sexta-feira, 15 de março de 2024

Criada para Todo o Serviço – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O jornalismo está cheio de criadagem. Conheci uma criada feita de papelão na casa de obras da tipografia, coisa que já não existe e é pena porque ali se utilizavam as sobras de papel no acerto do “bacalhau” das rotativas. Conheci um criado que sabia pouco da profissão mas muito sabedor a lamber botas ao patrão. Chegou a director e ministro. Conheço uma criada para todo o serviço que faz muito jeito quando é preciso atropelar o Direito à Inviolabilidade Pessoal com “notícias” encomendadas pelo dono. Chama-se “Interesse Público”.

A criada para todo o serviço é um velho truque usado pelos salteadores dos Media quando se trata de cometer crimes contra os Jornalistas e a profissão mais velha do mundo, o Jornalismo. Ataques à honra, ao bom nome, à consideração social, à esfera privada, pessoal, segredo de pessoas e instituições são justificados com o “Interesse Público”. Carregadoras e carregadores de câmaras, microfones e gravadores violam alegremente Direitos, protegidos pela Constituição da República à boleia da criada para todo o serviço. Fazem um papelão!

Hoje no Jornal de Angola José Otchinhelo fala sobre o assunto. Quem ler aquilo fica com uma ideia perigosamente distorcida sobre a matéria. Como continuo ligado às e aos profissionais que trabalham na Empresa Edições Novembro vou escrever, mais uma vez (a milésima?) sobre o interesse público no Jornalismo.

Esta criada para todo o serviço só faz sentido no conjunto das Causas de Exclusão do Ilícito. Os Jornalistas quando produzem as mensagens informativas têm de obedecer escrupulosamente aos critérios éticos e deontológicos que suportam os conteúdos, entre os quais destaco a verdade dos factos, o contraditório e o rigor, que é a marca distintiva do Jornalismo. Volto a repetir: Jornalismo é um exercício permanente de grande rigor e só se realiza numa lógica de contrapoder.

A Liberdade de Imprensa é tão importante que os Jornalistas até podem produzir e publicar mensagens informativas que atropelam os critérios que suportam os conteúdos. Desde que estejam presentes as Causas de Exclusão do Ilícito. Todas num conjunto indissolúvel! 

Primeira. O Jornalista reportou, em boa-fé, como verdadeiros e autênticos os factos que serviram de base à notícia ou reportagem. Se em Tribunal provar que foi enganado e agiu dentro das normas éticas e deontológicas, não há crime. Não há censura nem castigo.

Segunda. O Jornalista ouviu todas as partes atendíveis, nas mesmas circunstâncias. Não pode fazer um telefonema, confrontar uma parte com factos falsos e exigir uma resposta imediata para depois dizer na sua peça que até ao fecho da edição não houve resposta. Truque muito usado na falsificação do Jornalismo.

Terceira. O jornalista apurou os factos por uma fonte. Esses factos colidem contra o Direito à Inviolabilidade Pessoal. É obrigado a confirmar a verdade dos factos. E reconfirmar por uma terceira fonte independente das outras duas. É a Teoria das Três Fontes, desprezada, ignorada, espezinhada e abandalhada em nome do banditismo mediático. Estou a falar do Dever de Cuidado inerente a todas as profissões. Em Tribunal, se o Jornalista que publica uma notícia falsa provou que reputou, de boa-fé, os factos como verdadeiros. Ouviu as outras partes e confirmou os factos em respeito pelo Dever de Cuidado, é absolvido. 

Quarta. A última Causa de Exclusão do Ilícito é o Interesse Público. A tal criada para todo o serviço. Porque ela é usada a torto-e-a-direito. Isoladamente. Sem ter em conta as outras três. Não pode. As quatro têm de estar presentes ao mesmo tempo. Nenhuma vive por si. Reportar como verdadeiros os factos, em boa-fé, não chega. Ouvir apenas todas as partes não chega. Confirmar e reconfirmar vale pouco ou nada sem dar os outros passos. O Interesse Público não é nada isoladamente. Todas em concurso ou nada! O banditismo mediático fez do Interesse Público uma criada para todo o serviço. Um logro. Uma aldrabice.

