sábado, 4 de janeiro de 2014

MANDELA FOI-SE, MAS O APARTHEID ESTÁ BEM VIVO NA AUSTRÁLIA

 

John Pilger
 
No fim dos anos 1960 o editor-chefe do London Daily Mirror, Hugh Cudlipp, atribuiu-me mais uma missão. Devia retornar à minha pátria, a Austrália, e "descobrir o que está por trás da sua face radiante". O Mirror fizera uma campanha incansável contra o apartheid na África do Sul, onde havia relatado o que estava por trás da sua "face radiante". Como australiano, eu fora bem recebido naquela fortaleza da supremacia branca. "Admiramos vocês aussies ", diziam as pessoas. "Vocês sabem como tratar os seus negros".

Eu ficava ofendido, é claro, mas também sabia que apenas o Oceano Índico separava as atitudes raciais das duas nações coloniais. Do que eu não estava consciente era de como a semelhança provocou tamanho sofrimento entre o povo original do meu próprio país. Quando crescia, meus livros escolares haviam deixado claro, para citar um historiador: "Nós somos civilizados e eles não são". Recordo como a uns poucos talentosos jogadores da Aboriginal Rugby League foi permitido atingirem sua glória desde que eles nunca mencionassem o seu povo. Eddie Gilbert, o grande jogador aborígene de críquete, o homem que bateu Don Bratman com um resultado zero ( duck ) , foi impedido de jogar outra vez. Isso não era atípico.

Em 1969 voei para Alice Springs no coração vermelho da Austrália e encontrei-me com Charlie Perkins. Num tempo em que o povo aborígene nem sequer era contado no recenseamento – ao contrário dos carneiros – Charlie era apenas o segundo aborígene a obter um grau universitário. Ele tem feito bom uso desta distinção liderando "campanhas itinerantes" ("freedom rides") em cidades racialmente segregadas no sertão australiano da Nova Gales do Sul. Ele apanhou a ideia das campanhas itinerantes nas que se verificaram no Sul Profundo (Deep South) dos Estados Unidos.

Alugámos um velho Ford, apanhámos a mãe de Charlie, Hetti, uma anciã do povo aranda, e fomos para o que Charlie descreveu como "inferno". Era Jay Creeki, uma "reserva nativa", onde centenas de aborígenes eram encurralados em condições que eu só tinha visto na África e na Índia. De uma torneira do lado de fora pingava um líquido castanho; ali não havia instalações sanitárias; a comida, ou "rações", era fécula e açúcar. As crianças tinham pernas finas como palitos e barrigas inchadas pela desnutrição.

O que me impressionou foi o número de mães e avós enlutadas – desoladas pelo roubo de filhos pela polícia e autoridades do "bem-estar" que, durante anos, haviam levado aquelas crianças com pelo mais clara. A política era a "assimilação". Hoje, isto mudou apenas no nome e na racionalização.

Os rapazes acabariam a trabalhar em fazendas dirigidas por brancos, as meninas como serviçais em lares da classe média. Isto era trabalho escravo não declarado. Eles eram conhecidos como a Geração Roubada. Hetti Perkins contou-me que quando Charlie era criança ela teve de mantê-lo atado às suas costas e escondia-o sempre que ouvia o tropel dos cavalos da polícia. "Eles não o levaram", disse ela, com orgulho.

Em 2008, o primeiro-ministro Kevin Rudd pediu desculpas por este crime contra a humanidade. Os aborígenes mais velhos ficaram gratos; acreditaram que o primeiro povo da Austrália – a mais duradoura presença humana sobre a terra – podia finalmente receber a justiça e o reconhecimento que lhe fora negado durante 220 anos.

O que poucos deles ouviram foi o PS adicional das desculpas de Rudd. "Quero ser categórico acerca disto", disse ele. "Não haverá indemnização". Que a 100 mil pessoas profundamente ofendidas e marcadas pelo ódio racista – resultado de uma forma de movimento eugenista com ligações ao fascismo – não fosse dada qualquer oportunidade para restabelecerem suas vidas era chocante, embora não surpreendente. A maior parte dos governos em Canberra, conservadores ou trabalhistas, tem insinuado que os primeiros australiano são culpáveis pelo seu sofrimento e pobreza.

Quando o governo trabalhista na década de 1980 prometeu "plena reparação" e direitos à terra, o poderoso lobby mineiro avançou com o ataque, gastando milhões a fazer campanha de que "os negros tomariam nossas praias e cerca de arame farpado". O governo capitulou, muito embora a mentira fosse grotesca; o povo aborígene mal chega a três por cento da população australiana.

Hoje, crianças aborígenes estão outra vez a ser roubadas das suas famílias. As palavras burocráticas são "removidas" para "protecção da criança". Em Julho de 2012 havia 13.299 crianças aborígenes em instituições ou entregues a família brancas. Hoje, o roubo destas crianças é mais intenso do que em qualquer momento durante o último século. Entrevistei numerosos especialistas em cuidados infantis que encaram isto como uma segunda geração roubada. "Muitos dos garotos nunca vêem outra vez as suas mães e comunidades", disse-me Olga Havnen, autora de um relatório para o governo do Território do Norte. "No Território do Norte, foram gastos $80 milhões na vigilância e remoção de crianças e menos de $500 mil no apoio a estas famílias empobrecidas. Muitas vezes não é dado qualquer aviso às famílias e elas não têm ideia para onde os seus filhos foram levados. A razão apresentada é negligência – o que quer dizer pobreza. Isto é destruir a cultura aborígene e é racista. Se o apartheid da África do Sul tivesse feito isto, teria havido um alvoroço".

