Vítor Santos | Jornal de Notícias
| opinião
Que o Governo foi apanhado de
surpresa com a greve dos motoristas de matérias perigosas, já não restam
dúvidas. Mas até por isso a reação devia ter sido mais cautelosa. Abrir a
requisição civil no Grande Porto e na Grande Lisboa é desprezar as populações que
vivem longe dos grandes centros.
O carinho com que António Costa
trata descentralização, regionalização e derivados aparenta resultar mais do
taticismo político do que de uma evidente preocupação com um país onde todos os
momentos são aproveitados para cavar mais fundo no abismo de assimetria entre
litoral e interior.
O Governo preocupou-se com os
cerca de 4,5 milhões de habitantes que vivem nos dois maiores centros urbanos,
acautelou a chegada e saída de pessoas dos dois grandes aeroportos e ficou a
rezar para que a primavera leve embora o mau tempo. Até na crise dos
combustíveis é possível centralizar sem esforço. Qualquer correção a posteriori
não apaga o centralismo da primeira decisão.
A trapalhada começou com uma
greve ignorada até se sentirem os efeitos. A capacidade de antecipação do
Executivo situou-se abaixo de zero, mas agora é necessário ultrapassar o
problema, e, simultaneamente, perceber este fenómeno dos sindicatos com tão pouco
tempo de vida que conseguem mobilizar os trabalhadores para paralisações
suscetíveis de bloquear setores vitais do país. Foi assim, também, com as
greves dos estivadores e dos enfermeiros. Estamos a falar de organizações
criadas fora da esfera das centrais sindicais, o que talvez deva preocupar CGT
e UGT.
A legitimidade da greve não está
em causa, mas como motoristas dizem uma coisa e patrões outra, a propósito de
(baixos) salários e (excesso) de horas de trabalho, o melhor mesmo é deixá-los
debater, porque sem discussão não há convergência, esperando que os governantes
também consigam conversar entre eles, substituindo o Conselho de Ministros por
uma aula de Geografia, onde seja possível estudar o mapa de Portugal, de forma
a perceberem que existe um país e não duas enormes áreas metropolitanas.
*Editor-executivo
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