parceiros da CPLP a aceitar a adesão do que muitos vêem como ''indesejável'' membro na família. Assim não fosse e arriscaria uma situação de isolamento que seria ''muito negativa'', segundo o pragmatismo do primeiro-ministro Passos Coelho.

Não deixou, no entanto, de ser caricata, patética e incoerente o posicionamento do presidente Cavaco Silva. Opositor aberto à adesão, justificou a sua presença na Cimeira da capital timorense com o pretexto, diga-se paternalista e pretensioso, de ''ajudar Timor-Leste para que a mesma fosse um sucesso.'' E numa demonstração de falta de sentido de Estado e tato diplomático comparou, em conferência de imprensa, a situação da Guiné Equatorial com a da Coreia do Norte, desta feita justificando a adesão argumentando que ''o isolacionismo nunca conduziu à democracia e ao respeito pelos direitos humanos''.

Se fosse coerente consigo mesmo, Cavaco Silva teria optado pela ausência na Confêrencia de Díli e permanecido em silêncio no conforto do Palácio de Belém, demonstrando assim a sua reprovação. Foi o que fizeram, em sentido oposto, Dilma Rousseff e José Eduardo dos Santos, apontados como os principais patrocinadores da integração da Guiné Equatorial como membro de pleno direito da CPLP.

Vozes e opiniões indignadas e bem inflamadas de políticos, jornalistas e comentadores contra a adesão encheram páginas de jornais e espaços de comentários nas rádios e TVs portuguesas fustigando o governo luso, particularmente a sua diplomacia, por um desenlace que consideram ser uma autêntica humilhação nacional.

Houve quem sugerisse que Portugal abandonasse de imediato a CPLP e os esquerdistas do Bloco de Esquerda propuseram dois dias depois ao Parlamento um voto que pedia a condenação da entrada do país de Obiang na organização lusófona. O mesmo foi chumbado pela maioria PSD/CDS que apoia o Governo e por parte da bancada Socialista, com abstenções de Comunistas e Verdes.

A Cimeira da cobiça e da desvergonha (I), titula em editorial o jornal Público, um dos mais ferrenhos nas críticas à adesão, na sua edição online de 23 de julho afirmando no primeiro parágrafo que a ''“carteira” de Obiang fala mais alto do que quaisquer outros valores. ''A memória deles pode ser curta, a minha não (II), escreve no mesmo dia e no mesmo jornal a eurodeputada socialista Ana Gomes para quem ''a entrada da Guiné Equatorial presta-se, desde já, a ensombrar a imagem da CPLP. Pois confere um carimbo de respeitabilidade internacional a um regime ditatorial que procura lavar mais, e mais facilmente, no exterior, os proveitos da tirania e da corrupção''. Para o colunista Vasco Pulido Valente, o que aconteceu em Díli foram "merecidos vexames'' (III).

Escreve o articulista que: ''A nós que por aqui andamos a contar tostões não nos faz mal o vexame público do país, que é uma tradição histórica e, pior ainda, um hábito de vida''. E referindo-se ao governo angolano acrescenta: ''Embora obedecer ao Império Britânico seja em princípio menos comprometedor do que obedecer a um bando de cleptocratas”. Mas o colunista acabaria por, no essencial, dar razão ao editorial do Jornal de Angola com o título ''A grandeza da língua'' (IV) no qual aquele diário estatal qualifica certos setores das elites portuguesas com adjetivos como ''preconceituosa”, “incoerente”, “estrábica'', ''ignorante'', ''corrupta e ''soberba''.

Ainda no Público, a colunista Teresa de Sousa questiona dias depois: ''O que anda a fazer a diplomacia portuguesa?''(V). Uma diplomacia que, segundo ela, ''verga-se aos editoriais “ameaçadores” do Jornal de Angola'' e ao Brasil azul (Atlântico Sul), a nova prioridade estratégica prevalecente no Itamaraty, depois do Brasil verde (Amazônia), que visa o fortalecimento das relações Sul-Sul. A colunista sugere que a ''última coisa que passaria pela cabeça de Dilma era ver este objetivo estratégico prejudicado por uma qualquer teimosia de Portugal sobre a questão dos direitos humanos.''

No essencial os argumentos dos críticos são válidos, não apenas do ponto de vista da argumentação meramente política. Credíveis relatos internos e externos mostram que o regime de Obiang choca-se com princípios e valores fundadores da CPLP como o primado da paz, da democracia, dos direitos humanos, da boa governança e da justiça social.