A União Europeia proibiu os Media da Federação Russa. Todos os Estados do ocidente alargado aceitaram a censura sem pestanejar. Censura pura e dura. Assim conseguem passar a propaganda sem contraditório. E conseguiram isto: A Rússia é comunista. A Rússia quer invadir e ocupar toda da Europa. A Rússia quer atacar com a bomba atómica. Putin é um assassino.  

O único país do mundo que usou bombas atómicas chama-se Estados Unidos da América (EUA). Quem instalou na Ucrânia laboratórios de armas químicas e biológicas foi um país chamado Estados Unidos da América. Quem usou essas armas em vários pontos do mundo foi um país chamado Estados Unidos da América e seus aliados, da OTAN (ou NATO). Os colonialistas portugueses usaram desfolhantes nos Dembos, território da I Região Política e Militar do MPLA. Bombas da OTAN e dos EUA!

A maior força da Oposição na Federação Russa é o Partido Comunista. O regime segue os ditames da “economia de mercado”. O maior opositor a Putin nas Eleições Presidenciais é o líder comunista, Sergei Malinkovich. Ninguém o conhece porque não recebe ordens e dinheiro da CIA, dos serviços secretos britânicos nem da União Europeia. Não quer nada com a OTAN (ou NATO). Podem ter a certeza de que vai ter maior votação do que teria o defunto Navalny. 

No ocidente alargado só se fala em guerra. Querem a guerra custe o que custar. A carne ucraniana para canhão acabou. A carne polaca começa a escassear. Vão mandar carne de primeira. Pelos vistos os franceses já estão na Ucrânia. A Alemanha recusa seguir essa via. Mas basta Berlim ficar de fora? Eles anseiam a guerra. Estão a ser empurrados pela recessão. Pela falência económica. E pelo nazismo galopante no ocidente alargado, de Biden a Macron, de Úrsula von der Leyen a Rishi Sunak. 

O mundo ocidental caminha aceleradamente para a nazificação. Os russos pagaram uma factura descomunal pelo nazismo. Quase 30 milhões de mortos. Deviam ser apoiados no esforço de desnazificação da Ucrânia e do mundo. Pelo contrário, estão a ser combatidos. E querem encurralá-los no seu reduto. Ainda não perceberam que vão ser derrotados. E pior: Estão a empurrar a maior potência militar mundial para a Ásia! Assim seja.

O ministro João Baptista Borges anunciou a instalação de uma fábrica de alumínio em Angola. Os malefícios da guerra são imensos. Um deles é termos pessoas de décima categoria na direcção dos partidos e do Estado. À frente de empresas estratégicas. Só vamos recuperar desses malefícios daqui a 150/200 anos. Mas a longa guerra trouxe um benefício. Pudemos partir do quase zero em 2002. Essa situação permitia proibir qualquer indústria poluente em Angola. Proibir insecticidas e pesticidas na produção agrícola. Qual o quê! Estamos a aceitar todo o lixo venenoso que os países desenvolvidos rejeitam. 

O senhor ministro João Baptista Borges fica a saber que está a prestar um péssimo serviço a Angola e ao Povo Angolano. O alumínio é veneno mortífero! A indústria do alumínio é a maior contribuinte para o aquecimento global. A refinação da alumina envenena o ar que respiramos. Gera gases e aerossóis cáusticos. Poeiras altamente corrosivas. Destrói a vida de pessoas, plantas,  animais, ar, terra e água.

Depois temos as “lamas vermelhas”. No mundo são produzidas 90 milhões de toneladas desses resíduos altamente poluentes. Normalmente são depositados em lagoas artificiais que custam fortunas! Mas o preço maior é a poluição das águas à superfície e das águas profundas. Angola tem poderosas reservas de bauxita donde é extraída a alumina. Isto quer dizer que vamos ser envenenados em todo o processo, da alumina aos cabos eléctricos e outros produtos. 

Senhor ministro, exportem a bauxita! Os donos das fábricas de alumínio que extraiam a alumina nos países deles. E não aceitem uma fábrica de alumínio em Angola. Nunca. Pobres e envenenados não! Qual é o problema para Angola se comprar produtos acabados de alumínio? Nenhum. Também importamos iates, Lexus, outros popós de luxo e ninguém se queixa.

* Jornalista

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