Eduardo Oliveira
Silva – Jornal i, opinião
Embora a figura não
exista como tal,uma moção de censura também deveser construtiva
A moção de censura
que o PS põe hoje à discussão na Assembleia da República tem uma dupla função
nesta fase, apesar de estar condenada à rejeição.
Em primeiro lugar
verberar a governação de Passos Coelho. Em segundo, tentar mostrar António José
Seguro e o PS como uma alternativa credível. Por partes.
Há razões de sobra
para censurar o governo. Além de não ter cumprido as promessas eleitorais
feitas numa altura em que havia dados suficientes para não esconder o
verdadeiro programa, o executivo não acertou uma única das suas projecções e o
ambiente económico tem-se degradado diariamente, ao ponto de Portugal estar
hoje mais perto que nunca de um segundo resgate, que já parece inevitável.
Simultaneamente, a condição social da população tem-se degradado a um ponto
inconcebível, com desemprego, recessão e desesperança. Além disso, o país está
suspenso de decisões do Tribunal Constitucional depois de o governo ter,
deliberadamente, optado por insistir em medidas que são manifestamente
contrárias à lei fundamental, numa atitude que lembra aqueles condutores que
andam em contramão e acham que são os outros que estão enganados. Além dos
erros económicos, das trapalhadas ao nível da coordenação política, da
estrutura pouco eficiente, o governo está também afectado por tensões entre os
seus próprios membros e, o que é mais grave, por divergências públicas
assumidas por importantes protagonistas dos dois partidos da coligação quanto à
necessidade de recomposição. Claro que, objectivamente, nada disto põe
formalmente em causa a legitimidade democrática do primeiro- -ministro nem a
sua manutenção. O grande problema é que a equipa dá sinais de cansaço e de
algum descontrolo, precisando no mínimo de uma recauchutagem, como acontecia
antigamente aos pneus gastos.
Quanto a Seguro, a
moção vem em momento adequado, se souber usá-la em seu favor. Em qualquer
circunstância, o líder do PS precisaria de utilizar um momento depressivo do
governo para ganhar ascendente político e dar de si uma imagem de alternativa
credível. Essa necessidade tornou-se ainda mais imperiosa depois do regresso
com estrondo à crista da actualidade de José Sócrates, que ainda por cima vai
tornar-se comentador já a partir de domingo.
Ao contrário de
Sócrates, Seguro não vai poder entrar em jogos de autojustificação do passado.
Pelo contrário, tem de apresentar alternativas económicas, sociais e caminhos
para o futuro que ultrapassem a mera dialéctica. Não tem evidentemente de
chegar ao extremo de apontar soluções governativas em termos de coligação ou de
maioria monopartidária, porque essa matéria está reservada ao eleitorado ou à
Assembleia.
Se não subir à
tribuna transmitindo esperança, ideias e convicção, Seguro não se poderá
admirar se, com a dose de fatalismo que os caracteriza, os portugueses acabarem
por usar no fim do debate expressões do tipo “para pior já basta assim”. Está
nas mãos dele evitar que isso aconteça e, convenhamos, não parece missão
impossível.
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