Mas a politização dessas evidências peca por carregar igualmente uma grande dose de cinismo, hipocrisia, paternalismo, suposta superioridade moral e a tentativa de tutela exclusiva de uma língua comum por parte do país de origem da mesma para fins meramente políticos. Uma breve radiografia política à todos os países da CPLP mostraria a olhos nus que os citados princípios e valores são violados e fragilizados diariamente e de forma chocante em todos os espaços lusófonos, sem exceção.

Citando apenas o Brasil, no maior dos lusófonos milhares de brasileiros, na maioria negros e índios, vêem seus direitos de cidadania diariamente violados, suas vidas ceifadas pelo simples ''pecado'' da cor. Raras são as vozes em Portugal que se levantam contra e se indignam.

No que respeita à pena de morte, um dos argumentos mais esgrimidos pelos críticos contra o regime equato-guineense, nunca vi de algum comentador, político ou orgão de imprensa vocalmente contrários a adesão Guiné Equatorial à CPLP, críticas ferozes à consagração da mesma na atual Constituição Federal brasileira.

Embora se aplique apenas em caso de guerra, ela existe e o condenado, em certas situações, pode ser executado sumariamente, sem que seja sequer julgado. Portugal, membro da sinistra OTAN, tem relações de parceria estratégica com os EUA e a China, dois países com pena capital.

No que toca à ditadura, Portugal ainda hoje se ajoelha e suspira por uma parceria estratégica com Angola. No ano passado o Governo de Lisboa apavorou-se quando o poder de Luanda, constantemente retratado em setores da mídia e da política lusa com sendo uma ditadura disfarçada de democracia formal, engavetou a tão desejada parceria estratégica que vinha sendo trabalhada entre os Governos dos dois países.

No que toca a corrupção, transparência e boa governança, nenhum dos Estados-membros da CPLP está em condições de dar lições de moral a outros. Quanto aos banalizados conceitos de democracia e dos direitos humanos, idem.

Estados recentemente saídos de experiências dolorosíssimas de guerras e ditaduras dão os seus primeiros passos na experimentação democrática e deles se exigem comportamentos e práticas que outros vêm experimentando e aperfeiçoando há séculos. Outros, mal consolidaram as suas democracias e já se arrogam ao direito de moralistas, espelhando-se pretensiosamente como modelos a seguir.

Modelos esgotados onde o que na verdade domina é a Televicracia, termo cunhado pelo jornalista e escritor mexicano Jorge Saldaña para explicar a complexidade de uma aberração política onde as mídias se transformaram em ''poderes de facto'' que não resultam dos votos mas que os influenciam, sendo a televisão o núcleo principal desses poderes. Um embuste mediático que nega a democracia em todos os seus conceitos.

A barulheira eurocêntrica que se fez sentir em Lisboa por causa da adesão da Guiné Equatorial revela igualmente uma visão estreita do que deve ser a CPLP, uma amnésia histórica que roça o insulto aos africanos e um desconhecimento do enquadramento do país agora oficialmente trilingue (caso raro) de grande importância geoestratégica nas relações internacionais. Vivemos num mundo globalizado, cada vez mais competitivo e interdependente.

A entrada na lusofonia não pode nem deve ser condicionado apenas à dimensão da língua falada e escrita como muitos defendem. Fazer isso é um exercício de negação fundamentalista do passado e reducionista da história. Assim fosse e os países africanos lusófonos sequer fariam parte da CPLP porque a maioria das suas populações sequer fala e escreve o Português. E quem assim demagogicamente pensa sequer tem dinheiro para manter uma comunidade meramente de afetos.

A dimensão econômica da adesão da Guiné Equatorial deve ser vista como uma vantagem para a CPLP e não reduzida a um mero aproveitamento de petróleo e gás natural que elimina importantes dimensões identitárias da mesma como a histórica e a cultural. Tão pouco deve ser usada para nos mantermos em silêncio e à margem dos atropelos aos nobres valores consagrados estatutáriamente na Comunidade. Sou dos que defendem uma exigência cada vez maior na observância dos mesmos em todos os espaços da lusofonia.

E creio que isso apenas se consegue com uma verdadeira democratização da CPLP como organização verdadeiramente comunitária de bem e não um clube de interesses elitistas e obscuros.

