sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Hong Kong: ESTUDANTES QUEREM VIAJAR PARA PEQUIM NO SÁBADO




Hong Kong, China, 14 nov (Lusa) - Representantes dos manifestantes pró-democracia de Hong Kong querem viajar no sábado para Pequim com o objetivo de se reunirem com representantes do Governo central e pedir o pleno sufrágio universal nas próximas eleições, em 2017.

A Federação de Estudantes de Hong Kong, que agiu como interlocutor oficial no diálogo com o Governo de Hong Kong, pretende enviar três representantes para tentarem uma reunião com o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, e membros do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional que participaram na reforma política do sistema eleitoral de Hong Kong, escreve a agência Efe.

A viagem é descrita como um "protesto político" depois de o governo de Hong Kong ter rejeitado o diálogo entre os manifestantes e as autoridades centrais, disse na noite de quinta-feira o secretário-geral da Federação de Estudantes, Alex Chow, durante um discurso em Admiralty, uma das três zonas ocupadas pelos estudantes.

Alex Chow, Eason Chung Yiu-wa e Nathan Ley Kwun-chung são os três responsáveis da Federação de Estudantes que pretendem viajar até Pequim, uma viagem que segundo o primeiro é um sinal de que "os cidadãos de Hong Kong não têm medo da manipulação de Pequim".

"Estamos dispostos a ser detidos ou presos. Ao avançarmos com esta missão temos de enfrentar as consequências", disse Alex Chow.

Lester Sum, secretário-adjunto da Federação de Estudantes, não deu detalhes sobre a viagem, numa altura em que alguns dos membros estavam a tratar das autorizações da visita ao interior da China.

Alex Chow, que mostrou dúvidas sobre se as autoridades chinesas vão permitir a entrada dos estudantes, disse que a viagem será cancelada se a polícia avançar com a retirada das barricadas das zonas ocupadas, tal como tem sido referido esta semana.

O secretário-geral da Federação dos Estudantes explicou que no caso da intervenção da polícia em Hong Kong, os jovens teriam de ficar no território para lidar com a situação. Alex Chow defendeu, porém, que qualquer ação de dispersão dos protestos iria demonstrar que Pequim rejeitou por completo a voz da população de Hong Kong.

Fontes do governo central, citadas hoje pelo diário de Hong Kong Mingpao, descartam a hipótese de o executivo de Pequim se envolver nas ações para devolver a normalidade às zonas ocupadas.

Segundo o diário independente, a visita que o Presidente chinês, Xi Jinping, tem prevista a Macau em dezembro, no âmbito das celebrações do 15.º aniversário da transição do exercício de soberania, é a principal razão pela qual o governo central não quer intervir.

A pressão sobre as centenas de estudantes que permanecem acampados nas ruas intensificou-se nos últimos dias, sobretudo depois de o Tribunal Superior de Justiça se ter pronunciado contra a possibilidade de os jovens apelarem da ordem judicial que dá autoridade à polícia para desocupar várias das ruas ocupadas no âmbito dos protestos iniciados há mais de seis semanas.

A polícia tem ainda autorização judicial para levar a cabo detenções no caso de os manifestantes manifestarem algum tipo de resistência física.

A antiga colónia britânica vive a mais grave crise política desde a transição de soberania para Pequim, em 1997.

Pequim aprovou o princípio "uma voz, um voto", mas reserva a um comité eleitoral, maioritariamente favorável ao Partido Comunista chinês a pré-seleção dos candidatos a chefe do Executivo em 2017, condições consideradas inaceitáveis pelo movimento pró-democracia.

FV // JCS

China deteve cerca de 100 ativistas durante cimeira da APEC, denuncia ONG




Pequim, 14 nov (Lusa) -- As autoridades chinesas detiveram uma centena de ativistas durante a cimeira dos líderes da Ásia Pacífico em Pequim, realizada esta semana, denuncia hoje a organização não-governamental Chinese Human Rights Defenders (CHRD).

Em comunicado, a CHRD indicou que aumentaram as restrições aos dissidentes e ativistas em Pequim, mas também noutras partes da China, sob o pretexto de "manter a estabilidade" durante o fórum de Cooperação Económica da Ásia Pacífico (APEC), que reuniu vários líderes mundiais na capital chinesa entre os dias 05 e 11 deste mês.

"Enquanto os líderes mundiais se reuniam para debater a economia, os direitos humanos eram ocultados sob a grande mesa de jantar da APEC, na qual Xi Jinping (Presidente chinês) recebeu Obama, Nobel da Paz, e Michelle Bachelet (Presidente do Chile, vítima da perseguição do regime de Pinochet)", disse à Efe Wendy Lin, coordenadora em Hong Kong da CHRD.

Entre os casos registados pela ONG está o da ativista Ni Yulan, que ficou paraplégica na sequência de uma carga policial, refere a agência Efe.

Libertada depois de passar mais de dois anos na prisão, a ativista e família foram colocados em prisão domiciliária desde 11 de novembro alegadamente devido à APEC e a intenções de alguns diplomatas de a visitarem.

Ge Zhihui, outra ativista incapacitada, também foi submetida a prisão domiciliária durante dez dias, denunciou a CHRD.

A organização acrescentou que dois ativistas da província de Heliongjiang (norte) foram enviados para a prisão, além de outros casos similares em Xangai (leste) e Wuhan (centro), entre outros.

Alguns ativistas protagonizaram uma manifestação nos arredores de Pequim e reivindicaram ao Governo que proteja os direitos humanos.