Na cidade de Wilcannia, Nova Gales do Sul, a esperança de vida dos aborígenes é de 37 anos – mais baixa do que na República Centro-Africana, talvez o país mais pobre da Terra, actualmente devastado pela guerra civil. Outra distinção de Wilcannia é que o governo cubano realiza ali um programa de alfabetização, ensinando jovens aborígenes a ler e escrever. É nisto que os cubanos são famosos – nos países mais pobres do mundo. A Austrália é um dos mais ricos do mundo.

Filmei condições semelhantes há 28 anos atrás, quando fiz meu primeiro filme acerca dos indígenas da Austrália, The Secret Country . Vince Forrester, um ancião aborígene que então entrevistei, aparece no meu novo filme, Utopia. . Ele levou-me a uma casa em Mutitjulu onde viviam 32 pessoas, na maior parte crianças, muitos deles a sofrerem otite média, uma doença infecciosa totalmente evitável que prejudica a audição e a fala. "Setenta por cento das crianças nesta casa está parcialmente surda", disse ele. Voltando-se directamente para a minha câmara, disse: "Australianos, isto é o que nós chamamos um insulto aos direitos humanos".

A maioria dos australianos raramente é confrontada com o segredo mais sujo da sua nação. Em 2009, o respeitado Relator Especial das Nações Unidas, Professor James Anaya, testemunhou condições semelhantes e descreveu as políticas de "intervenção" do governo como racistas. O então ministro para a Saúde Indígena, Tony Abbott, para "fazer algo útil" e parar de ouvir "a brigada da vítima". Abbott é agora o primeiro-ministro da Austrália.

Na Austrália Ocidental são escavados minérios da terra aborígene e despachados para a China com um lucro de mil milhões de dólares por semana. Neste, o estado mais rico e mais próspero, as prisões enchem-se com aborígenes esmagados, incluindo jovens cujas mães postam-se às portas da prisão, suplicando pela sua libertação. Aqui o encarceramento de australianos negros é oito vezes superior ao dos negros sul-africanos durante a última década do apartheid.

Quando Nelson Mandela foi enterrado esta semana, a sua luta contra o apartheid foi devidamente celebrada na Austrália, embora a ironia estivesse ausente. O apartheid foi derrotado em grande medida por uma campanha global da qual o regime sul-africano nunca se recuperou. Um opróbrio semelhante raramente deixou marca na Austrália, principalmente porque a população aborígene é tão pequena e porque os governos australianos têm conseguido dividir e cooptar uma liderança dividida com gestos e promessas vagas. Isso pode estar a mudar. Uma resistência está a crescer, apesar de tudo, nas terras centrais aborígenes, especialmente entre os jovens. Ao contrário dos EUA, Canadá e Nova Zelândia, que fizeram tratados com o seu povo original, a Austrália tem apresentado gestos muitas vezes incluídos nas leis. Contudo, no século XXI o mundo exterior começa a prestar atenção. O espectro da África do Sul de Mandela é uma advertência.
 
19/Dezembro/2013
 
O trailer de Utopia, o novo filme de John Pilger, pode ser assistido aqui .

O original encontra-se no
London Daily Mirror e em johnpilger.com/...

Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
 

2013 FOI O ANO MAIS QUENTE DE SEMPRE NA AUSTRÁLIA

 


Camberra, 03 jan (Lusa) - O ano passado foi o mais quente na Austrália desde que o instituto de meteorologia local começou a medir as temperaturas anuais, em 1910, tendo sofrido a pior vaga de calor desde então e vários incêndios de grandes proporções.
 
"2013 foi o ano mais quente na Austrália desde que as temperaturas começaram a ser registadas", disse o instituto no seu relatório anual sobre o clima, divulgado numa altura em que várias partes do país continuam a sofrer de altas temperaturas.
 
"Muitas temperaturas em toda a Austrália têm estado bem acima da média desde setembro de 2012. Longos períodos de temperaturas acima da média começam a ser normais, com uma notótia ausência de tempo frio", lê-se no relatório hoje divulgado.
 
O instituto acrescenta ainda que o verão de 2012-2013 foi o mais quente alguma vez registado, e incluiu uma onda de calor prolongada que terminou a 19 de janeiro de 2013, o primeiro dia desde 31 de dezembro de 2012 em que as temperaturas não chegaram aos 45 graus nalgum ponto do país.
 
Numa análise ao relatório, a climatóloga Sarah Perkins, citada pela AFP, afirma que o relatório confirma que os efeitos do aquecimento global são já bem visíveis, lembrando as temperaturas que chegaram a registar valores bem acima dos 40 graus nos últimos anos.
 
"Embora os recordes sejam batidos aqui e ali, a quantidade de recordes batidos no último ano é extraordinário", disse a professora da Universidade da Nova Gales do Sul, em Sydney, salientando que "os estudos já mostraram que o risco de haver mais verões como o de 2013 aumentou cinco vezes por causa das mudanças climáticas induzidas pelo Homem".
 
MBA // PJA - Lusa
 

Moçambique: PRESENÇA DE HOMENS ARMADOS CRIA PÂNICO EM HOMOÍNE

 


Os residentes das zonas de Fanhafanha, Nhaulane, Catine, Phunguene e arredores, no posto administrativo de Pembe, no distrito de Homoíne, na província de Inhambane, vivem momentos de alvoroço e estão a abandonar as suas casas à procura de lugares seguros na vila sede de Homoíne e na cidade de Maxixe, devido à presença de homens armados, supostamente da Renamo, que passeiam naquela região em grupos de oito a 10 elementos, porém, sem ameaçar a ninguém.
 