Vejo, por tudo isso, a integração da Guiné Equatorial como um feliz reencontro com a história dos povos da lusofonia e um enorme desafio à própria comunidade que os diz representar. É falacioso defender que a mesma confere um selo de respeitabilidade internacional à ditadura de Obiang. 

A Guiné Equatorial é membro da francofonia e de diversas organizações multilaterais regionais, continentais, intercontinentais e globais. A CPLP é uma organização que mal se firmou no plano internacional e, mais preocupante, mal se afirmou nos espaços da lusofonia onde ainda é praticamente desconhecida. 

A barulheira portuguesa confirmou uma grande verdade: esquecer o passado é correr o risco de deixar desprotegido o futuro. Demonstrou-se  um grande desconhecimento, amnésia histórica e desrespeito pela história de Portugal e dos povos com que no passado privou criando fortes elos identitários comuns.

Foram inquestionavelmente séculos de convivências bem mais violentas do que pacíficas. No entanto, neles se criaram e se fortaleceram laços de identidades histórico-culturais inquebrantáveis que não se reduzem apenas à enorme responsabilidade portuguesa no hediodno comércio e tráfico de escravos.

Assim fosse e a Guiné Equatorial, ao invés da adesão, estaria hoje a instaurar um processo internacional contra Portugal reivindicando justas compensações morais e materiais pelos enormes danos causados pelo horrendo tráfico negreiro.

Nesse quesito os africanos dão uma lição a Portugal ao mostrarem-se, por enquanto, tolerantes para com as páginas mais obscuras da sua história. Isso demonstra, por um lado, a grandeza de alma dos filhos daqueles a quem um dia se tirou a alma para fossem escravizados. Por outro, mostra que apesar de todos os pesares, alguma coisa de bom ficou do relacionamento secular de Portugal com a África.

A visão estreita e a amnésia histórica de parte de inúmeros políticos, comentadores e da generalidade da imprensa em Portugal, ignorantes da sua própria história, fica resumida no parágrafo final do citado editorial do Jornal de Angola: ''Os portugueses têm um grande orgulho na expansão marítima da qual resultou o seu império. Mas agora há países e povos que guardam a memória desse passado comum e querem pertencer à CPLP. Alguns  renegam esse passado e opõem-se ao alargamento da organização. São demasiado pequenos para a grandeza da Língua Portuguesa.''

Perde-se muito tempo e energias com críticas avulsas, mesquinhices, birrinhas e ciumimhos quando o que se deveria fazer era publicitar a CPLP, explicar aos povos da lusofonia o que ela significa e representa, fortalecê-la, torná-la conhecida e visível através de programas de intercâmbios culturais, desportivos, empresariais, políticas de livre circulação para todos no espaço geográfico lusófono etc.

Não tê-la como uma organização que, até agora, em que pese toda a sua validade, tem servido praticamente como instrumento de aproveitamentos políticos, de passeios turísticos e negócios das elites políticas, econômicas e culturais. São os povos, apenas eles, que podem fazer a grande Comunidade da Lusofonia em todas as suas dimensões. Não políticos demagogos, jornalistas e intelectuais vaidosos com agendas próprias.

Por isso há que começar a democratizá-la já dando vez e voz aos seus povos através de iniciativas e instituições como, por exemplo, um Parlamento Lusófono que a possa escrutinar.
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Moçambique: Confrontos militares ofuscaram direitos humanos nas zonas de tensão




Acordo entre Governo e Renamo foi alcançado, esta segunda-feira, depois de 65 rondas de negociações marcadas por avanços e recuos. Para trás ficam dezenas de mortos e danos materiais

As privações de acesso à alimentação, serviços de saúde, ensino, habitação e à informação constituem as principais violações dos direitos humanos em Moçambique. A situação parece contraditória, dado que o Estado moçambicano é subscritor de vários instrumentos internacionais de defesa e promoção dos direitos humanos. Na verdade, o principal problema com que o país se debate está na fraca capacidade de implementação de uma vasta legislação que procura proteger a dignidade humana. As falhas estendem-se à fiscalização, esta última actividade por excelência da Assembleia da República.

Estas constatações foram feitas no debate sobre a situação dos direitos humanos no país, denominado “Campanha Internacional sobre os Direitos Humanos, Cidadania e Acesso à Informação”. No primeiro dia do encontro, que decorre no município de Boane, província de Maputo, o presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), Custódio Duma, defendeu que um dos desafios que o país deve superar para garantir a promoção dos direitos humanos é popularizar o conceito e capacitar os funcionários, sobretudo a Polícia e professores, sobre a matéria.