Durante a cimeira da APEC, considerado o evento mais importante realizado na capital chinesa desde os Jogos Olímpicos de 2008, as autoridades montaram um grande dispositivo de segurança, que incluiu fortes medidas antiterroristas, e contra eventuais manifestações, descreve a agência Efe.

FV // PJA

Macau - Metro: PROLONGAMENTO ATÉ À ILHA DA MONTANHA




As obras devem arrancar no início do próximo ano estando ainda em cima da mesa a hipótese de ligação ao metro da China que passa na Ilha

OGoverno decidiu estender a linha do metro ligeiro para a Ilha da Montanha, anunciou ontem o Executivo. De acordo com Lau Si Io, Secretário para os Transportes e Obras Públicas, Macau e a Ilha da Montanha já resolveram a questão da junção dos itinerários e da profundidade dos terrenos, sendo que a extensão do metro já se encontra em fase de concepção do projecto.

À saída de uma reunião da Assembleia Legislativa, o responsável do Governo disse, contudo, que apesar de as obras poderem começar a ser feitas “no final deste ano, ou no início do próximo”, ainda há que ponderar algumas coisas. Uma delas é, por exemplo, a necessidade de que as duas partes estejam envolvidas na concepção do projecto da extensão, que está, então, a ser feita. “Relativamente ao início das obras, nesse sentido, é necessário que as duas partes envolvidas, Macau e interior da China, estejam de acordo.
 Porque [esta construção] envolve directamente a ilha da Montanha, por isso precisamos de ter a consideração da outra parte [Governo Central]”, esclareceu o Secretário. “Prevê-se que no próximo ano se possam iniciar as respectivas obras”, esclareceu Lau Si Io à imprensa, ressalvando contudo que, como “depois da conclusão do projecto, terá início o concurso público para as respectivas obras”, não é possível avançar com um calendário exacto.

DEBAIXO DE ÁGUA

Para já, e de acordo com o comunicado enviado ontem, sabe-se que “o percurso da extensão do metro ligeiro para a Ilha da Montanha funcionará através de uma linha subaquática”, pelo que será projectado um túnel abaixo do nível das águas do rio, “onde passa o canal de navegação Shizi Men”.

A ligação do metro de Macau ao metro da China, que passa na Ilha da Montanha, é outra das hipóteses.

Lau Si Io acrescentou ainda que os serviços de Obras Públicas e Transportes receberam das forças de segurança pública o pedido de reconstrução do posto fronteiriço Flor de Lótus, encontrando-se ainda este projecto a ser analisado.

Hoje Macau

PR timorense promulga lei da comunicação social, mas volta a remetê-la para Tribunal de Recurso




Díli, 14 nov (Lusa) - O Presidente de Timor-Leste, Taur Matan Ruak, promulgou a lei da comunicação social, mas voltou a remeter o diploma para o Tribunal de Recurso para "fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade", anunciou hoje em comunicado a presidência timorense.

"O Presidente da República, Taur Matan Ruak, promulgou o decreto do parlamento nacional que aprova a lei da comunicação social. O diploma promulgado foi remetido ao Tribunal de Recurso para fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade", refere o comunicado.

Segundo a Presidência timorense, o reenvio do diploma para o Tribunal de Recurso deveu-se ao facto de o parlamento ter confirmado a norma constante no artigo 24.º, que já tinha sido considerada inconstitucional por "violação do princípio da igualdade".

O artigo 24.º refere-se à participação de pessoas singulares ou coletivas estrangeiras no capital social de um órgão de comunicação social, que não pode exceder os 30 por cento do capital.

Em julho, o Presidente timorense pediu a fiscalização preventiva da lei devido a dúvidas suscitadas sobre a constitucionalidade das normas aprovadas.

Em outubro, o parlamento fez alterações aos artigos 20.º e 40.º, que o Tribunal de Recurso tinha considerado que violavam a Constituição por limitarem a atividade jornalística, e voltou a aprovar a lei.

A lei da comunicação social tem sido fortemente contestada pelos jornalistas timorenses, sociedade civil e organizações internacionais de defesa dos jornalistas.

Em setembro, a Amnistia Internacional (AI) exortou o parlamento de Timor-Leste a fazer alterações à lei da imprensa em conformidade com a decisão do Tribunal de Recurso.

Segundo a AI, ativistas timorenses acreditam que a "lei foi promulgada para impedir os jornalistas locais e estrangeiros de informar sobre os supostos atos de corrupção, nepotismo e má gestão financeira em Timor-Leste".

MSE // VM

Leia mais em Página Global sobre TIMOR-LESTE

G20: REUNIÃO COMEÇA SÁBADO ENSOMBRADA PELO FRACO CRESCIMENTO DA EUROPA




Birsbane, Austrália, 14 nov (Lusa) - O debate sobre as regras dos limites da dívida pública e do défice será o maior desafio à intenção de definir uma nova meta para o crescimento durante o debate na reunião do G20, que hoje se inicia em Brisbane, Austrália.

De acordo com a análise da agência financeira Bloomberg, os líderes mundiais têm expressado a sua frustração com o que dizem ser uma obsessão da União Europeia, comandada pela Alemanha, sobre os limites do défice orçamental.

Quando se sentarem em Brisbane para debater o pedido da União Europeia para uma estratégia de crescimento "alargada" com vista a aumentar o investimento do setor privado e travar os défices excessivos, o grupo do G20 vai incluir a França e a Itália, dois países que têm publicamente criticado a visão rígida da Europa neste tema.

