quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Portugal | VENTURA, O ELEFANTE

Rafael Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião

E ao terceiro dia de debates, não esteve lá André Ventura. Mas é ainda o líder do Chega quem domina os escaparates eleitorais. Porque alguns confrontos podem durar para além da sua data de validade. E ainda mais se os principais atores políticos derem um empurrão adicional.

Um dos empurrões deu-o António Costa. O socialista ainda não debateu com André Ventura. Mas já decidiu tirar partido do debate do chefe da Direita radical com Rui Rio, à procura de mais uma meia dúzia de votos a 30 de janeiro. Para tentar envergonhar o seu principal adversário na corrida a S. Bento, não resistiu a dar corda a Ventura.

O outro empurrão deu-o Rui Rio. Primeiro, porque poderia e deveria ter sido definitivo sobre o que pensa das penas de prisão perpétua, na altura própria, em vez de tentar dar a quem o ouvia uma lição jurídica. Depois, porque, como não esclareceu na altura certa, se viu obrigado a voltar ao tema, já na ressaca, para deixar a questão em pratos limpos.

Fica claro que, na dimensão de combate em que os debates televisivos se transformaram, em nome das audiências, André Ventura é o gladiador e os restantes líderes os alvos. É evidente que a "demagogia barata" (citando Marcelo Rebelo de Sousa, o único político que, até à data, conseguiu num debate televisivo reduzir Ventura à sua verdadeira dimensão política) é fácil de propor e difícil de combater (que o digam Catarina Martins e Rui Rio).

André Ventura é o elefante na loja de porcelanas. Não tem medo de partir a louça, mesmo que a louça partida não resolva o problema de nenhum português de bem. Ele não está aqui para isso. Está aqui para, com conversa de café, fazer tremer o sistema, como dizem os cartazes que andam por aí. E é com surpresa que se percebe que o sistema treme.

PS. Como a memória é curta, recordem-se três episódios que ajudam a definir André Ventura e o Chega. É o partido no qual se apresenta e vota em congresso uma moção em que se defende a retirada forçada do útero à mulher que aborte. É o partido em que um vice-presidente faz um ataque misógino e racista a uma mulher negra, deputada, associando-a à frase "Desconizar este lugar". É o partido cujo líder é condenado em tribunal por chamar "bandidos" a portugueses de pele negra que posaram numa fotografia com o presidente da República. Sim, é este tipo de gente.

*Diretor-adjunto

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