O pânico da população não é à toa. É que o Homoíne viveu o maior massacre da província de Inhambane protagonizado pela Renamo durante a guerra dos 16 anos. Na madrugada de 18 de Julho de 1987, bandos da Renamo chacinaram pelo menos 424 pessoas. Tratou-se de uma carnificina equiparada à de Wiriamu, em Tete, onde um exército colonial português assassinou 500 pessoas, para além de outras 600 mortas em Vanduzi, na região de Manica, por tropas rodesianas de lan Smith.
 
Segundo apurámos dos colaboradores da Rádio Comunitária de Homoíne, na região de Neve, no mesmo posto administrativo, localizava-se a antiga base da Renamo. Contudo, desde ontem, várias famílias de Fanhafanha, Nhaulane, Catine, Phunguene são transportadas em carinhas de caixa aberta em direcção a Homoíne e cidade de Maxixeos com o intuito de encontrar sossego e evitar serem vítimas em caso de ataques, pese embora os referidos homens armados não terem ainda, felizmente, protagonizados desmandos.
 
De acordo com os colaboradores daquela rádio, entre 31 Dezembro passado e 01 de Janeiro em curso, algumas famílias da zona de Catine, a mais influente em Pembe, ouviram ruído de um helicóptero que alegadamente estaria a desembarcar os homens armados em causa, os quais, no dia seguinte, contactaram os líderes comunitários e pediram que se fizesse uma cerimónia de invocação de espírito para anunciar a sua presença como pessoas de bem.
 
O @Verdade apurou ainda que os homens armados supostamente da Renamo garantiram aos líderes comunitários que não vão fazer mal a ninguém, mas não vão tolerar provações tais como tiroteio protagonizado por alguma força militar do Governo. Aliás, como sinal de boa convivência na zona, o grupo armado até compra produtos tais como feijão nalguns comerciantes, para além de que na noite de quinta-feira (02) foram vistos a fazer o reconhecimento de algumas zonas de Pembe. Visitaram estabelecimentos comerciais dentre outros locais, mas não se apoderaram de nenhum bem nem causaram desmandos.
 
O distrito de Homoíne está localizada a 60km da cidade costeira de Inhambane e que dista 400km de Maputo, porém, daquele distrito para o posto administrativo de Pembe são aproximadamente 35km. Informações em poder do @Verdade dão conta de que foi destacada para a região uma equipa militar, dal fazem parte elementos da Força de Intervenção Rápida (FIR).
 
Verdade (mz)
 

Moçambique: AS IMPOSIÇÕES DA RENAMO NAS CONVERSAÇÕES

 

O País (mz)
 
Diálogo polÍtico
 
Renamo propõe o nome de Gilles Cistac para dirigir as conversações com José Pacheco. A lista de mediadores estende-se a Matteo Zupi, um importante padre católico que desbloqueou o Acordo de Roma.
 
No caso improvável de o governo moçambicano vir a aceitar a exigência da Renamo, maior partido da oposição no país, de mediadores e observadores moçambicanos e internacionais no diálogo entre ambos, seria necessária uma mesa muito maior.
 
Na última carta sobre a matéria, dirigida ao Presidente da República, Armando Guebuza, datada de 05 do mês em curso, a Renamo propõe um total de 14 mediadores e observadores.
 
Na carta, cuja cópia a AIM teve acesso, a Renamo quer que o diálogo, que insiste em chamar “negociações”, seja mediado pelo constitucionalista moçambicano Gilles Cistac; bispo italiano Matteo Zuppi ; ex-presidente su-africano Thabo Mbeki; e um representante não identificado da União Europeia.
 
A composição - um moçambicano e três mediadores estrangeiros - é, não por coincidência, a mesma da equipa de mediadores nas negociações de paz havidas Roma entre 1990 e 1992.
 
O mediador moçambicano na altura era o reformado arcebispo da Beira, Jaime Gonçalves, e os três estrangeiros eram todos italianos - Mario Raffaelli em representação do governo italiano, Andrea Riccardi e Matteo Zuppi da Comunidade católica Sant’Egidio. Zuppi foi posteriormente promovido ao cargo de bispo auxiliar de Roma.
 
Quanto aos observadores, a Renamo propõe quatro moçambicanos – o bispo anglicano Dinis Sengulane; o proeminente académico e reitor da Universidade Politécnica, Lourenço do Rosário; o ex-reitor da Universidade Eduardo Mondlane, Filipe Couto; e Alice Mabota, a presidente da Liga Moçambicana dos Direitos Humanos.
 
Na lista de propostas, Renamo avança também seis observadores estrangeiros, mas todos são países no lugar de indivíduos - os Estados Unidos, China, Portugal, Cabo Verde, Quénia e Botswana.
 
Desde Setembro, o governo tem vindo a reiterar que não pretende internacionalizar o diálogo com a Renamo, daí discordar da ideia de convidar observadores estrangeiros, muito menos mediadores.
 
Leia mais na edição impressa do «Jornal O País»
 

OS LEGADOS GEOPOLÍTICOS DE 2013

 


Aprofunda-se declínio dos EUA e União Europeia. Primavera Árabe reflui. China amplia suas ambições. Persiste ameaça climática. Francisco reintroduz debate da desigualdade
 
Roberto Savio – Outras Palavras
 
No momento de esperança que o ano novo pode oferecer, seria útil examinar o legado que recebemos dos doze meses que terminam. Foi um ano cheio de acontecimentos: guerras, aumento da desigualdade social, sistemas financeiros sem controle social, decadência das instituições políticas e erosão da governança global.
 
