Eduardo
Oliveira Silva – jornal i, editorial
Ao
contrário do que o governo proclamava, a retoma não existe e a culpa não é do
Tribunal Constitucional
Está
novamente a preparar-se a tempestade económica e social perfeita em Portugal. Para isso
concorre simultaneamente a degradação da situação internacional e nacional.
No
contexto internacional é inevitável que, mais tarde ou mais cedo, haja
consequências directas das situações dramáticas e extremas que se vivem em
países essenciais para o abastecimento de petróleo ao mundo, como o Iraque, que
está a ser tomado por forças sunitas radicais que podem acabar com o que resta
do país e lançar o caos numa vasta região.
Há
também conflitos mais próximos que afectam a estabilidade e, portanto, a
economia, como o da Ucrânia, condenada a ficar dividida em territórios
autónomos e praticamente inimigos ou a dar origem a novos Estados, para já não
admitir a integração de mais algumas regiões na Mãe Rússia.
Na
sua pequena escala, Portugal continua a ser um país tranquilo, seguro,
prazenteiro para o turismo, mas onde nada de estrutural muda, limitando-se o
governo a uma política de austeridade, cortes , ataques a reformados e
funcionários públicos e à venda de empresas que rendiam dividendos.
É
verdade que não se deu a espiral recessiva que se temia e antevia, mas até isso
se deveu ao facto de o Tribunal Constitucional ter devolvido aos bolsos dos
portugueses algum dinheiro, animando a procura interna.
Tirando
os juros da dívida nacional e de todos os países do mundo, não há boas
notícias, e não é o facto de o vice-presidente da Comissão Europeia Antonio
Tajani ter dito que a Europa deve acabar com a austeridade que impede que, até
2019, tenhamos de cortar um total de 7 mil milhões de euros nos orçamentos, o
que fará com que continuemos a perder em áreas como a saúde, a segurança social
e outras funções do Estado, como a defesa e a justiça.
Os
números macroeconómicos mais recentes apontam para uma queda da actividade
económica, demonstrando que não tinham fundamento as proclamações de êxito do
governo.
Quanto
à economia das pessoas em concreto, a situação agrava-se continuamente. Ainda
ontem vieram a público dados do Banco de Portugal que indicam que, por dia, 80
famílias estão a falhar o pagamento das suas casas, registando-se 4083 novos
casos só este ano. Mais grave, o número total de incumpridores está quase a
voltar a atingir os 150 300 de 2012 (faltam cerca de 500). Consequência
directa: o fisco está a penhorar e vender 189 casas por dia, em média.
Este
é o quadro em que
Portugal vive. Não vale a pena iludir as questões de fundo. A
retoma não está a acontecer e, mesmo que haja alguma proximamente, será apenas
por três factores possíveis: Sines voltar a funcionar em pleno, a Autoeuropa
vender mais uns milhares de automóveis e o turismo estar a dar bons resultados.
Menos mal se assim suceder, mas há uma coisa que já é indiscutível e
incontroversa: nada mudou no nosso paradigma económico. Apesar de um ministro
da Economia vindo das empresas e de casos de sucesso nas exportações,
designadamente o calçado, o vinho, a agro-indústria e algumas áreas
tecnológicas ainda residuais, a verdade é que o nosso tecido económico mantém o
mesmo perfil de sempre. Ora isso não é culpa do Tribunal Constitucional, mas é
certamente, em parte, responsabilidade do governo, que não consegue condições
para que se possa injectar dinheiro mais barato na economia nacional, onde as
taxas são exorbitantes ao pé das que, por exemplo, são cobradas na Alemanha, o
que é um factor fundamental de competitividade. Menos retórica de política
interna e mais acções concretas é algo de que Portugal necessita urgentemente.
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