A Alemanha e os seus aliados dizem que as regras sobre a dívida pública, limitada pelos tratados a 60% do PIB, são essenciais para a credibilidade europeia, mas os acontecimentos dos últimos seis anos na zona euro têm prejudicado a reputação do bloco da moeda única no que diz respeito à gestão económica, independentemente da questão de saber se os 18 países conseguem, de fato, cumprir as metas.

A economia da zona euro cresceu 0,2% no terceiro trimestre do ano, acima dos 0,1% do trimestre anterior, divulgou hoje o Eurostat na estimativa rápida, na qual se anuncia também que para o total da UE, o crescimento foi de 0,3% entre julho e setembro, o que compara com os 0,2% do segundo trimestre e, em termos homólogos, a economia da zona euro cresceu 0,8%, enquanto na União Europeia o PIB aumentou 1,3%.

O fraco crescimento da Europa, de resto, foi um dos principais riscos apontados pelo Fundo Monetário Internacional para cortar, em setembro, a previsão de crescimento da economia global, e um dos maiores responsáveis do Banco de Inglaterra disse recentemente que "o espectro da estagnação económica ameaça a Europa".

Do outro lado do Atlântico, as palavras também são de preocupação: "O mundo não se pode dar ao luxo de ter uma década perdida na Europa", disse o secretário do Tesouro norte-americano, equivalente ao ministro das Finanças no modelo europeu.

As "políticas que mantêm o status quo" na Europa não são consentâneas com a agenda de crescimento do G20 e é preciso "uma ação resoluta por parte das autoridades nacionais e de outros organismos europeus para reduzir o risco de a região cair em recessão".

MBA // EL

G20: Navios de guerra russos ao largo da costa australiana para garantir segurança de Putin




Brisbane, Austrália, 14 nov (Lusa) -- A Rússia tem quatro navios de guerra ao largo da costa da Austrália para garantir, caso seja necessário, a segurança do Presidente russo, Vladimir Putin, durante a cimeira do G20, que começa no sábado em Brisbane, foi hoje divulgado.

De acordo com informações divulgadas pela comunicação social australiana, a representação diplomática russa no país explicou às autoridades australianas que a frota naval também está a testar as suas capacidades para eventuais investigações científicas na Antártida.

Os quatro navios russos estão em águas internacionais, no Mar do Coral, e estão a ser vigiados por igual número de navios das forças australianas.

O Ministério da Defesa australiano confirmou entretanto a presença dos navios russos ao largo da costa norte da Austrália, enquanto uma outra fonte do Governo de Camberra explicou que o navio de guerra australiano Parramatta está a realizar manobras militares com o navio russo Varyag.

As autoridades australianas também indicaram que a presença destes navios é "completamente coerente com o direito internacional dos barcos militares de exercerem o direito de navegar em águas internacionais".

Alguns analistas estão a interpretar a presença da frota naval russa como um exercício de força de Vladimir Putin, numa altura em que o governante russo terá de encarar as críticas dos líderes do G20 (grupo que integra os países mais desenvolvidos do mundo e as principais economias emergentes) devido às suas ações na Ucrânia.

A cimeira do G20 em Brisbane, a terceira maior cidade da Austrália, decorre até domingo.

SCA // VM

G20: CAMERON E ABBOTT PEDEM A PUTIN PARA MUDAR DE ATITUDE




Camberra, 14 nov (Lusa) -- O primeiro-ministro britânico, David Cameron, pediu hoje a Vladimir Putin para parar de atacar a Ucrânia e o seu homólogo australiano, Tony Abbott, acusou o presidente russo de procurar restaurar a "glória perdida do czarismo".

As declarações dos chefes de governo numa conferência de imprensa conjunta são feitas na véspera da deslocação do presidente russo à cimeira do G20, no sábado e domingo em Brisbane, no leste da Austrália, e numa altura em que os ocidentais evocam a ameaça de novas sanções contra Moscovo devido ao conflito ucraniano.

Falando no parlamento australiano, Cameron advertiu a Rússia de que arrisca novas sanções se não se comprometer a resolver o conflito na Ucrânia, uma ex-república soviética onde forças pró-russas controlam regiões russófonas no leste do país.

"Se a Rússia adotar uma abordagem positiva em relação à liberdade e à responsabilidade da Ucrânia, as sanções podem ser levantadas. Se a Rússia continuar a fazer piorar a situação, as sanções podem intensificar-se. É tão simples como isto", sublinhou Cameron.

O primeiro-ministro australiano, por seu turno, pediu a Putin para "fazer 'mea culpa'" em relação ao despenho do avião da Malaysia Airlines em julho, numa zona controlada por rebeldes pró-russos no leste da Ucrânia, que causou 298 mortos, alguns dos quais australianos.

O avião foi abatido por um míssil fornecido pela Rússia, segundo os ocidentais, o que Moscovo desmente, "apontando o dedo" às forças ucranianas.

Criticando o crescimento das atividades militares de Moscovo, Tony Abbott adiantou que a Rússia mostra a sua força como não fazia há muito tempo, referindo o aparecimento esta semana de vários navios da marinha russa a norte das costas australianas.

"Quer se trate de atacar a Ucrânia, da intensificação dos voos de aviões militares no espaço aéreo do Japão e dos países europeus, da força naval que está agora no Pacífico Sul, a Rússia está muito mais segura de si agora", assinalou Abbott.