Talvez nada haja de novo nisso, já que tais tendências nos acompanham há bastante tempo. No entanto, alguns acontecimentos têm impacto mais profundo e duradouro. Vamos apresentá-las brevemente, em forma de lista para recordar e conferir (mas não em ordem de magnitude)
 
1. O colapso da Primavera Árabe: O Egito e a Síria são suficientemente paradigmáticos para dissuadir outros países árabes a segui-los. Passará muito tempo antes que as lutas internas no amplo e diverso mundo do Islã possam ser resolvidas. O verdadeiro desafio, na região, é utilizar a modernidade como elemento de viabilidade. O golpe de Estado no Egito deu nova força aos radicais que não creem na democracia e nunca se saberá se a Irmandade Muçulmana poeria ter dirigido o país com eficácia, ou teria fracassado (o que é mais provável). Os estrangeiros não podem resolver este conflito, como mostra com clareza o exemplo da Síria – que se converteu em guerra de poder financiada por atores externos
 
2. Autossuficiência energética nos EUA: Em cinco anos, a exploração das areias betuminosas reduzirá as importações petrolíferas dos Estados Unidos à metade e, se esta tendência se estender, o país poderá chegar a ser autossuficiente em abastecimento de energia. O impacto no preço do petróleo é claro. Isso afetará a importância estratégica do mundo árabe e de países com petrodólares, como a Rússia. A indústria norte-americana receberá um forte impulso, enquanto diminuirá o incentivo para desenvolver energias renováveis em todo o planeta.
 
3. A impossibilidade de chegar a um acordo importante sobre mudança climática: O fracasso da última conferência sobre mudança climática na Polônia demonstrou que há pouca vontade política para chegar a um consenso global sobre a forma de abordar esta questão. No entanto, segundo a maioria dos cientistas que se dedicam ao estudo do clima, estamos nos aproximando rapidamente a um ponto de não-retorno, com a perspectiva de um dano irreversível no ecossistema global. Enquanto isso, investidores franceses estão comprando terras no sul da Inglaterra para plantar vinhedos. A Islândia é assediada por cada vez mais investidores (inclusive chineses), que querem explorar grandes extensões de terra, onde o cultivo está se tornando possível. Todas as nações estão se preparando para a exploração das reservas de minerais sob o gelo ártico, que, ao se derreter, abre novas vias para o transporte marítimo. Tudo isso demonstra que o mundo dos negócios, além de avaliar o cenário mais claramente que os governos, perde rapidamente qualquer noção de responsabilidade social.
 
4. Declínio dos Estados Unidos: O presidente Barack Obama teve de cancelar sua participação na recente reunião de cúpula asiática, devido à crise orçamentária dos EUA. Mas o presidente russo, Vladimir Putin, participou e foi capaz de manobrar com êxito os acontecimentos na Síria. A concretização da reforma da saúde de Obama está ameaçada. Edward Snowden mostrou ao mundo que os EUA não respeitam seus próprios aliados. Enquanto isso, o Tea Party foi capaz de paralisar o governo norte-americano e levar o Partido Republicano a abraçar uma política de devastação do setor público. Gente em todo o mundo considera hoje os EUA um parceiro pouco confiável, em crise irreversível, com um presidente que pronuncia belas palavras, mas não é capaz de colocá-las em prática. Ninguém foi capaz de colocar o setor financeiro sob controle e os escândalos e multas gigantescas são uma realidade constante. Não há solução à vista na Palestina e os EUA enfrentam grandes dificuldades para se retirar do Afeganistão, enquanto o Iraque volta a mergulhar no caos. As negociações com o Irã dão forte impulso ao setor xiita radical no mundo islâmico. Os EUA foram, tradicionalmente, um país com grande capacidade de recuperação, mas seu futuro hoje não parece nada promissor.
 
5. Declínio europeu: O ano de 2013 marcou a falta de unidade na Europa e o ascenso definitivo da Alemanha nos assuntos europeus. Hoje, só a macroeconomia conta no continente. A Irlanda é elogiada como bom exemplo, depois de ter conseguido controlar seu déficit público. Mas o dano em seu tecido social pode ser dramático. O mesmo está ocorrendo com Portugal. A Grécia é um exemplo extremo. Os gregos perderam 20% de suas receitas e o desemprego subiu a 21% – no entanto, mais cortes estão sendo exigidos. Este texto não pretende analisar como a Alemanha foi favorecida por políticas que destroem outros países, sem nenhum laivo de solidariedade. Nas eleições europeias de 2014, é provável que uma grande parte dos cidadãos vote nos partidos anti-europeus que surgiram em quase todos os países, com a exceção da Espanha, já que o governo de Mariano Rajoy é suficientemente de direita para ocupar este espaço – como demonstram as leis sobre aborto e ordem pública. O debilitamento do Parlamento Europeu irá se estender por muito tempo, até que a Europa recupere algo de atrativo, que perdeu aos poucos diante de seus cidadãos.
 
6. Nacionalismo chinês: Em poucos meses, o novo presidente, Xi Jinping, assumiu uma autoridade sem precedentes desde as épocas de Mao e Deng. Está fomentando a ideia de um sonho chinês, para galvanizar a população sob sua liderança. Este movimento apoia-se na afirmação da China como uma potência que se impõe perante o mundo. Foram dados passos audazes para consolidar as reivindicações territoriais do país, o que abriu conflitos com a Coreia, Filipinas, Vietnã e Japão. Com o governo japonês controlado agora por políticos nacionalistas, muitos analistas consideram a possibilidade de uma terceira guerra mundial iniciada na Ásia. No século 16, a China reunia 50% do PIB mundial e há forte desejo, entre os chineses, de recuperar seu papel no mundo. O tratado de defesa entre o Japão e os Estados Unidos converte este conflito em algo potencialmente global.
 