Alguns participantes reconheceram que o país tem estado a registar avanços significativos na promoção dos direitos humanos, mas disseram que há ainda muito por fazer. Aliás, intervenções houve que defenderam a necessidade do Estado ser mais interventivo na promoção da dignidade humana, através da adopção de políticas e cumprimento das mesmas.

Em declarações ao “O País”, a ministra da Justiça, Benvinda Levi, disse que o Estado está a cumprir o seu papel na promoção dos direitos humanos, mas reconheceu alguns desafios no processo. Um dos desafios apontados pela ministra da Justiça é a promoção da dignidade humana, sobretudo nas zonas rurais, onde o tema é pouco conhecido.

Benvinda Levi chamou atenção dos participantes sobre o papel de cada cidadão moçambicano no respeito e promoção dos direitos humanos. “A promoção da dignidade humana não é somente da responsabilidade do Estado, mas também de toda a sociedade, que deve colaborar valorizando e ajudando o próximo”, lembrou a ministra. 

CONFLITOS ARMADOS OFUSCAM DIREITOS HUMANOS

A “Campanha Internacional sobre os Direitos Humanos, Cidadania e Acesso à Informação” acontece num ano em que algumas zonas do país viveram momentos de tensão político-militar, uma situação que resultou em mortes e deslocação de população.

Na verdade, é opinião unânime dos participantes que os ataques armados registados com maior incidência em alguns distritos de Sofala, com destaque para o troço entre rio Save e Muxúnguè, na EN1, violaram os direitos humanos. Além causar vítimas humanas, os ataques colocaram milhares de famílias em situação de total vulnerabilidade, inviabilizando o acesso aos serviços básicos, como educação e saúde.

Não é por acaso que alguns participantes defenderam que o consenso alcançado, segunda-feira, entre o Governo e a Renamo deve preservar a paz, como forma de garantir a promoção da dignidade humana. O acordo foi alcançado depois de 65 rondas negociais marcadas por avanços e recuos.

A “Campanha Internacional sobre os Direitos Humanos, Cidadania e Acesso à Informação” termina amanha e foi organizado pelo IBIS.

O País (mz)

RENAMO CANDIDATA PORTA-VOZ DETIDO ÀS LEGISLATIVAS MOÇAMBICANAS




António Muchanga, porta-voz da Renamo detido a 07 de julho, figura como número dois pela província de Maputo nas listas do maior partido de oposição moçambicano às legislativas de 15 de outubro, noticia hoje o jornal MediaFax.

Muchanga foi preso à saída do Conselho de Estado, que decidira momentos antes levantar a imunidade de que o porta-voz beneficiava enquanto conselheiro nomeado pela Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), por alegada instigação à violência.

Desde então, o dirigente da Renamo está detido na prisão de alta segurança da Machava, nas imediações da capital, tendo como advogada a presidente da Liga dos Direitos Humanos, Alice Mabota.

Em 2009, a Renamo elegeu apenas um deputado pelo círculo da província de Maputo.

Segundo o MediaFax, em círculos onde a Renamo tem tradicionalmente peso, apostou no secretário-geral do partido, Manuel Bissopo, para liderar a candidatura por Sofala, e em Ossufo Momade, que exerceu o mesmo cargo, para cabeça de lista em Nampula, maior círculo eleitoral do país.

Em Manica, a Renamo aposta no principal representante do partido no processo de diálogo com o Governo, Saimone Macuiane, e na cidade de Maputo no académico António Namburete, que também inclui o grupo de negociadores.

Para a Zambézia, segundo maior círculo eleitoral do país e onde a Renamo é habitualmente forte, o cabeça de lista é Abdala Ossifo Ibraimo.

Moçambique tem previstas eleições gerais (presidenciais, legislativas e assembleias provinciais) para 15 de outubro.

Para as presidenciais, a Renamo candidata o presidente do partido, Afonso Dhlakama, que vai enfrentar Filipe Nyusi, da Frelimo, partido no poder, e Daviz Simango, líder do Movimento Democrático de Moçambique.

Lusa

Brasil - Santander: banco que dá prejuízo a acionistas pode ser bom conselheiro?