O chefe do governo australiano considerou que "a Rússia seria muito mais interessante se aspirasse a ser uma superpotência de paz, liberdade e prosperidade, em vez de tentar restaurar a glória perdida do czarismo ou da União Soviética".

PAL // PJA

VLADIMIR PUTIN JÁ NÃO VÊ MAIS OS ESTADOS UNIDOS COMO “PARCEIRO”




O discurso de Vladimir Putin em Sochi marca um ponto de viragem nas relações internacionais. O presidente russo deixou claro que ele agora já não vê os Estados Unidos como "parceiro". Não se trata de uma declaração de guerra, mas de um facto: os Estados Unidos estão em guerra contra o resto do mundo. Giulietto Chiesa analisa as consequências deste passo em frente.

Giulietto Chiesa* – Rede Voltaire

Em Sochi, no mês de outubro de 2014, Vladimir Putin reformulou drasticamente as relações entre a Rússia e Washington. Um discurso ponderado [1]; seria um erro grave subestimar a sua importância. Muito mais forte e, às vezes, dramaticamente claro em relação ao que ele havia pronunciado em Munique, em 2007 [2]. No decurso destes 14 anos no poder o presidente russo nunca tinha ido tão longe. E, compreende-se melhor porquê seguindo o seu raciocínio.

Vejamos de que revisão, ou "Reset", se trata. Até ontem, Putin havia permanecido "dentro" do esquema pós-Guerra Fria. Ele ficara lá, não só porque não tinha verdadeiramente escolha como porque, com toda a probabilidade, acreditava neste esquema que ele achava útil e realista. Mas, a ideia de o ultrapassar permanecia bem presente no seu espírito, a mais ou menos longo prazo, construindo com os Estados Unidos uma nova arquitetura para a segurança internacional.

Falar de «sapos» sobre tudo o que a Rússia teve de engolir sem tugir palavra, durante anos, desde a queda do Muro de Berlim é um doce eufemismo. Seria mais exacto falar de estaladas (tapas-br) em série. A Rússia foi posta à margem da maior parte das principais decisões a nível internacional, relegada para segundo plano, afastada sem nenhuma consideração. Isto foi (também) uma maneira de lhe fazer compreender que ela só contava «para as sobras», e, que não nos importamos que isso mude.

Excluída da gestão de conflitos em África, ignorada no debate sobre as questões financeiras, colocada na fila de espera da Nova Ordem Mundial. Duramente atingida aquando da guerra na ex-Jugoslávia, indo até ao bombardeio de Belgrado e independência do Kosovo. Apenas admitida à mesa das negociações quando era absolutamente indispensável, como nas discussões com o Irão e durante a crise síria.

Pior: com os últimos presidentes americanos, de Bill Clinton a Barack Obama passando por George W. Bush, os Estados Unidos têm manobrado à escala planetária omitindo regiamente reconhecer a área de influência da Rússia, indo por aí sem qualquer tipo de atenção diplomática. Instalaram-se em toda a Ásia Central ex- soviética: do Azerbaijão ao Quirguistão. Nem sempre com a mesma facilidade, claro, mas sendo o principal passar a mensagem: Washington significava a Moscovo assim que não dava qualquer importância ao peso da Rússia nesta região do mundo.

Já para não falar da Otan, cuja expansão para o leste, após o fim do Pacto de Varsóvia, continuou sem descanso, simultaneamente ao alargamento da União Europeia a toda a Europa Oriental, até incluir alguns territórios que tinham feito parte da União Soviética como as três repúblicas bálticas. Tudo em violação dos acordos, orais e escritos, que impediam à Otan instalar bases ou armamento nas novas repúblicas que aderiam umas após as outras à União Europeia. Uma expansão acompanhada de declarações cada vez mais distantes dos actos, e segundo as quais a expansão da Otan não era motivada para um cerco progressivo à Rússia.

Finalmente, as operações destes últimos anos, com a inclusão da Geórgia de Mikhail Saakashvili nos mecanismos da Otan, e a promessa de uma futura entrada na Otan, a todo o vapor, da quarta ex-república soviética; e, com as pressões e promessas semelhantes feitas à Moldávia. Lembremos também a «guerra da Geórgia», que se concluiu com a derrota de Tbilisi após o massacre de Tzkinvali e a intervenção das forças armadas russas para repelir os Georgianos do território da Ossétia do Sul. O reconhecimento pela Rússia das duas repúblicas da Abecásia e da Ossétia do Sul (que Putin não formalizara até agosto de 2008) foi o primeiro sinal mostrando que o Kremlin decidira - mesmo que isto não tivesse sido de sua própria iniciativa mas, a tal, forçado pelas manobras adversas - a dizer “stop” a Washington.

Tudo isso foi subitamente atirado para segundo plano pela perigosa aventura do golpe de Estado em Kiev, que produziu o derrube pela força do presidente Viktor Yanukovych e o estabelecimento de uma nova Ucrânia ostensivamente hostil e belicosa “vis-à-vis” a Moscovo. A manobra toda, não só com o consenso mas, também, com o financiamento, supervisão e contrôlo pelos norte-americanos das operações no território da Ucrânia, primeiro a nível político, e militar em seguida.

Não se pode compreender, plenamente, a síntese feita por Putin em Sochi, se não se levar o conjunto destes acontecimentos em conta.

A conclusão que se impõe é a seguinte : a liderança norte-americana não prevê qualquer forma de multipolaridade, nem qualquer respeito de regras entre parceiros do mesmo nível. Não há quaisquer regras comuns. O que resta é apenas o caos, sem qualquer orientação geral.