7. As mudanças no Vaticano. A eleição do papa Francisco supôs uma mudança de rumos muito necessária na igreja católica. O Papa colocou novamente ênfase nos seres humanos, em oposição ao mercado. Empregou termos como “solidariedade”, “justiça social” e “marginalização”, que já haviam desaparecido do discurso político. O presidente Barack Obama o seguiu, em certo momento, com um discurso claro contra as crescentes desigualdades sociais nos EUA. Entretanto, segundo a London School of Economics, em vinte anos a Grã-Bretanha voltará ao nível de desigualdade dos tempos da rainha Vitória. O papa Francisco é o único que denunciou o desmantelamento de estado de bem-estar social surgido no pós-II Guerra. Confiemos em que sua exortação dialogue com a possível redação de um novo Das Kapital, em que os protagonistas não serão os trabalhadores, mas os jovens.
 
*Roberto Sávio é fundador e presidente emérito da agência de notícias Inter Press Service (IPS) e publisher de Other News.
 

AS AMARRAS DA UE DOS MONOPÓLIOS – UMA EUROPA SEM FUTURO

 

Vladimir Nesterov [*]
 
No passado Verão o bom humor prevaleceu em Bruxelas. Quando o Eurostat publicou o seu relatório estatístico para o segundo trimestre, ficou-se a saber que a economia da zona euro tinha crescido, apesar das expectativas pessimistas de alguns especialistas. Nada de significativo, claro – em 0,3% e mesmo isso, graças principalmente a uma certa recuperação económica na Alemanha e em França. O crescimento das maiores economias da Europa foi equivalente a 0,7% e a 0,5%, respectivamente, em termos anuais. Foi previsto que o PIB da Alemanha iria crescer mais 0,5% no final do ano. Evidentemente o PIB da zona euro, que baixou por causa dos "países problemáticos" do Sul da Europa, também iria descer nos mesmos 0,5%.

De qualquer modo, o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, apressou-se a anunciar que "se ultrapassara o ponto baixo da crise financeira na Europa" e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, proclamou que "a UE está a passar de uma política de crise para uma política de crescimento". E tudo isto foi acontecendo enquanto os especialistas continuavam a dizer que é demasiado cedo para começarmos a regozijar-nos quanto ao "crescimento". Por exemplo, Guntram Wolff, director do centro analítico Bruegel, afirmou nessa altura, "Os números do crescimento em toda a Europa ainda são demasiado baixos para permitir inverter a situação no mercado do emprego. As taxas de desemprego vão continuar a manter-se altas no Sul da Europa no próximo ano. Vai demorar algum tempo antes de assistirmos a um alívio nessa área… Penso que o investimento público é especialmente importante na Alemanha, que tem uma das quotas mais baixas na UE. É surpreendente que num país onde o dinheiro dos empréstimos contraídos é tão barato, os investimentos sejam tão baixos. Na Alemanha em especial há algum défice no que se refere a infra-estruturas públicas. Nalgumas regiões, como a do Ruhr, é evidente que os investimentos públicos estão a ficar para trás".

No entanto, nem Berlim nem Bruxelas estão preparados para esta mudança dos acontecimentos. Claro, o BCE tentou tomar algumas medidas, por exemplo, baixando a taxa de desconto para 0,25%. Mas a Alemanha, que tem a economia mais forte da Europa, não aumentou os investimentos de acordo com a iniciativa do BCE. Submetendo-se à vontade de Berlim, houve outros países que fizeram a mesma coisa.

Vendo a política financeira dos seus governos, os empresários também aderiram ao jogo do "dinheiro barato". Começaram a investir, mas em imobiliário, e não no sector real. Isso aconteceu em França, na Alemanha e noutros países.

Um Novembro sóbrio

O optimismo do Verão dos funcionários de Bruxelas evaporou-se em Novembro passado. No final do terceiro trimestre, o crescimento económico da zona euro revelou-se ilusório – foi apenas de 0,1% (!). Ou seja, a crise não tinha desaparecido; mantivera-se apenas em baixo a fim de voltar a rebentar com nova força. O terceiro trimestre desmentiu a noção generalizada de uma "Europa a duas velocidades", segundo a qual, enquanto no Sul da Europa não há crescimento, ele existe sem sombra de dúvida no Norte. Nada pode estar mais longe da verdade; nenhum país na zona do euro pode actualmente gabar-se de um crescimento significativo. Mesmo na Alemanha, o crescimento do PIB foi ridiculamente modesto – 0,3%, ou 1,3% em termos anuais. E possivelmente nem vão acabar com estes 1,3%. A verdade é que em Setembro a produção já começara a diminuir. E o quarto trimestre começou de modo extremamente fraco; em Outubro o volume da produção industrial da Alemanha foi 1,2% mais baixo do que em Setembro. A produção na indústria de transformação baixou em 1,1%, a produção de bens de capital diminuiu em 3% e o fabrico de bens consumíveis duradouros diminuiu em 4,5%.

"A economia alemã não conseguiu fazer um bom arranque no quarto trimestre. Os negócios ainda estão emperrados por falta de investimento. Isso indica uma posição bastante cautelosa para a actividade de investimento nos próximos meses", disse o economista do Commerzbank, Ralph Solveen, comentando os recentes acontecimentos.

Afinal, tudo tem a ver com o reduzido poder de compra na Europa e no resto do mundo, provocado pela crise. Para a economia alemã, que se centra na exportação, os tempos são difíceis. Vale a pena observar que em Novembro na cimeira China-UE em Beijing, nem os alemães nem os outros europeus, que estão habituados a criticar o governo chinês por "violações dos direitos humanos", disseram uma única palavra sobre este tópico. E é compreensível: quer os alemães gostem ou não da forma como os chineses fazem as coisas, não há nenhum outro consumidor dos seus produtos tão grande como a China, e dificilmente aparecerá outro.