O alarde associando oscilações da Bolsa às pesquisas eleitorais é uma versão 'Não vai ter Bolsa' do 'Não vai ter Copa'. Quem apostou contra o Brasil, perdeu

 Helena Sthephanowitz

O banco Santander do Brasil abriu seu capital ao público na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) em outubro de 2009, a R$ 23,50 cada ação. Menos de cinco anos depois, a matriz espanhola do banco fez, em 29 de abril de 2014, uma oferta pública para os acionistas minoritários – que detêm cerca 25% dos papéis do Santander do Brasil negociados na Bovespa – trocarem suas ações pelas ações da matriz do grupo espanhol, ao valor de R$ 15,31.

Significa que quem aplicou seu dinheiro nas ações do Santander Brasil em 2009 ao valor unitário de R$ 23,50, depois recebeu uma proposta do próprio banco de negociá-las por R$ 15,31. Um prejuízo de 34,85% entre uma operação e outra. Será que o banco pode ser considerado um bom conselheiro? A ponto de escrever uma mensagem nos extratos de caráter especulativo sobre rumos da economia de acordo com oscilações das pesquisas eleitorais que, pela falta de fundamentação mais sólida, não difere muito de previsões vistas nos horóscopos.

Outra curiosidade é que a matriz do grupo espanhol quer se fortalecer unificando com as operações brasileiras. Ou seja, há uma clara aposta no crescimento do mercado brasileiro maior do que na Espanha e, independentemente do resultado das eleições – senão esperaria outubro passar para montar tal operação ou não, conforme o resultado.

Há, de fato, especulação financeira na Bolsa de Valores quando as pesquisas melhoram as chances dos candidatos de oposição, porque o mercado financeiro vê o candidato do PSDB, Aécio Neves, como o seu representante. Se considerarmos as tensões naturais entre os interesses de lucro de banqueiros e o papel moderador da autoridade de governo para defender a sociedade dos excessos cometidos pelos bancos, através da boa regulação do mercado, Aécio se posiciona do lado do balcão em que estão os banqueiros. Dilma Rousseff é criticada por eles, que reclamam de excesso de "intervencionismo".

Porém, tal especulação não passa de alarde. Os espertos espalham o boato de que a Bolsa de Valores sobe ou desce conforme o resultado das pesquisas. As pessoas ingênuas acreditam e passam a vender ou comprar ações em função de oscilações nas pesquisas. Os espertos sabem de antemão o comportamento e fazem seus movimentos inversos, de forma a ganhar o dinheiro dos ingênuos. É como boiadeiros que conduzem a manada rumo ao abate.

Se a oposição tucana ganhasse as eleições, com suas medidas amargas prometidas, o mais provável é haver no Brasil medidas recessivas pedidas pelos bancos. E estas medidas prejudicam o desempenho de empresas, inclusive as de capital aberto, com ações negociadas. Logo, o cenário mais provável seria que a Bovespa sofresse queda em 2015, caso houvesse a eleição do tucano, e permanecesse combalida. Algo semelhante ao que ocorreu no início do governo Collor.

Mesmo a Petrobras perderia valor ao longo do tempo à medida que o tucano cumprisse sua promessa de retirar o protagonismo da estatal na exploração do petróleo no pré-sal, entregando para empresas estrangeiras. Seriam as petroleiras estrangeiras que teriam suas ações valorizadas em seus países, enquanto a Petrobras perderia valor por passar a um processo de encolhimento, como ocorreu no governo FHC.

O Banco do Brasil também perderia valor, pois o projeto tucano é privatista, de enfraquecer os bancos públicos em favor dos bancos privados. A única estatal que poderia ter seu valor de mercado maior a curto prazo seria a Eletrobras, se Aécio promovesse um tarifaço na conta de luz, como faz com a Cemig, forçando o cidadão a pagar mais para distribuir mais dividendos aos acionistas.

Porém, essas medidas prejudicariam todo o setor produtivo que tem a eletricidade como insumo. É outra medida recessiva que prejudica a produção e as exportações. Há outras questões, como a visão equivocada do tucanato em se imaginar atrelado apenas às economias estadunidense e europeia, se afastando do G-20 e dos Brics, o que importaria a crise europeia para cá, fazendo a bolsa cair.

Enfim, uma análise bem fundamentada não autoriza ninguém a levar a sério estas variações na Bolsa de Valores por causa de pesquisas. Até porque se houvesse essa relação de verdade, os próprios bancos contratariam suas pesquisas eleitorais internas diariamente para tomada de decisão no dia a dia. Mas os espertos especulam, e azar de quem perder dinheiro caindo nesta conversa.