Putin observou - sem o dizer explicitamente, mas mostrando que compreendeu, perfeitamente, que o verdadeiro alvo era ele, o próprio. Que as sanções económicas não visavam sancionar a Rússia, mas sim a penalizar o seu circulo. Que nos comportamentos e declarações dos dirigentes ocidentais, discernia-se facilmente a ideia que Putin não representava a Rússia e que, portanto, uma vez que ele tivesse sido eliminado a Rússia poderia reentrar na linha.

Dito por outras palavras, o Ocidente entende não negociar com a Rússia enquanto Putin permanecer à sua cabeça.

A resposta de Sochi é nítida e clara, e constitui um ponto de não retorno. Ele apoia-se em vários pilares fundamentais. O primeiro é a ideia que a unidade do Ocidente é relativamente precária. A Europa está longe de ser unânime atrás da América. Mesmo com reservas ela continua a ser um parceiro. Os números relativos às trocas económicas e comerciais falam por si, tanto como a história do período pós-guerra. É o primeiro pilar. E isso poderá ser uma aposta que não se renovará. Mas é claramente uma maneira de deixar em aberto todo o conjunto de cenários possíveis. Putin mostra que sabe perfeitamente que a Rússia, que ele tem entre as suas mãos, está associada de mil maneiras ao sistema ocidental. Mesmo durante os seus 14 anos de poder, e não apenas durante a era Yeltsin, a Rússia atou-se de pés e mãos ao destino do Ocidente. Ela está, portanto, vulnerável e deverá pagar a factura, que será sem dúvida muito amarga. Putin, encontra-se, assim, encostado à parede e terá que provar aos seus concidadãos que consegue desenvencilhar-se disto .

O problema poderia desanuviar-se devido à crise política desta Europa. A erosão dos partidos políticos, em quase todo o lado, mostra que se pode encontrar outros interlocutores fora do quadro dos «conservadores» tradicionais, ligados aos partidos de esquerda social-democratas agora todos pró-atlantistas. A Europa popular desloca- se para a direita, tomando um cunho anti-europeu, anti-americano e anti-globalista, e converge para o outro pilar sobre o qual Putin se apoia : o do patriotismo, do conservadorismo ético, dos valores tradicionais da família, da educação, e do respeito pelo passado. A «Família europeia» poderá vir a estar muito bem modificada nos próximos anos. E há, aqui, um terceiro pilar este evidente : o Oriente, a China, o Irão, o resto do mundo. É para esta direcção que se vai virar a águia de duas cabeças se as tentativas para o Ocidente correrem mal. As sanções--- explica Putin--- não pararão esta Rússia, que, tal como ele a descreve, aparece como subitamente acordada, solidária e compacta, como ela não estava desde há pelo menos dezenas de anos. É uma espécie de prelúdio para um governo de salvação nacional, no qual poderiam muito bem participar os comunistas de Guennady Zyuganov, os liberais democratas de Vladimir Jirinovsky, tal como os nacionalistas de direita e de esquerda, ignorando olimpicamente as distinções que existem na Europa e, mais geralmente, no Ocidente, mas que nunca tiveram um peso real na Rússia.

A «América» de Obama, a «América» que Moscovo percebe como em vias de enfrentar uma crise sem retorno, (já que após Obama, poderemos muito bem chegar do mau ao péssimo com Hillary Clinton, que ganharia as eleições na base de um programa republicano dos mais radicais), não é mais um parceiro. O urso russo— assim se exprimiu Putin –- não entende sair do seu território. Ele não tem ambições expansionistas. Mas isso não significa, no entanto, estar disposto a ser desalojado.

Putin chegou a esta conclusão. É o seu plano para resistir. Veremos agora se ele está à altura de o executar capazmente. E, com esta «América» que joga ao «ou vai ou racha», a partida anuncia-se árdua. Sobretudo quando os dois protagonistas estão encostados à parede.

Tradução: Alva - Fonte Megachip (Itália)

*Giulietto Chiesa é jornalista. Ele foi correspondente deEl Manifesto e deAvvenimenti, colaborador de inúmeras estações de rádio e televisão na Itália, na Suíça, no Reino Unido, na Rússia e no Vaticano. Autor de diversos obras, ele escreveu, nomeadamente, sobre a dissolução da URSS e sobre o imperialismo norte-americano. Antigo deputado ao parlamento Europeu (Aliança dos Democratas e Liberais, 2004-2008), é membro do Bureau executivo do World Political Forum (Fórum Político Mundial).

G20 - Putin em entrevista: orientamo-nos por interesses, e não por simpatias ou antipatias




No sábado, na cidade australiana de Brisbane, a cúpula do G20 inicia os seus trabalhos. Aí, dirigentes dos 19 maiores países do mundo e da UE irão resolver tarefas da economia global. Na véspera da partida para a Austrália, O presidente da Rússia, Vladimir Putin, em uma entrevista exclusiva à Tass, abordou as questões que planeja levantar nos encontros com os seus colegas.

O senhor presidente vai participar em mais uma cúpula do G20. Até que ponto este formato continua sendo necessário, atual e até que ponto é lógico que países do G20, ao mesmo que tentam cooperar e desenvolver a economia global, impõem sanções a um dos membros do G20?

Esse formato é necessário ou não? Penso que sim. Por quê? Porque o G20 é o lugar ou o palco onde nos podemos encontrar, analisar também as relações bilaterais, os problemas globais e pelo menos chegar a uma compreensão comum sobre a essência do problema e como o resolver, mostrar a via do trabalho conjunto.