As coisas não correm melhor nos países mais pequenos da zona do euro. A Áustria conseguiu regressar a um insignificante crescimento de 0,2%. A Holanda compensou uma queda na primeira metade do ano, apresentando um crescimento de 0,3%. A Finlândia atingiu um crescimento de 0,4%. Também não houve alterações significativas para melhor no "problema" do Sul da Europa. O crescimento em Espanha é microscópico; a Itália ainda não está a crescer e desde o início da crise o seu PIB reduziu-se em 25% (!). Na Grécia o declínio continua como habitualmente, apesar de não tão rapidamente como anteriormente.

Quanto à França, as pessoas pensam agora que o "doente crónico" da Europa já não é a Grécia, mas o seu próprio país. Uma redução de 0.1% no PIB provocou uma espécie de stress nacional. Afinal, tanto o gaullista Nicolas Sarkozy como o socialista François Hollande reduziram continuamente as despesas sociais, aumentaram os impostos existentes e introduziram outros. Em consequência, o desemprego aumentou no terceiro trimestre deste ano; entre os jovens, segundo dados para Setembro, manteve-se ao nível dos 25%.

Entre os problemas económicos na Europa, a pobreza está a avançar rapidamente. Segundo sociólogos do Eurostat, em 2012 havia 124,5 milhões de pessoas no limiar da pobreza. A pior situação é na Bulgária, onde a pobreza e o isolamento social ameaçam a metade (!) da população. Logo a seguir à Bulgária vêm a Roménia e a Letónia, onde 42% e 37% dos residentes, respectivamente, estão em risco de pobreza. Na Lituânia, a pobreza ameaça 33% da população, na Polónia 27,2% e na Estónia 23,1%. Também temos de mencionar a Itália entre esses países; embora a percentagem de pessoas pobres não seja tão grande (29,2%), em termos absolutos, chegam aos 18,2 milhões de pessoas. Os italianos formam a maior massa de pobres na Europa.

Do eurocepticismo ao pessimismo total

A crise da dívida que já vai no quinto ano na Europa e as severas medidas de austeridade que tiveram que ser introduzidas em todos os países europeus estão a provocar o aumento do euroceptismo, não só na periferia da Europa, mas em países relativamente prósperos como a Alemanha e a Áustria.

Os resultados de uma sondagem realizada no final de Agosto – início de Setembro de 2013 pela firma francesa de marketing IFOP mostram um aumento abrupto no número de eurocépticos nas quatro economias de topo da zona euro: Alemanha, França, Itália e Espanha. A principal pergunta que foi feita a alemães, franceses, italianos e espanhóis foi se eles achavam que ser membro da União Europeia lhes era vantajoso. 37% dos residentes além Pirenéus acham que ser membro da UE só traz problemas a Espanha (um ano antes só 26% em Espanha eram eurocépticos). Em França o número dos que estão descontentes com o facto de o seu país ser membro da União Europeia aumentou de 38% em 2012 para 43% neste momento. Na Alemanha, 44% da população são contra ser membro duma Europa unida (há um ano os eurocépticos na Alemanha eram 36%). O maior número de eurocépticos está na Itália, onde 45% dos cidadãos não vêem quaisquer benefícios em fazer parte da União Europeia…

Juntamente com o eurocepticismo, as almas dos residentes do Velho Mundo estão cada vez mais pessimistas. As pessoas estão a perder a esperança e a fé no futuro. Segundo dados do Centro Americano de Investigação Pew, que efectuou um estudo sobre este tópico na Primavera de 2013, apenas 28% dos alemães, 17% dos britânicos, 14% dos italianos e 9% dos franceses acreditam que os seus filhos vão viver melhor do que as gerações anteriores. O que ainda é mais interessante é que o pessimismo no ocidente contrasta profundamente com o optimismo nos países em desenvolvimento; 82% dos chineses, 59% dos indianos e 65% dos nigerianos acreditam num futuro melhor.

Obviamente, os especialistas que acreditam que a Europa está a perder a sua antiga posição de liderança como locomotiva de progresso, têm razão. Chegou a época de novas civilizações.
 
 [*] Economista.

O original encontra-se em:
www.strategic-culture.org/news/2013/12/29/a-europe-without-a-future.html . Tradução de Margarida Ferreira.

Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
 

O RESSURGIMENTO DA EXTREMA-DIREITA

 


Emanuel Areias (17 anos) – Diário De Notícias, opinião do leitor – Jornalismo do Cidadão
 
O mundo de hoje vive acanhado e debilitado devido aos graves problemas políticos que se fazem sentir nas sociedades. Evidenciando o caso específico da Europa, é fácil depreender que os países que constituem este continente estão a atravessar um momento complicado devido à crise e ao período recessivo instalado.
 
Fazendo um retrocesso ao passado, no fim da Primeira Guerra Mundial, a Europa atravessou uma situação caótica, semelhante à atual, mas causada por outros fatores, ficando dependente dos empréstimos dos Estados Unidos da América.
 
Esse pós-guerra causou imensos danos morais às populações, que passavam enormes dificuldades. Todo esse clima de tensão social fez com que as populações reivindicassem direitos.
 
O fim dos impérios autocráticos e a instauração do demoliberalismo tinha sido uma das principais vitórias do povo, só que, os estados liberais e democráticos não conseguiam resolver os problemas das nações.
 