Como há males que vêm para bem, o fato de um banco grande como o Santander ter replicado oficialmente este alarmismo chamou atenção para o que está acontecendo de fato. Este alarde é uma versão "Não vai ter Bolsa" do "Não vai ter Copa". Quem especulou que a organização da Copa do Mundo 2014 no Brasil fracassaria, perdeu. A Copa foi um sucesso na organização e nos resultados econômicos que o evento produz para o país.

Com aqueles que apostam contra a economia brasileira, que mostra capacidade de superar as adversidades, deve ocorrer a mesma coisa. A economia brasileira vem resistindo nos momentos mais adversos, até porque hoje é muito sólida, com reservas de US$ 370 bilhões que garantem folga para enfrentar tormentas. Se ajusta com novas oportunidades e horizontes que se abrem, como a recente criação do Banco de Desenvolvimento dos Brics.

Os que hoje pregam o terror para especular nas bolsas pedirão para esquecer o que escreveram logo que passar as eleições. Abertas as urnas, não haverá mais pesquisas eleitorais para especular com a crença dos ingênuos.

Rede Brasil Atual, em Blog da Helena

Porta-voz dos índios Yanomami pede protecção à polícia brasileira devido a ameaças de morte




Brasília, 30 jul (Lusa) -- O porta-voz da tribo Yanomami, Davi Kopenawa, pediu proteção a polícia brasileira devido a uma série de ameaças de morte feitas por homens armados, alegadamente contratados por garimpeiros que trabalham ilegalmente nas terras indígenas, divulgou hoje a Survival International.

Em junho, segundo a Survival International, homens armados em motas invadiram o escritório do Instituto Socioambiental (ISA), que trabalha em estreita colaboração com os Yanomami, perguntando por Davi Kopenawa.

Os homens ameaçaram a equipa de funcionários do ISA -- que é uma organização da sociedade civil de interesse público (OSIP) - com armas e roubaram computadores e outros equipamentos. Após o assalto, um dos homens foi preso e declarou ter sido contratado por garimpeiros.

Em maio, a Hutukara Associação Yanomami -- presidida por Kopenawa -- recebeu uma mensagem dos garimpeiros de que o porta-voz não estaria vivo até ao final deste ano.

"Eles querem acabar comigo... Não faço como os brancos que vão atrás de uma pessoa para acabar com ela. Não atrapalho o trabalho deles, mas eles estão atrapalhando o nosso trabalho e a nossa luta. Vou continuar lutando e trabalhando pelo meu povo. Porque esse é o meu trabalho. Defender o povo e a terra Yanomami", disse Davi Kopenawa.

Desde o ataque, um clima de medo tem pairado sobre os escritórios do ISA e da Hutukara, com homens em motas a intimidar os funcionários e a perguntar sempre pelo porta-voz, que também é um xamã.

De acordo com a Survival, os garimpeiros ilegais trabalham na terra Yanomami, poluindo o ambiente que os Yanomami dependem para a sua sobrevivência.

Em colaboração com a Hutukara, o Governo do Brasil lançou uma grande operação para expulsar centenas de garimpeiros ilegais e destruir as máquinas do garimpo em fevereiro de 2014.

Kopenawa, que foi chamado de "Dalai Lama da floresta", está à frente da luta pela proteção da terra Yanomami há mais de 30 anos.

O porta-voz dos Yanomami viajou para o exterior em várias ocasiões para aumentar a consciencialização sobre a necessidade urgente de proteger a floresta Amazónica da destruição. Já discursou na ONU e recebeu o prêmio Global 500, entre outros, pela sua contribuição na luta pela preservação ambiental.

"As leis do Estado não significam nada na fronteira da Amazónia, que é tão selvagem e violenta como o oeste-americano costumava ser", disse hoje o diretor da Survival International, Stephen Corry.

"Qualquer pessoa que se coloque no caminho dessa colonização agressiva corre o risco de ser morto a sangue frio. Não são falsas ameaças -- ativistas indígenas são frequentemente assassinados por resistirem à destruição das suas terras", sublinhou Corry.

Para o ativista ambiental, "a vida de Davi Kopenawa está em perigo. Aqueles por detrás das ameaças e deste último ataque devem ser levados à justiça e as autoridades precisam agir logo para evitar o assassínio de mais um homem inocente".

CSR // VM - Lusa

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