Isto é o principal, porque é absolutamente irrealista esperar que tudo o que lá for analisado venha a ser realizado, tendo em conta que as próprias decisões não têm caráter obrigatório. E parcialmente não são cumpridas. Elas não são cumpridas onde e quando não correspondem aos interesses de alguém, antes de tudo trata-se dos interesses dos jogadores globais. Mas isso não significa que se trate de um formato inútil. Tem utilidade.

– Talvez tornar obrigatórias essas decisões?

Isso é impossível. Você sabe que não existem exemplos desses na prática internacional. À exceção das decisões das questões do Conselho de Segurança na esfera da própria segurança internacional. Mas isso foi realizado em condições muito difíceis da sangrenta Segunda Guerra Mundial. Hoje, é simplesmente irrealista imaginar a elaboração de mecanismos que garantam a execução, tanto mais na esfera da economia. Mas, repito, tudo isso tem um caráter moralmente político-econômico. Isso por si só já não é mau.

Agora, quanto ao facto de alguns países do G20 imporem sanções contra a Rússia da parte do G20. Claro que isso contradiz o próprio princípio da atividade do G20, mas não só da atividade e dos princípios de funcionamento do G20, isso contradiz também o Direito Internacional, porque as sanções podem ser impostas apenas no quadro da Organização das Nações Unidas e do seu Conselho de Segurança.

Mais, isso contradiz até os princípios da OMC, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, o chamado GATT. Os Estados Unidos criaram essa organização, mas, agora, violam grosseiramente estes princípios. Isso é prejudicial e claro que nos provoca certos danos, mas também é prejudicial para eles, porque, no fundo, mina todo o sistema das relações económicas internacionais.

 No G20 formou-se um certo equilíbrio de forças: por um lado, o G7, e, por outro lado, os países BRICS e alguns Estados que se juntam a eles. Partindo do que o senhor presidente disse, cada um defende os seus próprios interesses, como imagina esse equilíbrio de forças: é uma discussão de onde nasce a verdade ou é um confronto completamente novo dos dois blocos?

Primeiro, parece-me que seria muito mau se se começasse novamente a criar quaisquer blocos. Isso não é nada construtivo, seria mesmo prejudicial para a economia mundial. Nós não estamos agora a falar em economia?

 Economia onde a política se ingere cada vez mais.

Isso é verdade. Mas não obstante, o G20 é, antes de tudo, um fórum económico. Eu já citei a OMC, que formulou determinadas regras de jogo. Foi criado um mecanismo como o FMI. Discute-se também o aperfeiçoamento dos mecanismos financeiros internacionais e das relações económicas. Sabe que a chamada volta de conversações de Doha no quadro da OMC se encontra, no fundo, num beco sem saída. Por quê? Devido à diferença de abordagens e à diferença de interesses entre as economias em desenvolvimento e as economias desenvolvidas, ao mesmo tempo que surge um desequilíbrio no campo do capital num caso e, noutro, surgem desequilíbrios no campo das correntes comerciais.

Nas economias desenvolvidas há muito capital livre e a questão está no investimento, eficaz e fiável, no investimento seguro desses capitais nas regiões e nas economias do mundo que garantam estabilidade, defendam a propriedade e gerem algum lucro, traga uns ou outros rendimentos às economias desenvolvidas. Por isso, eles exportam capital e os países em desenvolvimento formam as correntes comerciais.

Uns precisam de estar confiantes em que os seus capitais serão seguramente investidos, enquanto que os outros devem estar confiantes de que não mudarão as regras de jogo tal como querem os que exportam capital, nomeadamente por considerações políticas, nomeadamente.

Mas todos devem compreender que a economia e as finanças se encontram hoje completamente independentes uma da outra.

No nosso caso: suponhamos que os parceiros limitaram o acesso das nossas instituições financeiras aos mercados financeiros internacionais. Nós, com os capitais que atraímos dos mercados financeiros internacionais, financiamos as nossas instituições financeiras e empresas que adquirem produção acabada nessas economias desenvolvidas e garantem lá locais de trabalho, apoiam a esfera social e o crescimento da economia. Se não fizermos isso, lá surgirão problemas. Trata-se de coisas profundas que, à primeira vista, talvez não estejam à superfície.

À custa do nosso trabalho com a Alemanha aí são mantidos 300 mil empregos. Se deixarmos de fazer aí encomendas, acaba-se tudo. Eles talvez se reorientem, mas é preciso saber para onde. Isso não é nada simples.

Por isso é necessário resolver todas as tarefas, dificuldades (que são muitas) que surgem. E se enveredarmos por outra via... Por exemplo, agora, os Estados Unidos falam da criação de duas uniões: uma Transatlântica e a outra Transpacífica. Se se tratar de dois grupos fechados, isso, no fim de contas, não conduzirá à liquidação, mas ao aumento dos desequilíbrios na economia mundial. E claro que nós queremos que esses desequilíbrios não existam para que possamos trabalhar juntos. Mas só poderemos resolver essas questões em conjunto.

Porque há 20, 30, 50 anos atrás, a situação era outra. Porque é que eu afirmo com tanta convicção que só em conjunto poderemos resolver com eficácia? Quanto à paridade do poder de compra, o PIB dos países BRICS já é maior do que igual índice dos países do G7: se não me engano, o do BRICS é de 37,4 triliões de dólares, enquanto que o do G7 é de 34,5. E se vierem dizer agora: “Não, nós vamos fazer separadamente aqui assim e assim, e vocês façam como quiserem”? Isso não provocará mais do que um posterior desequilíbrio. Se quisermos, precisamos de resolver juntos.