É então que surge na Rússia, a Revolução Soviética que veio alterar mentalidades e proclamar uma nova doutrina política, o comunismo, ou seja a ideologia marxista-leninista.
 
O medo do bolchevismo e do terror que era o comunismo instalou grandes preocupações à classe média e burguesia europeia.
 
Como as democracias não funcionaram e havia graves problemas de natureza financeira, o receio pelo comunismo e a necessidade de um líder forte, capaz de promover a estabilidade social, fez com que houvesse a emergência de autoritarismos.
 
Ditaduras de extrema-direita expandiram-se um pouco por toda a Europa.
 
Mas o que é isso de extrema-direita? No plano ideológico, a extrema-direita ou direita radical representa o mais elevado grau de direitismo do espectro ideológico-político.
 
Os partidos extremistas defendem o autoritarismo, o anticomunismo, o antiparlamentarismo, o nacionalismo, a exaltação do líder, o militarismo ou o imperialismo.
 
O fascismo instaurado por Mussolini, em Itália, serviu de base a regimes ditatoriais, na Espanha com Francisco Franco, na Alemanha com Hitler ou em Portugal com António de Oliveira Salazar.
 
Atualmente o que se tem verificado na Europa é o ressurgimento de partidos de extrema-direita.
 
Tem havido uma crescente aprovação desses partidos por parte da população, pois esta sente-se abalada pela não resolução da crise existente.
 
Por exemplo, em França, o partido Frente Nacional liderado por Marie Le Pen, estabeleceu-se como a terceira força política do país.
 
Este partido evidencia um caráter autoritário pois a sua ideologia centra-se no protecionismo económico, a tolerância zero face à criminalidade e à imigração, tem uma posição cética em relação à União Europeia e defendem a antiglobalização.
 
As previsões indicam que este partido em França terá no futuro ainda mais força.
 
Na Itália, o Movimento 5 Estrelas, fundado em 2009, por Beppe Grillo tem conseguido atrair muitas pessoas.
 
Este comediante procura destituir os partidos tradicionais do poder e dar o poder político aos cidadãos comuns. Tem um diálogo marcadamente populista.
 
Também na Inglaterra, o partido UKIP liderado por Nigel Farage começa a surgir como alternativa. Devido ao descontentamento generalizado, os resultados do UKIP têm disparado nas eleições locais intercalares e nas sondagens.
 
O eterno populista, Nigel Farage, lidera um partido marcadamente eurocético e contrário à imigração.
 
Também na Finlândia, o partido dos Finlandeses Verdadeiros, presidido por Timo Soini, conheceu um aumento de votos nas últimas eleições legislativas daquele país.
 
Tendo o nacionalismo, o euroceticismo, o populismo, o desconforto face à imigração e a antiglobalização como ideais primordiais, os partidos de extrema-direita têm evoluído significativamente e são forças políticas emergentes em vários países da Europa.
 
São muitos os jovens europeus que ingressam nessas forças políticas, cansados de promessas e de mal-estar social.
 
Estes jovens são mais críticos para com os governantes porque estão preocupados com o futuro e com a identidade cultural, temendo o crescimento galopante da imigração.
 
Está a crescer na Europa um clima e um sentimento forte contra os imigrantes, e para além disso, uma enorme desconfiança face aos muçulmanos.
 
Os partidos com ideias xenófobas, anti-imigração e anti islamitas estão a expandir-se rapidamente.
 
É necessário e urgente que os políticos europeus encarem este problema de frente, pois o radicalismo e o extremismo estão novamente a invadir o mundo inteiro.
 
O sentimento de descrença nas democracias pode levar ao surgimento imediato de ditaduras.
 
Se isso acontecer, teremos que viver sob o comando de um presidente autocrático.
 
É preciso reagir pois o futuro não se avizinha terno. Cabe às lideranças políticas e a cada um de nós a luta contra o poder autoritário e opressor.
 
Na foto: O PIDE Anibal Cavaco Silva
 

Portugal: O QUE CAVACO DISSE “FOI GRAVE E INCONSTITUCIONAL” - Louçã

 


No espaço ‘Tabu’, da ‘Edição da Noite’ da SIC Notícias, Francisco Louçã abordou o discurso de Ano Novo do Presidente da República e o Plano B ao Orçamento de Estado apresentado pelo Governo esta quinta-feira. Para o antigo coordenador do Bloco de Esquerda, o chefe de Estado surpreendeu ao abordar o programa cautelar, algo que não lhe compete e é inconstitucional, e critica o Governo por falar de medidas que ainda não decidiu se vão ser aplicadas ou não, causando algum alarme social.
 
No espaço de comentário que protagoniza, todas as sextas-feiras, na SIC Notícias, Francisco Louçã começou por fazer referência ao discurso de Ano Novo de Cavaco Silva, afirmando que houve apenas um ponto surpreendente no seu discurso: o facto de ter falado do programa cautelar. Algo que acredita que surpreendeu até o executivo de Passos Coelho.
 
“O Presidente fez um discurso previsível. A parte do programa cautelar é a única parte surpreendente. Depois da polémica com as suas decisões anteriores, em aprovar o Orçamento de Estado para 2014, o Presidente foi ainda mais longe”, começou por dizer, para acrescentar que o que Cavaco fez “foi grave e inconstitucional”, pois não é a ele que “compete comunicar este tipo de decisões nem se antecipar ao Governo numa medida que este tem desmentido”.
 
Em causa estão as declarações do chefe de Estado em que afirmou que seria grave para Portugal regredir na situação em que se encontra e em que referiu a necessidade de se recorrer a um programa cautelar para garantir o acesso do país aos mercados.
 
