António Martins –
Outras Palavras
Nos EUA,
petroleiras já obtêm, por dinheiro ou junto aos parlamentares, leis e acordos
que impõem censura sobre contaminação ambiental
Fracking
é um processo ainda quase desconhecido no Brasil. Empregado cada vez mais
largamente nos Estados Unidos, é visto, lá, como uma das apostas para recobrar
“soberania energética”. Consiste em injetar, em certas regiões do subsolo,
água, areia e um coquetel de produtos químicos, em altíssima pressão. Permite
recuperar depósitos de petróleo ou gás existentes em rochas subterrâneas, mas
que não podem ser extraídos por métodos normais de extração. Agora, o fracking pode
tornar-se conhecido, em todo o mundo, por outros de seus produtos. Veto total à
produção de evidências a respeito de seus efeitos sobre o Ambiente e a Saúde.
Silêncio forçado, imposto inclusive a crianças, em troca de dinheiro. Leis
adotadas, sob forte influência de lobbies empresariais, para silenciar também
os médicos. Em síntese, novas formas de bloquear três elementos essenciais da
democracia: informação pública, transparência e possibilidade de influenciar a
formulação de leis.
O último episódio
de censura veio à tona ontem, no site norte-americano Alternet e no jornal londrino The Guardian. Em audiência
judicial, um casal — Chris e Stephanie Hallowich, do Condado de Washington, na
Pennsylvania — revelou ter assumido, em acordo judicial com uma operadora
de fracking, cláusula que os obriga a silêncio, até o fim da vida, sobre
os danos causados pelo processo a sua saúde. A censura perpétua estende-se,
segundo os termos do contrato, a seus filhos, então com sete e dez anos de
idade.
Em entrevista ao
Alternet, Sharon Vion, ativista da organização Earthworks, que se
opõem ao fracking, explica por que este tipo de pressão é eficiente. O casal
Hallowich vivia em uma pequena chácara, próxima a um dos locais em que se
adotava este tipo de extração. Depois que os trabalhos começaram, a família
passou a apresentar sintomas como queimação nos olhos, ulcerações na garganta,
dores de cabeça e ouvidos. A água da propriedade ficom contaminada. A empresa
ofereceu-se para comprá-la, por 750 mil dólares. Impôs, porém a cláusula de
silêncio. O casal aceitou-a, para poder mudar-se. O caso veio à tona por
pressão de um jornal local e porque os Hallowich estão preocupados com a
impossibilidade prática de calar as crianças.
Há centenas de
acordos deste tipo, continua Sharon. E graças ao silêncio das vítimas, a
indústria do fracking tem sido capaz de alegar, em juízo e em audiências
legislativas, que “não há evidências concretas” da contaminação. Seria,
certamente, fruto de exageros… A mesma desculpa é adotada por autoridades
favoráveis à extração.
Um terceiro texto, na revista The Atlantic, revela que
é ainda mais vasta a intervenção, nas decisões políticas, das empresas de fracking
— entre elas, a Halliburton, fortemente ligada ao Pentágono e à guerra contra o
Iraque. Alegando “segredos industriais”, obtiveram, do Congresso, o direito de
não revelar, com exatidão, que mistura de produtos químicos injetam no solo.
Estão desobrigadas de obedecer, também, dispositivos que exigem transparência
em relação aos riscos de contaminação da água. Sabe-se já que entre os
compostos estão alguns de alta toxicidade, como benzeno, tolueno, etilbenzeno e
xileno. Em doses baixas, produzem o tipo de sintomas sentido pelos Hallowich.
Com o tempo, ou dependendo da dosagem, causam câncer.
Talvez o caso mais
bizarro de silêncio forçado seja, porém o que envolve os médicos da
Pennsylvania. The Atlantic revela que o legislativo estadual aprovou, no ano
passado, lei que determina às empresas de fracking fornecer, a estes
profissionais, informações necessárias a seus diagnósticos. Porém, impõe-se uma
cláusula de confidencialidade. Os médicos não podem revelar o que souberam das
operadoras a ninguém — nem mesmo aos pacientes que estão tentando tratar…
É de estranhar,
nestas condições, que tantos vejam tal tipo de “democracia” como farsa?
Sem comentários:
Enviar um comentário