O
Governo proibiu a manifestação programada para amanhã (sábado), em Cabinda. Os
organizadores dizem que têm (julgam que Angola é um Estado de Direito e uma
democracia) direito constitucional a manifestar-se. Os sipaios do regime dizem
que está em causa a ordem pública. Solução: porrada em que sair à rua.
Orlando
Castro
Porque
a esperança é legítima e a última a morrer, muito boa gente espera que, amanhã,
o bom senso evite males maiores. Mas tudo indica, como é típico nas ditaduras,
que tal não vai acontecer. A máquina do MPLA, com a criminosa conivência da
comunidade internacional, vai – como diz Kundi Paihama – “varrer” a Oposição.
E
se em Angola é assim, em Cabinda vai passar-se o mesmo. Aliás, tal como
acontece com os angolanos, também os cabindas passam fome, vivem numa pobreza
generalizada e na saúde a situação é gravíssima, não tendo os hospitais sequer
condições mínimas para realizar um parto.
Sendo
os cabindas um Povo com uma elevada estatura moral, continuam serenamente a não
dar – até um dia – ao regime colonial a oportunidade que ele espera para os
varrer da região.
Sendo
um Povo pacífico que, contudo, não se ajoelha perante os homens, aposta em pela
via cívica dizer ao políticos angolanos que a repressão, entre outras técnicas
ditatoriais, tem um prazo de validade que há muito foi ultrapassado.
Os
cabindas (e a comunidade internacional só não sabe isso porque se vendeu ao
regime angolano) sabem bem que em matéria de emprego, por exemplo, só são
admitidos os que tiveram cartão do MPLA. Tal como sabem que pelas regras do
regime colonial angolano, são sempre culpados até prova em contrário.
Aliás,
grande parte do Povo de Cabinda nem sequer tem liberdade para cultivar as
lavras, procurando dessa forma meios mínimos de subsistência. Os militares
ocupantes determinam até o acesso aos campos de cultivo.
Pena
é que a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) passe ao lado da
realidade e nem sequer tome posição em relação ao facto de, em Cabinda, se uma
grávida em serviço de parto der entrada no Hospital tem de levar – caso queira
ter alguma assistência – o álcool, o algodão, as ligaduras, as compressas e as
seringas.
Essa
situação que se não fosse tão dramática seria com certeza anedótica, não impede
que a Procuradoria-Geral da República em Cabinda tenha dinheiro para pôr no
terreno campanhas do que chama educação cívico-jurídica que, na verdade, se
pode traduzir como manifesto apelo à filiação canina no MPLA.
Volta
e meia o regime avança com as campanhas que, diz a propaganda do MPLA, visam
também a elevação da consciência jurídica dos cidadãos tendo em vista acabar
com condutas contrárias à lei, aos bons costumes, bem como incentivar as regras
democráticas.
Estão
contidos nos pacotes destas campanhas, temas como “As eleições gerais e a
liberdade de imprensa à luz da constituição e da lei”, “A lei contra a
violência doméstica e as ofensas decorrentes de divergências de filiação
partidária no seio das famílias”, “As eleições gerais à luz dos direitos,
liberdades, e garantias fundamentais”.
Portugal
esconde-se… cobardemente
Assim,
o regime angolano continua a usar a razão da força para calar a força da razão em Cabinda. O mundo
cala-se. Portugal põe o rabinho entre as pernas e olha para o lado.
Há
alguns anos, no limiar do novo milénio, o governo belga apresentou ao Povo da
República Democrática do Congo desculpas formais e oficiais pelo seu
envolvimento no assassinato de Patrice Lumumba, herói da independência daquele
país africano e chefe do seu primeiro governo.
Para
Cabinda, não é necessário que Portugal chegue a tanto, embora fosse da mais
elementar justiça… caso Portugal fosse um Estado de Direito. Os cabindas apenas
querem a verdade. Não só não exigem desculpas, como nem as esperam.
Os
cabindas são o único povo do planeta a quem é negado, sistemática e
terminantemente, a compreensão, a amizade e a solidariedade. O único povo cujos
mais elementares direitos são espezinhados. O único que, contra o direito e a
sua própria vontade, é empurrado para soluções extremas, como se o objectivo
fosse arranjar um pretexto para eliminar os cabindas da face da terra.
Porque
razão os supostos jornalistas portugueses não falaram, não falam, não recordam
o que o padre Jorge Casimiro Congo foi dizer ao Parlamento Europeu (Bruxelas),
no dia 26 de Janeiro de 2010, a convite da eurodeputada socialista portuguesa
Ana Gomes?
O
padre Casimiro Congo disse algo que define sublimemente os cabindas e que os
angolanos nunca deverão esquecer: “Diante de Deus, de joelhos; diante dos
homens, de pé”.
Jorge
Casimiro Congo lamentou também a posição do governo português, de condenar na
altura apenas o que classificou como um ataque terrorista durante a Taça das
Nações Africanas (CAN), afirmando que “Portugal é o ultimo a falar, não deve
ser o primeiro a falar”. E porquê? Porque “Portugal é que é o culpado do que
acontece em Cabinda. Não
nos aceitou, traiu-nos”.
Se
as verdades ajudassem a reduzir o défice português, as que foram ditas pelo
padre Congo, não só por serem históricas mas sobretudo por serem actuais, o
governo do reino lusitano estaria bem da vida.
Mas
não ajudam. Desde logo porque, da Presidência de República portuguesa ao
Governo, passando pelo Parlamento e pelos partidos, ninguém sabe o que é, da
facto e de jure, Cabinda. Para quase todos, a história de Portugal só começou a
ser escrita em Abril de 1974, ou até mais tarde.
Optimista
quanto ao futuro, sobretudo por saber que o seu povo nunca será derrotado
porque nunca deixará de lutar, o padre Congo disse ainda ter esperança de que
no futuro haja “governos portugueses com mais calma para ver este problema”,
porque acredita “que há partidos que começam a levantar a cabeça” e surgirão
figuras que fiquem “acima de quaisquer negociatas, de petróleo, ou de
mão-de-obra que tem de ir para Angola”.
É
claro que não houve nenhuma reacção oficial de Portugal às acusações do padre
Congo. Uns porque entendem (e talvez bem) que quem manda em Portugal é cada vez
mais o clã Eduardo dos Santos; outros porque entendem que se o MPLA virar a
rota e passar a investir noutro lado lá vão ao charco alguns grandes negócios;
outros ainda porque se estão nas tintas para a honorabilidade de um Estado de
Direito.
Estado
de Direito que Angola não é e que Portugal é cada vez menos.
Folha
8 (ao)
Leia
mais em Folha 8
Sem comentários:
Enviar um comentário