 Hoje fala-se do aparecimento de um novo G7, precisamente os países BRICS, a Indonésia, a Turquia e o México. Considera que esse formato tem futuro?

Já disse: é preciso resolver em conjunto, porque tudo está interligado no mundo moderno e, se se criar uniões regionais, como nós criamos uma união regional: a União Económica Eurasiática com a Bielorrússia e o Cazaquistão, elas devem ser apenas um complemento aos instrumentos globais existentes, que devem trabalhar segundo essas normas globais.

– Uma das propostas da presidência australiana do G20 é a criação de um centro de investimentos em infraestruturas. Para a Rússia, que tornou prioritários os projetos de infraestruturas, isso é positivo? Ou não se irá enquadrar com o nosso trabalho devido às ditas sanções?

– Aqui não é preciso enquadrar nada, nem chegar a acordo sobre alguma coisa. Isso simplesmente mostra, e é difícil não estar de acordo com o governo australiano, que estamos no caminho certo, que agimos absolutamente na via correta; que a comunidade internacional, económica, neste caso, mantém os mesmos pontos de vista em relação aos governos na situação que se cria na economia mundial, simplesmente confirma a nossa razão. Isso é sempre agradável e útil.

– Para a Rússia, isso será mais ajuda ou será simplesmente um palco onde pode compartilhar a sua própria experiência?

Penso que, antes de tudo, é simplesmente um palco para troca de experiência. E também não é mau, creio, para a preparação de quadros. Além disso, é, em certo sentido, a continuação das nossas propostas que formulámos durante a cúpula do G20 na Rússia, em São Petersburgo.

 As cúpulas, seja dos G20, da APEC ou, antes, dos G8 foram para o senhor presidente uma possibilidade de falar com os colegas frente a frente. A cúpula que agora se realizou em Pequim foi a sua primeira viagem ao estrangeiro depois do discurso no Clube de Discussão Internacional Valdai, uma extensa intervenção programática sobre questões da segurança global, da ordem mundial. Recebeu alguma reação ao seu discurso dos líderes ocidentais?

– Não, no Clube de Valdai tem lugar uma discussão com peritos, é uma espécie de discussão livre. Talvez mesmo, como deve acontecer nesses lugares, ela tem e deve tomar um caráter um tanto ou quanto agudo, para dar o tom da discussão, para provocar mesmo um pouco os parceiros da conversa a fim de que eles se abram, mostrem o seu ponto de vista, para procurar em conjunto a solução de problemas ao nível de peritos, mas, quando realizamos encontros bilaterais com os colegas, aí discutem-se mais questões de caráter pragmático.

– Não se notou mudança das posições deles, não surgiram questões para com eles? O senhor não notou?

– Não, nada muda tão rapidamente. Se alguém quis ouvir o que eu disse, deve passar algum tempo depois disso para que tudo seja analisado nas respetivas estruturas administrativas, governamentais, presidenciais. Primeiramente, analisar ao nível de conselheiros, peritos, depois realizar discussões, sem barulho, falar sinceramente uns com os outros no silêncio dos gabinetes. Todos esses palcos de discussão são bons precisamente porque se pode falar abertamente. Depois, já a outro nível, como eu já disse, no silêncio dos gabinetes de trabalho, regressar e discutir calmamente isso. Isto exige tempo.

 Na cúpula os G20, planeja conversar com alguém separadamente?

Sim, temos encontros aí planejados: com a chanceler alemã, numerosos encontros.

 Os observadores assinalam que as suas relações com Angela Merkel se tornaram mais tensas, menos amigáveis nos últimos tempos. Não notou isso?

– Não, não notei. Sabe que nós nos orientamos por interesses, e não por simpatias ou antipatias pessoais.

 Mas antes o senhor também se orientava por esses interesses?

Não antes, mas sempre. E ela também se orienta sempre pelos interesses do seu país. E qualquer outro dirigente de um país, Estado, governo. Por isso, não vejo aqui nada de substancial no caráter das nossas relações, não vejo mudanças substanciais.

Entrevista resumida, em Voz da Rússia 

Foto: RIA Novosti/Michael Klimentiev

Crise na Ucrânia deve sobrepor agenda econômica durante cúpula do G20



Opera Mundi, São Paulo


Ao aterrisar na Austrália, presidente da Rússia, Vladimir Putin, ignora ameaças de sanções do ocidente e mantém navios de guerra na costa australiana

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, chegou nesta sexta-feira (14/11) à cidade de Brisbane para participar da cúpula do G20 na Austrália, onde chefes de Estado e de governo se encontrarão neste fim de semana. Apesar de a agenda econômica ser tema de praxe na reunião, os líderes mundiais devem focar na discussão sobre a atual crise ucraniana, que já dura quase um ano.

Nos últimos dias, saltam denúncias de que tanto Kiev quanto os separatistas pró-Moscou romperam a trégua assinada durante o Acordo de Minsk, em setembro. Além disso, a Rússia posicionou pelo menos quatro navios de guerra próximos à costa noroeste da Austrália, segundo agências internacionais.

Para o primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, tal medida é incomum, mas não sem precedentes. “Não esqueçamos que a Rússia tem sido mais assertiva militarmente nos últimos tempos”, comentou Abbott à Reuters.

