Paulo
Baldaia – Diário de Notícias, opinião
A
justiça está deitada na cama que fez para si própria nas últimas décadas. O
povo já não se contenta com o facto de o dono disto tudo ter sido detido e
interrogado por um juiz. Pelo contrário, desconfia de tanto aparato e já nem
pede justiça, exige vingança.
Todos
perguntam onde estava este poder (juízes, procuradores, jornalistas,
políticos...) quando ele era de facto dono disto tudo? Por certo se sabe muito
mais hoje do que há apenas dois meses, mas não estranhem que o povo estranhe
tanta vontade de fazer justiça depois de tanto silêncio e cumplicidade.
Para
ficar bem na fotografia, a justiça está "obrigada" a dar ordem de
prisão a este banqueiro e o povo, de seguida, pedir-lhe-á mais prisões, de mais
banqueiros, de mais gente importante e poderosa. Pressionada, a nossa justiça
deixará que a violação do segredo de justiça, essa arma poderosa para condenar
pessoas na praça pública, volte a funcionar. E já começaram as fugas selectivas
de informação, querendo provar a culpa do arguido mesmo que para isso quem
investiga tenha de fazer figura de parvo.
O
Expresso Diário contou-nos a história de umas caixas, com papéis para destruir,
encontradas pela investigação no escritório improvisado de Ricardo Salgado, e
dava nota do que essa mesma investigação terá feito perante tão grande
descoberta. Passo a citar: "A PJ fotografou, foi-se embora e cinco dias
depois [...] entrou no hotel com um mandado de busca." Se não fosse
trágico, dava para rir. O Ministério Público acreditou que Salgado queria
destruir provas e achou por bem dar-lhe cinco dias para pensar no assunto. Não
lhes passou pela cabeça que é na produção de prova e na sua justa avaliação, de
acordo com a lei, que se faz boa justiça. Por aqui se vê que, infelizmente, não
há uma única razão para acreditar que a justiça vai mudar em Portugal.
Para
avaliar o estado da justiça pouco importa que isto termine com uma condenação
ou uma declaração de inocência do mediático arguido. A democracia assenta na
separação de poderes mas a maior parte do tempo parece que a justiça é um
Estado à parte, com as suas próprias regras, sem ter de dar cavaco a ninguém.
As
instituições da justiça estão entre as mais desconsideradas pelos portugueses e
vivem hoje, como viviam ontem, sob suspeita de tratar de modo diferente
cidadãos que, à luz da lei, deveriam receber tratamento igual. Ainda não foi
desta que provaram não temer os poderosos. Os titulares da justiça, a quem se
exige maior responsabilidade, agem do mesmo modo que a generalidade dos
cidadãos, com reverência face a quem tem poder e com desdém em relação a quem
cai em desgraça. Para
haver Justiça é preciso muito mais do que o circo que já começaram a montar.
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