Rui Peralta, Luanda
O
ISIS - a nova vaga do fascismo islâmico - é uma consequência das dinâmicas
geradas no mundo islâmico pela ocupação do Iraque. Logo após a ocupação
formaram-se diversos grupos de resistência e de luta armada, entre eles a Jamaa
al Tawhid wal-Jihad, um grupo surgido em 1999 e que formou a Al-Qaeda no
Iraque, unindo-se mais tarde ao Conselho dos Mujaidines, formando em 2006 o
Estado Islâmico do Iraque, dirigido por altos-oficiais, sunitas, da Segurança,
do Partido Baas e do exército do regime de Sadam Hussein.
Milhares
de iraquianos foram detidos em cárceres secretos, onde eram torturados. Muitos
desapareciam para sempre, outros reapareciam, amargurados e endurecidos pelas
torturas e humilhações, tornando-se extremamente ligados á religião e á
interpretação sunita do Islão. A ocupação norte-americana desarticulou o
exército iraquiano, criminalizou o Partido Baas e integrou as milícias do
partido nas novas forças de segurança, para lutar contra a resistência.
Fomentaram-se as divisões - numa política de “dividir para reinar”- entre
sunitas e xiitas, utilizando o sectarismo como base da nova estratégia de
combate á resistência.
Os
esquadrões da morte formados pelos norte-americanos e pelos britânicos
prenderam milhares de jovens sunitas, muitos dos quais eram assassinados, sendo
os seus cadáveres abandonados nas ruas de Bagdade. Centenas de milhares de
famílias abandonaram o país e mais de 5 milhões de iraquianos converteram-se em
refugiados, instalando-se metade deles na Síria. Em pouco tempo o Iraque, um
país tradicionalmente caracterizado pela excelente relação entre sunitas e
xiitas, onde um elevado número de matrimónios eram mistos, um país sem tensões
sectárias, tornou-se um inferno.
Muitos
dos oficiais de Sadam e muitos quadros do Partido Baas, compartilharam as celas
com membros de grupos religiosos em vias de radicalização. Abu Baker
Al-Bagdadi, que em 2010 assumiria a liderança do Estado Islâmico do Iraque
(ISIL ou Daesh) foi detido pelos norte-americanos em 2004 e enviado para o
campo Bucca, local conhecido pelas torturas e humilhações a que os prisioneiros
eram sujeitos pelos norte-americanos. Por este campo de concentração passaram
muitos dos actuais responsáveis do Daesh, tendo muitos deles adquirido aí o seu
primeiro contacto com o wahabismo, a doutrina islâmica, sunita, dominante na
Arábia Saudita.
Em
2011 o Estado Islâmico do Iraque enviou uma delegação á Síria, lançando as
sementes do futuro Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIL ou Daesh),
formado em 2013. Em menos de um ano as fileiras do ISIL foram engrossadas por
milhares de mercenários chechenos, bósnios, muçulmanos provenientes dos Balcãs
do Norte de África e da Ásia, bem equipados e com bons níveis de treinamento e
o ISIL tomou várias cidades iraquianas, sem qualquer resistência, enquanto
proclamava o Califado Islâmico do Iraque e do Levante, um espaço similar ao da
Jordânia.
USA
e NATO, Israel, Turquia e as petro-monarquias do Golfo viram no ISIL uma
potencial arma contra o Irão. Através do ISIL mantiveram governo de maioria
xiita no Iraque em profunda instabilidade, desestabilizaram a Síria e Israel
mantive o Hezbollah ocupado em Damasco. A Turquia viu no ISIL uma forma de
deter os curdos e permitiu que o ISIS vendesse, em solo turco, petróleo roubado
á Síria, um das maiores formas de financiamento dos grupos fascistas islâmicos.
Os USA, a Arábia Saudita e os Emiratos Árabes Unidos, bombardeiam o Iémen,
cultivando o fascismo com a morte de milhares de pessoas, através dos
bombardeamentos indiscriminados, numa tentativa de debilitar os xiitas
iemenitas.
O
colonialismo no Médio-Oriente e as ingerências sucessivas dos USA e seus
aliados da NATO – como o golpe de Estado fomentado pela CIA no Irão contra o
governo democrático de Mossadeq ou o apartheid sionista e os crimes perpetrados
na Palestina, ou, ainda, as tentativas de desestabilização da região do Magreb,
no Norte de África – são causas históricas do enraizamento do fascismo
islâmico, que nasce nos finais dos anos 70, com o apoio dos USA, da NATO e dos
conservadores islâmicos (as monarquias do Golfo e a Turquia) para combater a
influência das forças progressistas, nacionalistas laicas que dominaram o mundo
politico islâmico foi dominado, nos anos 60 e grande parte da década de 70.
Com
a guerra do Afeganistão, as organizações integristas islâmicas receberam
financiamentos diversos, armas e equipamentos para combater a URSS em solo
afegão. No Egipto surgem grupos como a Jihad Islâmica e na Argélia, a Frente
Islâmica de Salvação Nacional (FIS, que integrava diversos grupos da direita
ultraconservadora islâmica) ganhou as eleições. Um golpe militar acabou com as
ilusões dos integristas argelinos e grupos fascistas como o GIA (Grupo Islâmico
Armado) fazem a sua aparição. As redes fascistas islâmicas começam a ganhar
peso e a Al-Qaeda estabelece-se como o protótipo de actuação e de organização
destes sectores islâmicos, apoiados pelo Ocidente e pelas monarquias do Golfo.
A ocupação do Iraque em 2003 e a ocupação do Afeganistão em 2011 provocaram o
alimento que estas forças necessitavam.
Não
estamos na presença de nenhum “choque civilizacional”, como algumas corujas da
mitologia Ocidental pretendem impor á opinião pública mundial, nem de qualquer
“guerra de culturas”, ou mesmo de “guerras religiosas” (coisa que não existe.
As guerras são sempre sociais, económicas e politicas). O Islão não é menos nem
mais violento que o Cristianismo e os grupos fascistas islâmicos utilizam um
discurso que em nada difere dos seus congéneres cristãos ocidentais. A
violência extrema que é exercida em nome do Islão não tem origem em nenhum ADN
conatural a uma religião, como pretendem alguns “fazedores de opinião” nas
tertúlias pestilentas das redes sociais, ou nos monólogos intermináveis da
máquina de propaganda conhecida por “comunicação social”.
Tem
um nome: Fascismo!
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