As novas incursões militares da Rússia e sua decisão de negligenciar as ameaças de sanções por parte das potências ocidentais devem ser colocadas em xeque durante a cúpula. Além do atual conflito no sudeste ucraniano – que já resultou na morte de mais de 4 mil pessoas –, assuntos econômicos também devem ocupar espaço nas pautas do encontro.

Dentro dessa agenda, deverão ser debatidos assuntos como o crescimento econômico mundial; a reforma do sistema bancário global; a criação de postos de trabalho; e a regulamentação de paraísos ficais, evidenciados pelo recente e polêmico caso dos “LuxLeaks”. Contudo, grande parte desses temas econômicos já foi discutido nos últimos dias na China, durante o fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec).

Hoje, o primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, declarou na Austrália que a ação da Rússia em território ucraniano é "inaceitável" e garantiu que mais sanções serão desenvolvidas se o Kremlin não melhorar a situação.

Além de Putin, líderes de Argentina, Coreia do Sul, Espanha, Índia, Japão e México já chegaram à Brisbane. Nas próximas horas são esperados o presidente da China, Xi Jinping, a chanceler alemã, Angela Merkel, o chefe de Estado dos EUA, Barack Obama, e o governante francês, François Hollande.

Na primeira viagem internacional após reeleição, a presidente do Brasil, Dilma Rousseff, também vai participar da Cúpula do G20, após escala de dois dias no Catar, onde encontrou o emir, Tamim bin Hamad al-Thani.

Na Austrália, Dilma insistirá que os países mais desenvolvidos devem adotar medidas para estimular o crescimento mundial e evitar que a crise acabe por contaminar totalmente as nações emergentes. A presidente também ressaltará que devem ser dados passos mais firmes rumo a uma profunda reforma de todas as instituições internacionais e que é necessário reforçar os mecanismos de controle aos mercados financeiros.

Além disso, espera-se que Dilma encontre Obama, no que será a primeira reunião formal entre os dois desde que um escândalo de espionagem turvou a relação bilateral em 2013.

Na foto: Cúpula do G20: organizadores fecham detalhes finais de encontro entre líderes mundiais

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G20 COMO APOSTA ÚNICA PARA OS DESAFIOS ATUAIS




Fiódor Lukianov, analista político - Ilustração: Konstantin Maler, em Pátria Latina

Tensão na cúpula em Brisbane será compensada pela heterogeneidade de vozes

Nos dias 15 e 16 de novembro, a cidade australiana de Brisbane receberá os principais líderes do mundo em uma nova reunião do G20. Os turbulentos acontecimentos em torno da Ucrânia, o dissolução do G8 e as declarações grosseiras do primeiro-ministro australiano, Tony Abbott, em relação à Rússia, nos permitem olhar o encontro sob o prisma do conflito. Porém, este é apenas um episódio no processo de formação da nova ordem mundial, na qual o G20 pode desempenhar um papel importante.

No contexto das instituições tradicionais, que com dificuldade se adaptam às rápidas mudanças da situação internacional, o G20 é uma estrutura nova, criada precisamente para responder aos desafios atuais. Evidentemente, não possui a legitimidade universal da ONU, já que não se apoia em estatutos formais nem critérios de filiação. Em compensação, a composição é representativa, os seus Estados não são apenas economicamente influentes e ricos, mas muito diversificados, além de não estarem unidos por questões culturais ou ideológicas.

No ano passado, a presidência dos G20 coube à Rússia, e todos os participantes concordaram que Moscou cumprira com sucesso a sua função. A apoteose foi a reunião de líderes em São Petersburgo, onde foram realizadas consultas que permitiram impedir uma nova guerra no Oriente Médio e encontrar uma solução viável para o problema das armas químicas de Bashar al-Assad.

Hoje, contudo, os feitos de há um ano parecem ter ficado em um passado distante. A crise política ucraniana agitou o mundo, e a Rússia, que deveria presidir o G8 em 2014, foi afastada e excluída do fórum. Oficialmente, o G8 se diluiu devido à Crimeia, mas a verdade é que a Rússia era há muito tempo vista ali como um elemento estranho.

Nesse contato, há motivos de sobra para crer que a cúpula na Austrália será tensa. Alguns países tentarão mostrar oposição a Moscou, enquanto outros destacarão a importância de ações conjuntas para estimular a economia global. A Rússia, por sua vez, dedicará grande atenção ao G20, pois neste formato Moscou nunca estará sozinho.

O trabalho em configurações de orientação ocidental aos quais estamos mais habituados é pouco eficaz atualmente. A própria experiência do Conselho Rússia-Otan, e até mesmo a OSCE, com toda a heterogeneidade e utilidade instrumental dessa organização, reproduzem o mesmo cenário: a Rússia de um lado, e o restante, do outro.

Já no G20, isso é impensável. O debate acalorado sobre a Síria em setembro de 2013 demonstrou, por exemplo, a divisão entre os defensores da abordagem norte-americana e da russa. A presença no grupo de países muito influentes que não seguem os passos de Washington – sobretudo os Brics – dá espaço para manobra e para a criação de coalizões.

Além disso, a Rússia não esconde seu interesse de que o G20, que surgiu como uma plataforma para discutir a economia global, seja oficialmente ampliado à esfera política. Afinal, a política tem mais do que nunca um grande impacto sobre a economia.

*Fiódor Lukiánov é presidente do Conselho de Política Externa e de Defesa da Rússia.


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