Daniel Oliveira – Expresso,
opinião
A função do
Tribunal Constitucional é, entre outras, analisar a constitucionalidade das
leis. Fá-lo, a pedido da Assembleia da República ou do Presidente da República.
É essa, e não outra, a sua responsabilidade. Essa análise, longe de ser
objetiva, pode ter em conta algumas circunstâncias. Por exemplo, pode
determinar-se que uma decisão só se aplica a partir do momento da deliberação.
Não se deve, como fez o Tribunal Constitucional no último Orçamento, dizer que
uma norma é inconstitucional e que, no entanto, por razões externas à lei, pode
ser aplicada no futuro. Ao decidir assim os juízes determinaram quando é e
quando não é válida a lei, enfraquecendo a Constituição que juraram defender.
O Tribunal
Constitucional não está vinculado ao memorando da troika. Ele não é tido
nem achado para a sua decisão. São os decisores políticos que têm de garantir a
conformidade entre os acordos que assinam com instituições externas e a lei
fundamental. A Constituição está acima de qualquer memorando. E a
democracia exige que poderes diferentes cumpram funções diferentes. Isto é
especialmente importante em momentos extraordinários e de crise. Caso
contrário, permitimos a arbitrariedade.
O governo, decidiu,
com notícias colocadas na imprensa e declarações do primeiro-ministro, fazer
chantagem sobre os juízes do tribunal. Garantindo que um chumbo do Orçamento
levará a um novo resgate ou a uma crise política. E exigindo-lhes
responsabilidade. A ver se nos entendemos: a única responsabilidade dos juízes
é determinar se o Orçamento respeita a Constituição. Todas as consequências da
inconstitucionalidade parcial ou total das normas que o TC está a analisar são
da exclusiva responsabilidade de quem fez o Orçamento. A queda do governo
ou um novo resgate, em caso de chumbo do Orçamento, só pode ser imputada à
maioria parlamentar se, pela segunda vez, não tiiver cumprido a lei fundamental
escrita por deputados e não por juízes.
Mas a estratégia de
condicionar o TC parece já ter começado a resultar. O Tribunal, que passou a
ser uma fonte de fugas de informação para os jornais (o que é gravíssimo), fez
saber que só tomará uma decisão depois da moção de censura do PS. Tentando
com isto defender-se de uma confusão entre as funções do tribunal e da
oposição, fez exatamente o contrário: confundiu o que não pode ser confundido.
O Tribunal deve ser
frio. Gelado, mesmo. Nem a sua decisão nem o tempo em que a toma devem
depender de qualquer acontecimento político que lhe seja externo. Não deve
fazer uma gestão mediática deste processo. Deve, pura e simplesmente, com base
no orçamento que tem à frente e da Constituição que limita as demais leis do
País, tomar uma decisão. E deixar que sejam os atores políticos a gerir as
consequências políticas, económicas e sociais e a assumir as suas
responsabilidades. Para o resto, estamos cá nós, os cidadãos: para
responsabilizar quem tem o poder de tomar decisões políticas que determinam o
nosso futuro.
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