quarta-feira, 3 de abril de 2013

O Tribunal Constitucional não é responsável pelas consequências das suas decisões




Daniel Oliveira – Expresso, opinião

A função do Tribunal Constitucional é, entre outras, analisar a constitucionalidade das leis. Fá-lo, a pedido da Assembleia da República ou do Presidente da República. É essa, e não outra, a sua responsabilidade. Essa análise, longe de ser objetiva, pode ter em conta algumas circunstâncias. Por exemplo, pode determinar-se que uma decisão só se aplica a partir do momento da deliberação. Não se deve, como fez o Tribunal Constitucional no último Orçamento, dizer que uma norma é inconstitucional e que, no entanto, por razões externas à lei, pode ser aplicada no futuro. Ao decidir assim os juízes determinaram quando é e quando não é válida a lei, enfraquecendo a Constituição que juraram defender.
O Tribunal Constitucional não está vinculado ao memorando da troika. Ele não é tido nem achado para a sua decisão. São os decisores políticos que têm de garantir a conformidade entre os acordos que assinam com instituições externas e a lei fundamental. A Constituição está acima de qualquer memorando. E a democracia exige que poderes diferentes cumpram funções diferentes. Isto é especialmente importante em momentos extraordinários e de crise. Caso contrário, permitimos a arbitrariedade.

O governo, decidiu, com notícias colocadas na imprensa e declarações do primeiro-ministro, fazer chantagem sobre os juízes do tribunal. Garantindo que um chumbo do Orçamento levará a um novo resgate ou a uma crise política. E exigindo-lhes responsabilidade. A ver se nos entendemos: a única responsabilidade dos juízes é determinar se o Orçamento respeita a Constituição. Todas as consequências da inconstitucionalidade parcial ou total das normas que o TC está a analisar são da exclusiva responsabilidade de quem fez o Orçamento. A queda do governo ou um novo resgate, em caso de chumbo do Orçamento, só pode ser imputada à maioria parlamentar se, pela segunda vez, não tiiver cumprido a lei fundamental escrita por deputados e não por juízes.

Mas a estratégia de condicionar o TC parece já ter começado a resultar. O Tribunal, que passou a ser uma fonte de fugas de informação para os jornais (o que é gravíssimo), fez saber que só tomará uma decisão depois da moção de censura do PS. Tentando com isto defender-se de uma confusão entre as funções do tribunal e da oposição, fez exatamente o contrário: confundiu o que não pode ser confundido.

O Tribunal deve ser frio. Gelado, mesmo. Nem a sua decisão nem o tempo em que a toma devem depender de qualquer acontecimento político que lhe seja externo. Não deve fazer uma gestão mediática deste processo. Deve, pura e simplesmente, com base no orçamento que tem à frente e da Constituição que limita as demais leis do País, tomar uma decisão. E deixar que sejam os atores políticos a gerir as consequências políticas, económicas e sociais e a assumir as suas responsabilidades. Para o resto, estamos cá nós, os cidadãos: para responsabilizar quem tem o poder de tomar decisões políticas que determinam o nosso futuro.

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