As consequências do seu discurso implicariam que “o Governo respondesse” e ao não fazê-lo este “parece ter sido apanhado de surpresa”.
 
Para Francisco Louçã ninguém tem dúvidas que o Governo está a negociar um plano cautelar, mas defende que este só o deve anunciar quando tiver a certeza que irá ser bem-sucedido.
 
O ex-bloquista elogiou, ainda, o Partido Socialista pela sua resposta ao discurso de Cavaco Silva. Para Louça, o partido liderado por António José Seguro foi muito incisivo ao afirmar que se Cavaco não pedisse a fiscalização das medidas do Governo, seria o próprio partido da oposição a pedir explicações ao Tribunal Constitucional em relação aos cortes nas pensões e nos salários. “A resposta do PS é de louvar. Foi muito incisiva, o que não é comum”, disse.
 
Em relação ao Plano B ao Orçamento de Estado, apresentado esta quinta-feira, após reunião de Conselho de Ministros, o comentador referiu que o “plano foi apresentado sem nenhum plano”, e criticou a forma de comunicar deste executivo.
 
O político refere que as medidas foram apresentadas “de forma desmazelada e em que ainda nada é certo”, provocando um grande alerta nas pessoas. Este defendeu, ainda, que quem deveria ter falado na conferência de imprensa seria a ministra das Finanças, o primeiro-ministro ou o vice-primeiro-ministro Paulo Portas.
 
Notícias ao Minuto
 

Portugal: CENA DE RUA

 

Carla Romualdo  - Aventar
 
Manta estendida no chão, por cima de cartões e sacos plásticos. O sítio não é o melhor, tão desabrigado, demasiado perto da esquina, sopra vento o dia inteiro. Impossível não vê-los desde longe. O homem está sentado no chão e ao seu lado estão os quatro cães, com seis pratos de biscoitos à frente, pratos generosamente abastecidos pelas senhoras que zelam com cuidados maternais pela comunidade canina da cidade. Assim alinhados, ele embrulhado numa manta, todos os cães com a sua mantinha pelo lombo, os pratos de biscoitos à frente, parecem sentados frente à televisão, quase divertidos com o programa que lhes tocou, essa sucessão de gente que passa com uma expressão de tédio ou de angústia, um riso adolescente, um silêncio ressentido entre casais. A cena doméstica surpreende, faz-nos abrandar para ver melhor a família, os cãezinhos tão ordeiros, tão pacatamente sentados que parecem gente, gente crescida que observa com curiosidade e talvez alguma surpresa o espectáculo das gentes que passam.
 
Estes cães honram a sua missão, entendem que é da bondade dos estranhos que depende a sobrevivência, enroscam-se no dono quando faz frio, dormitam com uma orelha sempre à escuta de um perigo que se aproxime, lambem as mãos das viúvas que lhes despejam pacotes de biscoitos para o prato, mantêm-se debaixo da manta longas horas, porque sabem que é isso que se espera deles. São bichos de espectáculo, cães artistas, solenes na sua dignidade de mendigos que não pedem, não soltam um teatral ganido à passagem dos transeuntes, estão simplesmente ali, sentados com a mantinha pelas costas, como se fossem gente e honrassem a diário o seu papel, a troco da sobrevivência da família.
 
E o Tó Zé, o pai, levanta o acampamento ao fim do dia, reúne a trupe com um assobio disciplinador, e assume a posição de condutor quando seguem todos pelas ruas, em fila indiana, ele com a sacola das mantas às costas, a caneca de chapa das moedas, os pratos de comida, os biscoitos guardados em sacos do supermercado, o blusão dois números acima, a trança encardida a sair do boné.
 
Expeditos e alinhados, sem sinal de desarmonia familiar, homem e cães, pai e filhos, irmãos de ofício, companheiros. Nada os faz perder tempo pelas ruas, caminham sempre, ignoram outros cães e outros homens, caminham sem se deterem, até chegarem a casa, barraco de telhado de zinco e paredes com tijolo à mostra, para passar a noite enroscados nas mesmas mantas que trouxeram da rua. Cães artistas, às ordens do seu chefe, seu pai, agente, gestor das esmolas e dos biscoitos, provedor das mantas, grande condutor, que descobriu que já só dos animais se condoem os que passam, dos seus olhinhos tristes e dos focinhitos húmidos, e por isso chovem mais biscoitos nas tigelas do que moedas na caneca.
 
- Não tenho vergonha de dizer que, em muitas noites, são o meu jantar.
 
Foi o Tó Zé quem disse, os cães não falam.
 
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Portugal: AINDA E SEMPRE OS PENSIONISTAS

 

Triunfo da Razão
 
2014 não começou com grandes surpresas. O Presidente da República dá o seu OK ao Orçamento de Estado e Passos Coelho insiste no ataque aos pensionistas. Desta feita, o Governo aposta num alargamento dos cortes das pensões e mexidas na ADSE. Aumenta-se assim o número de pessoas atingidas.

Recorde-se que o valor em causa não atinge os 400 milhões de euros e que estes cortes têm lugar no país do BPN, das PPP's, dos Swaps, Banif, etc.

Para Passos Coelho ainda e sempre os penisiostas, os reformados, os aposentados. Aquela franja da população que já não tem capacidade de encontrar outras fontes de remuneração; velha para emigrar; aquela franja da população que se debate com crescentes despesas de saúde; aquela franja da população que não tem quem a proteja, que não tem capacidade de paralisar o país ou exercer outras formas de pressão. É tão fácil ser-se forte com os fracos. Se dúvidas persistirem, perguntem a Passos Coelho.

Ana Alexandra Gonçalves
 
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